MISTÉRIO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “La Cortigiana”
JAS 2023
(71x88, em papel de algodão
Hahnemuehle, 310gr, Artglass AR70
em mold. de madeira)
Original de minha autoria
Dezembro de 2025

"La Cortigiana" - JAS 2023
POEMA – “MISTÉRIO
QUE ROSTO
Tão belo,
O teu,
E que voz
Tão afinada
Que dá corpo
Ao teu canto
Nos momentos
De alegria,
Quando és
Por amante
Desejada,
Por quem em ti
Mais confia.
QUE CORPO
Tão perfeito,
Em movimento,
A dançar,
Que magia
No palco
Da fantasia
Quando te vejo
Voar.
QUE MÃOS
Tão criativas
Sempre
Entregues
Às tuas
Belas pinturas,
Com segura
Inspiração,
De todas
Entre as mais puras,
Por divina
Vocação.
QUE MUSAS
Que nos encantam
Por tudo aquilo
Que são,
Por sua imensa
Beleza
E por tudo
O que nos dão.
MAS, TU,
O que sabes
Tu fazer?
Disse à musa
Que um dia
O encantou;
O que, de ti,
Podes dar?
Foi o que então
Perguntou.
NADA
Tens pra oferecer,
Nada tens
Na tua mão
Para os que apenas
Te amam
Sem saber
Por que razão?
SÃO MISTÉRIOS
Do amor
De que não
Se conhece
Razão
(Respondeu-lhe,
Fria, a musa),
São mistérios,
Isso são,
Enigmas
Que os poetas
Cantam
Com arte
E precisão.
ESTRANHO
Fenómeno
Da vida,
Mistério
Sem causa
Aparente,
Filho incerto
Do destino,
Entra na alma
Do amante,
Qual passageiro
Errante,
Poderoso
E genuíno.
CANTAR,
Dançar,
Pintar,
Nada disso
Já interessa,
Quando o amor
Bate à porta
Logo a aventura
Começa.
E COMEÇA
Sem aparente
Razão,
Nasce ali
E logo nasce
Intenso
Como paixão
Para que a vida
Renasça
Com a força
De um vulcão.

CATARSE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Perfil de um Poeta”
JAS 2025
Original de minha autoria
Dezembro de 2025
"Perfil de um Poeta" - JAS 2025
POEMA – “CATARSE”
SINTO A TUA FALTA
E como a sinto
Eu danço
E não descanso
Até cair exausto
No palco
De um poema.
OUÇO O ECO
Do teu silêncio
Apenas sussurrado
E, como o ouço,
O meu canto
É um pouco
Triste,
Desencantado.
MAS JÁ NÃO SINTO
O veludo
Da tua pele
E como não o
Sinto
Eu pinto-a
De cores intensas...
...........
Numa folha
De papel.
NÃO OUÇO
A tua melodia
E como não a
Ouço
Fico em silêncio
Para melhor
Te sentir
Cá dentro
Da fantasia.
FAZ-ME FALTA
A tua voz,
Faz-me falta
O teu sorriso
E por isso
Te recrio
E te levo
Ao paraíso.
DA TUA FALTA
Nasce em mim
A orquestra
Para uma sinfonia,
Andamentos
Sem fim,
Contrapontos do
Silêncio,
Corpos que
Dançam,
Luzes, cores,
Aromas, flores,
Uma bela
Cenografia
Neste palco
De palavras,
Neste palco
De magia.
E ASSIM NASCE
Este meu canto,
Do silêncio e
Da dor,
Na dança
E no amor,
Em poesia,
Nas palavras
Que lanço
Ao vento
Construindo
Estas pontes
Pra te ter
Por companhia.
VISITO-TE
De mil maneiras,
Procuro-te
Numa torre
De marfim
Enredado
Numa teia
Para melhor
Te sentir
Com a leveza
Da arte
E em forma
De sereia,
Naufragar
Nesses teus olhos
Ao som
De uma bela
Melopeia.
OS SEIOS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Mulher”.
Pintura de JAS (2025) sobre foto
artística de autor anónimo
e de minha propriedade.
Dezembro de 2025.

"Mulher". JAS 2025
POEMA – “OS SEIOS”
ERAM OS SEIOS
De uma mulher
A sua atracção
Fatal,
O que ela
Lhe dizia
Para ele
Era banal,
Mas a forma
Do seu peito
Era desenho
Perfeito
De um corpo
Sensual.
CONTOU-ME,
Em tarde
De melancolia,
Da arrebatada
Pulsão,
Quando ele
Nesse dia
A perdera
E ali mesmo
Vira morrer
Essa fatal
Atracção.
ERAM SEIOS
Generosos
(Disse-me,
Com certo brilho
Nos olhos,
Mas serena
Amargura)
Os dessa linda
Mulher,
Uma imensa
Alvura
Em formas tão
Sensuais...
............
Era a física
Mais pura
Dos corpos
Que se atraem
E seus embates
Fatais.
CONFESSOU,
Com olhar
Um pouco vago,
Que o seu corpo,
Insistente,
O convidava
A olhar,
Bem de frente,
Com a libido
A ferver...
..........
E, então,
Estremecia,
Ficava paralisado,
Não sabia
O que fazer.
MAS NADA MAIS
Ele queria
(Foi o que sempre
Lhe disse)
Do que vê-la
Em pose
De maternal
Sedução,
Alimento
Dessa sede
Tão faminta,
Dessa irresistível
Pulsão...
SENTIA-OS
Como fetiche,
Como se a vida
Lhe pedisse
Apenas um seu
Olhar,
Criança perdida
No mundo,
Náufrago
Em alto mar...
MAS, AGORA,
Já sem a visão
Que sempre
O atraíra
(Foi o que logo
Me disse),
Só sentia
Melancolia
E uma doce
Nostalgia
Desse corpo
Sedutor
Onde naufragara
Um dia,
Em busca de
Salvação...
................
Ou talvez mesmo
De amor.
MULHER-MÃE
Era destino
Que só nela
Se cumpria,
Fruto de uma longa
Solidão
Que se consumou
Nesse dia,
Como se tudo
Só fosse
Uma doce ilusão,
Um fruto
Da fantasia...
...............
Ou, então, fosse
Paixão!

O AZEVINHO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Azevinho om Bagas”
JAS 2025
Original de minha autoria
Novembro de 2025

POEMA – “O AZEVINHO”
NÃO SEI PORQUÊ,
Talvez seja
O destino,
As bagas
Lá apareceram
No azevinho
Que vi,
Um arbusto
Pequenino
Que pôs fim
Ao que sofri.
ERA MESMO UM
Azevinho,
Com as bagas
Vermelhinhas,
Daquelas
Que sempre quis,
Eram bagas
Como as minhas,
Que me faziam
Feliz.
FUI AO MERCADO
(Nem sei bem
Por que razão)
E logo vi
Um azevinho
Com bagas
Tão vermelhinhas
Que nem quis
Acreditar...
............
Estava mesmo
À minha espera
Para comigo
O levar?
COMPREI-O
À vendedora
E li-lhe o poema
Das bagas,
Das outras
Que eu cantei,
Quis mostrar-lhe
O meu encanto,
Falar-lhe
Daquele tempo
Em que por ele
Esperei.
LEVEI-O LOGO
Para o meu amado
Jardim
Era isso
Que ele esperava,
Ser cuidado
Só por mim...
E PLANTEI-O
Onde ele irá
Crescer,
Ao lado
Do azevinho
Que bagas
Nunca quis ter,
Ficando sempre
Sozinho
E não sei
Se a sofrer.
E ASSIM FELIZ
Fiquei
Encontrei as minhas
Bagas,
As que sempre
Procurei.

TARDE DEMAIS
Poema de João de João de Almeida Santos
Ilustração: “S/Título”
JAS 2025
Original de minha autoria
Novembro de 2025
POEMA – “TARDE DEMAIS”
TARDO A ENCONTRAR-TE
Porque não sei
Como procurar-te
Guiado
Por um poema,
Pois não sei
Onde o vento
O levará.
NÃO É A VONTADE,
Mas o destino
A marcar
Os passos
Que eu darei
Ou que nunca
Ousarei
Nas estreitas
Veredas
Da vida.
Ah, mas isso
Eu não sei,
É certeza
Proibida.
E TU SABES
Que não sei,
Mas sabes
Por onde andei
E onde
Eu me perdi
À procura do que
Não podia ter,
Até que te encontrei,
No fim
Desse caminho
Que já nem sei
Se trilhei
Ou se o abandonei
Antes de um qualquer
Começo....
...........
Ah, isso
Também não sei.
ÀS VEZES
Encontrava-te,
Encontros fugazes,
Onde o teu brilho
Me iluminava
Por dentro
E me cegava
Por fora.
MAS NÃO SABIA
Se te queria
Para nunca
Te ter,
Sentir saudades
Do perfume
Da aurora
Quando te reencontrasse
Na memória fresca
Dos afectos
Inacabados...
..................
Os mais perfeitos,
Os mais cantados.
SIM, DEIXO-ME IR
Nas mãos
Do destino,
Mas há sempre
Um sobressalto,
Repentino,
Quando o real
Me atropela
Por dentro
E tudo se torna
Estranhamente
Inóspito.
SE NÃO ME DEIXO IR
Viajo para outros
Lugares,
Tenho sempre
De viajar
À procura de mim,
De um espelho
Onde me veja
Por dentro
A olhar-te
Por fora,
À espera do próximo
Sobressalto...
.................
Que nunca demora.
COMO ME PERTURBA
Esse véu
Que te cobre
Quando te quero
Pintar
Com palavras,
Ver-te nua,
Com a alma
A tiritar,
Despida,
À mercê dos
Tumultos
Que te marcam
Como sulcos,
Cicatrizes
Ásperas
Da vida.
MAS EU PROCURO-TE
Com olhar
Atento,
Perscrutando
A alma
Que se aninha
Em ti
Para te proteger
Do risco da beleza
Exposta
Como fractura,
Aquela que os poetas
Cantam
Quando pressentem a
Liberdade
À beira
Da ruptura.
TALVEZ A NOITE
Também te sirva
De véu
E te cubra
As cicatrizes
Da vida,
Luz coada
Pela penumbra
Que te amacia
A alma
Encrespada
E te devolva
Como sonho
Intemporal
Onde te reinventarei
Como mulher
Desejada...
..........
Para além
Do bem
E do mal.
TARDO
A encontrar-te
No bulício
Dos dias
Até que no amanhecer
De um poema
Te reencontre
E te diga
Com o olhar,
Sem mais,
O que não posso
Dizer
Com estas palavras
Já gastas...
..................
Mas talvez já seja
Tarde demais.
VENTO DO DESERTO
O Regresso da Medusa
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “S/Título”
JAS 2025
Original de minha autoria
Novembro de 2025
"S/Título". JAS 2025
POEMA – “VENTO DO DESERTO”
IRROMPESTE
Como rosto
Esculpido
Com arte
Pelo vento
Num dia
De neblina
Um pouco frio
E cinzento.
EM TEUS CABELOS
Se reflectia
A beleza
Do teu rosto
E tu resistias
Ao vendaval
De palavras
Que o vento,
Teimosamente,
Ia soprando
Sobre ti.
UM VÉU
Cobria-te
Levemente
Como tecido
De mensagem
Cifrada
Trazida
Pelo vento,
Pelo tempo
Desenhada.
MAS TU FUGIAS
Para dentro
De ti
E esculpias
Com tuas mãos
Outra mensagem,
Pó do deserto
Sobre véu
Em filigrana.
VINHA DO DESERTO,
O vento,
E trouxe consigo
A Medusa
Para petrificar
A tua imagem?
SIM, PORQUE TU,
Sem um espelho
Na alma
E olhar
Incerto,
Ias-te
Petrificando
Como escultura
Soprada
Pelos deuses
Do deserto.
ERAM RISCOS
A três dimensões
E desafiavam
As finas letras
Que eu ia
Desenhando
A preto e branco,
Mas com cor
E luz
Por dentro,
Para melhor
Te ver
E te tocar,
Docemente,
No fio
Do horizonte,
Onde, com elas,
Se cristalizava
O meu desejo
De ti,
Como lava
Ardente.
AH, ESSE ROSTO
Que o poema
Cantará
Fustigado
Pelo vento
Do deserto
Em fuga vã
Desse lugar
De onde
Nunca sairá...
ROSTO ESCULPIDO
Por ti,
Como Medusa
De ti própria,
Sem saber
Que quanto mais
Te desenhares,
Petrificada,
Mais te suspendes
Sobre estas mãos
Que, de longe,
Te acariciam
Com palavras
E te elevam
Ao Parnaso...
..............
O que me sobra
De ti,
Inelutável
Ocaso
De tudo
O que eu senti.
MUDA TUDO, TUDO MUDA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Encruzilhada”
JAS 2025
Original de minha autoria
Novembro de 2025
POEMA – “MUDA TUDO, TUDO MUDA”
MUDA O VENTO
E mudam também
As palavras,
O poeta
O dizia.
Sobre sinais
Era sábio,
Mas de vento,
Isso não,
Sobre o vento
Pouco sabia.
MUDA TAMBÉM
A vontade
E muda
De direcção,
Mudam
As cores
Com que a pinto
Pra temperar
A ambição.
O QUE CONTA
São os ciclos
Desta vida,
Os que o tempo
Desenhar
Pra cada nova
Partida
Num eterno
Movimento
Como o das ondas
Do mar.
HÁ ENCRUZILHADAS,
É preciso
Escolher
Para logo decidir,
Mas às vezes
Não podemos
E, então,
Ah, então,
O que fazemos?
Temos mesmo
De fingir.
MAS NÃO HÁ
Muito a fazer
Porque o vento,
Sempre o vento,
Sopra às vezes
Numa certa direcção
Para levar
As palavras
A voarem
De feição.
MUDAM OS TEMPOS
Muda o vento,
Muda a vontade
E a ambição
E até muda
A verdade
Quando é forte
A ilusão.
MAS AS CORES
Do arco-íris
(Essas, que belas
Que são)
Viajam sempre
Comigo,
Voam leves,
De feição,
Mesmo que alguém,
Por castigo,
Possa dizer-me
Que não.
AS CORES
Animam
A vida
E o desejo
De mudança
Pois transformam
O incerto
Em horizonte
D’esperança.
O COREÓGRAFO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Penché” JAS 2025 Original de minha autoria Novembro de 2025
POEMA – “O COREÓGRAFO”
SOU COREÓGRAFO Da minha alma, Desenho-me No espaço Com a suave Melodia do teu Silêncio, Sempre embalado Por essa música Inaudível Que soa sempre Desse teu lado... IMAGINO-TE, Às vezes, Num solo, Em palco, Numa noite De luar, Na praia Da meia-lua, Bailando Ao som Dos murmúrios Intermitentes Do mar. MAS O SILÊNCIO É a tua Sinfonia, O teu canto De sereia, A melodia Que ressoa Nesse mar Murmurejante De linóleo Onde te desenho Em suave Bailado, A despedida Que nunca Terá fim... .............. Esse meu fado. GOSTO DESTA DANÇA, Contraponto Dos sinais Invisíveis Com que pontuas A tua assinalada Ausência, Um bailado A solo Com o som Dos murmúrios Do mar E da minha poesia Na praia Da meia-lua, Numa noite De luar E perfume De maresia. E EU CANTO-TE, Mas neste meu Canto Eu conto-me Como espelho Onde podes Rever O passado Desse futuro Que nunca Existirá. AGORA, SOZINHO Na praia Da meia-lua, Acendo um sol Com as minhas mãos E procuro O que nunca Encontrarei, A não ser Sombras De mim próprio, A cantar, Como se as notas Musicais Estivessem Gravadas Na areia branca Da baixa-mar. ESTE, O que te celebra Em arte, Com poesia, Já não é ele, Mas o coreógrafo Da sua melancolia.
AS BAGAS
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Bagas no Jardim”
JAS 2025
Original de minha autoria
Outubro de 2025
POEMA – “AS BAGAS”
AO RAIAR
De um certo dia
Desci logo
Ao jardim,
Havia algumas
Rosas,
Um azevinho
Sem bagas,
Três cameleiras
Frondosas
E tudo ali
Para mim...
VI DEUSA
Desnudada
Por entre verde
Folhagem,
Uvas frescas
De latada
E a deusa
Como imagem.
MAS AS BAGAS,
As bagas
Do azevinho,
Vermelhas,
Cor do meu sangue,
Não as tinha,
O pobrezinho,
Era arbusto
Exangue.
E EU TRISTE
Por as não ter
A fazer-me
Companhia
Quis um enxerto
Fazer
Com bagas
Como as queria.
PEDI AO JARDINEIRO
Que as trouxesse
Pra mim,
Pois sem elas
Era pobre
O meu amado
Jardim.
MAS O TEMPO,
Sempre o tempo,
Não as daria
Até o azevinho
Crescer,
Por isso, pus mãos
À obra
Para em versos
As ter...
EM VERSOS,
Também em cor,
Era assim
Que as teria,
Quisesse
O pintor
Pintá-las,
Ilustrar
A poesia.
BAGAS
E fantasia,
Ali prontas
Pra criar,
Não as tendo
O azevinho
Desenhei
Um novo arbusto
Para bagas
Ele me dar.
E ASSIM FIQUEI
Feliz
Por ter bagas
Vermelhinhas,
Não eram
Do azevinho,
Mas as bagas
Eram minhas.
A OFERTA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “A Montanha Encantada” JAS 2022 (94x119, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70 em mold. de madeira) Original de minha autoria Outubro de 2025
POEMA: “A OFERTA”
DO ESTRANHO Encontro Que aconteceu Nesse dia Quis libertar Minha alma, Junto ao mar, À hora Da maresia, Quando a brisa É mais calma, Amiga Da fantasia... ................ Mas só libertei O meu corpo Da opressão Que sentia. FICOU O CORPO Sozinho, À deriva, nesse dia, Mas no regresso Da praia Encontrei-a No caminho... ........ Milagre Da fantasia! LOGO LHE FIZ Um poema Pois a brisa Já não chegava, Pus palavras A sorrir Quando a alma Regressava. DEPOIS VIAJEI Prà montanha, Colhi frutos Lá no alto Pra lhos trazer No cabaz, Guardei-os junto Do peito Pra esse encontro Fugaz, Mas que eu queria Perfeito. “LEMBRAS-TE BEM Dessa cesta E dos frutos que Trazia?”, Perguntei-lhe Nesse dia. “Vinham todos Da montanha, Traziam consigo Alegria”. ESSES FRUTOS Eram poemas Que lhe queria Ofertar, Derramavam seus Aromas Em palavras de Embalar. NA CESTA Havia estrelas Às centenas, Vermelhinhas... ................ “Não viste nelas Cintilas Que voavam Tão juntinhas?” ERAM MIL CORES E aromas Que desses frutos Brotavam, Colavam-se À minha alma Porque por ela Passavam. “DEPOIS PARTISTE Com eles, Rápida, Sem me olhar, E eu por ali Me fiquei, Parado, Sem saber O que pensar”. “SÓ À NOITE Me disseste: Obrigada, Meu amigo, Esses frutos Que me deste, São belos E tão gostosos, Mas não são O teu abrigo”. PRA SUPORTAR A tristeza Vali-me Da poesia, Escrevi versos Em rima Pois sempre Neles ecoa Uma bela melodia. CUREI O CORPO, Não a alma, Porque ficou Presa a ela Desde o dia Em que a vi, Ninguém pode Devolver-ma... .............. Mas, assim, Não a perdi.
SORRIR
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Sorriso”
JAS 2023
(49x82, papel de algodão,
310gr, e verniz Hahnemuehle,
Artglass AR70 em mold. de madeira)
Original de minha autoria
Outubro de 2025
"Was bleibet aber,
stiften die Dichter"
"Mas o que permanece,
os poetas o fundam"
Hölderlin
POEMA – “SORRIR”
SE O TIVESSE
Comigo,
O mundo
De que preciso,
Trocava-o
Por um sorriso
Ou a ternura
De um olhar,
Olhos castanhos,
Olhos bonitos,
Perder-me neles,
A navegar...
MAS NÃO O TENHO
E pouco importa,
Também o mundo
Já não é meu
E não posso
Oferecê-lo
Como se fosse
O meu céu...
É GRANDE DEMAIS
Para mim,
Meu fugaz
Acontecer
Num tempo
Que não tem fim,
É maior
Que o meu querer
Porque o mundo
É assim.
AH, MAS POSSO
Oferecer
O mundo
Do meu olhar,
Posso sorrir,
Posso escrever
E pintar,
Posso esculpir
Aquele rosto
Que sempre
Quis cativar.
OFEREÇO-ME
A esse rosto
Com a minha
Fantasia,
É um modo
De o ter
À medida
Do desejo,
Em festa,
Epifania,
Assim,
Como ainda
O vejo.
SONHAR
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “S/Título” JAS 2025 Original de minha autoria Outubro de 2025
POEMA – “SONHAR”
SONHEI, Um dia, Que as palavras Se gastaram, Desataram, Desfiaram, Sobrando Apenas fios Para tecer O silêncio Com que ainda Me falas. SONHEI Que a tinta Perdeu cor, Que não havia Poemas E que não era Pintor. SONHEI Que não eras tu, Que foi tudo Uma ilusão, Que no sonho Estava nu, Deserdado De afeição. SONHEI Que não sabia Onde estás, O que fazes E o que sonhas Nas noites Do teu luar, O que vês Nesses momentos Fugazes Em que olhas Para ti, Que não me ouves Nem sentes Porque estás Tão longe daqui... SONHEI Que te procurei No mundo Da fantasia, Onde as flores Caminhavam, Sabiam a maresia, Tinham rostos De mulher... ........... Mas surdos Ao que eu dizia. NO SONHO Fui à memória, Que também Perdeu a cor, Ficou tudo A preto e branco E sonhei, Sonhei, sim, Que te perdi... ................. E que da perda Sobrou dor. SONHANDO, Procurei cor Num outro Lugar qualquer, Mas só encontrei O cinzento... ............ E por falta De outras cores Meus versos Tão desbotados Já nem iam Com o vento. FOSTE PRA ONDE Que eu não te vejo? Perguntei Quando do sonho Acordei. SAÍSTE De onde estavas E agora resta O desejo De te cantar Sem a cor Com que antes Eu te via Pra que ouças O silêncio Com que ainda Me chamas Seja noite, Seja dia. GASTARAM-SE As palavras, Gastou-se tudo Em meu redor, Só ficou o teu Cinzento, A tinta Com que pinto O meu lamento E me afundo Na dor.
A PORTA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “A Porta” JAS 2025 Original de minha autoria Setembro de 2025
¡Qué trabajo nos cuesta traspasar los umbrales de todas las puertas! Vemos dentro una lámpara ciega o una niña que teme las tormentas. La puerta es siempre la clave de la leyenda. Rosa de dos pétalos que el viento abre y cierra. Federico García Lorca, “Puerta Abierta”, 1921
POEMA – “A PORTA”
BATI LEVE, Levemente, A uma porta Com a luz Do meu jasmim, Silêncio, Foi o que ouvi, Do princípio Até ao fim. ILUMINADA Por jasmim Numa cascata De luz, Esta porta É mistério Pra quem O mistério Seduz. TALVEZ SEJA Porta De sacrário Que guarde Corpo Intangível De deusa Do meu passado, Entrada De templo Encantado, Esse lugar De mistério, Esse lugar Do sagrado. SÓ SILÊNCIO De catedral Se ouve Com seu eco Em surdina Que desafia O poeta A cantar O que o eco Ilumina. AH, A VERTIGEM Do oculto, Celebrado Por uma porta Vestida De luz Pelo imponente Jasmim Com essa cascata Brilhante Que brota Do meu jardim E que tanto Me seduz. FOSSE A PORTA Transparente E raios de sol E de luz Entrassem nela, Vítrea Como janela, Dissipava-se O mistério Que a porta Não revela. MAS EU QUERO Apenas pintar Essa porta, Ombreira D’inspiração, Porque não ouso Passar A fronteira Que desvela O mistério Que há nela Com esta minha Canção.
LIVIDEZ
DIÁLOGO COM O PASSADO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Lividez” JAS 2025 (Variante de “La Cortigiana”, de 2023) Original de minha autoria Setembro de 2023
POEMA – “LIVIDEZ – DIÁLOGO COM O PASSADO”
ESTAVA Um pouco Lívido Esse teu rosto (Pintado), Caía tristeza Sobre ti Quando te via Ao sol-posto (A meu lado), Na rua Onde eu Te conheci. ERA TRISTE Altivez? Talvez fosse, Talvez, Porque olhavas E não me vias Quando passava A teu lado, Com a minha Timidez, Na rua Do desencontro, Já um pouco Desolado... ........ Pela tua Lividez. TUAS MÃOS, Ah, essas mãos, Desenharam-te Como pecado Em porcelana, Alma em fuga Desta vida Para um mundo Onde parecias Perdida. SENTIAS-TE Gueixa, Lá dentro De ti, Na cidade Proibida, No dia Em que perdi O que me Sobrara Dessa tua Incessante Despedida? PORQUE ESTAVA Lívido E triste O teu rosto? Não eras tu. Inventaste Esse perfil Onde te revias Na cidade Proibida Como eco Sensual Do meu remoto Desejo De te ter Na minha vida? PECADO De quem ama, Culpa Mortal Quando a divina Beleza É sensualmente Rasgada E ferida Por volúpia Carnal? COM QUE BÂTON Pintaste Essa alma Inquieta E incerta Que aflora, Intensa, Como desafio, Nessa boca Sensual? EMPUNHASTE-O, Esse bâton, Para desafiar, Certeira, Uma pulsão Que não ousas Depor E que cobres Com as cores Vivas De uma alma Em sobressalto... .............. Talvez ferida De amor? VEJO-TE, AGORA, A fumar, Lânguida, Com esse bâton Já gasto A transbordar De teus lábios Carnudos, Ao rubro, Em preguiça Abandonada, Pronta Para te dares, Não a mim, Mas sempre, Sempre, Ao olhar mágico De tuas mãos E da grafite Com que desenhas Milagres íntimos Sobre rostos Múltiplos E fugidios. ENTÃO PINTA-ME Também Com esse bâton E leva-me Contigo, Livres, Os dois, A quebrar Em mil pedaços Essa porcelana Do pecado Com a beleza Singela Desse teu Rosto doce E meigo Que acaricio Com as palavras Deste difícil Poema De reencontro Com o passado.
LUZ
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Paraíso” JAS 2022 (68x84, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em moldura de madeira) Setembro de 2025
POEMA – “LUZ”
TANTA LUZ, Meu Deus, Esse teu céu, Imenso mar, Espelho De todos Os sonhos Que dão asas Pra voar. O CÉU É BRANCO, Cintilante, Para te iluminar E os teus olhos Logo brilham, Em viagem, No meu mundo, A voar. QUANDO Nos sonhos Eu te vejo Iluminada Entro sempre Numa porta Branca Que me leva Ao paraíso, Guiado Por uma fada. E, ENTÃO, VOO, Deixando Para trás O meu Jardim Encantado, Os bailéus Da casa-mãe, Desenhados A rigor, A quelha da minha Infância Que já anuncia A viagem De uma vida D'errância E tantas vezes Com dor. NOS SONHOS, (Em todos eles) Caio das nuvens Brancas, Como Ícaro, Quase cego De tanta luz, No jardim Onde tu vives Sempre vestida De cores Como um manto Que seduz. É ESSA TUA LUZ Cintilante Que ilumina O que me sobra De ti, Nos sonhos Escritos, Pintados, Onde sempre Eu te vi E onde te vou Visitando Quando as saudades Apertam Por aquilo Que perdi. ETERNO RETORNO Na vida De um poeta Sonhador, Uma luz Que se acende Lá bem no alto Do céu, E o regresso Ao jardim, Esse céu Que é só meu.
VER
Poema de João de Almeida Santos Pintura: “La Peccatrice” JAS 2023, apud Klimt (57x88, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70 em mold. de madeira) Original de minha autoria Setembro 2025
POEMA – “VER”
QUANDO TE VEJO, Vejo-te a cores, Sinto aromas E provo sabores Na fantasia... EU VEJO TRAÇOS E vejo riscos E tantas fugas Prò infinito Nos sete céus Dessa magia E eu logo digo O que já sinto A quem pergunta: – É poesia. AO LONGE, O horizonte Desses teus riscos, Aqui, uma ponte Desenhada Que me leva Ao pé de ti Quando o rio Já transborda E eu sinto Que me perdi. QUANDO TE VEJO, Eu vejo ruas, Eu vejo praças E catedrais, Vejo desenhos Nas tuas mãos, Vejo vitrais E vejo sóis Em refracção Que aquecem A minha alma Porque é bela Esta visão. E VEJO ROSTOS, Vejo-te a ti Nesses poemas Que escrevi, Sentir-te perto Era o desejo, Ver o teu céu No horizonte, Sentar-me logo Neste meu banco E ver-te bela Sempre daqui. VEJO MONTANHAS E vejo cores, Eu vejo casas Por esses vales E esses rios Por onde corre O fio d’água Com que tu regas O teu jardim Pra nele nascerem Os meus poemas E a tua pele Ser de cetim. SINTO NO AR O teu calor, Cabelos negros A esvoaçar E sinto o vento Nesse teu rosto E altas ondas No nosso mar Mesmo que venhas Já no sol-posto Com os teus barcos A navegar Na imensidão Onde se perde O meu olhar. EU VEJO TELAS E os teus pincéis, Vejo a tinta Na tua mão, Vejo-te a ti, Doce pintora, Tão concentrada Nesses quadros Em construção. VEJO QUADROS E vejo letras, Nessa pintura Vejo sinais, Eu vejo tudo Neste pontão Do nosso cais E sou feliz De assim te ver... ............. E isso basta, Não quero mais. EU VEJO TUDO À minha volta, Mas não te vendo Eu sinto dor, Vem ter comigo A este rio, Passar a ponte Prò outro lado, Dar-me a mão E um sorriso, Fazer de mim Um ser amado Mesmo sem teres A tua ponte, Bela e leve, Já desenhado,
Mas, mesmo assim,
Que eu possa ser
O teu pecado. EU VEJO TUDO À minha volta, Mas faz-me falta O teu sorriso, Mesmo que minta Nada mais quero Pois é só disso Que eu preciso.
SONHO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “S/Título” JAS 2023 (original a cores e com o título “Epifania”: 79x82, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70 em mold. de madeira) Pintura de minha autoria Agosto de 2025
POEMA – “SONHO”
SONHEI Que numa tarde Fria De outono Te vi Fixando O vazio, Ausente, Um pouco Perdida, Como quem Já não sabe O que sente, Como exilada Da vida. NÃO ESTAVA Rubro De vida Esse teu rosto, Mas de uma cor Um pouco fria, Como se uma Moldura Te engolisse E apenas Te mostrasse Como retrato De um tempo Que voltar Já não podia. ROSTO Que eu só Sentia Interiormente No que ele Não me dizia E na mudez Gélida De um olhar Vago, Em abalada, À procura Não sei De quê, Talvez de nada. EU SENTIA-TE Como desejo Onírico De alma Vagante À procura do que Nunca Encontraria Para além De um corpo Em fuga, Já distante, E memória Dessa imagem Que perdia. DE TI, AFINAL, Só me sobrou Esse rosto, Tudo o que Me resta Pra te sonhar No longo Intervalo Entre mim E uma vida Pelo tempo Devorada Em que só já Sobra o frio Do silêncio... ............ E mais nada. SILÊNCIO Que se aninha Cada vez mais Dentro de mim, Ameaçando Emudecer-me E tornar-me Máscara Gémea de ti, Desenhada Com palavras Que já não Encontrarei Pois teu rosto E teu rasto Foi o que Eu já perdi... .......... E é por isso Que de ti Já pouco sei.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Travessia”
JAS 2022 (93x118, em papel de algodão,
310gr, e verniz Hahnemuehle,
Artglass AR70 em mold. de madeira)
Agosto de 2025
POESIA – “TEMPO”
CHRONOS
É o tempo
Em que tudo
Esmaece,
É neblina
Que cobre
O passado,
É juiz
Do que acontece
E decide
O que merece
Nele ficar
Registado.
O TEMPO
É escultor,
O tempo
É alquimia
Extrai
O ouro
Da vida
Pra só dela
Conservar
O que ela
Potencia.
MAS TAMBÉM É
Bruma
Espessa
Que dissipa
Os perfis
Que a vida
Desenhou,
Um certo rosto
Que já não vês,
Um perfume
Que se esvai,
Uma musa
Que por ti
Num certo dia
Passou,
Mas que desse
Passado
Não sai.
INEXORÁVEL,
O tempo
Desgasta
A vontade
De visitar
O passado
Que já não
Te pode sorrir,
Que já não
Podes tocar,
Onde já não
Podes ir
E não podes
Resgatar.
E ATÉ O POEMA
Vacila
Nessa espessa
Neblina
Onde tudo
Se esbate,
Bruma
Que cobre
O caminho
Que a vida
Nos destina
Pra travar
Esse combate.
MAS SUBSISTE
A memória
Que regista
O presente
Sob forma
De passado
Projectando
No futuro
O que será
Preservado.
ENTÃO O POEMA
Resiste,
Então o poema
Canta
O desejo
De futuro
E recria
O que na vida
Aconteceu
De mais intenso
E mais puro.
É O TEMPO
Da poesia,
O tempo
Da liberdade,
Reconstrói-se
Como futuro
O que já só era
Saudade.
VOAR
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Pássaro de Fogo”
JAS 2025
Original de minha autoria
Agosto de 2025
POEMA – “VOAR”
EU CANTO
E pinto
O meu destino,
Sonhos velados,
A minha vida,
Sonhos marcados
Por tudo aquilo
Que imagino
Nas noites frias
Da despedida.
PERDI A CHAVE
Do meu futuro
Já só me resta
A partida,
Por isso canto
E, como as aves,
Voo mais longe
E com mais cor
Porque no céu
Há mais azul
E nos meus sonhos
Já não há dor.
MAS HÁ SEGREDO
Não revelado
E se o dissesse
Não deveria,
Como poeta
E fingidor
Eu certamente
Até mentia.
E NÃO O DISSE,
Mas eu pequei
Com murmúrios
D’enamorado
Em poemas
Inocentes
Onde cantava
Esse meu fado
Com palavras
Luminescentes.
POR ISSO VOO
Sempre mais alto,
Trepo nas cores
Pra lá chegar,
O céu azul
Dá-me alento
Pra meus segredos
Nele guardar.
LEVO PALAVRAS
Comigo,
Procuro inspiração.
Levo cor,
O meu abrigo,
Levo a musa
E tudo o mais
E quando parto
Lá para cima
É sempre festa
Nesse meu cais.
LEVO-TE A TI
E desse jeito
Eu sou feliz
Lá bem no alto,
No azul do céu,
Onde respiro
Esse ar puro
E rarefeito,
Lá onde o mundo
É todo meu.
EU CANTO
E pinto
Pra exaltar
Esse teu rosto,
Iluminar
Em aguarela
Esse enleio
Do meu olhar
Pois se te vejo
Logo me vem
Esta vontade
De te pintar.
POR ISSO, CANTO
Por isso, voo,
Por isso subo
Lá para o alto
E dou-te asas
E o infinito,
Voar contigo
No céu azul
É um prazer...
............
E é bonito!
ILUSÃO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Bola de Cristal”
Original de minha autoria
Agosto de 2025
POEMA – “ILUSÃO”
A MUSA
Nunca existiu,
Dizia
O poeta
Fingidor,
Era apenas
Artifício
Pra simular
O amor.
E O POEMA
Também não,
São palavras
Ritmadas
Pra criar
A ilusão
De vidas
Que são
Criadas
Com alguma
Inspiração.
NADA EXISTE
A não ser
Como desejo
Que não se torna
Real,
Só nuvens
Que o vento
Leva
E já não voltam
Ao céu
Onde o poeta
Navega
E desenha
Com palavras
Tudo aquilo
Que perdeu.
O VENTO
É seu amigo
Leva palavras
Consigo
Pra simular
A vontade
D’estar sempre
Ao pé dela
Evitando
O castigo
De só a ver
Da janela.
É TUDO
Piedosa
Ilusão
De quem nunca
Partiu
Do lugar
Que habitou
Onde o amor
Mais não era
Do que aquilo
Que sonhou.
QUEM ÉS TU?
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Corpo” Original de minha autoria, baseado em foto em contraluz, de autor anónimo (Colecção privada) Agosto de 2025
POEMA – “QUEM ÉS TU?”
HÁ POESIA No teu corpo (Dizia o poeta), Delicada Geometria, Contraponto Expressivo De uma quente Melodia. HÁ MÚSICA, Pauta Da beleza física Que levita Entre cores, Aromas E sons, Em surdina, Construindo Enigmas Que só o Poeta Pode decifrar, Como quem Te ilumina. TENS A ALMA Inscrita No corpo, Como eu A tenho Nas palavras Com que construo Os poemas No discurso da Beleza Em que me vou Enredando Como em teia Que me prende E me liberta... ........... Com leveza. VEJO-TE Num bailado A solo, Dançando A despedida E canto-te Num poema Ao ritmo do Corpo E da alma Com que te Vais retratando Nas telas Pintadas Da vida. E PEÇO-TE Que não pares Esse teu Silencioso Bailado Até que eu Te desenhe Em palavras Pra que nelas Te revejas Como num espelho Encantado. MAS, AFINAL, Quem és tu? (Perguntou O poeta) Tu, que tantos Rostos tens E me falas Com o silêncio; Tu, que danças Em movimentos Que apenas Acontecem Na alma De um poeta; Tu, cuja melodia É a do vento Que me responde Com o eco Dos poemas, Vindo não sei De onde? NÃO SEI MESMO Quem és... Talvez a musa Inventada E constante Que me aquece A alma Quando o calor Das palavras Desaparece E ameaça Tornar-se Gelo puro E cortante. QUEM ÉS TU, Afinal? Uma só com Muitos rostos Ou todos Os rostos Num só Que se esfuma Cada vez mais Na bruma espessa Do tempo, Sem piedade Nem dó?
SAUDADE
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Musa” JAS 2025 Original de minha autoria Julho de 2025
POEMA – “SAUDADE”
QUANDO TE SONHAVA (Com palavras) Encontrava-te Sempre Num acaso Marcado Pelo destino, Olhava-te E segurava As tuas mãos Nos riscos Com que ias Desenhando Os teus rostos, A traço sempre Muito fino. OLHAVA-TE Nos olhos, Em silêncio, Timidamente, Com esse brilho Interior Que nunca se vê, Mas se pressente. AH, COMO GOSTO (Sempre gostei) Desse teu rosto, Linha de arte Saída de ti, Desse olhar Cúmplice Que me inebria E me sorri. DIZIA-TE Palavras (As do momento) Sobre o sol Que brilhava Ou sobre a chuva Que tardava, Sobre as nuvens Cinzentas Que pintavam O azul brilhante Do céu Ou sobre o vento Que me soprava Na alma E me fazia sentir Como quem Contigo renasceu. E SENTIA-TE Sempre Como quando Te vi Pela primeira vez, Sem saber Que fugiria contigo Da rua proibida Para este abrigo Dos poemas Onde agora, Clandestino, Sempre te revejo Como em espelho Mágico E cristalino. QUANDO TE PERDIA, Chegava, rápida, A saudade Que já espreitava Na esquina Discreta Desse teu olhar De permanente Despedida... E POR ISSO Te procurava Na arte, Nas palavras, Nas curvas Escritas da vida Que estão Mais cheias De poesia Do que aquilo Que nunca iria Acontecer A não ser Como pura Fantasia.
POEMA EM CONSTRUÇÃO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Trilhos” Original de minha autoria Julho de 2025
POEMA – “POEMA EM CONSTRUÇÃO”
MEMÓRIA Quente Acordada Por estímulo Vagante Na vida Desordenada De um tímido Amante. UMA LUZ, Um som, Uma aragem Interior, Um sobressalto, Saudade, Um sonho, Um encontro Inesperado Numa rua Da cidade. O CRESCIMENTO Interior Na alma De um poeta, Uma pulsão Que resiste A ser secreta, Um vai-e-vem Que não pára E se expõe Como sagrado Em ara. CAPTÁ-LA Com palavras Em movimento, É missão Pô-la ao vento, É música Em surdina, É ritmo, É melodia, Notas musicais Mil vezes Solfejadas Em busca De harmonia. RISCOS E CORES Desenhados Com fios De letras soltas, Soltar a alma Ao vento Em terras De utopia Como ondas Vivas, Revoltas, E cheiro A maresia. A COMPOSIÇÃO, O trautear De palavras Aquecidas Pela emoção, Memória viva Em busca De catarse Das cadeias Da paixão. OPERÁRIO Em construção É o que é O poeta E também A sua vida, Entre a penúria Do real E a sua Compensação, A riqueza infinita Da beleza Construída Como sua Salvação.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Tempo”, JAS 2025. Original de minha autoria. Julho de 2025.
POEMA – “TEMPO”
OS POETAS SÃO Seres Que vivem Em solidão Numa terra De ninguém, Foram-se Todos dali E quem se foi Já não vem. ELES VIVEM Entre o passado E o futuro, Num tempo Que não existe, Pois se o passado Passou No presente Já não persiste... ............. E o futuro Não chegou. NUNCA Se agarra O tempo, Ele foge Para a frente E também Foge Pra trás, Mas se voarmos Com ele Alguma coisa Nos traz. TRAZ-NOS O movimento, A vertigem Do futuro, Sermos rápidos Como o vento Em busca De porto Seguro. QUANDO Voamos com ele E o passado Já tem forma De futuro, Com palavras Se decanta Pra criar Um tempo novo Que seja Um tempo Mais puro. UM TEMPO Que é só nosso Liberto Da negação Onde a alma Se constrói Uma nova condição, Recriando O seu perfil Nessa sua solidão. É o TEMPO Da poesia, É o tempo Da criação, Se antes Era só uma
A via, Com o tempo E as palavras Voamos Numa outra Direcção, Movidos Pela fantasia.
O BEIJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "O Beijo". Original de minha autoria para este poema. Seis de Julho: “Dia Internacional do Beijo”. Poema inspirado em "Lotte em Weimar. O Regresso da Bem-Amada" (1939), de Thomas Mann, a obra que continuou "Werther" (1774), de Goethe, e no meu Romance "Via dei Portoghesi" (2019). Seis de Julho de 2025.
LEITMOTIV
“O amor é o melhor na vida, assim, no amor, o melhor é o beijo – Poesia do amor...”. “Beijo é alegria, procriação é luxúria” Thomas Mann
INSPIRADO TAMBÉM EM :
Kafka “Os beijos escritos não chegam ao destino, mas são bebidos pelos fantasmas ao longo do trajecto” Shakespeare “Se para te beijar devesse, depois, ir para o inferno, fá-lo-ia. Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos, de ter visto o paraíso sem nunca lá ter entrado” Bernhardt “O primeiro beijo não é dado com a boca, mas com os olhos"
POEMA – “O BEIJO”
BEIJO FOI O que nunca Te dei A não ser Com o olhar; O primeiro, Esse beijo, Dei-to, pois, Sem te tocar. E DEI-TE MAIS, Com palavras, Porque sempre Desejada, mas Quando olhar Já não podia, Foste embora, Triste, Zangada, E, assim, Eu não te via. FORAM BEIJOS Que sonhei Na triste rotina Dos dias, Desejos Que enfrentei Quando tu mais Me fugias. AGORA DOU-TE Beijos Escritos Que se perdem Pelo caminho, Mas se o poema Me falta Fico ainda mais Sozinho. O BEIJO É emoção, É razão Descontrolada, Se não o dermos A tempo Pouco mais Será que nada.
SEM BEIJO Não há amor, Sem amor Perde-se o beijo E perde a vida Sentido Quando dele Falta O desejo. POR ISSO O lanço Ao vento Pra que chegue Como brisa E suave melodia A quem de afecto Precisa Em forma De poesia. ESSE BEIJO Que me falta, De que nunca Fui capaz, Voa pra ti Em palavras Na sua forma Mais pura Para que no seu Trajecto Voe, voe A grande altura E fantasmas Não o bebam... ............. Seja beijo Que perdura. EU SEI Dos escolhos Da via, Dos perigos Que ele corre, Capturado Por fantasmas É um beijo Que me morre. MAS NESTE DIA Do beijo, Da poética Do amor, Eu te canto Em palavras Desenhadas Com a arte Do pintor. E PORQUE O dia é teu Ganha força, Intensidade, Mesmo que Fantasmas O bebam É um beijo De verdade. NÃO HÁ PALAVRAS Que bastem Pra repor O que não dei, Elas voam, Talvez não cheguem, Mas mesmo assim Eu tentei. É CERTO Que sempre O quis, Só que nunca To roubei, A culpa foi Desse tempo, Dos dias em que Te amei, Um tempo Em diferido, Sem presente Nem futuro, Talvez beijo Sem sentido Porque queria Do mais puro, Tangendo Eternidade Às portas Do Paraíso, Um beijo De divindade, Mas simples Como um sorriso. ESSE BEIJO Impossível Que não é do Foro humano Vou tentando Construí-lo Cada dia, Cada ano, Perdendo-me Pelo caminho Como sagrado Em profano.
RITUAIS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Fantasia” JAS 2025 Original de minha autoria Junho de 2025
POEMA – “RITUAIS”
IMAGINEI Um templo Revestido De vitrais, Celebrei-te Com palavras E com luz Em singelos Rituais. EVOQUEI O tempo Em que sempre Nesse teu olhar Esquivo Eu me perdia, Quando os silêncios Sobravam Como se fossem Castigo, Por tudo o que eu Nunca faria. AGORA É FUTURO Imaginado De voluntário Amante, Construído Nas ruínas De um passado Que nem é Muito distante. É TUDO O que me resta Como alimento Da alma, Um fervilhar De memórias, Inscrições Sensoriais, Um silêncio Que é profundo... ........... E mais nada, Nada mais. RESTA Um brilho Coado, Melancólico, Cinzento, O negro Desses teus Olhos E teus cabelos Ao vento. TUDO FERVILHA Na minha sofrida Memória, Delicada Inscrição De palavras Com história Partilhadas Com paixão. DOU-TE, ASSIM, Nova vida E renovo-me Também eu, Falo ao mundo Comovido Num poema Que escrevi Para te ser Oferecido Lá do alto Do meu céu. IMAGINEI Esse templo Para os meus Rituais, Quando regresso Do meu Jardim Encantado, Sempre com algo Mais, Todo de cores Bem vestido E o corpo Perfumado, Mas por dentro Melancólico Por te ter Assim perdido Nesse tempo Já passado.
GEOMETRIA DO AMOR
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Triângulos”
JAS 2025
Original de minha autoria
Junho de 2025
“Pinto quadros por letras, por sinais”
Cesário Verde
POEMA – “GEOMETRIA DO AMOR”
FAZES POEMAS,
Ó poeta,
Como quem
Desenha
Triângulos
Perfeitos
Na geometria
Do canto:
O poeta
Refractário,
A musa
Que o seduz
E a melancolia
Que o leva
A cantar
Para acender
Uma luz...
PORQUÊ
Geometria
Perfeita
Se o amor não
É exacto,
Linear,
Traço puro
De uma sofrida
Emoção
Que só tu
Podes
Cantar
Na mais funda
Solidão?
É PORQUE
A geometria
Te permite
Desenhar
O seu perfil
Ideal,
O rosto
Dessa alma
Que habita
O teu jardim
De cristal?
ELEVA-TE
À perfeição,
Que já não é
Pecaminosa,
Distante
Dessa linha
Tão rugosa
Que descreve
O amor?
POR ISSO,
Quando desenhas
O amor
Como círculo
Perfeito
Ou ângulo do
Número sete
Não é afeição
Que descreves,
É perda,
É já dor
Que se repete.
POR MAIS FIGURAS
Que desenhes
Ou fugas
Que tu encetes,
Linhas
Lá bem no alto
Do céu,
Não encontrarás
O amor,
Mas a projecção
Geométrica
Dessa nudez
Interior
Que espelhas
No teu canto...
...........
Uma perda,
Uma dor,
O teu pranto.
NÃO HÁ AMOR
Num triângulo
Perfeito,
Geometria
Do espaço,
Linhas
Em fuga
De uma rua
Deserta
Que se movem
Em busca
Da perfeição,
Mas sempre
Pra parte
Incerta,
Já longe
Da emoção.
AH, MAS NA COR
Com que o pintas
Com palavras,
Como fonte
De calor
Com que te
Aqueces
A alma,
Nisso, sim,
Tu avistas
O amor
Na palavra
Que te salva.
NAS FACES
Desse cristal
O vês
Em triângulos
De cor
E luz,
Espelhos
Do seu rosto
Em refracção
Que te inspira
E te seduz
Quando pintas
A beleza
E lhe falas
Do destino
A que o poema
Conduz.
TEUS POEMAS
Serão, pois,
Triângulos
De cor
E luz
Que te iluminam
A alma
Onde a guardas
Escondida
Porque
Ainda te seduz...
...........
E não sai,
Já não sai
Da tua vida,
Silhueta
Em contraluz.
CONFIDÊNCIAS DE POETA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Auto-Retrato”
JAS 2025
Original de minha autoria
Junho de 2025
POEMA – “CONFIDÊNCIAS DE POETA”
AGORA POSSO
Dizer-to,
Sou poeta
De corpo inteiro
(E que feliz
Eu me sinto!),
Ganhei chama
Pra te cantar
De alma cheia
(Sempre que,
Em mim,
Te pressinto),
Pra te chamar
Ao poema
E contigo
Reviver
Uma bela
Epopeia.
AGORA POSSO
Caminhar
Na rua
Do desencontro
Sem medo
De te perder
Numa esquina
Proibida,
Agora posso
Seguir
O que de belo
Encontrar
Nas voltas
Da tua vida...
E TAMBÉM POSSO
Desenhar-te
O perfil
Para te mostrar
Ao mundo,
Ser o rei
Da narrativa
Para nunca
Te perder,
Nem que seja
Um segundo,
Pois tenho
A alma cativa
Lá no fundo
Do meu ser...
.............
Lá no fundo.
SOU ARQUITECTO
Da minha vida,
Feiticeiro
De magias
Inventadas,
Oráculo do meu
Futuro
E poeta
Apaixonado,
Sou um livre
Sonhador,
Na palavra
E na cor
Por ti sempre
Fascinado.
AGORA QUE SOU
Poeta
De corpo inteiro,
Canto tudo
O que eu amo,
No presente
E no passado,
Momentos
De criação
Que o poema
Celebra
Ao trazer-te
Pela mão
Pra voar...
...........
A ti sempre
Abraçado.
AGUARELA DE PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “O Voo da Magnólia” JAS 2021 (91x115, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, mold. madeira) Original de minha autoria. Junho de 2025
POEMA – “AGUARELA DE PALAVRAS”
EU CANTO Esses teus olhos, Sua luz E sua cor, Translúcida Como o mel; O pintor, Que é poeta, Desenhou-os Com um secreto Pincel Que era (Como tu sabes) Uma modesta Caneta. PALAVRAS Leva-as O vento, Mas se beijam Os teus olhos, Sua cor Imaculada, Iluminam O teu rosto Como o sol A madrugada. AGUARELA De palavras, Galeria De um só rosto, O pintor Que é poeta Deixou Nas nuvens Do céu Uma mensagem Discreta
Desenhada
A teu gosto... TUA BOCA É carmesim Ao rubro Desta paixão, Teus olhos São energia Em intensa Combustão, Bem cá dentro, Em sintonia, No berço Da emoção,
Na raiz Do meu poema E da pintura Do voo Até à tua Janela, Eco Do teu silêncio Devolvido Em palavras Com as cores De uma aguarela”.
ANDORINHAS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Ninho em Construção” Original de minha autoria Junho de 2025
POEMA – “ANDORINHAS”
É PRIMAVERA, Há cerejas Pra colher E cores vivas Que deslumbram, A natureza Renasce, Andam Aromas no ar, Andorinhas Fazem ninhos Porque é tempo De criar. FAZEM CASAS Para os filhos Nos telheiros, Nos terraços, Nos beirais, São abraços Maternais Para o voo (E tudo o mais) Na imensidão Dos céus Que beijam Esta montanha Onde as vejo Passar. E EU (Vejam lá) Fui encontrar Um ninho Em construção No terraço Da Casa-Mãe Sobre a luz Que o ilumina: Uma luz Iluminada Por vida De andorinha Como magia De fada. ESVOAÇAM No terraço Na azáfama Do ninho Que está Em construção, Um vai-e-vem Sempre atento Por um amor Denodado E cuidada Precaução. VEJO A VIDA Que nasce Em azáfama Maternal Prà ventura Que espera Essas filhas Voadoras Em tempo De primavera, Esse tempo Seminal. E EU AQUI, Seu vizinho, A assistir À labuta Sem cansaço E ao despontar Do milagre Na parede Do terraço. AINDA ME DIZEM Que uma andorinha Não faz A primavera, Mas estas fazem, No terraço E até na minha Vida, Fico leve Como elas E já nem sinto O cansaço De estar sempre De partida.
VESTIDA DE CORES E DE LUZ
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Retrato”, JAS 2022 (68X80, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, mold. de madeira). Original de minha autoria. Maio de 2025.
POEMA: “VESTIDA DE CORES E DE LUZ”
VESTES CORES Garridas No palco Do mundo Em danças De luz Como quem grita A beleza Que levas Dentro de ti... .............. Beleza Que me seduz, Beleza Que me sorri... COBRES-TE DE TI (Eu bem sei), Agasalhas A alma E para mim Sorris, Repetindo O teu rosto Ao longo Do tempo Em tantos Perfis. DIZES-TE Em arte, Com aura, Inspiração, Num jogo D’espelhos Que me sabe A sedução. MAS DEPOIS Regressas a ti No fim Desse sonho Que te levou Ao paraíso. É a queda De um anjo Na rotina Do viver Onde lhe resta A leveza De um sorriso Pra que possa Renascer. E EU SIGO-TE E voo Com poemas Feridos De cores vivas, Ao rubro, Versos roucos De tanto te Repetir Cá de longe Nesta triste Melodia Feita de Murmúrios De alma, De doce Melancolia E de tentado Sorrir. NÃO IMPORTA Que a fuga Para a boca De cena À procura De autor Que te conte Ao mundo Seja fuga De ti própria Para a luz Da ribalta... .............. Não m’importa, Porque assim Já é luz Que não me falta. EU GOSTO De te ver assim, Luminosa, Oficiante Desse rito pagão Que celebra A arte E a liberdade, Qual pregão A convocar Para a festa Da vida... ............ Para a festa Da saudade. AH, COMO GOSTARIA De te rever Na praia Da meia-lua, No baile Da meia-noite, Em diálogo Silencioso Com luar De lua cheia, Cintilante, A iluminar Em pleno, Lá de cima, O teu rosto De sereia, A minha alma De amante...
VOZES
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “A Voz” Original de minha autoria 18 de Maio de 2025
POEMA – “VOZES”
O POETA Ouve vozes E diz De si para si “Vozes de burro Não chegam Ao céu”; Mas no meio Dessas vozes Há uma Que lhe segreda: “O caminho A trilhar Não é esse, É o meu”. FICA CONFUSO O poeta Pois gosta Muito das vozes Que vêm Lá do alto Do céu, Que inspiram Seus poemas E nada Lhe pedem Em troca, Nada lhe pedem De seu. ELE OUVE A vozearia Dos feirantes Da verdade, Por isso finge Afasia Porque neles Não há Vontade... ........... Nem sequer Biografia. SOBE AO MONTE, Desce ao vale, Invoca a deusa, Inspiração, Mas nada encontra Que o ajude Na difícil Decisão. O QUE OUVE São vozes Que ao céu Não chegarão. Não são boas, Essas vozes, Porque nelas Só encontra Vã conversa E altiva Presunção. MAS A VOZ Que lhe sussurra O caminho A seguir, Dizendo Que vem do céu, É a voz Maliciosa De um perfeito Filisteu. E POR ISSO Lhe responde Em velada Confissão: “Eu não vou Pelo teu caminho, É melhor que vá Sozinho Numa outra Direcção”. E ASSIM O POETA Cumpre A missão Que escolheu: Segue O caminho oposto Ao da voz Do Filisteu.
O JASMIM
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Rapsódia” JAS 2025 Original de minha autoria Maio de 2025
POEMA – “O JASMIM”
FLORESCEU O JASMIM, Dele jorra poesia, Embriaga, O seu aroma, Esparso Pelo jardim, E liberta A fantasia. DOU ÀS PALAVRAS A cor E o seu perfume Ilumina, Bate o sol Nas suas pétalas, É luz intensa Que brilha No poema que Germina. JÁ NÃO É SÓ O loureiro, Agora canto O jasmim, É tão vivo O seu perfume Que transborda No jardim. INUNDO-ME Também eu De palavras Com perfume, Canto a cor, Invoco a musa Para subir Ao seu céu, Do perfume Levo o sabor Que também é Um pouco meu. SOU ÍCARO Lá no alto E se o sol Me incendeia Por voar Em altura Proibida Caio logo Do poema No chão frio Desta vida. PEÇO AJUDA Ao jasmim, Volto a subir Com alegria, Lá no alto Eu renasço E regressa A poesia. E VOLTO A encontrar O jasmim Mesmo ao lado do Loureiro, Respiro fundo Os aromas E torno-me Seu jardineiro. E ASSIM EU VOU Vivendo No jardim Da minha vida Em poemas E pintura... .................... E quando a tristeza Regressa... Que seja esta A cura.
AS PALAVRAS ESCONDIDAS NOS TEUS RISCOS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “O Jardim e a Janela” (JAS 05.2025) Original de minha autoria Maio de 2025
POEMA – “AS PALAVRAS ESCONDIDAS NOS TEUS RISCOS”
ENCONTRO-TE Sempre Num acaso Marcado Pelo destino, Olho-te De frente Só com palavras E afago As tuas mãos Nos traços Com que desenhas O infinito. ÀS VEZES Olho-te nos olhos, Em silêncio, Com palavras, Sempre com Palavras, Em surdina, Timidamente, Com um brilho Interior Que não se vê, Mas se pressente. AH, COMO GOSTO Desse teu rosto, Linha de arte Saída de ti, Subtil, Desse sorriso Cúmplice, Que inebria, E do teu perfil, Que alumia. DIGO-TE Palavras, As do momento, Sobre o sol Ou sobre a chuva, Sobre as nuvens, Sobre o vento... E SINTO-TE Como quando Te vi Pela primeira vez Do meu jardim Sem te revelar Que fugiria contigo Da rua proibida Para o abrigo Da poesia Onde te fui Encontrar. SE TE PERCO, Chega, rápida, A saudade Que já espreitava, Dorida, Nesse teu olhar De eterna Despedida, A sonhar. ENTÃO ENVIO-TE Sinais E construo, Palavra a palavra, Um longo poema Com coisas Que parecem Triviais. SE NÃO FOSSE POEMA Temeria o excesso De palavras E perder-te De vez Nas tuas fugas, Nesses voos Sobre as aguarelas Com que agarras Os céus Da tua alma. E EU FICASSE Como folha branca Caída, No outono Do meu afecto, Do desejo De sonhar, E deixasse De fazer riscos À procura De palavras Que podiam Nunca chegar... MAS, POR ISSO, Continuo A procurar-te Na arte, Nas palavras, Nas curvas Apertadas da vida Que estão cheias De poesia E de ti, Daquilo que nunca Será dito, Mas vivido Nesse intervalo Onde as palavras Se aninham À espera do tempo Que já se foi E não volta Nunca mais.
A PORTA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Minha Aldeia”,
JAS 2024.
Original de minha autoria,
oferecido à Junta de Freguesia,
juntamente com os 10 Retratos dos
Presidentes de Junta, desde 1948,
em 27 de Abril de 2025
POEMA – “A PORTA”
OLHO A MONTANHA
Da minha porta
De granito
Amarelo
(O de sempre,
Muito belo,
Com cristais)
Sobre as telhas
Do sobranceiro
Telhado
Como se fosse
Janela
Do meu palácio
Encantado
(Que do sonho
É o cais).
DELA CONTEMPLO
A aldeia,
Mas é diferente
A visão,
Antes, eu via futuro,
Agora, vejo passado,
Mas é bela
A sensação
De a ter sempre
A meu lado.
ENTRE PASSADO
E futuro
Garantiu-me
Identidade,
Ficou quieta
À minha espera
Quando dela
Eu parti
Pra descobrir
A cidade.
A FRONTEIRA
Foi sempre
O azul profundo
Do céu,
Espelho
Da minha errância,
Um horizonte
Sem fim,
Projecção
Da fantasia,
Sem medida
Nem distância.
ELA É PORTO
De abrigo
E é lugar de
Partida,
É fronteira
Que atravesso,
É lugar
De despedida.
MAS HÁ SEMPRE
Um retorno,
Um regresso
Renovado
Onde posso
Renascer
Quando visito
A memória
Do que não
Quero perder.
DESTA PORTA
Vejo a aldeia
E logo viajo
Por ela,
Dou asas
À fantasia
Como se fosse
Janela
Donde voo
Com o vento
Soprado
Pela magia,
Por tudo aquilo
Qu’invento.
E DELA VOEI
Para o mundo
E o mundo veio
Até mim,
Mas quando passei
Esta porta
Já era um mundo
Sem fim...
POR ISSO
Regresso a ela.
Quando chego,
Logo amanhece,
Mas quando parto
Não entardece
Nem sinto
A despedida
Porque dela eu vejo
O mundo
Como a montanha
Da vida.
A FONTE
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “A Fonte” Original de minha autoria Abril de 2025
POEMA – “A FONTE”
VENHO AGORA De lá, De alma cheia, Venho Dessa torrente Gelada Que corre Pela encosta, Em cascata Ritmada, Esse rio A brotar Lá do alto Da montanha, Sem nunca, Mas mesmo nunca, Parar Quer eu venha Ou não venha, Com chuva Ou a nevar. MAS VENHO AGORA De lá, Trago-a sempre Comigo, A lembrar-me Tempo antigo E o rio Que lá corre, Ao fundo Desse meu vale, Ao fundo Do meu abrigo. ÁGUA FRIA, Água antiga Que me aquece A alma, Onde ficou Registado Esse frio seminal Quando ela Me visitava, Essa alvura Glacial. FICOU-ME Na memória Como tempo Juvenil Que não volta Nunca mais, Verdes anos, Inocente Aventura Quando à noite Eu procurava Os pardais Aninhados E com frio Sob as telhas Dos telheiros, Sob as telhas Dos feirais, Inocente desafio. OU A CAÇA Aos coelhos Sob a brancura Da neve Sem consequências De mais Porque nunca os Encontrava Nas caçadas Inventadas, Como a caça Aos pardais. E ESSES BONECOS Tão brancos, Toscas Esculturas De quem não sabe Esculpir Com a beleza Da neve, Essa forma De sorrir Tão cintilante E tão leve. TRAGO TUDO ISSO Comigo Quando visito A fonte À procura Do passado Que não volta Nunca mais, Mas ali Eu sempre o sinto Como se ela fosse Desde sempre O meu cais. UM PASSADO Inocente, Animado Pela neve, Mas que hoje É tão pesado Como antes Era leve.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Musa" Original de minha autoria Abril de 2025
POEMA – “TEMPO”
OLHEI-TE NOS OLHOS E eram negros, Intensos E tão profundos, Toquei teus cabelos Com o olhar, Caminhei a teu lado Nesse jardim E, então, senti Tão perto de mim O teu corpo A respirar O acre perfume Dessa ramagem Do vasto jasmim... .............. E logo aprendi A sentir-te melhor Com o meu olhar. INEBRIOU-ME O intenso Aroma Do belo jardim E enredei-te Num tão doce Enleio Que até parecia Nunca mais ter fim. BRILHARAM ALI, Nesse meu jardim, Tão docemente, Duas horas inteiras, Esses teus olhos... ................. E neles me perdi. ESTIVE NO CÉU Ao lado de Deus E lá vi dois sóis Que não eram dele (Uma luz intensa) Porque eram teus. MAS O TEMPO Corre Depressa demais E é sempre assim, Todos os dias Se tornam iguais Quando tu te vais E, em nostalgia, Eu fico no cais. VOLTEI A OLHAR-TE Três horas seguidas (Parecia verdade), Mas era ilusão, Porque tu partiste Deixando-me só E o que sobrou Foi a solidão. SUBIU A TRISTEZA A saudade irrompeu Colou-se-me Ao rosto... ............ E como doeu! SE EU NÃO TE VEJO Sinto Falta de ti, Mas se te encontro Logo te perco Porque o tempo Voa E logo te leva Pra longe dali. TER-TE DEMAIS Aumenta a saudade E quando te vais São negras As nuvens Da nossa cidade E é muito triste A tua partida Lá do nosso cais (É mesmo verdade). MAS MESMO QUE TRISTE Até sou feliz E com estas mãos Te vou escrevendo O que quero dizer... Mas o tempo Volta de novo A correr E cresce a vontade De logo te ver Mesmo que saiba Que é nesse instante Que te vou perder. TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Desse virar Da nossa esquina, Nessa mesma rua Onde eu te vi, Dessa janela De onde espreitámos O que do mundo Sobrava pra nós... EU JÁ NEM SEI Que hei-de fazer, Ter-te demais É puro prazer, Mas quando te vais Fico a morrer. NEM SEI Que te diga Ah, meu amor, Quando tu me deixas Já nem sinto dor Tão grande A tristeza De já não te ter Pois logo partiste Mesmo sem querer. OLHEI-TE NOS OLHOS Mas já não estavas E o que eu vi Foi a imagem Que tu me mostravas Quando sentias Que era tão grande Essa minha dor E é mesmo por isso Que aqui estou A escrever-te Este meu poema... .................. Como prova de amor.
VOAR
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Pássaro de Fogo”
JAS 2025
Original de minha autoria
Abril de 2025
“La palabra es
un ala del silencio”
Pablo Neruda
POEMA – “VOAR”
APETECE-ME VOAR
Sobre o seu silêncio
Com asas
Que são palavras
Em busca
Do parapeito
Da sua bonita
Janela
Onde eu possa
Pousar...
............
Nesse lugar
Que é só dela.
APETECE-ME VOAR
Sobre o silêncio
Sempre, sempre
Insinuado,
Pois na minha
Solidão
Logo cresce
A fantasia
E no voo
Das palavras
Vai um poema
Alado
Com a sua
Melodia.
E O VOO
Prossegue
Sempre
No azul profundo
Do céu
Até que eu sinta
O seu eco,
A ressonância
Em mim
De tudo aquilo
Que é seu.
COM AS ASAS,
Que são palavras
(Era Pablo
Que o dizia),
Voarei
Sobre o vale da
Sua vida
E lá de cima
Verei
O seu caminhar
Distraído.
Por isso,
Lhe mostrarei
Um caminho
Com sentido.
E, AGORA,
Que o pintei,
Também tenho
Um mensageiro
Que pode levar,
Com o vento,
Em viagem
Programada,
As cores
Com que a pinto
Pra que logo
As derrame
Na janela
Desejada.
MAS NÃO SERÁ
Preciso
Abri-la
Porque ele não
Entrará
Para não incendiar
O seu corpo
Com a minha
Fantasia,
Com o fogo
Que ele leva
Em forma
De poesia.
QUERO VOAR
Sobre o silêncio
Até à sua janela,
Mas se não
A encontrar
Crio outra
Mais bonita...
..............
Como se fosse
A dela.
É ESTE O MEU
Destino,
Pintar
Com cores
E palavras
Tudo aquilo
Que já não tenho,
Recriando
A minha vida
Como se fosse
Um desenho.
O POETA, A MUSA E O JARDIM
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “O Jardim” Original de minha autoria Março de 2025
POEMA – “O POETA, A MUSA E O JARDIM”
ENCONTREI-TE De novo No meu jardim Onde esta arte Nasceu E das cores Que lá havia E por dádiva Dos céus Ou brilho Da tua estrela Logo meu estro Cresceu; Subi, então, Ao Parnaso E teu rosto, Por milagre, Em palavras Renasceu. NESSE JARDIM De mil azáleas E de exuberante Jasmim Havia inebriantes Aromas E matizes Num sem-fim. HAVIA CORES Em seda pura Que brilhavam Como se fossem De exuberante Pintura, Havia verde, Vermelho, Amarelo E lilás, Todas as cores Do meu gosto Para com elas Pintar, Em moldura De arco-íris, A beleza Do teu rosto. A VIDA Vem é daí, É arco-íris Que se pinta Com a alma, É alquimia, É luz intensa Que fascina, É pauta Onde escrevo As notas Da melodia Que te canto Em surdina. INEBRIO-ME Com as sete cores, Vou atrás delas, Imparável, A voar, E o mundo Fica pra trás Na vertigem De te encontrar Lá no alto, Lá no céu, Para contigo Dançar Um poema Que é só teu. ÉS COR, És risco, És traço, És nuvem Branca Que se esfuma No azul profundo Do céu Esse mar Que eu navego Como se fosse Só meu. VIESTE Do jardim Onde cresceste, Trazias flores Impressas Nessa tua Pele macia, Mas as cores Eram tão vivas Que nelas Eu me perdia. E DISSESTE Com carinho, Com esse olhar Tão seguro, Que me querias E sentias Com afecto Do mais puro. E, DEPOIS, Lá regressaste Ao jardim, Levando-me Pela mão, Com brilho No teu olhar... E eu deixei-me ir A teu lado Tão feliz E fascinado Simplesmente Por te amar.
TIMIDEZ
RETRATO DE UMA MUSA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Timidez”, JAS 2023 (71x88, pintura digital, impressão giclée em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, Mold. de madeira). Março de 2025
POESIA – “TIMIDEZ – Retrato de uma Musa”
NUM DIA De primavera (Ou d'inverno, Já nem sei), Cruzei-me Com a timidez Impressa No seu rosto De mulher (Disfarçada De altivez). PÂNICO De luz excessiva E pavor da melodia Que provocava Os sentidos De quem nunca A ouvia. A VOLÚPIA (Proibida) Que ameaça, Incendiada, Uma alma Seduzida. CRUZEI-ME Com o mistério, Ali mesmo A meu lado, Enigma puro De quem se sente Seguro Num mundo Por demais Sinalizado. DEPOIS VEIO O silêncio, Aquele que quase Nem eco tem; A palavra Vai a caminho, Mas o eco Já não vem. CRUZEI-ME Com a recusa Do corpo, Envolto Nesse cinzento Fatal, Com fuga Já programada À sedução Sensual. CRUZEI-ME Com ela Num dia de Primavera (Ou d'inverno, Já nem sei) E tudo Me fascinou: Mistério E timidez, Opacidade Do corpo E temor da Melodia, O silêncio Reiterado Dos que não Sabem amar Os que estão Sempre a seu lado E quem neles Sempre confia. MAS NO FIM, Na primavera (Agora sim), Encontrei A poesia Para com ela Falar, Para a ver Em fantasia E até com ela Voar... FIZ MINHAS As palavras Que eram suas, Mas que se Recusava A dizer, Ouvi ecos Do silêncio Quando me disse “Olá!”, Simulando Aquiescer. IMAGINEI-LHE O corpo nu A tiritar Do afecto Que não sentia, Interpretei O silêncio No oráculo Seminal E compus versos De amor Nos dias De ritual. FOI ASSIM Que a encontrei, Ofereci-lhe Essa palavra Que ela nunca Admitia, Dita sequer Uma vez, Mas eu, Com palavras Proibidas, Reconstruí O afecto De que sempre Ela fugia, Por excesso De timidez.
O POETA-PINTOR
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Perfil de Musa” JAS, 2023 (63x78, pintura digital, impressão giclée em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em mold. de madeira) NO DIA MUNDIA DA POESIA, 2025
POEMA – “O POETA-PINTOR”
O POETA BRINCAVA Com suas palavras, Cantava-a sempre Quando não estava... ERA UM POETA, Era fingidor, Não a desenhava, Cantava-lhe A cor. MAS AS SUAS CORES Eram só poemas, Fazia pincel Da sua caneta. Enquanto poeta, As letras riscava, Mas a sua tinta Já não era preta... ............... Escolheu a cor, Pintar a palavra. POR ISSO COMPROU Um belo pincel E como pintor Pintava, pintava, Era a granel, E a sua tela, Que ele adorava, Já não era só O velho papel. DESCOBRIU A COR, Que o fascinou, Dourado, vermelho E tanto amarelo, Tudo ele pintou, Procurando sempre O que era belo. ATÉ QUE O ENCONTROU Na cor dos Seus olhos, Era luz da pura Que iluminava O novo papel Onde desenhou O seu fino rosto Com o seu pincel. DEU CORPO À COR Com que a dizia, As suas palavras Tornaram-se linhas Desse seu perfil Que ele desenhava Com a poesia, Em versos Que eram muito Mais de mil. PINTAVA-LHE O ROSTO, Pois os seus poemas Já não lhe chegavam, Pintor de palavras De cor as compunha E versos voavam No azul do céu... ................. “O que tu fazias, Faço agora eu”, Dissera-lhe um dia. “PORQUE SOU POETA, Deixaste-me só, Entregue à palavra, E, eu, tão pobre de ti, Porque sou pintor Pra me resgatar Pintei-me de dor E subi ao céu E pus-me a voar.” FUI AO ARCO-ÍRIS A ver se te via Atrás duma cor. Pintei o teu rosto Para um poema Que hei-de escrever Com todas as cores Que trago comigo Enquanto viver”. O POETA BRINCAVA, Mas era tão séria Essa brincadeira Que, perdido Em palavras, Encontrou a cor E nos seus poemas Dela fez bandeira. Era um poeta Mas também pintor.
CONFISSÃO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Epifania”, JAS 2023 (79x82, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, mold. de madeira). Março de 2025
POEMA – “CONFISSÃO”
TARDO A encontrar-te Porque não sei Como procurar-te Levado Por um poema. NÃO É A minha vontade, Mas o destino A marcar Os passos Que darei Ou que nunca Ousarei, Nesta estreita, Mas sedutora, Vereda Da minha vida. E TU SABES Que não sei, Mas sabes Por onde andei A perder-me, À procura do que Não podia ter, Para preservar Afectos remotos Que um dia Eu pudesse Reviver. ÀS VEZES Encontrava-te, Encontros fugazes, Onde o teu brilho Cegava por fora Mas iluminava Por dentro. MAS NÃO SEI Se ainda te quero Para nunca Te ter, Sentir saudades Logo ao amanhecer Do perfume Da aurora, Quando te reencontro Na memória fresca Dos afectos Iluminados Pelo raiar Dos dias. MAS EU GOSTO Destes encontros, De viajar À procura Do que em mim Sobra de ti, Itinerâncias De um transeunte Que se observa Num espelho Onde se vê Por dentro A olhar-te Por fora, À espera Do próximo Estremecimento, Que nunca, Nunca demora. AH, COMO ME ENCANTA Esse véu Que te cobre Os cabelos negros Quando te pinto Com palavras E te vejo nua No meu espelho, Com a alma A tiritar, À mercê Dos imprevistos Que te marcam Como sulcos, Cicatrizes ásperas Da vida. MAS EU PROCURO-TE Com olhar Comprometido E acolhedor, Perscrutando-te A alma pura Que se aninha Em ti Para te proteger Do risco da beleza Exposta Como fractura, A que vi quando, Pela primeira vez, Eu te sorri. TALVEZ A PENUMBRA Do sonho Te sirva de véu E te cubra As cicatrizes da vida, Te amacie a pele Encrespada E te devolva Como mulher Desejada... ................ Para além do bem E do mal. MAS EU NÃO SEI, Tenho medo Dos sobressaltos, De ser atropelado Na esquina De um inocente Jogo sedutor Que me cative A alma já em fuga Para o infinito, Onde se cruzam, Intermitentes, Os nossos olhares. TARDO A ENCONTRAR-TE No bulício Dos nossos dias Reconstruídos Com a fantasia Até que no amanhecer De um poema Me cruze contigo E te diga Com olhar Submisso E melancólico: Continuarei A procurar-te Onde já não estás, Levado pelo destino E pelo vento Que passa.
MIRAGEM
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “A Outra Janela”
JAS 2025
Pintura de minha autoria.
Março de 2025
POEMA – “MIRAGEM”
EU, DESTA JANELA,
Já não te vejo
Como na outra
Te via,
Há um caminho
A trilhar,
Uma miragem
Que exorta
A fantasia,
Mas não sei
Onde me pode
Levar...
SÓ SEI QUE
Parto,
Com o olhar,
De um jardim
Verdejante
Onde as camélias
Aludem
A um incerto
Destino
Que se adivinha
Errante...
DAQUI VEJO
Uma rua
Com uma forma
De rio,
Um traçado
Sinuoso
Por entre o casario,
Marcas
De passos remotos
Em granito
Amarelo,
Um longo caminho
De afectos,
Muito denso,
Mas singelo.
É OUTRA JANELA,
Virada
Para a montanha,
Onde se fixa
O olhar...
Mas dela,
A nascente,
Com o sol
A despontar,
Chega uma luz
Que encandeia
De tanto ela
Brilhar...
É A INTENSA
Luz do dia
Que me convida
A viver...
.........
Mas como
Poeta que sou,
Viro-me pra
Dentro mim
(Recorrente
Timidez)
Pra ver uma luz
Brilhar
Que me ilumine
De vez...
...........
E sem nunca
Me cegar.
ENTENDES?
O mundo,
Quando acorda,
A nascente,
E entardece,
A poente,
Muda de cor
E de luz,
Mas à noite
Vai-se embora
E eu vejo
O seu ocaso,
Seja por dentro
Ou por fora.
MAS, A TI,
Oh, a ti,
Eu vejo-te
Sempre a sul,
Entre nascente
E poente,
Vejo-te no horizonte,
Como estrela
Cadente,
A passar,
Iluminando
O caminho
Quando me ponho
A voar.
TUDO DEPENDE
Do olhar,
Bem sei.
Se não te vejo
Da janela
Sinto que voas
Comigo
Nas palavras
Com que,
Há muito,
Te celebro
E te digo.
MAS NÃO É
A tua,
Esta janela,
Porque nela
Te poderia ver
Lá do alto,
De um lugar
Que não é meu,
Porque aquela
Era janela
Que nunca
Me pertenceu.
EU CANTAVA-TE
Lá de baixo,
Desse meu lado
Da rua,
Por vezes,
Com alma cheia,
Outras,
Com alma nua,
Pra me poder
Vestir de ti,
Como se,
Assim vestida,
A alma
Não fosse minha,
Mas tua,
Pondo fim
À despedida.
MAS PERDI-TE,
Como sabes,
Porque não tinha
Escada
Para te alcançar...
E, agora,
Há camélias,
Por aqui,
Há flores
A encantar,
Um luminoso
Jardim
Que pode mesmo
Ser pra ti
Porque o posso
Regar.
E ATÉ HÁ
Uma escada...
..............
Mas só pra ver
Mais além
E voar
Com o olhar
Para uma ilha
Encantada,
Contigo
E mais ninguém.
MARÇO
Poema de João de Almeida Santos
Pintura: “Evocação de uma Magnólia”
JAS 2021 (98x126, em papel de algodão,
310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass
AR70, em mold. de madeira)
Original de minha autoria
Março de 2025
“MARÇO”
"MARÇO: um pouco chove
e logo deixa de chover:
volta a chover, pára,
ri o sol com a água.
Ora um céu celeste,
ora um ar escuro e negro:
ora tempestades d’inverno,
ora um ar de primavera.
Um pássaro com frio
espera que o sol espreite:
na terra ensopada suspiram
as violetas...
Catarina! Que queres mais?
Entende-me, meu amor!
Março, sabes, és tu,
e este pássaro sou eu"
“Arietta” (1898) do poeta
napolitano Salvatore di Giacomo,
(1860-1934).
POEMA – “MARÇO”
EU GOSTO DO MÊS
De arço
(Que está a começar),
Gosto do frio
Que sobra
(O inverno
A declinar)
E da neve
Que me chama
Quando a vejo
Lá no alto,
Lá no topo
Da montanha.
E GOSTO MUITO
Deste mês
Porque traz
A primavera
E a magnólia
Branca
Que acena
Ao passado
E ao tempo
Que aí vem.
...........
Auspicioso
Futuro
Saído
Da Terra-Mãe.
E ASSOMAM
As flores
E os cheiros
No jardim
E renasce
A natureza
Quando volta
Proserpina...
..........
E eu fico
Sempre feliz
De ver
O loureiro
Crescer,
Apontando
Para o céu
Como quem
O ilumina.
TAMBÉM VOLTA
A cameleira,
Anúncio
Do tempo novo
Com o branco
Cintilante
Que me fascina
O olhar
E anuncia
A magnólia
Que chega
Sempre
Despida
E me convida
A ficar.
AH, COMO EU GOSTO
De Março
Mês híbrido,
Mês meu,
Intervalo
Auspicioso
Do veloz
Tempo
Que passa,
Ponte
Que atravesso
Quando espero,
Confiante,
Que a natureza
Renasça.
AH, SIM,
Mas eu sou
Pássaro
Friorento,
Sempre, sempre
A suspirar,
Quando o sol
À minha alma
Insiste
Em não chegar...
MAS MARÇO
É ponte,
É transição,
É esperança,
É passado
E é futuro
E há sempre
Uma mulher
(Sentimento
Do mais puro)
Por quem o poeta
Espera
Às portas
Do seu desejo,
Às portas
Da Primavera.
ENSAIO POÉTICO
PARA UM DIA DE ANIVERSÁRIO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Fascínio”, JAS 2023 Original de minha autoria (68x88, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70 em mold. de madeira) Fevereiro de 2025
POEMA - "ENSAIO POÉTICO Para um Dia de Aniversário" HOJE NÃO VOU À cidade, Neste dia Deste mês. No fundo, Era o que Queria, Mas eu disse Aos meus amigos: "Vão vocês". COMIGO Não tem de ser, Mas hoje (Sei muito bem) É o seu dia, Por isso quero Alertar: “Esquecê-lo Não convém, É festa Com autoria, Não se deve Desertar”. É FESTA Por todo o lado, Há champanhe, Bolo-rei, É um dia Abençoado Pra brindar Com poesia. Eu faço o melhor Que sei: Ofereço A melodia. FICO EM CASA (Não posso ir), Mas sai poema E também ilustração, Dedico-os À minha Amiga, São prendas, São sinais De afeição. ADMIRO-LHE A beleza E a força De vontade, A vê-la no Instagram É a deusa Da cidade. FAZ ISTO E mais aquilo, Sempre, sempre, A correr, Esteve ali, Já não está, Tinha muito Que fazer... MAS QUE IMPORTA O que faz (Dizem-me Os meus amigos), Não é hoje O seu dia? Dá-lhe lá Os parabéns E festeja Os seus anos, Partilha Da sua alegria. ESTÁ BEM (Respondo eu), Vou festejar, Vou fazer-lhe Companhia, Com ternura, Cantando-lhe Os parabéns Com a minha poesia... ............. E com uma bela Pintura. CARA AMIGA, Parabéns, Que o seu dia Seja brilhante, Luminoso Como o sol, Pra de si Sermos reféns Como barco De farol. CANTE, DANCE Com os amigos, Acenda, à noite, A lua, Pum!, Salta a rolha Do espumante E vão todos Para a rua, Será uma noite Brilhante Porque a festa Será sua. NOS ANOS Da minha Amiga É isto que mais M’interessa, Celebrar A sua vida Como futura Promessa. POR ISSO, Aqui lhe deixo Um abraço De amizade. Viva, viva, Neste dia, Festeje bem Na cidade, Festeje Com poesia.
A NEVE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Neve e a Montanha” JAS 2025 Original de minha autoria Fevereiro de 2025
POEMA – “A NEVE”
EU SINTO A falta da neve Como a falta De um amor, É saudade, Melancolia Que sofro Como uma dor Que outrora Não sentia. MESMO SE A VEJO Ao longe, Lá no alto Da montanha, E a tenho Cá muito dentro De mim, Sua falta É moinha Que parece Não ter fim. ESCASSEIA Ou já não vem Ao encontro No jardim Ou nas ruas Da minha aldeia Como sempre O fazia, Era amor De juventude, Era assim Que a sentia. AMORES ANTIGOS São pra sempre (Os que foram No passado), Até que um dia Revivam E surjam ali A teu lado, Mesmo que seja Assim... ............. Num encontro Inventado. ERA SEGREDO Da neve Vir ter Ao jardim, Comigo, E eu crescia E vivia Num mundo De fantasia Que era o meu Seguro abrigo... ............ Onde melhor A sentia. NÃO ERA Turista de neve, Fazia parte de mim, Brincava sempre Com ela Nas ruas Da minha aldeia Ou, então (era segredo), No recanto Do jardim. MAS AGORA O que me resta? Ir à fonte glaciar Trazer a neve Comigo, Vê-la descer Lá do alto Em forma de água Gelada A caminho Do meu rio, Neve pura, Neve fria (Não seca, Mas já molhada) Que me refresca A alma Como quando Lá do céu A neve Se oferecia Como beijo De uma fada.
O POETA E O ARCO-ÍRIS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Arco-Íris no Vale” Original de minha autoria Fevereiro de 2025
POEMA – “O POETA E O ARCO-ÍRIS”
DOS CAMINHOS Serpejantes Da montanha Vêem-se Silhuetas De poetas Lá no alto, Lá no ar, Sentados Em arcos-íris Sobre o vale Da minha terra, Agarrados A palavras E prontos Pra desenhar Os ecos Da nossa serra. TANTA LUZ Nesse imenso Mar De gotículas Coloridas, Nesse céu Bruxuleante (Que já é Um pouco meu), Espelho Dos meus sonhos De amante Que deu asas Ao olhar Onde a fantasia Nasceu Para poder Navegar. ÀS VEZES É denso O arco-íris Que paira Sobre o meu vale, Subo nele E entro Na frescura Colorida Para me ver Caminhar Pelos sendeiros Da vida. LÁ DO ALTO Vejo o vale, Vejo a vida Que se move, Vejo a água Da ribeira Que corre E que cresce Quando chove, Dou asas À fantasia Para trazer Ao meu vale Tudo aquilo Que me comove E tem força De magia. ENTÃO, PINTO A comoção Com palavras Cinzeladas Em pauta De melodia Que provoca Emoção Em quem as ouve Cantadas Em plena Harmonia E desejo D’evasão. SÃO BELOS Os arcos-íris Que vejo Cá no meu vale, Iluminam A memória Dos tempos Que já lá vão, Quando a vida Tenteava Cada passo Que ela dava Em busca Da perfeição. E ASSIM VOU Desenhando Cada minuto Que passa Com a luz Que vem do céu Pois se ele Já é de todos Também é Um pouco meu.
UM SONHO NA MINHA ALDEIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: "Rua da Carreira"
JAS 2022
Original de minha autoria
Janeiro de 2025

“Rua da Carreira”. JAS 2022. Pintura digital, 68×70, impressão Giclée em papel de algodão (100% I 310gr) e verniz Hahnemuehle. Arglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “UM SONHO NA MINHA ALDEIA”
SONHEI-TE
Esta noite
Numa rua
Da minha aldeia...
..............
Não sei porquê
(Os sonhos são
Sempre assim),
Caminhámos
Lado a lado
Sem dizer
Uma palavra,
Sem um olhar
De través,
Apenas
Pressentimento,
Cá bem no fundo
De mim,
Sentindo-te
Como tu és.
DUAS VEZES
Lá estive
A sentir-te
Nesse tempo
Diferido
Dos encontros
Intangíveis
Que se desfazem
Nas nuvens
Quando o céu
É proibido
Aos afectos
Impossíveis.
MAS VI-TE
Com nitidez
(Um pouco baça,
É certo)
No silêncio
Do meu sonho,
Em encantada
Alvura
A recordar
Tempo antigo
Quando a neve
Regressava,
Branca e pura,
E nela me via
Contigo.
FOI NA "RUA DA CARREIRA",
Em frente
Da minha casa,
Sendeiro da minha
Vida,
Onde me via
Passar
A caminho do futuro,
Minha porta
De partida
Onde sempre
Me procuro.
CAMINHÁMOS
Por pouco tempo,
Como na vida real,
Nem um olhar
Nos trocámos,
Tão fugaz foi
Este sonho,
Intenso,
Mas espectral.
MAS SE A VIDA
Também é sonho
E sem sonho
Pouco mais é
Do que nada,
Sonâmbulo
Me encontraste
Na rua
Da minha aldeia,
Nunca antes
Visitada.
E AQUI ESTOU EU
A sonhar-te
Outra vez
Nos versos
Com que te chamo,
Recordando que
Te vi
Neste lugar
Que eu amo.
É SEMPRE ASSIM,
Meu amor,
Quanto mais tu
Te esfumas
Na vida
Ou, então, mesmo
A sonhar,
Mais me cresce
Esta dor,
Que não consigo
Parar...
................
Procuro, então,
Combatê-la
Com armas
De sonhador,
Que me põem
A voar.
DE TANTO EU
Te sonhar
Acabei por
Te encontrar
Na terra
Onde nasci,
Onde a neve
Derretia
Quando o sol
Já despontava
E o manto
Da saudade
Logo de dor
Me cobria
Porque ela
Me faltava.
AGORA A NEVE
És tu,
Fugaz que foi
A passagem
No chão dorido
Da vida,
Como a brancura
De outrora
Que de saudades
Doía
Em cada fatal
Despedida,
Quando a dor
Mais me vestia.
MAS SE EM SONHO
De novo
Te encontrar
Talvez eu volte
A sentir
A cativante
Magia
Da neve
No teu olhar,
Como a da minha rua
Que não há sol
Que a derreta
Na penumbra
Da memória...
..............
Que no sonho
E no poema
É mesmo
Como a tua.
SONHO ou A PORTA DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Transparência” Original de minha autoria Janeiro de 2025
POEMA: “SONHO ou A PORTA DO TEMPO”
NUM DIA DE CHUVA, Bateste levemente À porta da minha Memória, Como quem chamava Por mim, Com aparente Empatia, Soletrando O meu nome Em ritmo De melodia Com perfume De jasmim. ERA TRANSPARENTE, A porta, Reconheci A tua boca, O bâton púrpura Dos teus lábios, As linhas curvas Do teu corpo... E logo vi, Com o olhar Do desejo, Que eras tu, Como se o visse Despido, Sensual, Tão inocentemente Nu. NÃO SEI SE Me pressentiste, Não sei, A porta Era um espelho E através dela Só se via Do lado de cá, Do lado Da minha alma, A que sempre Te deseja, Mas que nunca Te terá. ENTRASTE, Por essa porta Cheia de cor, Que a chuva Humedeceu, Mas deixara-te Com mais Brilho... ........... O da chuva E o teu. TAMBÉM TU Eras transparente... Olhei-te E vi, em ti, Um céu diferente Que parecia Oferecer-se Ao desejo Como nunca Eu senti. NA TRANSPARÊNCIA, Despontou O sol, Subitamente, Coado por Neblina dourada Que descia Sobre mim Pra que te visse Brilhante, Exaltada, Com um brilho De cetim. ÀS VEZES, O dourado Ganhava tons de Âmbar E vestia-te O corpo nu Na minha Intangível Memória Sempre quente... ......... Como tu. VIA COM NITIDEZ Esse teu sorriso, Belo E cristalino, Mas, quando te quis Tocar, Desceu Sobre nós Um vidro fino, Baço e frio, E eu verti Lágrimas De inconformada Tristeza, Filhas De um profundo Vazio. AS LÁGRIMAS Deslizaram Pelo vidro E tu tentaste Agarrá-las (Em vão) Com todas As cores Que tinhas Na palma Da tua mão... DE REPENTE, Tornaste-te sol E eu já só era Um reflexo (Eu bem sabia) Dos teus Raios filtrados Por algumas Nuvens brancas Que iluminavam A minha pobre Fantasia. MAS LOGO DESPERTEI. Batera alguém Levemente À porta Do meu quarto. Corri a abri-la... ........ Ninguém! REGRESSEI, Rápido, À minha memória Para te reencontrar, Mas tu já não Estavas, Sequer como reflexo, A brilhar. DEIXARA ABERTA A porta do tempo, Por onde tu Desertaras, Como sempre, Pra parte incerta, Para uma dessas ruas Do destino Que fica sempre Deserta... OS SONHOS São sempre assim, Tudo se esvai Quando irrompe A luz do dia, Onde o sol É o farol Que sempre Nos desperta E nos aquece, Mas também Nos alumia.
O PASSADO E O PRESENTE
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Natureza Morta” Original de minha autoria Janeiro de 2025

“Natureza Morta”. JAS 2025
POEMA – “O PASSADO E O PRESENTE”
QUANDO O PASSADO É presente E mora mesmo A teu lado, Quando o tempo Se pressente, Mas um muro Intransponível Te mantém Sempre isolado, Esse tempo Marca O compasso Da vida, Memória De uma partida Que nunca Se desejou. CRIA Angústia, Desespero, Inaudível Ecoar, Porque é passado, Passou, E já não pode Voltar. RESTA A FRESTA Do imprevisto, Do acaso Que te faz Estremecer E quase abalroar, Um passado Que flui Ali mesmo A teu lado, Mas já não podes Tocar. É VIVO E é morto Esse passado, É fluxo Intangível, É escuro, Ao lado de onde Estás, Sem presente Nem futuro, Onde as sombras Não se movem Nem prà frente Nem pra trás. A LUZ ESTÁ Lá fora E pode encandear Com seu forte Clarão E tudo então Se mistura Lá no fundo De ti mesmo, Num imenso Caldeirão. POR VEZES, O tempo É como O nada, Pulveriza A memória E tudo Perde sentido, Como terra Devastada. AH, MAS ACONTECE O acaso, A visão Do teu passado Que caminha A teu lado E te convida A cantar, Ilusão De que te ouçam Nas ruínas Desse muro Derrubado A sonhar. QUANTAS VEZES Acontece O sonho Te libertar... ............ E como é Tão bom Sonhar Sem saber Que é um sonho Até ao teu Acordar. E SE O SONHO Comanda a vida Também há-de O passado Comandar Pra dar forma Ao encontro Desejado Entre quem Por ele Sempre soube Esperar. ESTE É O SONHO Que, um dia, O poeta Fascinou: Reconstruir O passado Para viver Encantado Como sempre Desejou, Em sonho Ou acordado, No presente, No futuro Ou até no seu Passado... .......... No tempo A que o destino O votou.

CAMINHOS PARALELOS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Le Rouge et le Noir” Original de minha autoria. Janeiro de 2025
"Le Rouge et le Noir". JAS 2025

POEMA – “CAMINHOS PARALELOS”
VI-A UM POUCO Triste Naquele dia, Eram muitos E apressados Os que na rua Passavam No dia Dos namorados, De minha tão leda Memória, Desses tempos Já passados Que não voltam Nunca mais. E TAMBÉM EU Regressava Por ali, Num acaso Circular, Nesse dia Luminoso Em que eu a vi Passar. COINCIDÊNCIAS Do lugar, Tristeza Triste, A sua... ........... De relance, Vi-a passar E fiquei De alma Nua De só a poder Abraçar, De través, Com o olhar, Quando a vejo Na rua. O SEU DESTINO E o meu Seguem Sempre por aí, São caminhos Paralelos Que se encontram No olhar Num ponto Do infinito, São veredas Impossíveis, Caminhos Do interdito. OS ASTROS Ou os deuses Marcaram Este meu penoso Fado E dele não posso Sair, Prisioneiro De um passado Que não é Possível cerzir. EXPIO, ASSIM, Com dor E tanta Melancolia, O fardo Do impossível Em forma de Redenção: Canto versos Com melodia, Poesia, Salvação, Na cidade Da utopia Para onde Eu sempre vou Com as estrofes Na mão.

AS FONTES DE TIVOLI
Poema de João de Almeida Santos, inspirado no romance "Via dei Portoghesi". Ilustração: “S/Título”, JAS 2024. Original de minha autoria. Dezembro de 2024.

“S/Título”. JAS 2024
POEMA – “AS FONTES DE TIVOLI”
FOI NAS CEM FONTES De Tivoli, Nos jardins De Villa D’Este, Que bebeu Da água pura E com ela Transformou Sua vida Atormentada Numa bela Aventura. SEDUZIDO E abandonado Por musa bela E forte Que o tornara Cativo, Sem saber Por que razão, Perdeu o rumo, Perdeu o norte, Seu castigo, E caiu Em profunda Solidão. NÃO FOI SONHO De amante Perder-se Em fantasia, Foi fogo Vivo e cortante Onde viver Não podia. PARTIU, POIS, Pra encontrar Novo rumo, Nova via, Palavras, Versos, Estrofes, Essa bela Alquimia... ............. Mas esse era Percurso Que nem ele Bem conhecia. PÔS-SE, CONTUDO, A caminho, Subiu logo Ao monte, Bebeu cem vezes Da água, Vagueando Por ali Para afogar Sua mágoa Nas fontes De Tivoli. NO LUNGOTEVERE, Onde vivia, Só via as pontes Por onde ela Passava Ao encontro Do destino No outro lado Do rio, Como quem já Não tem rumo E vive Em desvario. SALVOU-O A água pura Que tinha sempre Consigo, Bebia quando A via Pra se resgatar Do castigo, Do fogo Que o consumia, Era água De poeta, A que vem De Hippocrene, Que alimenta As musas E liberta A fantasia.

LINHAS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Linhas”, JAS 2020 Original de minha autoria Dezembro de 2024

“Linhas”. JAS. 2020
POEMA – “LINHAS”
PROCURO, Com apego, A perfeição Em cada verso Que escrevo, Movido Por comoção. E PERSIGO A utopia, Dando asas Ao desejo De plena Harmonia Nas palavras Que escrevo Com a minha Fantasia. É COMO A VIDA, A poesia, É incerto Percurso De linhas Curvas, Tortas Ou sincopadas, É procura De formas Que falem, Com exactidão De cristal, Das mágoas Sofridas Em mágoas Cantadas Por inquieto Jogral. AS ESTROFES São círculos Que o poeta Desenha Com a alma, Onde as letras São linhas À procura De sentido E em forma De palavra. MAS, POR VEZES, Elas são Emaranhados Confusos Que depressa Se deslaçam, Quais novelos De fiar... É CONSTANTE Entretecer, Um constante Caminhar Por linhas Desencontradas, Um luminoso Viver Em palavras Inventadas. E, ENTÃO, Já no final, Surge O círculo Perfeito Que não se pode Deslaçar, É um eterno Retorno Onde o fim É sempre novo, Mas um novo Começar. A POESIA (Está bem De ver) Não é redonda Como o círculo, Não é... .............. Mas é composta Por linhas Em movimento, Já sopradas Pelo vento Em busca D’exactidão, Dom Concedido Somente A quem sente A sua dor Como porta De saída Pra poética Evasão. PALAVRAS São linhas Que se enlaçam E deslaçam, Frequente Compulsão, Sentimentos Escritos E desenhados Com a alma Em alvoroço E com força De vulcão. ASSIM É A POESIA, Levitação, Almas inquietas Em intensa Propulsão, Linhas Que são palavras Que resgatam Os que sofrem De perpétua Comoção, Os que as procuram Em busca De um milagre, Em busca De redenção.

A SAUDADE
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Melancolia”, JAS 2022 Original de minha autoria Dezembro de 2024

“Melancolia”. JAS 2022. 80×88, em papel de algodão (310gr) e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em mold. de madeira
POEMA – “A SAUDADE”
NUM DIA Cinzento Da vida Cruzei-me Com a saudade, Estava vestida De negro E não soube Que fazer, Perdido Lá na cidade, Nesse triste Entardecer... FINGI Que não a via, Mas olhei-a De través, Sem saber Por que o fazia Ou receio De um revés. MAS ELA Entrou em mim Porque de mim Não saíra, Memória Incompleta De algo Que não partira. É SAUDADE Do que nunca Aconteceu E por isso Atinge forte, Como raio E trovão, Quem revive O que viveu Em sofrida Solidão. A SAUDADE Aparece Onde menos Se espera, Ela sempre Acontece, Redonda Como esfera. E É NOS DIAS Cinzentos Que ela Sempre Aparece Disfarçada De acaso... ....... É assim Que acontece, É destino A caminho Do ocaso. A SAUDADE, Imprevisível E forte, Encandeia Quem a sente, Qual clarão Em noite escura Nos dias Cinzentos Da vida, Sempre intensa, Sempre impura, Uma infinda Despedida... ................ Que já nem o tempo Cura. QUANTO MAIS O tempo passa Mais a saudade Dura E cresce Pois se o passado Não cura Para sempre Permanece.

A FIGUEIRA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Pasárgada”
JAS 2021
Original de minha autoria
Dezembro de 2024

“Pasárgada”, JAS 2021, 108×138, impressão Giclée em papel de algodão (310gr) e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em mold, de madeira
POEMA – “A FIGUEIRA”
EU TINHA
Uma figueira
Lá onde está
O tão cantado
Loureiro.
Generosa
E fagueira
Dela fiquei
Prisioneiro
Ou até
Enamorado.
NA AURORA
Da minha vida
Dava figos
Ping’o mel
Que, deliciado,
Comia.
Crescendo, assim,
A seu lado
Era belo
O que sentia...
...........
Ser por ela
Acarinhado.
MAS UM DIA
Ela morreu.
Fiquei triste
E calado,
Sem saber
O que fazer...
..............
Mas logo plantei
Um loureiro
Mesmo ali
A seu lado
E fiz tudo
(Mesmo tudo)
Para por ele
Ser amado,
Para com ele
Eu crescer.
TORNEI-ME
Um bom
Jardineiro,
No afecto
Imaculado
Para ver se
Conseguia
Ficar de novo
Encantado.
E NÃO É QUE
Consegui!
Partira
À aventura,
Já sem figos
E doçura,
Mas foi tão forte
O que senti
Que ainda hoje
Perdura.
PERDER
Ou ganhar,
São estas
As leis da vida,
Perdi
A minha figueira,
Logo encontrei
Um amigo
No dia
Da despedida.
E ASSIM
Eu consegui
Recriar
O que perdi
Ao plantar
O loureiro,
Porque vê-lo
No jardim
(Também ele
É fagueiro)
Estimula
A fantasia:
Recrio
A velha figueira
Com um golpe
De magia,
É emoção
Verdadeira
Em forma
De poesia.

“Pasárgada”, JAS 2021. Detalhe
TREME A TERRA, QUANDO PASSA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Perfil de Mulher”,
JAS 2022. Original de minha autoria
(Colecção Privada). Dezembro de 2024

“Perfil de Mulher”, JAS 2022 – 94×114, impressão Giclée em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em mold. de madeira (Colecção privada)
POEMA – “TREME A TERRA, QUANDO PASSA”
SINTO UM CERCO
Muito quente
Que me envolve
O corpo
Quando ela passa
Na rua,
Mas o silêncio
É frio,
Não responde
Ao chamamento
Quando eu a desafio
A mostrar-se
Um pouco nua.
TREME A TERRA
Quando passa,
Passos lentos,
A olhar,
Como alguém
Que se perdeu...
........
E sofro
Porque esvoaça
Nesse céu
Que não é meu.
SILÊNCIO
É a palavra
E diz mais
Do que parece,
Eu vejo,
Quando ela passa,
Silhueta
De mulher
Que se esgueira
Ao olhar...
.............
De quem olha
E não esquece,
De quem sabe
O que é amar.
E MESMO QUE SE
Esconda,
Que finja
Que não é ela
E na multidão
Se dilua,
Quem sempre
A vê
Da janela
Sempre a sente
Um pouco sua.
TREME A TERRA
Quando passa,
Mas não a sinto
Perdida
Pois se o cerco
É sempre quente
Quando passa
Dá-me vida.
NÃO É ACASO
(Não é),
Talvez seja
O destino
Ou desejo
Desigual,
Se a terra
Treme
Quando ela passa
Não é efeito
Banal
Pois também eu
Estremeço
Ao seu primeiro
Sinal.
TREME A TERRA
Quando passa,
Estremeço
Também eu,
É a vida,
Uma graça
Que vem
Lá de cima
Do céu.

RITUAIS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Catedral”, JAS 2024 Original de minha autoria Novembro de 2024

“Catedral”. JAS 2024
POEMA – “RITUAIS”
NESSE DIA, Imaginei Um templo Revestido de vitrais, Celebrações Em palavras E singelos rituais... EVOCAVA, Assim, O tempo Em que sempre Me perdia Nesse seu olhar Esquivo Que quase tudo Dizia, Em que os silêncios Sobravam Como se fossem Castigo De pecados Em que nunca Me revia. O QUE RESTOU É alimento Da alma, É fervilhar De memórias, Inscrições Sensoriais, Silêncio Profundo A poético Chamamento E nada mais... ......... Um poema, A catedral, Invocação Em tormento, Oficiar Rituais. FUTURO Imaginado De voluntário Amante Construído Nas ruínas De um passado Que já é Muito distante. O QUE SOBRA É um brilho Coado, Melancólico, Cinzento, O negro De seus olhos Inquietos E de seus cabelos Fartos, Ao vento... TUDO A FERVILHAR Na minha sofrida Memória, Delicada recriação Em palavras Com história. DOU-LHE, ASSIM, Nova vida, Renovo-me Também eu, Falo ao mundo Comovido De um tempo Que é só meu. IMAGINO Esse templo Sempre que Regresso Do meu Jardim Encantado, Vibrante de cores E por fora Perfumado, Mas por dentro Melancólico e Sofrido Por a ter, Nesse tempo Já passado, Dolorosamente Perdido...

“Inscrições”. JAS 2024
CONFISSÃO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Perfil de Musa”
Original de minha autoria
Novembro de 2024

“Perfil de Musa”. JAS 2023; 63×78, em papel de algodão (310gr) e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70 em mold. de madeira
POEMA – “CONFISSÃO”
COMO SABES,
E sabes como
(Ou talvez não),
Sou poeta
E sou pintor
Para pintar
O teu rosto
(Talvez em vão),
Com os riscos
E as cores
Que persistem
Na memória
(Mas talvez aches
Que não).
QUANDO QUIS
Pintar
Teus olhos,
Teus cabelos
E essa boca
Que nunca
Ousei beijar
Descobri
Que não sabia
Por onde dever
Começar.
TINHAM-SE
Diluído
Na memória
Visual
Os traços
Desse teu rosto
Fatal
Que sempre
Me encantou...
............
E como eram
Teus olhos
Nesse tempo
Já passado
Que há
Tanto tempo
Passou.
MAS NÃO FAZ MAL
(Disse pra mim
Em segredo),
Pinto-te como
Ainda te vejo,
Com a alma
Incandescente,
Cabelos negros
E olhos
Da mesma cor,
Lábios vermelhos
Que desafiam
O beijo
Que não ouso,
Por pudor.
MESMO ASSIM
(Talvez por isso),
Sinto
Uma branca
Neblina
Que cai leve
Sobre teu rosto
E não o posso
Pintar
Com o rigor
Que desejo,
Pois só com
A alma
O vejo
Para o poder
Desenhar.
AH, SIM,
Com ela
Há nitidez,
Sinto-te
Como te via
E por isso
Sei pintar-te
Com rigor,
Com palavras,
Com poesia,
Lá onde mora
A dor.
LUZ
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Paraíso”, JAS 2022
Original de minha autoria
Novembro de 2024

“Paraíso”. JAS 2022 – 68×84, papel de algodão (3210gr) e verniz Hahnemuehle, Artglass AR 70, em mold. de madeira
POEMA – “LUZ”
TANTA LUZ
Neste meu céu,
Esse imenso
E cintilante
Mar
Que um dia
Foi todo meu
E deu asas
Ao olhar,
Espelho
Dos sonhos
De amante
Onde a fantasia
Nasceu
Pra lá poder
Navegar.
ESPELHO
Branco
Que te ilumina
Na noite escura
E fria
Onde brilham
Os teus olhos,
Luar
Prateado
Desta minha
Fantasia.
E QUANDO
Nos sonhos
Te vejo
Iluminada,
Entro na porta
Branca
Que me leva
Ao paraíso...
.......
Levado
Por uma fada.
E VOO, VOO,
Deixando
Para trás
O meu jardim
Encantado,
Os bailéus
Da casa-mãe
Desenhados
A rigor,
A quelha da minha
Infância,
Manhãs brancas
De surpresa
Em puríssimo
Alvor.
NOS SONHOS,
(Em todos eles)
Caio das nuvens
Brancas
Como Ícaro,
Quase cego
Da sua luz
Até te encontrar
No jardim
Vestida de todas
As cores
Que povoam
As cidades
Dos poetas
E pintores
Com aromas
De jasmim.
É ESSA
Cintilante
Luz
Que ilumina
O que me sobra
De ti,
O que ainda
Me seduz
Nos sonhos
Em que te pinto
E que sempre
Me sorri.
É SONHO,
É tudo quanto
Me basta
E nada mais,
É tudo
O que eu preciso
Pra te sonhar
Comovido
À beira
Do nosso cais.

POEMA PARA UM ROSTO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Rosto para um Poema”
Original de minha autoria
Novembro de 2024

“S/Título”. JAS 2024
POEMA – “POEMA PARA UM ROSTO”
EU CANTO
Esses teus olhos,
Ah, eu canto
A sua luz,
A sua cor
Transparente
Como mel.
Este pintor
Que é poeta
Desenhou-os
Com um secreto
Pincel
Que era, sim,
Uma caneta.
PALAVRAS
Leva-as
O vento
(Eu bem sei),
Mas coladas
À cor
Desses teus olhos
(Como eu os
Desenhei)
São asas
Que me livram
Do tormento.
AGUARELA
De palavras,
Quero dizer,
Galeria
De um rosto
Só,
O pintor que é
Poeta
Assim desata
Seu nó
E deixa
Mensagem
Discreta.
TUA BOCA
É de púrpura
(É, sim)
Como eu
Sempre a vi,
Ao rubro
De uma intensa
Paixão,
Energia
Para voar
Por aí
Em acesa
Combustão.
HÁ VIDRO
Que a separa?
Pois há,
Mas se murmurar
O teu nome
Essa tela
Que é poema
Será sempre
A minha ara
No fogo
Que me consome.
CRESCEM FLORES
A teus pés,
Pintei-as
De todas as cores
Colhidas
No meu Jardim,
Anunciam
Novos aromas
E outros tantos
Sabores
Pintados todos
Pra mim.

TENTAÇÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Cristais”, JAS 2021
(67x89, papel de algodão, 310gr,
e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70,
mold. de madeira). Colecção privada.
Outubro de 2024.

“Cristais”. JAS 2021
“¡Quién fuera como tú,
fruta, / todo pasión
sobre el campo!”
Final do poema de
Federico García Lorca
“Canción Oriental” (1920),
dedicado à Romã.
POEMA – “TENTAÇÃO”
INQUIETO,
Como sempre,
Vi-te por dentro
Depois de te ter
Cantado
Por fora,
Feliz,
Mas um pouco
Triste,
Assim...
Como quem chora!
CONTEMPLEI
Teus cristais,
Vi cintilar
Tua alma
E logo te pintei
Por dentro,
Sem mais,
Numa tarde
Leda e calma.
E CEDI À TENTAÇÃO
De te oferecer
Aos lábios
Da minha amada,
Ao compromisso
Fatal,
Pra que ficasse
Enleada
E, como Deusa
Do Olimpo,
Se tornasse
Imortal.
MAS ELA É
Concha fechada,
Seus cristais
São ouro negro,
É mistério
Bem guardado,
Silêncio
É o seu lema
Porque, dizem,
É dourado.
MAS PARA MIM
É romã...
.............
Quando a chamo
Ao meu canto
E a pinto
Com afã,
Alma cheia,
Cresce
No meu Jardim
Como em ilha
Encantada
Nasce o canto
Da sereia.
NUNCA TOCOU
Teus cristais
Nem os comeu
Como eu queria
Para, qual Hades
Do poema,
A ter
Eternamente
Cada noite
E cada dia.
POR ISSO TE PROCUREI,
Fruto
De tentação,
Alimento
Dos deuses,
De Kore
A eterna
Perdição.
TALVEZ ME ACENDAS
O estro
E a vontade
De rimar
Pois silêncio
Não é ouro
Se me falta
A sua voz
E não a posso
Cantar.

O JASMIM
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Rapsódia”
Original de minha autoria
Outubro de 2024

“Rapsódia”. JAS. 10-2024
POEMA – “O JASMIM”
FLORESCEU
O meu jasmim,
Dele jorra
Poesia,
O seu aroma
Embriaga
E liberta
A fantasia.
DOU COR
Às minhas
Palavras,
O seu perfume
Ilumina,
Bate-lhe o sol
Na folhagem
E o poema
Germina...
JÁ NÃO É SÓ
O loureiro,
Agora canto
O jasmim,
É tão vivo
O seu perfume
Que o estro
Já cresce
Em mim.
INUNDO-ME,
Pois,
De palavras,
De aromas
E de cor,
Subo ao céu
De um poema
Com desejo
De o compor.
SOU ÍCARO
Lá no alto
E quando o sol
Bate forte
Caio em mim
Do poema
E no chão
Da minha alma
Fico perdido,
Sem norte.
LOGO INVOCO
O jasmim,
Para ganhar
Energia,
Volto a subir
Às alturas,
Renascer
Em poesia.
VEJO DE NOVO
O jasmim
Mesmo ao lado do
Loureiro,
Respiro fundo
O perfume
E torno-me
Seu jardineiro.
E ASSIM EU VOU
Vivendo
No jardim da
Minha vida
Onde as palavras
São cores
E os aromas
Melodia,
Os poemas
São canções,
Milagres
Da fantasia.

ÀS VEZES
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “A Lua Desceu sobre Mim”
JAS 2024
Original de minha autoria
Outubro de 2024

“A Lua Desceu sobre Mim”. JAS. 10- 2024
POEMA - "ÀS VEZES"
ÀS VEZES
Tenho saudades
Do tempo
Que não vivi,
Dos encontros
Que falhei,
Das coisas
Que já não fiz
Ou que, fazendo,
Errei.
CONSTRUÍ-ME
Como quis,
À medida
Do desejo
E em cada passo
Que dava
Fazia nascer
Um passado
Que neste poema
Não vejo.
MAS TENHO MESMO
Saudades,
Que mais posso
Eu fazer?
Quem vive
Daquilo que faz
E dá uma voz
Ao que sente,
Vai construindo
O futuro
Pra libertar
O presente.
NÃO ME QUEIXO
Do passado,
Do que nele
Construí
E da vida
Que levei...
.............
Contra ventos
E marés
Muitas vezes
Eu falhei...
HUMANA
Imperfeição,
Quero dizer,
Porque se fosse
Perfeito
Não estaria
O poema
Pronto
Para nascer
Com palavras
Que resgatam
Do que não soube
Fazer.
É VERDADE,
Eu bem sei
Que um dia
Tropecei
E me perdi
No caminho,
Procurava,
Procurei,
Fazendo o percurso
Sozinho...
...........
Mas voltava
A tropeçar,
Até que um dia
Parei
Para não
Recomeçar...
MESMO ASSIM,
Recomecei
E voltei
A caminhar,
Mas não mais
Eu tropecei
Porque em palavras
Peguei
Pra me poder
Resgatar...
..........
Foi assim
Que me salvei.
SALVARAM-ME
Essas palavras
Compostas
Em poesia
Porque fiz
Do tropeçar
Matéria
De fantasia.

AS BAGAS
Arietta
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “O Jardim”, JAS 2024 Original de autoria Outubro de 2024

“O Jardim”. JAS 2024
POEMA - "AS BAGAS"
Arietta
AO RAIAR De um belo dia Visitei O meu jardim... Havia Algumas rosas, Um azevinho Sem bagas, Três cameleiras Frondosas E tudo ali Para mim. VI DEUSA Desnudada Por entre verde Folhagem, Uvas frescas De latada E o jardim Como imagem. MAS AS BAGAS, As bagas do azevinho, Vermelhas, Cor do meu sangue, Não as tinha, O pobrezinho, Era um arbusto Exangue. E EU, TRISTE Por não as ter A fazer-me Companhia, Quis um novo Azevinho Com bagas Como as queria. PEDI LOGO Ao jardineiro Que o encontrasse Pra mim, Sem elas Era mais pobre O meu bonito Jardim. MAS O TEMPO, Ah, o tempo, Não as traria Até o azevinho Crescer... Por isso, pus mãos À obra Para em versos As ter... EM VERSOS... Também em cor, Era assim Que as teria, Quisesse O meu pintor Ilustrar A poesia. BAGAS Na fantasia, Ali prontas Para criar, Não as tendo O azevinho Desenhei Um novo arbusto Para bagas Ele me dar. E ASSIM FIQUEI Feliz Por ter bagas Vermelhinhas... ........... Não sendo Do azevinho, Mas da minha Fantasia, Todas elas Eram minhas, As bagas De minha cria.

O SONHO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Jardim Espectral” JAS 2024 Original de minha autoria Setembro de 2024

“Jardim Espectral”. JAS 2024
"Estamos perto do acordar, quando sonhamos que sonhamos" (Wir sind dem Aufwachen nah, wenn wir träumen, dass wir träumen) Novalis
POEMA – “O SONHO”
SONHEI, Um sonho estranho (Não sei porquê, Mas os sonhos São assim), Que numa tarde De outono Eu te vi, Silenciosa, Etérea, Ali, A meu lado, Sob o loureiro Do meu Jardim Encantado. NÃO ERA RUBRO De vida cheia O teu rosto, Olhar incerto Em forma pura, Retrato Em papel baço Ou escultura... ............. De travertino, Distante Destes versos Que na alma São reversos De um sofrido Destino. E EU ALI, Nesse jardim Espectral, A sofrer-te Em suave Melancolia Por só poder Pressentir Em palavras A tua alma, Talvez em fuga, Talvez vazia. ROSTO Impenetrável Que só ouvia Interiormente No que, afinal Não dizia, Intermitente, Mudez gélida Como o mármore Do teu rosto Em travertino, Olhar vago À procura Não sei de quê, Talvez de nada Ou das marcas Do destino. PRESSENTIA-TE Sem ouvir A tua voz. Era apenas Desejo Onírico De alma Vagante E uma silhueta, Talvez errante, Em tarde Já tardia Na espessa Neblina Que me cobria. DE TI Sobrou-me Um rosto, Tudo aquilo Que me resta Pra te sonhar Neste intervalo Tardio Entre mim E a tua vida, Um eterno Desencontro Já gravado Como ferida. ESSE PERFIL Marmóreo Prenunciava Um glacial Silêncio que, Ao acordar, Me há-de Emudecer, Tornando-me Máscara gémea Desenhada Com palavras Que eu nunca Encontrarei, Por te perder... O rasto E os olhos Negros, Esses Que sempre Para ti Eu celebrei Porque sempre Te quis ter.

VOAR
João de Almeida Santos Ilustração - “Voar”, JAS 2023 Original de minha autoria Setembro de 2024

“Voar”. JAS 2023 (71×88, papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em moldura de madeira).
POEMA – “VOAR”
EU CANTO E PINTO Tudo o que sinto, Sonhos velados, O meu destino, Versos e cores, Os meus brocados, É poesia, É desatino, Vivo na vida Meus sonhos Cantados. É ASSIM, É a vida, É um lugar De partida, É viagem, Nada mais... ............. E quando parto Lá pra cima, Azul do céu, É festa rija Lá no meu cais. VOU COM AS AVES Voo pra longe E com mais cor Porque no céu Há mais azul E nos meus sonhos A vida Tem mais sabor. POR ISSO VOO Sempre mais alto, Trepo nas cores Pra lá chegar, O vento Dá-me alento Para voar... ............ E lá em cima, Junto das nuvens, Os meus segredos Posso guardar. POR ISSO Eu canto, Por isso subo Lá para o alto, Nada mais vejo, Nada mais ouço E assim não vivo Em sobressalto. LEVO PALAVRAS E levo cores, Levo tudo Do mesmo jeito E logo sinto, Azul e leve, Ar rarefeito E menos peso Na minha alma E menos frio Cá no meu peito. CHAMO A MUSA Pra ir comigo E dou-lhe asas Para voar No infinito Do céu azul... ............. E liberdade Para sonhar. VOO COM ELA Sem um destino Na imensidão... ................ E lá bem alto, Já de mãos dadas, Voamos juntos Ao ritmo certo E bem marcado Da emoção.

CONFISSÕES IMPROVÁVEIS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “La Peccatrice”, JAS 2023 Original de minha autoria Setembro de 2024

“La Peccatrice”, JAS 2023 – 57×88, papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, mold. madeira.
POEMA – “CONFISSÕES IMPROVÁVEIS”
RESISTO
(Como se vê) Ao cansaço De te recriar Aqui, No meu Jardim, Busca Incessante De palavras E de cores Que parece Não ter fim... ATÉ AS PALAVRAS Já nada querem
Dizer, Braços caídos, A esvaecer... E cores Rasgadas A desbotar Em cenários De abraços Feridos Para esquecer. CANSAÇO, Melancolia, Também prazer, Recriar-te com Palavras Em poesia Pra não sofrer, Desejo vivo De sentir A pulsação Da tua alma E com ela Reviver. MAS DE NADA VALE Pedir sinais, Que os manejas Com mestria, Talvez sageza, Ao sabor De teus caprichos Venais, Mas de inabalável Dureza. TALVEZ ANDES Perdida Com futilidades Da vida, Sem conhecer O que digo, Tão alheia Aos meus desejos Que até me sabe A castigo. NÃO FOSSEM As cores Reconstruídas Do arco-íris Que tenho No meu jardim A pintar o rio Da tua vida E talvez eu Navegasse Pra outra foz, Talvez No meu cais De partida Te desse O derradeiro Adeus De despedida Do pouco Que ainda Resta de nós. SIM, MAS VERIA Sempre a tua Réplica, Veria sempre O cintilar Dos teus sinais... ............... E, então, Ponho-me A viajar Em fantasia, A criar imagens Com a luz filtrada Dos meus vitrais, A ver pleno Onde há vazio... ............. E, assim, eu Já nem sinto Na minha alma Aquele frio Dos teus silêncios Glaciais.

PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Fascínio”, JAS 2023 Original de minha autoria Setembro de 2024

“Fascínio”, JAS 2023, 68×88, papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em mold. de madeira
POEMA – “PALAVRAS”
PARA QUE SERVE O poema, Meu amor? “Para nada!”, Dizes tu, “São palavras Que usas Pra te sentires Menos nu”. MAS PALAVRAS São como o vento (Respondi-lhe Com verdade), Vão, Voltam E mudam De intensidade, Sopram forte Ou de mansinho, São volúveis, Ilusão, Vão para sul Ou vão pra norte, Encontram O seu caminho, Mas cruzam O meu destino Mesmo que eu diga Que não. SÃO INTANGÍVEIS, São sinais, Podem ferir Como espada, Às vezes, Como silêncio, Ou até Um pouco mais, Outras, pior, Como nada, Nem sequer Como sinais. AS MINHAS Dizem sempre O que sinto, Parecendo Não o dizer, Mas, às vezes, É proibido, Outras simplesmente Por não querer, Mas se te escrevo E até minto (O que até bem Pode ser) É por ser forte O desejo De um dia Eu te ter. ESTE POEMA Que te envio Escrevi-o Com o vento, Mas nele eu Também minto E até o vermelho É cinzento, Pra esconder Aquilo que eu Já não sinto, Pelo menos No momento, Pelo menos Até ver. MAS É ESCRITA Inocente Que quer chegar Ao destino, Como o Sol Vai a poente Num poema Cristalino. SÃO PALAVRAS, São sorrisos E, às vezes, Fingimentos, São murmúrios, Sentimentos Daquele que Sempre te quer, São o sonho Do poeta Quando a vida Adormece No rosto De uma mulher.

“S/Título”, JAS 2024
NEVERMORE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Sedução”, JAS 2024
Original de minha autoria
Setembro de 202

“Sedução”. JAS 2024
POEMA – “NEVERMORE”
SE NUNCA MAIS
Te encontrar,
Mas disso
Eu tenho a certeza,
Melhor te devo
Guardar
Para não deixar
Morrer
A poética leveza,
A que liberta
A alma
E ajuda
A resistir
Fazendo forte
A fraqueza
E suave
O existir.
FICA COMIGO
A tristeza,
Sobrevém
Melancolia?
Tristeza
Não me faz bem,
Não é boa
Companhia.
SE NUNCA MAIS
Te encontrar,
Vou ter saudades
De ti,
Mesmo assim,
Na tua ausência,
Sou aquele
Que te sorri.
SORRIR FAZ BEM
À alma,
Liberta,
Engana a dor,
O sorriso também
Resgata
Da “doença”
Do amor.
DOENÇA,
Diz o poeta?
Não,
Não é bem isso,
Talvez seja
Perdição,
Ficar, assim,
Submisso,
Numa certa
Solidão...
REGRESSA,
"Doce
Melancolia",
Enche a alma
Do poeta,
Dá-lhe versos,
Poesia,
Essa fala
Tão discreta,
Palavras
E melodia,
A sua força
Secreta!
SE ASSIM FOR,
Eu Viverei
Na casa da poesia
Onde a tristeza
Em verso
É suave
E delicada,
É mais quente
Do que fria,
É doce,
Aveludada,
É saudade
Transformada
Em pura
Melancolia.

MELANCOLIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Melancolia”, JAS 2022. Original de minha autoria. Agosto de 2024.

“Melancolia”. JAS, 2022. 80×88, em papel de algodão (310gr) e verniz Hahnemuehle. Artglass AR70 em mold. de madeira.
POEMA – “MELANCOLIA”
EU PRECISO De falar Da melancolia Que sinto, Mas não sei Bem o que seja... ......... Talvez se Em poesia Vertida Bem retratada A veja. TENTEI Pintá-la Num rosto Para ver se Conseguia Ficou no rosto Pintada O melhor Que eu sabia. TER CERTEZAS É coisa que eu Não tenho Nem a poesia Mas dá, Mas se sinto Melancolia Por algum motivo Será. NÃO É FÁCIL Definir Com rigor A melancolia Que sinto E se a procurar Num poema Pode até parecer Que minto... BOM, FINJO, Não minto, Mas fingir Pode bem ser, Porque é Melancolia O que sinto Se em perda Eu viver. TALVEZ A melancolia Seja perda, Seja vazio E tristeza, Mas se a sofrermos Em arte Mais do que peso É leveza. O POETA Tem razão, Tristeza é Doce Melancolia Se a sentirmos Com palavras Na pauta Da poesia, Quando a dor De uma perda Se torna leve E constante E a “sombra Luminosa” Do ausente A nossa mais “Fiel amante”.

CIAO, MAMMA, TI MANDO UN BACIO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Mamma” Original de minha autoria 18 de Agosto de 2024

“Mamma”. JAS. 08-2024
POEMA - "CIAO, MAMMA, TI MANDO UN BACIO"
EU GOSTO De viajar Em palavras, Gosto mesmo De palavrar E há números Que são palavras Que eu gosto De cantar. NÃO FALO Do número três Ou do sete, Que são, Para vidas imperfeitas, Sempre perfeitos Demais, Falo de vidas Contadas Com palavras Desenhadas De que os números São sinais. EU TENHO NÚMEROS Tão cheios De palavras Com sentido Que são vida Em movimento, Sinais de tempo Vivido, Já levado Pelo vento... HÁ NÚMEROS Que são palavras E outros que São flores, Há números Que são Como beijos E outros Pintados a cores Que evocam Um passado De que fomos Escultores. E HÁ O NÚMERO De hoje Que traz consigo Um nome, Um poema Que me fala, Um abraço Que me aquece, Um regalo que Me embala, Uma imagem De ternura Que me sorri E me cura Das asperezas Da vida, Âncora bela E segura. É O NÚMERO Que traz consigo O nome Que me conta E me sustém, Nome Que guardo Sempre comigo... ....... O nome De minha Mãe.

O ECO DO SILÊNCIO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Eco do Silêncio”, JAS 2023 (71x82, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle; Artglass AR70 em moldura de madeira). Original de minha autoria. Agosto de 2024.

“O Eco do Silêncio”. JAS 2023 – 71×82, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle; Artglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “O ECO DO SILÊNCIO”
AS PALAVRAS São as asas Do silêncio, Dizia o poeta, E bem, Elas voam Mas só voltam Se seu eco Voltar também. O SILÊNCIO Só tem eco Se o poeta Lho der E o eco Será sempre Como um beijo De mulher. VÃO AS PALAVRAS, Vem o eco E o silêncio Tem sentido, Com palavras Pinta seu rosto Em perfil Bem definido. ASSIM É A FANTASIA De poeta Encantado, A musa Fica em silêncio E ele Em palavras Enlaçado. SÓ AS PALAVRAS Resgatam Da profunda Melancolia, Elas vão E logo voltam Como eco Dessa pauta Que se chama Poesia.

DIÁLOGO IMPERFEITO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “La Cortigiana”, JAS 2023 (71x88, papel de algodão,
310gr, e verniz Hahnemuehle,
Artglass AR70 em moldura de madeira). Original de minha autoria. Agosto de 2024.

“La Cortigiana”. Jas, 2023 (71×88, em papel de algodão, 310gr, e verniz Hahnemuehle, Arglass AR70 em moldura de madeira). Agosto de 2024.
POEMA – “DIÁLOGO IMPERFEITO”
PERGUNTA O poeta À musa: Não acreditas Em mim, Pois não? Tanto de mim Neste excesso De palavras Para viajar No tempo Ao sabor Da fantasia E de uma doce Ilusão... PARECE Um jogo, Não é? Mas é vida, É sentida E pensada, É em palavras Tecida E em palavras Consumada. NO FIM, É o verbo... ......... E quando Te falo assim, Com palavras Arrumadas Num diálogo Imperfeito, Volto A passar Por ti, A olhar-te Sem te ver, Por fora, Mas por dentro, Na exactidão Cristalina Do momento. OLHAR Da alma, Digo eu, Sem ter A certeza Que verei Com nitidez A tua, Que o tempo Há muito Embaciou... DE NOVO Te verei Como nas Despedidas Ao entardecer, Que foram Tantas E tão sentidas, A doer... PERCURSO De vida Inesperado Nas margens Do destino Pelos deuses Inexoravelmente Traçado. POR ISSO, A tua Será sempre A imagem Oracular, Ritual, Que sai Da neblina Onírica Dos meus versos De jogral.

O POETA E O TEMPO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “O Silêncio e o Tempo”
Original de minha autoria
Julho de 2024

“O Silêncio e o Tempo”. JAS. 07-2024
POEMA – “O POETA E O TEMPO”
O POETA
É um ser
Em solidão,
Vive na terra
De ninguém,
Todos se foram
De lá
E quem se foi
Já não vem.
ELE VIVE
Entre
O passado
E o futuro,
Um tempo
Que não existe
Porque se o passado
Passou
No presente
Não persiste.
O TEMPO
Voa
Em direcção
Ao futuro
E deixa
O presente
Pra trás,
Mas quando
Volta
Pra nós
Já é passado
Que traz.
NÃO É POSSÍVEL
Travá-lo,
Porque voa
Para a frente
E voa também
Para trás,
Mas se voarmos
Com ele
Não é só passado
Que traz.
O TEMPO
É devir,
É movimento,
É balanço,
É medida,
É a via
(Que é sempre
Indefinida)
Entre o que foi
E será
E como tudo
Na vida
O que trouxer
Se verá.

“O Silêncio e o Tempo”. Detalhe
A CARTA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Retrato”
JAS 2022
* 68x80, papel de algodão
- 310gr - e verniz Hahnemuehle,
Artglass AR70 em moldura
de madeira.
Original de minha autoria.
Julho de 2024.

“O Retrato”. JAS 2022.
POEMA – “A CARTA”
OLÁ, COMO ESTÁS?
Eu estou bem
E saudades
Não me faltam,
Não caio
Em negação,
Quando elas
Mais apertam
Subo ao Monte,
Lá no alto,
Em busca
D’inspiração.
NÃO PARECE,
Mas é bom
Ter muitas
Saudades de ti,
Quer dizer
Que há passado,
Esse tempo
Abençoado
Que contigo
Eu vivi.
POR ISSO, SIM,
Eu estou bem
De saudades,
Embora mal
De passado,
Com imaginação
Vou vivendo
Como te tendo
A meu lado.
E, OLHA,
Se nunca mais
Te encontrar
Passo
A inventar
Encontros
Que nunca
Hão-de ter fim,
Recrio
A tua alma,
Desenho-te
Só para mim.
NÃO ME FIXAREI
No teu corpo,
Ia doer,
Faz sempre mal,
Por isso vou
Projectar-te
Num ecrã
Que é mental.
COM A FORÇA
Do desejo
Recrio o tempo
Que foi,
Recrio
Esse passado,
Evito, assim,
O vazio
E revejo-me
A teu lado.
QUE MAIS POSSO
Eu fazer?
Perder-te
Como poeta?
Deixar
As saudades
Pra lá?
Repetir o abandono
E perder-te
Também cá?
AH, ISSO EU
Não farei,
Ganhei nova
Identidade,
Voltar atrás
Já não posso,
Não depende
Da vontade,
Por isso eu vou
Em frente
Pra cantar
A tua imagem
Como espelho
Da saudade.

A VISITA
Poema de João de Almeida Santos em nove andamentos. Ilustração: “A Musa e o Jardim”. Original de minha autoria. Julho de 2024.

“A Musa e o Jardim”. JAS. 07-2024
LEITMOTIV
“Ah, que inefável pureza! Que candura imaculada!... Dir-se-ia que a Natureza Nasceu esta madrugada!...” Guerra Junqueiro, “Idílio” (A Musa em Férias)
Musa, desce do alto da montanha Onde aspiraste o aroma da poesia, E deixa ao eco dos sagrados ermos A última harmonia. (...) Desce. Virá um dia em que mais bela, Mais alegre, mais cheia de harmonias, Voltes a procurar a voz cadente Dos teus primeiros dias. Machado de Assis, “Última Folha” (Crisálidas)
POEMA – “A VISITA”
I.
FUI VISITAR O jardim Num quente dia De Verão Às voltas Com a memória, Nem sei bem Por que razão...
II.
E QUE VEJO No jardim Quando acabo De chegar? Vejo loureiro, Vejo jasmim, Vejo mil cores Fabulosas, Camélias Brancas E rosas, Explosão De alegria, Um bailado De aromas Num jardim Em euforia.
III.
AH, MAS À SOMBRA Do loureiro O insólito Acontece: Rosas trepam, Dão-lhe cheiro, Já nem loureiro Parece. IMITAM O velho enlace Da videira Cardinal E provocam-me A rima A cada passo Que dão Na subida Lá pra cima, Para o alto Do arbusto, Onde rosas Lá não chegam Nem sequer A muito custo.
IV.
O ESTRO Já é escasso, Foi-se a musa, Não a sinto, Procuro-a, Mas troco O passo, Fica difícil O verso, Impossível O abraço. NEM O JARDIM Já me salva Da funda Melancolia, Vou tentando E não consigo Já ver nele O que eu via.
V.
E SE VOLTAREM Aromas, Mas faltar A minha musa, Mesmo assim Há poesia? Aromas Atraem musas E o poeta Não sabia?
VI.
AH, ENTÃO
Agora Que sinto Aromas Renascendo No jardim Talvez a musa Regresse Como aroma De jasmim E talvez ela Desperte Os versos Que eu conservo No mais Íntimo de mim.
VII.
O LOUREIRO Já tem rosas, A musa já Regressou E o estro Do poeta É fonte Que não secou.
VIII.
VIVA A ARTE, Viva o poeta E os aromas Do jardim, Viva a musa Que regressa Com poemas Para mim. VIVA EU E viva ela Quer a veja No jardim Ou a veja Da janela, O estro Já regressou, Rejubila
O poeta Graças ao Regresso Dela E ao que dela Lhe sobrou.
IX.
ASSIM RETOMA O canto E a vontade De cantar, As musas São sedutoras E o poeta Tenta ser Mas quando As musas O deixam Já não sabe Que fazer, Por isso vai Ao jardim À procura De aromas Em busca D’inspiração Porque sabe Que os aromas São das musas A mais forte Sedução.

O BEIJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "O Beijo". Original de minha autoria para este poema. Seis de Julho: “Dia Internacional do Beijo”. Inspirado em "Lotte in Weimar" (1939), de Thomas Mann, a obra que continuou "Werther" (1774), de Goethe, e no meu Romance "Via dei Portoghesi". Seis de Julho de 2024.

“O Beijo”. JAS. 06-07-2024
LEITMOTIV
“O amor é o melhor na vida, assim, no amor, o melhor é o beijo – Poesia do amor...”. “Beijo é alegria, procriação é luxúria” Thomas Mann
INSPIRADO TAMBÉM EM:
“Os beijos escritos não chegam ao destino, mas são bebidos pelos fantasmas ao longo do trajecto” Kafka
“Se para te beijar devesse, depois, ir para o inferno, fá-lo-ia. Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos, de ter visto o paraíso sem nunca lá ter entrado” Shakespeare
“O primeiro beijo não é dado com a boca, mas com os olhos” Bernhardt
POEMA – “O BEIJO”
BEIJO FOI O que nunca Te dei A não ser Com o olhar... O primeiro, Esse beijo, Dei-to, pois, Sem te tocar. E DEI-TE MAIS, Com palavras, Quando olhar Já não podia, Foste embora, Apressada, E, assim, Eu não te via. FORAM BEIJOS Que sonhei Na triste rotina Dos dias, Desejos Que enfrentei Quando tu mais Me fugias. AGORA DOU-TE Beijos Escritos Que se perdem No caminho, Mas se o poema Me falta Fico ainda mais Sozinho. O BEIJO É emoção, É razão Descontrolada, Se não o dermos A tempo Pouco mais Será que nada. SEM BEIJO Não há amor, Sem amor Perde-se o beijo E perde sentido A vida Quando falta O desejo... POR ISSO O lanço Ao vento Pra que chegue Como brisa E suave melodia A quem de afecto Precisa Em modo De poesia. ESSE BEIJO Que me faltou, De que nunca Fui capaz, Voa pra ti Em palavras Na sua forma Mais pura Para que no seu Trajecto Voe, voe A grande altura E fantasmas Não o bebam Enquanto seu Voo dura. MAS SEI Dos escolhos Da via, Dos perigos Que ele corre, Capturado Por fantasmas É um beijo Que me morre. O BEIJO Que não te dei Foi pecado Original, Ficou perdido Na alma Como chaga Corporal MAS NESTE DIA Do beijo Eu canto A poética Do amor Pra me redimir Dessa falta Com palavras Desenhadas Com a arte Do pintor. E PORQUE O dia é teu Ganha força, Intensidade, Mesmo que Fantasmas O bebam Este é Um beijo meu, É um beijo De verdade. NÃO HÁ PALAVRAS Que bastem Pra repor O que não dei, Elas voam, Mas não chegam... .............. E mesmo assim Eu tentei. É CERTO Que sempre O quis, Só que nunca To roubei, A culpa foi Desse tempo, Dos dias em que Te amei, Um tempo Em diferido, Sem presente Nem futuro, Talvez beijo Sem sentido Porque queria Do mais puro, Tangendo eternidade Às portas Do Paraíso, Um beijo De divindade, Mas simples Como um sorriso. ESSE BEIJO Impossível Que não é do Foro humano Vou tentando Construí-lo Cada dia, Cada ano, Perdendo-me Pelo caminho Como sagrado Em profano.

O TEMPO E A PALAVRA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Palavras Deslaçadas” Original de minha autoria Poema inspirado numa pequena poesia de Luciana Stegagno Picchio Junho de 2024

“Palavras Deslaçadas”. JAS. 06-2024
(...) La vita che è stata un istante come un fumo scolora e solo le parole creano il passato" “Lotofagi”, In Luciana Stegagno Picchio, La Terra dei Lotofagi, Milano, Vanni Scheiwiller, 1993: 35
POEMA – “O TEMPO E A PALAVRA”
POR ESTRANHO Que pareça Já não me Lembro De ti, Do teu corpo, Do teu rosto, Do que sempre Neles vi, Dos olhos Negros, Profundos Que um dia Abracei E que no tempo Perdi. JÁ NÃO ME LEMBRO De ti, Apenas tenho A imagem Do que aos outros Transmiti Com palavras Desenhadas E do que nelas Revi. AGORA És feita De presentes Vividos Em ausência, Em versos Rimados Ao sabor Da melodia Que trauteio Em surdina Nas quentes Pautas Desta minha Fantasia. OLHO-TE Nos olhos Quando desenho A tua alma, Não com riscos Ou com cores, Mas com palavras Sofridas, Já gastas, Deslaçadas Pelo tempo Que passou, Por emoções Proibidas. A VIDA QUE FOI Esfumou-se Num instante Do passado Já distante, Esse tempo Que perdi, Mas com palavras A trouxe Pra reviver Essa vida Nos poemas Que escrevi. E É ASSIM Que permaneces, Em versos Bem desenhada, Hoje e sempre, Sempre aqui, A forma De conservar Esse tempo Que contigo Eu vivi.

“Palavras Deslaçadas”. Detalhe
NUVEM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Travessia”, JAS 2022, 93x118, impressão Giclée em papel de algodão e verniz Hahnemuehle (100% e 310gr), Artglass AR70, mold. de madeira. Original de minha autoria. Junho de 2024.

“Travessia”. JAS 2022. 06-2024
POEMA – “NUVEM”
EM SOMBRA Intangível Se diluía Esse corpo Desejado, Nuvem No céu da Fantasia, A que ele Mais queria Ver-se sempre Abraçado. VIA A silhueta Esfumar-se Lá no alto, Soprada Pelo vento, E desenhava Com palavras, Por entre Silêncios E murmúrios Sincopados, O que dela Lhe sobrara No seu Mais íntimo Recanto: A luz do seu Corpo, Seus olhos Negros Flamejados. AS PALAVRAS Atropelavam-se Para correr Atrás dela No céu Quente Da sua Fantasia Em pautas Para música De câmara Com a sua Melodia. INTIMIDADE, Era o que ele, Nessa ausência Sofrida, Nesse silêncio Fatal, Mais desejava E sentia, Como se fosse Carnal. “NÃO ACREDITAS Nisto, pois não?” Perguntava-lhe Em surdina, Com a alma. “Tanto de mim, Neste excesso De palavras Sobre ti, Como lava De vulcão A deslizar Num poema Pela encosta Íngreme Do teu corpo...” "LÁ NO ALTO, Posso olhar-te Sem te ver, Por fora, Mas por dentro, Com a alma, Ondes me cresces Em palavras Sem que saibas Que outras vidas Nascem Como fruto Do desejo Proibido E do tormento, Até que um dia Elas te cheguem, Assim, Inesperadas E levadas Pelo vento."

“Travessia”. Detalhe.
IDENTIDADE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: "Eu - Nos Tempos de Roma"
Original de Pedro de Almeida Santos
18 de Junho de 2024

“Eu – Nos Tempos de Roma”. Por Pedro de Almeida Santos. 18.06.2024
POEMA – “IDENTIDADE”
EU SOU QUEM SOU,
Dizia Jahvé,
Mas eu,
Que também sou,
Sou aquele
Que, afinal,
Ainda não sabe
Quem é.
OU SABE,
Ao ter sido,
Pois cada um
É o que é
Pelo que foi
E será,
Pela vida
Que fizer,
Do que da vida
Fará.
PARA ALÉM
Do que eu sou,
É para fazer
Que existo,
Pois o simples
Existir
Não chega
Pra definir
Da vida
O seu registo.
O QUE FOR
Ver-se-á
No caminho
Que escolher...
.............
Mas, vagando
Pela vida,
Serei só
O que fizer?
MAS QUEM SOU EU,
Afinal?
Sou somente
O que já fui
Ou continuo
O caminho,
Com os outros
Ou sozinho,
Como desejo
Constante
De me encontrar
Por aí,
Sempre livre,
Sempre errante
Desde que
De mim eu saí?
SOU POETA?
Sou pintor?
Vivo feliz
Na cidade?
Sou
Cidadão
Do meu mundo
Com incerta
Identidade?
NÃO SEI,
Como dizia
O poeta,
Mas se só for
O que fiz
Não existo
Como tal,
Não sou mais
Que cena nua,
Desenho
Feito a giz
Por pintor
De qualquer rua,
Filho de arte
Banal.
EU EXISTO,
Ou não existo,
Para além
Do que já faço
E do que outros
Vêem fazer?
Só existo
Em seu olhar?
Sou aquilo
Que pareço
E nada mais
Posso ser,
Nada mais
Posso criar?
A VIDA É MAIS
Do que aquilo
Que pareces
E se não fores
O que és
Nunca ela
Te dará
O que, afinal,
Não mereces...
OS OLHOS
Dos outros
Teus espelhos
Sempre serão,
Ajeitas-te
Para lá fora
Ver
O que, afinal,
Pode ser
Uma pura ilusão,
Pois quando
Regressas a ti
Quebra-se
Esse espelho
E regressa
A solidão.
EU QUERO SER
O que sou
E também o que
Pareço
Mas para ser
O que quero
Só a mim
Eu obedeço.
SER E PARECER
A uma só vez
Eis a minha
Solução,
Mas se o parecer
Me domina
É melhor que
Diga não.

O LOUREIRO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Luz”
Original de minha autoria
Junho de 2024

“Luz”. JAS. 06-2024
POEMA – “O LOUREIRO”
CRESCEU MUITO
O Loureiro,
Cresceu, cresceu,
É assim,
Cresce por dentro
E por fora,
E cresce
Dentro de mim.
AGORA TEM LUZ
Por dentro,
Vem lá do alto,
Do céu,
Ilumina o Jardim
Que, antes,
Era só meu.
UM GIGANTE
À minha frente,
Apontando
Para o céu,
Eleva-se,
É imponente,
No jardim
Que já é seu.
QUANDO TENHO
De o podar
Dói-me a alma...
..............
Mas tem de ser,
Da poda
Ninguém se salva
Pra com ela
Renascer.
ARBUSTOS
Flores
Ou frutos,
Tudo muda
No Jardim,
Tudo está
Em movimento
E também eu
Me sinto assim
Quando sopra
Forte
O vento.
SÓ UMA COISA
Não muda
Pra que tudo
Possa mudar,
Não muda
A minha vontade
Nem a forma
De o cantar.

“Luz”, Detalhe
O POETA E O SILÊNCIO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “A Melancolia do Poeta”
Original de minha autoria
Junho de 2024

“A Melancolia do Poeta”. JAS. 06-2024
POEMA – “O POETA E O SILÊNCIO”
TEM RAZÃO
O poeta que quer
Ser rei
Dos silêncios
E não ficar
Escravo
Das palavras
Que ela diz...
ESCUTAR
O silêncio
Da musa
É a missão
Do poeta,
O eco
Das palavras
Em surdina
Com que ele
O interpreta.
FÁCIL É TROCAR
As palavras,
Difícil é
Interpretar
Os silêncios
Em que a musa
Se instala
Sem saber
Se são recusa
Ou se são
A sua fala.
MAS ELE SOFRE,
Entre os silêncios
Expressos
E as palavras
Trocadas,
O acre sabor
Da pura
Melancolia,
O passado
Que passou
E que agora,
Com as palavras
Que tem,
Ele renova
E recria.
FOI NESSE
Intervalo
Entre as palavras
E os silêncios
Que um dia
Se abrigou
Quando por essas
Palavras
Trocadas
De afecto
Soçobrou.
MAS LEVANTOU-SE
Pra dos silêncios
Ser rei,
Recriando
O passado
Em poéticos
Rituais
Pra não ficar
Prisioneiro
De um tempo
Que não volta...
............
Nunca mais.
DOS SILÊNCIOS
Das suas musas
Ele é rei,
Ele é jogral,
Só ele
Os pode ouvir
Como ecos
Do seu canto
Nos dias
De ritual.
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AS BAGAS E O AZEVINHO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Bagas no Jardim”
Original de minha autoria
Junho de 2024

“Bagas no Jardim”. JAS. 06-2024
POEMA – “AS BAGAS E O AZEVINHO”
AO RAIAR
De um belo dia
Vi cinco rosas
Vermelhas
Num canto
Do meu jardim,
Mas também vi
Um azevinho
Sem bagas,
Pobrezinho,
Sem vermelho
Carmesim.
VI TAMBÉM
Esse loureiro
Que tenho
Lá no Jardim,
Arbusto muito
Frondoso
Com fortes
Raízes em mim.
VI A DEUSA
Desnudada
Por entre verde
Folhagem,
Vi as uvas
Da latada,
Marufo
E cardinal,
Vi cores,
Senti aromas
Nesse jardim
Matinal.
MAS NÃO TINHA
Bagas,
O azevinho,
Vermelhas,
Cor do meu sangue,
Estava ali
Tão sozinho,
Melancólico,
Exangue!
O LOUREIRO
Estava triste
Por não ter bagas
A fazer-lhe
Companhia
E por isso
Sugeriu-me
Que lhe fizesse
Um enxerto
Pra lhe dar cor,
Alegria.
ESTAVA TRISTE
Também eu
Por bagas
Que não havia,
Enxerto
Que não servia
Pra dar cor
Ao azevinho,
O rubor
Do carmesim...
................
Então,tornei-me
Pintor
Do que não tinha
O jardim.
PINTEI-O
Com mil bagas
Pra consolar
O poeta
Mas também
O seu loureiro...
................
Não as tinha,
O azevinho,
Passou a tê-las
O seu novo
Companheiro.
FEZ-SE PINTOR
O poeta
Para dar ao seu
Jardim
O que não tinha
Ou perdeu,
Pôs bagas
No azevinho
E o loureiro
Agradeceu.

IDENTIDADES
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Outra Janela".
Original de minha autoria.
Maio de 2024.

“A Outra Janela”. Jas. 05-2024
POEMA – “IDENTIDADES”
QUEM ÉS TU?
(Talvez um dia
Perguntes)
Eu sou aquele
Que canta
Pra ti,
Que te desenha
O perfil
Sem nunca
Te nomear,
Aquele que
Sempre
Te chama
Como quem gosta
De ouvir
O eco
Do seu cantar.
QUEM SOU EU?
(Insistirás...)
Ah, sou aquele
Que num dia
Inesperado
Te disse
Que era mais
Do que certeza
Gostar da tua
Beleza
Mas sem te
Comprometer
Porque o teu corpo
Não era
O que mais eu
Desejava
Vir algum dia
A ter.
MAS TU
(Agora,
Sou eu
Que pergunto),
Quem és tu,
Afinal?
Aquela que
Tem medo
De me olhar,
Que diz
Que não
Pode ser,
Que não me ousa
Dizer
Que tudo pode
Arriscar
Porque teme
As tempestades
Deste meu
Incerto mar?
MAS PORQUÊ
Estas perguntas
Que aludem
Ao que nunca
Aconteceu,
Tão longe
Que estamos
De ter
Caminho
Pra percorrer
Em busca
Do impossível
Ou do que nunca
Foi meu?
TALVEZ SEJA
Muito fácil
Responder
Se souberes
Que só tive
Uma razão
Pra te ter
Deste modo
Intangível
Que nunca
Ousaste
Entender...
..........
Porque parecia
Impossível...
UM POEMA,
Um canto
Em surdina,
Um arco-íris
Vertido
Numa bela
Aguarela,
Um modo
De te olhar
Sem sair
Do meu lugar...
.............
O de um poeta
À janela.

A FONTE E A NEVE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Pasárgada II”, JAS 2022. Museu da Guarda. * Impressão Giclée, 119x119, em papel de algodão e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70. Maio de 2024.

“Pasárgada II”. JAS 2022. 05-2024
POEMA – “A FONTE E A NEVE”
ERA MAIO E subia Lentamente A montanha A caminho Dessa fonte Seminal, Um rio De água pura E fria, Torrencial, Cristalina, A jorrar... .......... Uma dádiva Divina Pra fruir E ofertar. SUBITAMENTE, O céu Cobriu-se Dessa neblina Brilhante Que anuncia Neve Lá no alto Da Montanha. Pressentem-na Os que a têm Em si, Os que ela Sempre inspira E acompanha, Como eu, Que sempre Em mim a senti. ATRAÍDO Por um íman Invisível, Mudei de rumo E para o topo Subi, Tão grande E tão constante Era a sede Desse branco Sempre frio e Cintilante No seio do qual Eu cresci. SAUDOU-ME Lá em cima, Vinda Do alto do céu, Farrapos brancos Caíam, Feitos de fios De véu, Murmúrio Da natureza A insinuar De mansinho A sua discreta Beleza. DAVA-ME As boas-vindas E continuei, Feliz, A subir Até à densa Neblina Do céu E à esparsa Brancura, Esse véu Tecido com Leves farrapos De seda, Seda branca, Seda pura Que a natureza Me deu. E COMO GOSTEI De me ver Envolvido Nessa teia Que abraça Com neblina E frio, Com o branco Que cintila, Branco leve, Branco macio Que lembra Noites de sonho E me sabe A desafio... NADA MAIS Eu pude ver Que um palmo De alvura Mesmo ali A meus pés, Uma intensa Brancura Que anuncia O infinito Que está ali... ............ Mas não vês. INSPIREI FUNDO Esse branco E esse frio, Bebi da densa Neblina Que me envolvia Como abrigo E regressei À fonte Com neve Na alma E já com água No corpo Levei a montanha Comigo.

REVELAÇÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Penché Arabesque”.
Original de minha autoria.
Maio de 2024.

“Penché Arabesque”. JAS. 05-2024
POEMA – “REVELAÇÃO”
EM BREVE
Eu te direi
O nome cifrado
Dela,
O da musa
Que me inspira
E que um dia
Pintei
Numa bela
Aguarela...
NESSE DIA
Falarei
Dos cabelos
Negros
E fartos
Que lhe dançam
Com o vento
Que sempre
Me sopra
Na alma
E nos versos
Que desenho
Nos nossos
Dias de festa,
Quando a folia
Acalma.
PINTAREI
Seus olhos
Negros,
Janelas abertas
Da alma
Quando me fita
E me diz,
Com gravidade
E leveza,
Que o amor
É coisa séria,
Profundo
Como raiz
E de uma rara
Beleza.
HEI-DE DIZER-TE
Por que razão
Ela esconde
Suas pernas
Esguias
E sedutoras,
Leves
Como penas
De colibri,
Que lembram
Os Arabesques
Da bailarina
Elegante
Que gosta
De me dançar
As mazurkas
Do Chopin...
.............
E que sempre
Me sorri.
SIM, UM DIA
Falo-te dela,
Do véu
Translúcido
Que sempre
Lhe cobre
O corpo,
Me inspira
E desafia
Quando tento
Desenhá-la
Com as cores
Da nostalgia.
TUDO
Num só poema,
O véu
Com que finjo
Que não é ela,
A cubro
De transparências
Ao modo de
Botticelli,
Com palavras
Desenhadas
A pintar
A sua vida
Como se ela
Só fosse
Uma longa
Despedida...

MÃE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Mãe”. Original de minha autoria. 5 de Maio de 2024. Domingo, Dia da Mãe.

“Mãe”. JAS. o5-2024
POEMA – “MÃE”
GUARDO-TE Desde sempre Aqui, Na galeria Íntima Dos afectos. FIXEI-TE MELHOR Naquele dia E guardei Na memória Profunda O teu rosto Quando te vi Um pouco perdida, Por encanto, A olhar-me Como se fosse A primeira vez. UM BRILHO QUIETO Em teus olhos, Suspensa Nas nuvens, A suave paixão Maternal, Inefável, Que não há palavras Que cheguem Para a contar Com a alma, De tão cheia De mim estares, Quase A transbordar... A AUSÊNCIA Permanente, Tão cortante E insistente, O preço que Pagavas Para que eu Me tornasse No que mais Querias que fosse Fazia crescer Em ti O encantamento Que tinhas Contigo Desde o dia Em que te nasci E comigo Renasceste. AQUI SEMPRE A meu lado, Esse teu rosto Sedutor Nunca me Despertara O desejo De o cantar Em palavras, Em riscos E cores, Para além da Memória Remota Do afecto, Melodia Em surdina, Contraponto Do silêncio. PALAVRAS, SIM, Esse olhar Penetrante Da alma, Esse canto Devotado A tocar, Em cada dia Que passa, As fronteiras Intangíveis Do sagrado. FOI PRECISO Aprender Os delicados Ofícios Da arte Para te poder Celebrar E dizer De todas as formas Que sei O que não quero Calar. E AQUI ESTOU. Esse dia Haveria de Chegar. E chegou.

DIA MUNDIAL DA DANÇA
"J'ARRIVE MADEMOISELLE...", JAS 2024
Pintura by João de Almeida Santos

“J’Arrive, Mademoiselle…”, JAS 2024
LIBERDADE
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Liberdade” Originais de minha autoria Abril de 2024

“Liberdade”. JAS. 04-2024
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE, Num dia De sol: “Voas comigo Prà linha Do horizonte?". Deste-me a mão E sorriste: “Voo, sim, Pois preciso De ar puro Lá bem no alto Do Monte”. E PARTIMOS. Tu levaste O arco-íris Que tinhas Dentro de ti E eu as letras Que tinha Comigo, Guardadas Na minha alma, O seu porto De abrigo. ENREDÁMOS Todas as cores Com linhas De palavras Deslaçadas, Construímos Asas em forma De verso E voámos No céu De um poema Pintado todo De azul... ANDEI CONTIGO Por lá Anos a fio, Vagueando Ao sabor da Inspiração, Levados Pela brisa Que sopra fria No Monte, Mas afaga O coração. E COMO GOSTEI De voar contigo, Livres como Pássaros Sobre o vale Onde te encontrei Um dia Construindo Castelos Na areia Com a força Da magia. É ASSIM QUE EU Te vejo, Tecendo a vida Com o sopro Da tua alma E as cores Do arco-íris Pintadas Por tua mão Como pauta Colorida Da nossa bela Canção. FOI ASSIM Que nos dissemos Nesse tempo, Livres de amarras Que não nos deixam Voar, Traçando Com arte Um destino Marcado Pela vontade De fazer Da nossa vida Caminho Da liberdade.

“Liberdade”. JAS 2024. Detalhe da Pintura “Liberdade”
LIBERDADE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Pássaro de Fogo”
Original de minha autoria
25 de Abril de 2024

“Pássaro de Fogo”. JAS. 04-2024
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE,
Num dia
De sol:
“Voas comigo
Prà linha
Do horizonte?".
Deste-me a mão
E sorriste:
“Voo, sim,
Pois preciso
De ar puro
Lá bem no alto
Do Monte”.
E PARTIMOS.
Tu levaste
O arco-íris
Que tinhas
Dentro de ti
E eu as letras
Que tinha
Comigo,
Guardadas
Na minha alma,
O seu porto
De abrigo.
ENREDÁMOS
Todas as cores
Com linhas
De palavras
Deslaçadas,
Construímos
Asas em forma
De verso
E voámos
No céu
De um poema
Pintado todo
De azul...
ANDEI CONTIGO
Por lá
Anos a fio,
Vagueando
Ao sabor da
Inspiração,
Levados
Pela brisa
Que sopra fria
No Monte,
Mas afaga
O coração.
E COMO GOSTEI
De voar contigo,
Livres como
Pássaros
Sobre o vale
Onde te encontrei
Um dia
Construindo
Castelos
Na areia
Com a força
Da magia.
É ASSIM QUE EU
Te vejo,
Tecendo a vida
Com o sopro
Da tua alma
E as cores
Do arco-íris
Pintadas
Por tua mão
Como pauta
Colorida
Da nossa bela
Canção.
FOI ASSIM
Que nos dissemos
Nesse tempo,
Livres de amarras
Que não nos deixam
Voar,
Traçando
Com arte
Um destino
Marcado
Pela vontade
De fazer
Da nossa vida
Caminho
Da liberdade.

“Liberdade”. JAS 2024. Detalhe da Pintura “Liberdade”
UM SONHO NA ALDEIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Rua da Carreira", 2022.
Original de minha autoria.
Abril de 2024.

“Rua da Carreira”. JAS 2022. Pintura digital, 68×70 (c/mold). Impressão Giclée em papel de algodão (100% I 310gr) e verniz Hahnemuehle. Arglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “UM SONHO NA ALDEIA
"SONHEI-TE,
Esta noite,
Numa rua
Da minha aldeia...
..............
Não sei porquê
(É assim que
Os sonhos são),
Caminhámos
Paralelos
Sem dizer
Uma palavra,
Sem um olhar
De través,
Estranhos
Em solidão.
DUAS VEZES,
Duas vezes
Lá estive,
A sentir
O que sentia
Na rua
Da minha aldeia,
Nesse tempo
Diferido
Dos encontros
Intangíveis.
MAS VI-TE
Com nitidez
(Um pouco baça,
É certo)
No silêncio
Do meu sonho,
Cintilante
Como a neve,
A recordar
Tempo antigo
Quando ela,
Muito leve,
Vinha ter
Sempre comigo.
FOI NA RUA
Da Carreira
(A rua
Chama-se assim)
Em frente
Da minha casa,
Onde me vejo
Passar
Quando as saudades
Apertam
E eu tenho
De voltar.
SE A VIDA
É um sonho,
Como dizia
O poeta,
Também os sonhos
São vida,
Pois eu vi que,
Embalada,
E já um pouco
Perdida
Nesse teu
Caminhar
Ondulante,
Me sentiste,
Neste encontro,
Como sonhador
E amante.
E AQUI
Estou eu
A sonhar-te
Outra vez,
Com palavras
Que componho,
Porque te vi
Nesse sonho...
..........
Na rua da
Minha aldeia.
É SEMPRE ASSIM,
Quanto mais tu
Te esfumas
Mais cresce
Este desejo
De ti.
É por isso
Que te sonho,
Pra desenhar
O teu rosto
Como no sonho
Te vi.
E DE TANTO
Te sonhar
Acabei por
Te encontrar
Na terra
Onde nasci,
Na rua
Onde brinquei,
Onde a neve
Derretia
Quando o sol
Lá despontava
E logo a saudade
Irrompia.
AGORA A NEVE
És tu,
Alvura
Que recriei
Para nunca
Eu perder
O que de ti
Me sobrou,
Como a neve
Da minha rua
Que não há sol
Que a derreta
Na penumbra
Da memória
Que, em parte,
É também tua,
Embora seja
Secreta.

A PORTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Montanha”. Original de minha autoria. Abril de 2024.

“A Montanha”. JAS. 04-2024
POEMA – “A PORTA”
OLHO A MONTANHA De uma porta De granito Amarelo, Com cristais (O de sempre, Muito belo), Como se fosse A janela Desse palácio Encantado Que do sonho É o cais. É A MONTANHA De sempre, A que vejo Da minha porta, Mas é muito Diferente O perfil Desta visão: Antes, era Futuro que via, Agora, vejo O passado, Essa bela Ilusão De a ter tido A meu lado. ENTRE PASSADO E futuro Era a minha Identidade, Ficou quieta, À espera, Quando dela Eu saí Pra descobrir A cidade. SEU HORIZONTE É o céu, Abóbada Sideral Na fronteira Da montanha, Sinto-a Dentro de mim Como fonte Seminal Que sempre Me acompanha. ELA É PORTO De abrigo E é lugar de Partida, É, pois, mais Do que porta Ou mesmo Do que janela, É fronteira Que passamos Quando a vida Em nós desponta, Quando a vida Se revela. MAS HÁ Eterno retorno, Há regresso Renovado Para, assim, Renascer, Revisitar O passado, O que não Quero esquecer. ESTA PORTA É magia, Viajo sempre Com ela, Dá asas À fantasia E dá-me um Forte alento Como se fosse Janela De onde voo Com o vento. DELA VOEI Para o mundo E o mundo veio Até ela, Quando passei Esta porta Também desci Da janela. POR ISSO REGRESSO A ela, Esse pilar Do meu ser Que da alma É janela De onde me posso Rever. QUANDO CHEGO, Logo amanhece, Quando parto, Já entardece, Mas não sinto A despedida Porque dela Vejo o mundo Como a montanha Da vida.

“A Montanha”. Detalhe
AS PALAVRAS NO JARDIM
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Jardim”.
Original de minha autoria.
Abril de 2024.

“O Jardim”. JAS. 04-2024
POEMA: "AS PALAVRAS NO JARDIM"
ENCONTREI-AS,
As palavras,
No jardim
Da minha vida,
Aninhadas
No arbusto
Num quente
Dia de verão...
...........
Esperavam,
As palavras,
Por poética
Evasão?
NÃO PENSAVA
Encontrá-las
Nesse lugar
Encantado,
Onde o sol chega
Coado
Pela ramagem
Do arbusto
Em suave
Travessia,
Como esse filtro
Do tempo
Que me esculpe
A memória,
Mas acende
A fantasia.
FORAM TAMBÉM
As palavras
Coadas
Pelo tempo
Que passou
Ou pela densa
Folhagem
Do arbusto
Que por estranha
Magia
Nesse verão
Me fascinou?
EU NÃO SEI,
Mas o que sei
É que elas
Se encontravam
Nesse loureiro
Encantado
Pra serem
Lançadas
Ao vento
De regresso
Ao passado.
ERA A CASA
Onde as palavras
Viviam,
Suspensas,
Em solidão,
Aguardando
A chegada
De quem lhes
Marcasse
O destino
E as levasse
Pela mão...
PODIA SER
Um poeta
Ou então ser
Um pintor,
Pintá-las
Como oferta
Ou cantá-las
Por amor.

UM SONHO NO POEMA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Sonho”. Original de minha autoria. Março de 2024.

“Sonho”. JAS. 03-2024
POEMA – “UM SONHO NO POEMA”
HOJE SONHEI-TE A noite toda. Tenho a certeza. Sonhei, Não dormi E foi só Pra te sonhar Que eu logo Adormeci. E FOI ASSIM Que te encontrei, Fora do tempo E nesse lugar Onde nunca Imaginei Que te podia Encontrar. FALASTE-ME De coisas íntimas, Em onírica confissão, Daquelas que Me fazem Estremecer Quando Te sonho Para te ver E te escrevo Ou te desenho Para te ter... .......... Em piedosa Ilusão. COISAS TUAS, As que guardas Nessa íntima Prisão Pra que desejos Não se soltem E te levem A infausta Perdição. MAS FALASTE-ME Com o corpo Colado Ao meu desejo De ti E eu senti O teu calor E um aroma Fatal Que me sabia A perfume De amor... .......... Já em fase Terminal. MAS CONTINUEI A sonhar-te, De manhã, Todo o dia, Até agora que, No poema, Já é noite Bem tardia... ....... Do dia De amanhã. E ACORDEI (No sonho) E continuei A sonhar-te De tão intenso E longo O sonho ser, A sentir-te Para nunca mais Te perder Até renasceres Em mim, No sonho E fora dele, Quando se torna Poema Pra melhor Te reviver... ...... Assim. SIM, “SONHEI Ter sonhado...”, Disse o poeta
À musa. "Ter sonhado, O quê?” Perguntou-lhe ela. “Que havia sonhado Estar com você.” “Estar?”, Respondeu-lhe a musa, Sorrindo. “Ter estado, Que é tempo passado.” “Mas o sonho Não tem tempo, Manel, Porque é tempo Recriado”, Disse-lhe a musa Que, no sonho, Esteve sempre A seu lado.

TALVEZ
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Arbusto Encantado”. Original de minha autoria. Março de 2024.

“O Arbusto Encantado”. JAS. 03-2024
POEMA – “TALVEZ”
TALVEZ SEJA Dos meus olhos, Talvez seja, Ou, então, seja Dos teus, Talvez seja Porque sonho Ou seja benção de Deus. TALVEZ SEJA Do aroma De flor Do meu jardim, Não sei bem O que será, O que sei (Ah, isso sei) É que há muito É assim. TALVEZ SEJA Da água Do nosso rio Quando o navego Por dentro Ou da beleza do Vale Na montanha Onde nasci, Talvez seja Do destino, Desse dia Em que te vi. TALVEZ SEJA Porque vivo Em frente De um loureiro, Lá em baixo, No jardim, Ele que fala E seduz Quando olha Para mim... ................ Mas, se não for, Não importa Porque à noite Te pressinto No perfume Do jasmim. TALVEZ SEJA De o perfume Inebriar Como o teu E, se for, Vou-te sonhar Nesse jardim Que é meu, Festa De aromas E cor A celebrar O encontro... ............. Simplesmente Por amor, Uma dádiva Do céu.

SILÊNCIO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Som do Silêncio”, JAS 2023,72x82, em papel de algodão (100%-310gr) e verniz Hahnemuehle; Artglass AR70, em moldura de madeira. Poema e Pintura em exposição no Museu da Guarda até 07.04. Março de 2024.

“O Som do Silêncio”. JAS 2023, 72×82, em papel de algodão (100%-310gr) e verniz Hahnemuehle; Artglass AR70, em moldura de madeira.
POEMA – “SILÊNCIO”
OUÇO A VOZ Do silêncio Que me cerca, Adentro-me Na multidão E ele cresce Por dentro, Na alma Me cresce E, quase, quase, Como grito Sufocado... ....................... Me ensurdece. AH, É DEMAIS, Este silêncio, Esta voz inaudível Caustica-me A pele macia Da memória Dos afectos, Uma moinha Na alma, Silvo De vento Cortante Nas janelas Destroçadas Da emoção. E EU FUJO Para o ermo, Lá em cima, Na montanha, À procura Da solidão de Eremita Em busca Da melodia Do nome Silenciado, Aquele que nunca Ousaste Pronunciar, Palavra em degredo, Nome castigado Que só o poema Pode resgatar. LÁ NO ALTO (É sempre assim), Ouço uma harpa Dedilhada Por ti, Notas musicais Que me fazem Estremecer E vejo riscos Coloridos Esvoaçando No teu azul De Lisboa Em direcção Ao infinito... VEJO-TE SAIR Da neblina Cintilante Do rio Que te veste A alma E sacio-me de Palavras Soltas, Em turbilhão, Até que a inspiração Chegue E as componha Num poema De redenção Que te cante E que te conte Às nuvens E ao vento Que passa... NOMEIO-TE E sussurro Uma pequena Palavra Que nunca ousei Pronunciar, Mas que ouviste Ressoar-te Na alma Mil vezes, Em mil poemas Sufocados. O SILÊNCIO É a tua fala (Bem sei), Mas eu não sairei Deste poema E do ermo reparador Até que me ouças E soletres Finalmente Esse nome Com as cores Da tua fantasia, As cores vivas Da emoção. FICO PRISIONEIRO De um poema Em construção Até ao resgate Desse nome Perdido E silenciado Na ilha remota Da tua memória, Âncora firme Da minha própria Salvação.

MARÇO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Neve e a Primavera”.
JAS 2022, 68x93, em papel de algodão
(100% - 310gr) e verniz Hahnemuehle.
Artglass AR70, em moldura de madeira.
Poema e Pintura em exposição no Museu
da Guarda até 7 de Abril. Março de 2024.

“A Neve e a Primavera”, JAS 2022, 68×93, em papel de algodão (100% – 310gr) e verniz Hahnemuehle. Artglass AR70, em moldura de madeira.
“POEMA – “MARÇO”
GOSTO DE MARÇO,
Entre a neve
E a primavera,
Entre o branco
E as flores,
A chegada
De Perséfone,
O mistério
Que me atrai
Nessa fronteira
Do tempo
Que ainda não
Passou.
GOSTO
Do Botticelli
Dos rostos
E dos corpos
Das três
Graças,
Feminis,
Volúpia de
Transparências,
Sensuais,
Primaveris.
GOSTO DO BRANCO
Da magnólia,
Dos seus farrapos,
E do branco frio
Da montanha,
Gosto
Dessa cor que
Que brilha
Nos meus olhos
E que sempre
Me acompanha.
GOSTO DE MARÇO
(Porque gosto),
Entrei nele
Contigo,
No signo do
Desencontro
Que se repete
Neste silêncio
Fatal,
Marcado
Contraponto
Desse tempo
Do meu canto,
Um “triste
Destino”
Que quase
Parece irreal.
PARA TI COLHIA,
Em Março,
Flores luminosas
E a inspiração
Crescia
Em estrofes
Desenhadas
Com a força
Da magia,
Fingindo sentir
O que dizer
Não podia,
Fosse só
Por duas horas
Ou fosse
Por todo um dia.
NO SIGNO
Do desencontro
Marcado como selo
Lá vou eu
Mais uma vez
Por aí,
Nem sei porquê,
Ou por falta de ti,
De braço dado
Com Botticelli,
Lá em cima,
Na Galleria,
Oráculo de arte
E templo
Da fantasia.
SINTO-TE PERTO,
Ah, eu sinto,
Depuro
A tua imagem
Em bissetriz
De mil rostos
Até se tornar
Ideia
De corpo ausente,
Dialéctica
Animada
De opostos.
DEPOIS REINVENTO-A
A cada instante,
Abraço-a
Com alma
De amante,
Pinto com
Palavras
O seu perfil
Ideal
E fixo-a
De novo
Neste meu
Jardim
De jogral.
AO ACORDAR,
No amanhecer
De cada poema
Verei que continuas
Em mim,
De olhos fechados
(Lembras-te?),
Como se fosses
Sonho do que
Nunca aconteceu
Naqueles dias
Passados.
ANDAREI
Por aí
(Os astros
O dirão),
Vagando
E pousando
O olhar
No pólen
Da beleza
Sensível
À procura
De seiva fresca
Para desenhar
Poemas
E dar vida
Ao impossível.
LÁ NO ALTO
Te encontrarei,
Imitação
Dos dias
Da criação,
A construir
Infinito,
Onde, num adeus
Já sem fronteiras
Nem cais
De partida,
Hás-de desenhar
Com a alma
As mil silhuetas
Ainda inacabadas...
..............
Ou talvez não!
MEU DEUS,
Como gosto de ti,
Em Março,
O mês da floração,
Quando a magia
Renasce
Para renovar
A vida
Com a força da
Paixão.

OCASO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Rasto de Luz” - JAS 2023 (83x83), papel de algodão e verniz Hahnemuehle (100% - 310gr), Artglass AR70, em mold. de madeira. Quadro e Poema (acrescido de dois
versos na última estrofe) que
integram a Exposição “Luz no Vale”, aberta ao público no Museu da Guarda até ao dia 7 de Abril.

“Rasto de Luz”. JAS 2023 (83×83), papel de algodão e verniz Hahnemuehle (100% – 310gr), Artglass AR70, em mold. de madeira.
POEMA – “OCASO”
CAMINHAVA SÓ No Paredão E sentei-me, À tardinha, A olhar A solidão, O oceano E o sol Lá ao fundo A brilhar Sobre a linha Do horizonte, Em tempo de Baixa-mar. O SOL CRIARA Um caminho De luz, Mar afora, A entrar Pelos olhos Dentro Nessa já Tardia hora. E CONVIDAVA-ME A segui-lo Com o olhar Em gesto De despedida, Era hora De sol-posto, Era hora De partida. A LUZ INTENSA Do sol, Longo rasto Luminoso, Incendiava O olhar De tão forte Ser a luz A refractar-se No mar. FIXEI Esse caminho E ouvi Da sua água Um suave Marulhar, Murmúrio Terno Das ondas, Melodia Luminosa Criada Pra embalar. ERGUI DE NOVO O olhar Para o sol Que s’esvaía, Respirei E voltei A respirar Uma intensa Maresia. RUA DE LUZ Marinha A levar-me Ao horizonte Por círculo De fogo Aceso Em urgente Despedida, Ocaso Que anuncia Noites Passadas De sonho, Estranhas Formas De vida. ASSIM ME PARECE Ter sido A história breve Que contigo Eu vivi, A mesma faixa De luz, O mesmo círculo De fogo Que o horizonte Engoliu, O serpenteio De corpos No luminoso Caminho Que a ti Me conduziu... ATÉ QUE O SOL Se pôs Pra regressar De manhã, Metáfora Luminosa Do nosso encontro Fugaz Já tão perdido No tempo, Esse tempo Tão voraz. E O SOL Lá regressou, Mas vinha De outro lado, Sem suave Marulhar, Sem ondas Pra navegar Nesse brilho Ondulante Que um dia Me encantou A lembrar-me O teu mar, Esse ondear Cativante
De quem não sei
Se me amou.

TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “La Peccatrice”, JAS 2023. Este poema integra um conjunto de sete que estão expostos, ao lado das pinturas que os ilustram, nas paredes das salas do Museu da Guarda que acolhem a minha Exposição individual “Luz no Vale”, de 51 pinturas, que está acessível ao público até 7 de Abril. Esta associação entre pinturas e poemas pretende ilustrar o processo sinestésico que adopto no meu trabalho criativo. Fevereiro de 2024.

“La Peccatrice”, 2023. JAS. 02-2024
POEMA – “TEMPO”
QUE FARIA Se te encontrasse, Olhos nos olhos, Numa margem Deserta Do nosso passado? QUE TE DIRIA Se te visse Caminhar, Airosa, Mas circunspecta, Ali mesmo A meu lado, Com esse rosto Tão belo, Tão brilhante, Acetinado? NÃO SEI, Porque não sei O que o tempo Fez de nós, Se petrificou Nas encostas Da memória A tua tão bela Imagem, Ficando Ainda mais sós Nesta já longa Viagem. TALVEZ ENCONTRO Impossível, Porque o tempo Transbordou E apagou As margens Do rio que Navegámos Entre escolhos Perigosos, Rápidos Sempre Imprevistos E como tu Revoltosos. MAS O RIO Já não tem água Nem murmúrios De corpos Por ela abaixo A vagar Até à foz Quente do mar, Melodia Do desejo A clamar Por um simples Lampejo Pra iluminar A viagem. E SE UMA FOZ Encontrasse Seria de um rio De palavras Em turbilhão A entrar Nesse teu mar Com a força Da paixão. MAS O NOSSO Já é um barco Fantasma Sem foz À vista E sem mar, Sem leito Pra navegar, Sem água Nem margens Para onde Transbordar. POR ISSO, Se te encontrasse Numa margem Deserta Desse tempo Já perdido Ou num porto De abrigo Do passado Que persigo Talvez eu Estremecesse, Mas seguiria Caminho, Com palavras E com contigo, Mesmo que fosse Sozinho.

A JANELA
ILUSTRAÇÃO: "A JANELA", 2022
Original de minha autoria.
O poema de hoje integra um
conjunto de sete poemas que
estão expostos ao lado das
pinturas que os ilustram, nas
paredes das quatro salas do
Museu da Guarda que acolhem
a minha Exposição individual
“Luz no Vale”, de 51 pinturas,
e que estará acessível ao público
entre 08.02 e 07.04.2024. Esta
associação entre sete pinturas
e sete poemas pretende ilustrar
o processo sinestésico que adopto
no meu trabalho criativo.
Desejo-lhe um excelente domingo
e deixo-lhe aqui o convite
para que visite a Exposição.

“A Janela”, 2022. JAS. 02-2024
POEMA - "A JANELA"
NOS VIDROS
Desta janela
Se espelha
Todo o meu ser,
É neles que
Eu te revejo
Quando deixo
De te ver.
DA JANELA
Vejo o mundo
E o mundo
Vê a janela,
Debruçada
No parapeito
Olho o céu
E olho a rua
Para ver
Se passas nela.
NOS VIDROS
Desta janela
Há reflexos
Da vida,
Olho pra eles
Pensativa
Mas não me sinto
Perdida
Se puder
Falar contigo
Quando estás
De partida.
NESTES VIDROS
Da janela
Se espelha
Todo o teu ser
Quando passas
Nesta rua
E me sinto
Estremecer
Da falta que tu
Me fazes
Por ainda
Não te ter.
SE TE AFASTAS
Da janela
E vislumbro
Silhueta
Lá ao fundo,
Longe dela,
Eu sofro
Por te perder...
......
Na rua
E também nela.
VOA PRA LONGE
Essa tua
Silhueta
Que s’esgueira
Na esquina
Como se fosse
Cometa
A passar
Na minha rua,
Mas também eu
Me diluo
E me sinto
Um pouco nua
Na imagem
Transparente
Dos vidros
Desta janela
Como se fosse
Já tua.
FOSTE EMBORA
Do meu mundo
Onde eu
Te queria ter
Ao alcance
De um olhar
Para nunca
Te perder.
MAS NÃO DEIXEI
A janela,
Esperei sempre
Por ti,
Hora a hora,
Dia a dia,
Até que, por fim,
Eu te vi.
VI-TE
Da minha janela,
Desenhei-te
Com alma
E olhar
De devoção,
Pintei-te todo
A vermelho
Da cor da minha
Paixão...
................
Mas mesmo assim
Tu partiste
Sem me dar
A tua mão.
DA JANELA
Sempre te vejo
Mesmo ausente
Da nossa rua,
Nos vidros
Fica imagem,
Perfeita
Como a tua,
Mas é sempre
Transparente
E não lhe posso
Tocar,
Guardo-a, então,
Com ternura
Em meu inocente
Olhar.
E GOSTO
Da Primavera,
Confundir-te
Com aromas
Que me chegam
À janela,
Anunciando
A chegada
Do melhor
Que sinto nela.
A JANELA
Não tem cortinas
Pra te ver
Na nossa rua,
Ver-te chegar
E partir,
Ficando um pouco
Mais nua,
Querer que
Me vejas
Assim
Tão brilhante
Como a Lua.
AH, QUANTAS VEZES
Eu desci
Da janela
Para a rua,
Olhava de baixo
Pra cima,
Mas eu nela
Não me via
E, assim,
Não era tua.
O MEU MUNDO
É a janela,
O da rua
É o teu,
É dela que
Eu te revejo,
Na rua
Já não sou eu.
DA JANELA
Do meu mundo
Olho pra ti
Com calor,
Sem ela
Eu não te sinto,
Fica um muro,
Meu amor.

“CHÃO”
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Luz na Montanha”, 2021.
Original de minha autoria.
O Poema de hoje integra um conjunto
de sete que estarão expostos, ao
lado das pinturas que os ilustram,
nas paredes das quatro salas do
Museu da Guarda que acolherão a
minha Exposição individual “Luz no
Vale”, com 51 pinturas, que estará
acessível ao público entre 08.02,
(dia da inauguração às 18:00), e
07.04.2024. Esta associação entre
sete pinturas e sete poemas pretende
ilustrar o processo sinestésico
que adopto no meu trabalho criativo.
Desejo-lhe um excelente domingo
e deixo-lhe aqui o convite para
que se associe a nós no dia da
inauguração da Exposição. 02.2024

“Luz na Montanha”. JAS, 2021. 02-2024
POEMA – “CHÃO”
DESCESTE,
Não sei bem
De onde.
Cravaste raízes
Profundas
Neste meu
Sagrado chão.
AO LONGE,
Lá na montanha,
Surge, do nada,
Incandescente,
Um clarão.
São os meus olhos
Que te iluminam...
...............
Ou talvez não.
NUNCA VI
Chover do céu
Tanta luz...
..........
E no chão
Que sempre piso
Tão delicada raiz
Que cresce
Dentro de mim
E, suave,
Me conduz
Como quando
Me sorris.
ESTA LUZ
Que lá do alto
Ilumina
É magia,
É milagre,
É fogo
Que me fascina
Neste meu
Entardecer...
............
Faz-me voar
Para ti
Apenas para
Te ver.
MAS NAS RAÍZES
Que crescem
Por dentro
E por fora
Como rendilhado
Neste meu chão
Seminal
Fica presa
A minha alma
Como se fosse
Prisão...
..................
Por pecado capital.
ELEVA-SE NELAS
A geometria
Perfeita de um
Monólito
Sideral
Para te invocar
Em ritual
De montanha
Onde possas
Renascer
Como a divindade
Da chama.
A MAGIA
Deste chão,
Despertada pela luz
Que vem lá
De cima,
Do alto,
Devolve-me
A liberdade,
Acende-me a fantasia,
Põe-me a alma
Em sobressalto
E o corpo
Em euforia...
ENTÃO, CANTO
Então, danço
Neste chão
Que é só meu,
Dou asas
À fantasia
E a fronteira é o céu.

ESCULPIR-TE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Aurífice”, 2022. Pintura e Poema de minha autoria. Ambos integram a Exposição de Pintura e Poesia, “Luz no Vale”, cuja inauguração ocorrerá a 8 de Fevereiro, às 18:00, no Museu da Guarda. Janeiro de 2024.

“O Aurífice”. JAS. 2022
POEMA: “ESCULPIR-TE”
ENTRE O BRANCO E O NEGRO Quis esculpir-te A alma Na flor que, Num acaso, Encontrei Perdida No jardim Da minha vida... ATRÁS DE TI, Ou em fuga (Já nem sei), Gastara Todas as cores do Arco-íris Que tinha Guardado Dentro de mim. SOBRARA Uma marmórea Pedra negra, Espelho oracular Onde me via Escuro na alma Por falta De cores Exuberantes Que me protegessem Do frio glacial Da tua ausência, Suportada Nas longas Intermitências E contrapontos De uma melodia Inacabada. SOPREI FORTE Com a alma Desnuda E a flor Pousou suavemente Na pedra lisa E brilhante Da catedral, Do oráculo Vestal Onde te queria Celebrar Como amante. ESCULPI-TE Como filigrana De ouro preto Sobre branco-pérola, Aurífice da tua Alma sedutora No coração Alvoraçado Dessa flor Onde guardei O teu nome Gravado em letras Invisíveis. DESENHEI Alvas incrustações Em filigrana Como marcas Indeléveis Da arte Que um dia Me visitou Para celebrar A beleza Do teu rosto. E, AGORA, A olhar para O branco e o negro Desse cântico Desenhado E esculpido, Ofereço-te Este poema Sobre pintura Imaculada Onde te celebro Com arte Minimal, Na forma E na cor, Sem fronteiras, E onde Te reinvento Em fuga: Um elegante Fio branco Que esvoaça, Livre, No marmóreo céu Do teu altar. A ÂNCORA, A sul, Desliza Suavemente Sobre ti E dilui-se, Como eu, Na negra Vastidão... EVOCO-TE, ASSIM, A branco e negro Sobre a flor Que um dia Encontrei Perdida No meu Jardim Encantado Quando visitava O impossível... ............... À tua procura.

ONDAS REVOLTAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Thálassa”, 2024. Original de minha autoria para este Poema. Janeiro de 2024.

“Thálassa”. JAS. 01-2024
POEMA – “ONDAS REVOLTAS”
ONDAS REVOLTAS Embatem Com harmónico Estrondo Nos rochedos Esculpidos Da praia Da meia-lua. DO ALTO DA TOSCA Escadaria Fixo o horizonte E vejo-me A surfar As ondas Desse teu mar, Em fuga E sem destino Marcado... .............. Simplesmente, A vagar. SINTO NA PELE A espuma branca Que se dispersa Em mil gotículas Sobre a areia fina Da praia, Alvura Cintilante Que me encandeia E me põe À deriva Nas águas Mornas Do mar. DEPOIS SINTO Um leve E curto Marulhar, Sinto paz, Uma melodia Na alma, Azul Que se desprende De ti, Me pinta todo Por dentro E me convida A cantar. REGRESSAM De novo, Tonitruantes, As ondas E esta fúria Impetuosa Do mar Tempera-me A vontade De contigo Navegar. MAS SINTO-ME Frágil Na praia Da meia-lua, A força Cadenciada Das ondas Atrai-me como O canto Das sereias E eu sinto-me Levitar. DE NOVO Ondas brancas, Fervilhando Contra rochas, Esculpindo, Maresia, Gotículas Que pairam No ar E me refrescam A alma, Morrinha Difusa Que me rega A pele já Tão seca de ti... ............. E me ajuda a Renascer. E EU, Sentado ali, A meditar Sobre ti, A ouvir o canto Da Milva Sobre o mar, Thálassa... Thálassa, E com ela Ensaiando Um tímido Trautear... PARÃ... PARÃ... PARÃ... ............. Neste teu mar O barco invisível Do tempo Ali mesmo A flutuar E o meu destino É azul E as ondas Batem nas rochas Sem parar E eu, Já seduzido Pelo som Encantatório, Sinto o meu corpo A tremer, Mas sinto a alma A vagar... ...................... Na praia da meia-lua.

POEMA PARA UM ROSTO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Fascínio”, 2023. Original de minha autoria,
brevemente em exposição
no Museu da Guarda. Janeiro de 2024.

“Fascínio”, 2023. JAS, pintura digital, 68×88, impressão Giclée em papel de algodão (e verniz) Hahnemuehle (310gr), Artglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “POEMA PARA UM ROSTO”
AH, ESSES TEUS OLHOS Exortam-me, Mas não ouço palavras, Não ouço sons E até pressinto Um impulso hesitante, Um leve espanto contido Que te suspende E mantém Nesse impasse Tão sofrido. DOCE MISTÉRIO, Sinais intensos, Os teus, Que falam Sem te dizer E capturam
O olhar Até, por fim, Me perder. ESSE TEU ROSTO Intenso, Esses olhos Fascinantes Perturbam, Têm um estranho Poder Porque invocam Nome incerto, O chamam Sem o dizer. SE TE OLHO, Tu seduzes E eu fico
Expectante, Suspenso Entre o calor Do desejo E o frio Do impossível, No limiar Deste meu lado Tão frágil, Deste lado Tão sensível. QUERES FALAR, Mas dos lábios Sai silêncio, Talvez suspiro Ou um leve Balbucio, Receias denunciar O que não tens Pra dizer Em contido desafio. CALASTE Com medo De perder O que nunca Agarraste Com as mãos Puras Do desejo... TEUS LÁBIOS Sussurram, Desenham palavras Sem som E suspendem O encontro Adiado, Como esse beijo Que não ousaste Inventar Com as cores Da tua alma, Esse beijo Sufocado. NOS TEUS CABELOS Enovela-se-me A alma, No teu mistério Caio tão fundo Que já nem posso Esbracejar, Agarrar-me Às paredes macias Do desejo, Por elas acima Trepar À procura Do que nunca Chegará, Forte que seja O ensejo.
ESSE MISTÉRIO
E esse sedutor
Olhar Onde afundo As raízes Da alma Consomem-me A energia Para, em sonho, Eu contigo Navegar. VEJO-TE Fixar o vazio, Mais além Do horizonte, Melancolia Em estado puro, Valsa lenta Dentro de ti, Que balbucias A vida, Incapaz De a gritar Aos que não Querem ouvir A palavra Proibida. AH, SIM, Mas eu gosto Dessa tua solidão E viajo contigo Até ao lado mais Esconso Da tua alma Para depois o pintar Com todas As palavras Que tiver comigo, Até que um dia Me abandonem, Exaustas de tanto Clamarem Por ti, Cansadas de tão Inútil castigo.


“Fascínio”, 2023. JAS, pintura digital, 68×88, impressão Giclée em papel de algodão (e verniz) Hahnemuehle (310gr), Artglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “POEMA PARA UM ROSTO”
AH, ESSES TEUS OLHOS
Exortam-me,
Mas não ouço palavras,
Não ouço sons
E pressinto
Um impulso hesitante,
Um leve espanto contido
Que te suspende
E mantém
Nesse impasse
Tão sofrido.
DOCE MISTÉRIO,
Sinais intensos,
Os teus,
Que falam
Sem te dizer
E capturam o olhar
Até, por fim,
Me perder.
ESSE TEU ROSTO
Intenso,
Esses olhos
Fascinantes
Perturbam,
Têm um estranho
Poder
Porque invocam
Nome incerto,
O chamam
Sem o dizer.
SE TE OLHO,
Tu seduzes
E eu fico expectante,
Suspenso
Entre o calor
Do desejo
E o frio
Do impossível,
No limiar
Deste meu lado
Tão frágil,
Deste lado
Tão sensível.
QUERES FALAR,
Mas dos lábios
Sai silêncio,
Talvez suspiro
Ou um leve
Balbucio,
Receias denunciar
O que não tens
Pra dizer
Em contido desafio.
CALASTE
Com medo
De perder
O que nunca
Agarraste
Com as mãos
Puras
Do desejo...
TEUS LÁBIOS
Sussurram,
Desenham palavras
Sem som
E suspendem
O encontro
Adiado,
Como esse beijo
Que não ousaste
Inventar
Com as cores
Da tua alma,
Esse beijo
Sufocado.
NOS TEUS CABELOS
Enovela-se-me
A alma,
No teu mistério
Caio tão fundo
Que já nem posso
Esbracejar,
Agarrar-me
Às paredes macias
Do desejo,
Por elas acima
Trepar
À procura
Do que nunca
Chegará,
Forte que seja
O ensejo.
ESSE SEDUTOR
Olhar,
Esse mistério
Onde afundo
As raízes
Da alma
Consomem-me
A energia
Para, em sonho,
Eu contigo
Navegar.
VEJO-TE
Fixar o vazio,
Mais além
Do horizonte,
Melancolia
Em estado puro,
Valsa lenta
Dentro de ti,
Que balbucias
A vida,
Incapaz
De a gritar
Aos que não
Querem ouvir
A palavra
Proibida.
AH, SIM,
Mas eu gosto
Dessa tua solidão
E viajo contigo
Até ao lado mais
Esconso
Da tua alma
Para depois o pintar
Com todas
As palavras
Que tiver comigo,
Até que um dia
Me abandonem,
Exaustas de tanto
Clamarem
Por ti,
Cansadas de tão
Inútil castigo.

O JARDINEIRO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Confissões no Jardim”, 2023.
Original de minha autoria.
Impressão Giclée em papel de algodão
e verniz Hahnemuehle, 88x71,
Arglass AR70 em moldura de madeira.
Janeiro de 2024.

“Confissões no Jardim”, 2023. JAS. 01-2024. Impressão Giclée em papel de algodão e verniz Hahnemuehle, 88×71, Arglass AR70 em moldura de madeira.
POEMA – “O JARDINEIRO”
TORNEI-ME
Bom jardineiro,
Com letras
Faço flores
E com rosas
Eu pinto versos,
Com camélias
Invento amores,
A deusa
Dos sonhadores
Aguça-me
A fantasia,
Nascem poemas
A rodos
No jardim da poesia.
O QUE VALE
Amor-perfeito?
Um verso
Que sai do peito?
Os versos
São como as cores,
São delicados
Sabores
Que amaciam a alma
Quando ela
Fica em ferida,
São remédios
Que nos curam,
Que tornam
Mais doce a vida.
POR ISSO VOU
Ao jardim
Inebriar-me
De flores,
Saem versos
Só pra mim
Com palavras
Que são cores.
OLHOS-AS
Com atenção,
Fixo-as
Com o olhar,
Toco nelas
Com a mão,
Fico ali a meditar
No que vai
Acontecer
Em tempo de
Floração,
Com elas
A germinar...
NADA MAIS
Quero saber,
Só de cores
Pra me curar
Do que mais
Me faz sofrer.
MAS AS FLORES
Não duram
Sempre,
São mortais,
Ao ritmo
Da natureza,
Cada uma
Tem seu tempo
Pra resolver
A tristeza.
NAS FLORES
Vejo beleza,
Nas palavras
A matriz,
Em cada flor
Pureza
E em todos
Os perfis,
Até a tristeza
É bela...
............
Como quando
Me sorris.
POR ISSO SOU
Jardineiro,
Com flores
Aprendo sempre,
É saber
Sempre certeiro
Pois natureza
Não mente.
DAS FLORES
Eu faço versos,
Com letras
Pinto flores,
Faço rima
No jardim
E lá crescem
Meus amores...
..............
E as palavras
Curam dores
Que o poema
Sublima,
São como as cores
Dos meus olhos
Que iluminam
A rima.
POR ISSO SOU
Jardineiro
Da palavra colorida,
Crio perfumes
Em verso
Pra dar leveza
À vida.

CANETA DE CRISTAL
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Parousía"
Original de minha autoria.
31 de Dezembro de 2023

“Parousía”. JAS. 31.12.2023
POEMA – “CANETA DE CRISTAL”
E COM CANETA
De cristal
E a dádiva
De Athena
Pôs-se a compor
Com palavras
Para cumprir
Sua pena.
VALEU-LHE
A poesia,
A lamparina
Acendeu
E com o mais
Puro azeite
Em versos
Tudo ardeu.
SOZINHO
Na biblioteca,
Arrasado
De paixão,
Entregou-se
À poesia,
Libertou
A sua alma
Das grades
Dessa prisão.
NO TEAR
Ele teceu
Um manto
Com sua pena
E voou lá
Pràs alturas
Bafejado
Por Athena.
FOI COMO PRECE
Cantada
No altar
Da emoção,
Acendeu-se-lhe
A alma,
Toldada ficou
A razão.
NÃO É ASSIM
O amor,
Um foco intenso
Que cega?
Ardem palavras
Em dor
Porque é total
A entrega.
E FOI ASSIM
Que venceu
Uma dor
Que o oprimia,
Sem versos
E sem a deusa
Era templo
Que ruía.
![]()
REFLEXOS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Montanha Encantada”,
JAS, 2022 - Impressão Giclée em papel
de algodão (100% - 310gr) e verniz
Hahnemuehle, 94x119, Artglass
em moldura de madeira.
Dezembro de 2023.

“A Montanha Encantada”, 2022. JAS. 12-2023
“Tu prima m’inviasti verso Parnaso
a ber ne le sue grotte, e prima
appresso Dio m’alluminasti”.
Dante Alighieri, Purgatorio.
Canto XXII.
POEMA – “REFLEXOS”
PERDI-TE
Porque nunca
Te encontrei...
Numa rua,
Numa praça,
Num café.
Em lado nenhum.
Não sei.
AH, MAS ENCONTREI-TE
No Parnaso
(Agora me recordo),
Lá em cima,
Intangível,
Sem poder
Tocar-te
A não ser com
Palavras
Em forma de poema
Sensível às cores
Vivas
Da tua alma.
DE REPENTE,
Vestiste-me
Com elas,
As palavras,
E eu senti-me
Quente,
Afagado,
No meu canto.
SIM, ENCONTREI-TE
No Parnaso,
Lá em cima,
No Monte.
Através de ti
Eu vi a costa
E vi o mar
E o meu mundo
Interior,
Com nitidez,
Num sonho
Em azul...
.........
A tua cor.
DEPOIS VEIO
A neblina
Cintilante...
Cobria-te
Para te revestir
E refrescar
A alma
Com chuva
Miudinha...
...........
De palavras
Húmidas
Caídas do céu
Da minha fantasia.
EU NÃO ERA MAIS
Do que espelho
Que te devolvia
A imagem
Contra a
Petrificação
Que espreita sempre
Nos olhares
Indiscretos.
Mas tu não me vias.
Em mim,
Especulavas,
Dizias...
E DE TANTO TE
Veres
E dizeres
Decidiste declinar
O espelho que
Começava
A embaciar
A tua imagem.
E NÃO ERA DA
Neblina
Que te envolvia,
Mas dos desenhos
Que tuas mãos
Esboçavam
Timidamente
Nesse espelho
Já húmido
De ti.
E DESPEDISTE-TE
Do Monte.
Desceste para ti
Vertiginosamente,
Em desconforto,
Sob os olhares
Das mil górgones
Que sempre ameaçam
Petrificar-te.
E sucumbiste.
Ou talvez não...
NO MONTE,
O espelho disse,
De si para si:
“De tanto te veres
Em mim,
Ficou-me, de ti,
O repetido reflexo;
E sabes o que
Brotava
Quando te olhavas
Com palavras
Na minha superfície?
Beleza.
Toda a que
Me sobrou
Quando, triste,
Desceste o Monte.”
“MAS ESTA NÃO
Petrificará,
Porque ficou
Guardada
No meu corpo
Vítreo
Onde todos
Se revêem
Sem saber
Que no reflexo
Levam, gravada
Em transparência,
A tua imagem...
..........
Um pouco
Embaciada.”
“E EU POR CÁ
Fiquei,
Espelho do mundo,
A olhar para
O escuro espaço
Sideral
À espera
Que um cometa
Me alumie o caminho
Para te devolver
A imagem
Como teu reflexo
Original...”

EU TENHO SAUDADES
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Teus Olhos”, 2022. Original de minha autoria - Impressão Giclée, papel de algodão, 100% de 310gr, e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em moldura de madeira - 67X89. Dezembro de 2023.

“Teus Olhos”. JAS. 2022. Impressão Giclée, papel de algodão (100% e de 310gr) e verniz Hahnemuehle, Artglass AR70, em moldura de madeira – 67X89.
POEMA – “EU TENHO SAUDADES”
EU TENHO SAUDADES Dos teus belos olhos, Viajo com eles Nestes meus poemas Pra te alcançar Quando fico só E com nostalgia Desse nosso mar Onde o afecto cabia Sem se esgotar. EU TENHO SAUDADES Quando te encontro Nestes meus sonhos A olhos abertos, Porque eu já sei Que tens de partir E que o nosso tempo É sempre escasso Para te sorrir. EU TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Quando te digo, Com certas palavras, O que já pressinto... .................. Que fico sozinho Mesmo que a sonhar. EU TENHO SAUDADES Quando caminho Junto a teu lado Horas a fio Neste meu jardim, Te digo o que penso Acerca de nós... ................. Que o desencontro Nunca terá fim... EU TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Quando te canto Nestes meus poemas Ou então gracejo Pra te ver sorrir Quando eu suspiro Pela falta que fazes Se não te olhar Ou não te ouvir. EU TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Nem sei como vivo Aqui a teu lado Que quase te sinto Quando tu respiras O ar que me sopra Cá dentro de mim Onde tu existes Como densa bruma Deste meu jardim. EU TENHIO SAUDADES, Saudades de ti, E sei o porquê Deste meu sufoco... ................... Porque sempre me foges E não me nomeias Por qualquer razão, Mesmo que te diga E que te repita Que se o fizeres Não será em vão. COM TANTA SAUDADE, Sou, afinal, feliz Em cada momento, Mesmo longe de ti, A alma em tormento Levada pelo vento Pra longe daqui. MAS TENHO SAUDADES Desses teus olhos Que vejo assim, Porque me dizem que,
Longe que estejas, Estás perto de mim.

DESTINO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Voo da Rosa”.
Original de minha autoria.
Dezembro de 2023.

“O Voo da Rosa”. JAS. 12-2023
POEMA – “DESTINO”
RENUNCIEI
Para nunca
Te perder,
Mas neste
Silêncio sofrido
Vai declinando,
Traído,
O que pra sempre
Eu quis ter.
VÊS, BERNARDO,
Que destino?
Que desassossego,
O meu?
Quis seguir
O teu caminho
E, de tanto
Caminhar,
Perdi-me...
..............
Já não sou eu.
QUE DESENCONTRO
Foi esse
Desde o dia
Em que a vi?
Dei-lhe errados
Sinais,
Cavando
Cada vez mais
Esta funda
Solidão
Que nasceu
Quando a perdi...
VÁ, DIZ-ME
Tudo o que
Não sabes
(É a ela
Que eu peço),
Eu quero
Mesmo saber
Pra te cantar
Em poemas
E assim não
Te perder.
TU AMAS
A poesia?
Senti-la é
Doce sofrer,
Ela diz tudo
Com nada
E seu canto
É prazer,
É como o voo
Da rosa,
É melodia
De fada
Mesmo quando
Faz doer.
NO POEMA
Eu até finjo,
É poeta
Quem o diz,
Mesmo que sinta
O que digo
Nunca sou,
Sem ti,
Feliz.
MAS POEMA
É como a vida,
Posso ouvir
A tua alma
Em desejos
Com palavras...
........
É o modo
De te ter,
É remédio
Que me salva
De na solidão
Me perder.
ESTE CANTO
É, pois, meu,
Nem tu
Mo podes
Roubar,
Se dizem
Que é só pra ti...
..........
É verdade
De enganar.
MAS O VERSO
É o meu beijo
Nesse rosto
Que perdi,
É quente
Como o desejo
E resiste
A quem te diz
Que o poeta
Não te ama,
Porque desenha
As palavras
Com um pedaço
De giz...
O AMOR
Em poesia
Não é, afinal,
Deste mundo,
Quem o ler
Como utopia
Vai mais longe,
Vai mais fundo,
Nem vê
O pobre poeta
Como simples
Vagabundo...
EU NÃO GOSTO
Da renúncia,
Mas que posso
Eu fazer?
Se não cantar
O que sinto
É mais profunda
A perda,
Não há modo
De te ter...

APARIÇÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Epifania”.
Original de minha autoria.
Dezembro de 2023.

“Epifania”. JAS. 12-2023
POEMA – “APARIÇÃO”
EU VI UM ANJO DESCER
Docemente
Sobre mim,
Era rosto
Imaculado
Em momento
Inesperado
Que parecia
Não ter fim...
VINHA ELE
Lá de tão alto
Que nem eu
O pressentia,
Tive então
Um sobressalto
Porque em mim,
Pobre mortal,
Esse anjo
Não cabia.
SUA LUZ
Era intensa,
Ofuscava
O olhar,
O seu brilho
Deslumbrava,
Arte pura,
Sedução,
Vontade
De o cantar.
MAS NÃO SEI
Se era anjo
Ou se era
Uma mulher,
O seu rosto
Era belo,
Não era um
Rosto qualquer...
POR ISSO ME FASCINOU,
Porque ao vê-lo
Descer
Do trono
Onde reinava,
Quase, quase
Me cegou
Com a luz
Que emanava....
..........
Mas levou-me
Ao Parnaso
Onde a arte
Lhe sobrava.
FIXEI-O, ENTÃO,
Num quadro
De memória,
Traços leves,
Cores intensas
Que cativam
O olhar,
Pintei-lhe
O cabelo
De negro,
Dei-lhe rosto
De mulher,
Como se fosse
Avatar
Que tomou
Conta de mim
Para sempre
Me lembrar
Que não era
Querubim.
MAS QUE EU VI
Um anjo,
Ah, eu vi
Entrar bem
Dentro de mim
Sob forma
De mulher,
Porque anjo
Imaculado
Não cabe
No meu jardim
Faça eu
O que fizer.
FOI MISTÉRIO
Nesse oráculo
Da vida
Onde eu o
Tento ler
Em sinais
Que não terminam
Num dia
De despedida
Que eu não
Deseje ter.
EU VI UM ANJO DESCER
Neste vale
Da minha vida
E ele fez-me
Crescer,
Recomeçar
A partida,
Outra forma
De viver.
E COM POEMAS
Em viagem
Eu parti
Para com eles
Voar
Em cada palavra
Que digo,
Em cada verso
Que sinto
Na hora de celebrar.

METAMORFOSE
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Solidão da Camélia”.
Original de minha autoria.
Novembro de 2023.

“A Solidão da Camélia”. JAS. 11-2023
POEMA – “METAMORFOSE”
CAMINHAVA
Docemente,
Irreal,
Sobre as cores
Que eu lhe dei...
Na minha alma
Era flor
Que eu sempre
Cultivei,
Alimento
Dos meus olhos,
Melodia
Dos poemas
Que para si
Cantarei.
CAMÉLIA
É o nome
Da flor
Que um dia
Encontrei
Em profunda
Solidão...
A alvura luminosa
Era tão densa
E brilhante
Que quase a tomei
Na palma
Da minha mão.
QUIS TRAZÊ-LA
Para o poema
E disse-me
Logo que sim,
Ficaria mais serena,
Estando perto
De mim.
FALEI COM ELA,
Dei-lhe palavras
E cor,
Pois solidão
É castigo,
E ela, brancura
Divina,
Não merecendo
Essa dor
Acolheu
O meu abrigo.
CAMINHÁMOS
Numa ponte
Prà outra margem
Da vida,
Foram passos
De liberdade,
Não foram
De despedida.
ESSA PONTE
De papel
Era um arco-íris
Saído do meu
Pincel
Que a devolvia
Ao jardim,
Onde a cor
É alimento,
É como favo
De mel,
De meus olhos
O sustento,
Porque a arte
É assim.
VI NELA
Essa mulher
Dos meus sonhos,
Recriei-a
Com afeição,
Pintei-a
Em movimento,
Qui-la livre
No meu chão
De onde
Se elevou
Quando eu
Lhe dei a mão,
Nesse preciso
Momento.
É ESTRANHO
O movimento
Que não a afasta
De mim,
Ela vive
Em quietude
Porque se oferece
Assim:
Transforma
A solidão
Em poética
Virtude.
A SOLIDÃO
Em flor
Pode ser
Libertação
Se lhe dermos
Muita cor
Com a força da
Paixão.

SILÊNCIO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Som do Silêncio”.
Original de minha autoria.
Novembro de 2023.

“O Som do Silêncio”. JAS. 11-2023
POEMA – “SILÊNCIO”
OUÇO A VOZ
Do silêncio
Que me cerca,
Adentro-me
Na multidão
E ele cresce
Por dentro,
Na alma
Me cresce
E, quase, quase,
Como grito
Sufocado...
..............
Me ensurdece.
AH, É DEMAIS,
Este silêncio,
Esta voz inaudível
Caustica-me
A pele macia
Da memória
Dos afectos,
Uma moinha
Na alma,
Silvo
De vento
Cortante
Nas janelas
Destroçadas
Da emoção.
E EU FUJO
Para o ermo,
Lá em cima,
Na montanha,
À procura
Da solidão de
Eremita
Em busca
Da melodia
Do nome
Silenciado,
Aquele que nunca
Ousaste
Pronunciar,
Palavra em degredo,
Nome castigado
Que só o poema
Pode resgatar.
LÁ NO ALTO
(É sempre assim),
Ouço uma harpa
Dedilhada
Por ti,
Notas musicais
Que me fazem
Estremecer
E vejo riscos
Coloridos
Esvoaçando
No teu azul
De Lisboa
Em direcção
Ao infinito...
VEJO-TE SAIR
Da neblina
Cintilante
Do rio
Que te veste
A alma
E sacio-me de
Palavras
Soltas,
Em turbilhão,
Até que a inspiração
Chegue
E as componha
Num poema
De redenção
Que te cante
E que te conte
Às nuvens
E ao vento
Que passa...
NOMEIO-TE
E sussurro
Uma pequena
Palavra
Que nunca ousei
Pronunciar,
Mas que ouviste
Ressoar-te
Na alma
Mil vezes,
Em mil poemas
Sufocados.
O SILÊNCIO
É a tua fala
(Bem sei),
Mas eu não sairei
Deste poema
E do ermo reparador
Até que me ouças
E soletres
Finalmente
Esse nome
Com as cores
Da tua fantasia,
As cores vivas
Da emoção.
FICO PRISIONEIRO
De um poema
Em construção
Até ao resgate
Desse nome
Perdido
E silenciado
Na ilha remota
Da tua memória,
Âncora firme
Da minha própria
Salvação.

ALMA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Melancolia”.
Original de minha autoria.
Novembro de 2023.

“Melancolia”. JAS. 11-2023
POEMA - "ALMA"
FRIA
É a montanha
Onde nasci
Para o destino
Granítico
Da minha vida.
O CALOR
Habita
Outras paisagens
Mais a sul,
Onde nasce
A poesia
Para aquecer
Com flocos
De palavras
A minha alma
Granítica
E vadia...
MELANCOLIA,
Sim, melancolia...
........
É longo
E frio
O caminho
Dos que amam
No deserto,
Como gelo
Na noite,
O claro de lua
Iluminando
A alma nua
Em desespero,
Tendo areia
E vento
Como tempero.
MAS É QUENTE
A memória
Porque não mente
E é cortante,
Faz brotar
Sangue
Que escorre
Das artérias
Que irrigam
A alma.
ALMA FERIDA
Que o altar
Das celebrações
Não acolhe
Nessa distância
Desmedida
De uma fuga
Inesperada
E depois
Insistentemente
Ressentida
No eco
De um silêncio
Repetido.
OH, COMO É DURO
Vê-lo perdido,
Esse rosto
Melancólico,
No meio da floresta
Desordenada
De cores,
Esbracejando,
No seu irresistível
Ímpeto,
Em girândolas
Ou estilhaços
De fantasia
Em perigo
De cromática
Autofagia,
Em busca do
Tempo perdido!
VOA, VOA
A águia
Com seus riscos,
Mas o poeta
Adentra-se
Nas palavras,
Procurando,
Voar
Com outras asas
Que encontre
Em si,
Sem saber bem
Para onde
Viajar,
Perdido o infinito
Que lhe roubaram
Dessas mãos
Tão generosas
De traços,
De cores
Ou de rostos...
AMARGAS SÃO
As recordações
Como o gelo
Quente
Que não mente
E não derrete
Ao sol,
No poente,
Quando o verso
Declina
No horizonte marinho
Ali a seu lado
Porque à vida
E ao poema
Sempre
Reconduzem
As imagens,
Mesmo sem cor.
PROPÍCIA
Desperta
A manhã,
Sem ti,
Meu amor...

O POETA E A DOR
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Janus” Original de minha autoria. Novembro de 2023.

“Janus”. JAS. 11-2023
POEMA - "O POETA E A DOR"
O POETA É UM REFÉM Em permanente Toada, Ferve-lhe o sangue Na alma, Dor profunda, Delicada, Sempre igual, Sempre diferente, Ele vai fingindo Que a sente... ............ Em palavras Desenhada. É INTENSA A toada E é forte O que sente Ou é uma dor Simulada? O poeta Nunca mente Pois sua fala É cifrada. É DOR Que ele finge Poeticamente Sentir Para melhor A dizer, Para melhor Seduzir Ou é real evasão Do que nele Está cavado Como autêntica Prisão Ou o preço De um pecado? É REAL Ou aparente? É profunda Essa dor Que ele diz Que sempre Sente, Muitas vezes Por amor? É SENTIR De cada dia Ou é ferida Congelada? De tudo O que ele diz O que sente É quase nada? NÃO, ELE SENTE Em cada dia Uma ferida Sublimada Em forma De poesia Que se torna Cicatriz Que nunca fica Curada. Fica-lhe a marca No corpo E na alma Desenhada. É ESTE O SEU DESTINO, Fingir que sente O que sente Em fala Que é cifrada, É por isso Que ele canta Pra sentir Que no seu canto É a alma Libertada.

O QUE EU TE DISSE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Musa em Flor”
Original de minha autoria.
Outubro de 2023.

“Musa em Flor”. JAS. 10-2023
POEMA – “O QUE EU TE DISSE”
DISSE-TE NUM DIA
De profunda
Melancolia:
- Voaria contigo
Para os confins
Do tempo
Montado
Num risco
Com asas azuis
Que voasse
Para lá das nuvens,
Onde escreveria
O teu nome
Com palavras
De um poema.
DISSE-TE QUE
Teus cabelos
São moldura,
São novelos
Desfiados
Que te cobrem
Esse rosto,
Colo abaixo,
E se alongam
Até mim
Como raízes
Do meu olhar.
CORPO DE MUSA
Em flor,
Subtil geometria
Para onde converge
O meu olhar
À procura
De infinito
Nos traços
Desse teu rosto
Velado.
ALI AO LADO
Desse jardim
Onde sempre
Renasces,
Vejo casas
Alinhadas,
Ruas
Convergentes
Ao olhar,
Cores intensas
E dispersas
(Cores quentes)
Fontes,
Água,
Fugas,
Sempre fugas,
Em levitação,
Que anulam
As crispadas
Esquinas da vida
Com a beleza
De um risco
Traçado
Ou dito
Em silêncio.
VEJO-TE NUM FIO
De água,
Boca inundada
A transbordar
Dessa torrente
Líquida
Que cai
Em silêncio
De um pincel
Que tuas mãos
Deixam deslizar
Na brancura
De uma folha
Virgem
Que o vento
Soprou
Para uma mesa
Nua,
Apenas beijada
Por esse raio
De luz
Que te ilumina
E acende
A imaginação
(E que tanto
Me seduz).
AH, COMO GOSTARIA
De saltar
Para dentro
Dos teus desenhos,
Deslizar pelos
Teus dedos
E voar
À procura
Do que perdi
Ou nunca
Encontrei
E sentir
Essa leveza
Densa
Que nunca tive,
Mas sempre sonhei.
VESTIR-ME DE CORES,
Alinhar-me com
Traços dispersos
Para passear
Contigo
Nas pupilas
Dos teus olhos,
Desenhando
O teu corpo
Como se escrevesse
Um poema...
.............
Com as cores
Da tua alma
Solitária.
AH, PUDESSE EU
Pintar-te
Com palavras,
Dizer-te em cores,
Abraçar-te
Agarrado
A um risco
Que saísse
Do meu olhar,
À procura
De ti,
No céu do desejo...
EU QUERO ALCANÇAR
Essa fronteira,
Deslizando
Por teus dedos
E evadir-me
Para esse novelo
Desfiado
Que envolve,
Como moldura,
O teu rosto
E o teu olhar
Sempre em fuga
Para o infinito...

COLISÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Inspiração”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2023.

“Inspiração”. JAS. 10-2023
POEMA – “COLISÃO”
NAQUELE DIA
Caíste em mim
Como meteorito,
Embate espectral
Neste meu chão,
Abriste
Sulco profundo
Na minha alma,
Mas não doeu,
Essa abrupta
Colisão.
Foi simplesmente
Fatal.
A VELOCIDADE
Cegou-me,
Um clarão,
Ondas e
Vibrações
Abanaram-me
As raízes
(É sempre assim),
Estremeci
E começou
Um bailado
Que nunca mais
Terá fim.
PROCUREI-TE
Nessa cratera
Cavada na minha
Alma
E, passada
A tempestade,
Vi fragmentos
De ti,
Minerais
Por lapidar...
............
Como dunas
Abandonadas
Ao vento
Aqui bem perto
Do mar.
NESSA CRATERA
Profunda
Encontrei
Um brilho
Estranho
Que me pôs
A levitar,
Luz intensa
E cintilante
Na linha
Do meu olhar.
NUNCA MAIS
De lá saí
E com mãos
De alma pura
Peguei
Subitamente
Em ti...
ESCALDAVAS
De brilho
Em profusão,
Mistério
De uma beleza
Diferente
Que nascia
Desta estranha
Colisão.
FIZ DE TI
A minha bola
De cristal,
Li nela
A história de um
Encanto
Que trespassou
Como raio
A minha fronteira
Vital.
LEIO-ME A ALMA
Na superfície
Dourada
Do teu corpo
Incandescente,
Em tímida
Exibição,
Que me ilumina
O olhar
E me domina
Por dentro
Em permanente
Tensão.
RASTO CÓSMICO,
Atracção fatal
Que me suspende
A vida
E me põe
A levitar,
Subindo sempre
Mais alto
Sobre paisagem
Lunar.
AH, SIM,
És razão de culto,
De arte,
Encantamento,
Deusa
Celebrada
Neste canto
Que criei,
Advento,
O meu chão,
Palavras
Cifradas
Que falam
Por mim
Com paixão,
Via mestra,
Via quente
Da mais bela
E, de todas,
A mais sofrida
Evasão.

POR UM SORRISO…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Sorriso”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2023.

“Sorriso”. JAS. 10-2023
POEMA – “POR UM SORRISO…”
SE O TIVESSE
Comigo,
O mundo,
Trocava-o
Por um sorriso,
Pela ternura
Do teu olhar,
Esses teus olhos
Negros
Onde me perco...
...........
A navegar.
MAS É CERTO
Que os não terei,
Foi promessa
Para a vida,
Promessa
De despedida...
............
Eu bem sei.
NÃO IMPORTA,
Também o mundo
Não é meu
Para to oferecer,
É grande demais
Para mim,
Pra tão fugaz
Acontecer
Na travessia
Do tempo que flui
E não tem fim.
AH, MAS POSSO
Dar-te o mundo
Do meu olhar,
A incandescer,
E os frutos
Da minha arte,
A renascer,
Recriar-te
Em ausência,
Como diz
A Yourcenar...
................
E então ficarás
Mais bela
Do que tu mesma,
A olhar...
............
E a sorrir,
Num desenho
De palavras
Onde te posso
Esculpir.
MAS ESSE SORRISO
E esse olhar
Fugidio
Que exibes
Numa rua deserta
Da minha vida
Não os terei
Pra te poder
Contemplar
E te ter
Como só eu sei...
...........
E por isso
Te pinto
E te canto
Pra comigo
Te levar
Como sempre
Desejei.
GANHO-TE
Em fantasia,
Este modo
De te ter
Cada noite em
Cada dia,
À medida
Do desejo,
Em festa,
Epifania...
.............
É, assim,
Que te revejo.

RAPSÓDIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Teus Olhos”. Original de minha autoria. Outubro de 2023.

“Teus Olhos”. JAS. 10-2023
POEMA – “RAPSÓDIA”
SIM, EU CANTO Esses teus olhos, A luz, O brilho, A cor, Translúcida Como mel. O pintor, Que é poeta, Desenhou-os Com um secreto Pincel Que era, sim... ........... Uma caneta. É VERDADE, Palavras Leva-as O vento, Mas, banhadas Pela cor Desses teus olhos Tão belos, São sedutor Chamamento. AGUARELA De palavras, Quero dizer, Galeria De um rosto só. Este pintor Que é poeta Deixa mensagem Discreta Pra desatar O seu nó... TUA BOCA Não é púrpura, Ao rubro, Como eu Sempre a quis, Da cor Dessa paixão Em intensa Combustão Que do amor É motriz. HÁ VIDRO FRIO Que da minha A separa... Mas se murmurar O teu nome Essa tela Que é poema Transforma-se Logo em ara Onde a chama Se consome. E CRESCEM Flores A teus pés... Pintei-as De todas as cores Que encontrei No Jardim, Anunciam Novos aromas E outros tantos Sabores Pintados todos Por mim. EU CANTO A LUZ Dos teus olhos Com palavras E com cor, Porque é esta A melodia Que tu conheces Melhor...

LAMENTO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Palácio das Artes no Monte Parnaso”. Original de minha autoria. Setembro de 2023.

“Palácio das Artes no Monte Parnaso”. JAS. 09-2023
POEMA – “LAMENTO”
SINTO-ME SÍSIFO, Cansado De carregar Palavras De evasão Lá para o cimo Do Monte, O lugar Da redenção. PALAVRAS Com gravitas, O meu abrigo, Palavras com Com peso, Sofridas, O meu castigo. SINTO-ME CONDENADO A transportar Sentimentos Lá para o alto, Agarrados Às palavras E agarrados a mim, E logo trazidos De volta Neste processo Sem fim. REGRESSO Com menos peso, É verdade, Alguns ficam Por lá (Talvez metade), Disfarçados De palavras, Outros levados Pelo vento. LÁ NO ALTO (E no meu peito), O silêncio Ouve-se mais Porque o ar é Rarefeito E não há outros Sinais Nem há som Que o sustenha... .............. Procuro, então, Libertar-me E canto, Canto Com o ar puro Da Montanha. CANSA-ME Este ir e voltar, Mas nunca Desespero Porque nada mais Eu espero Ou sequer Posso fazer... ................ Estou condenado À viagem Para nunca A perder. CAMINHO Numa estrada De luz, É verdade, E os meus pés São asas De fantasia Que voam Ao seu encontro Por um golpe De magia... EU SINTO, SIM, O cansaço De tanto assim Caminhar, Mas sei muito bem O que faço Simplesmente Por amar. QUEM ME MARCOU Tal destino, Quem o marcou Afinal? Foram os deuses Do Olimpo Ou foi A visita da musa Naquele dia Fatal?

REMINISCÊNCIAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Epifania”. Original de minha autoria. Setembro de 2023.

“Epifania”. JAS. 09-2023
POEMA – “REMINISCÊNCIAS”
OLHANDO-TE, O teu rosto Lembra-me A Primavera De Botticelli. Reminiscências Da Galleria, Em tempos De alegre E toscana Epifania. MAS AGORA Sinto-me Como vela Que te alumia O caminho, Com candor, Que arde Por dentro Em palavras, Sozinho, Pra preservar O efémero Desse teu olhar Sedutor. ALUMIO-TE Enquanto esvaeço Até mais não ser Que resíduo De palavras Do poema Que te ofereço: Luminoso Renascer. MAS NÃO SEI Se vês esta luz Ou se apenas A imagino, Se tens caminho Ou sendeiro Pra trilhar Ou se é meu Desejo Derradeiro De, assim, Te preservar. EFÉMERO Sou eu Porque vou ardendo Por dentro E te atraio De mansinho, Qual borboleta Perdida, Porque não quero Que ardas Na chama Da minha vida Pra que não Fique sozinho. É PERIGOSA A luz da vela Quando na noite Escura O seu clarão Sobressai, Liberta calor Em chama ardente, Brilho intenso E fulgente, Esse brilho Que atrai. MAS A MINHA Canção Preserva O efémero Do teu sedutor Olhar, Enquanto ardo Por dentro Animado Pelo desejo De teu rosto Iluminar. POETA, Sou como fénix Renascida, Regresso sempre À vida Em cada verso Que crio E com ele E com palavras Retomo O meu caminho. E é, então, Que sorrio... O POETA Faz versos Como quem morre, Mas renasce Em cada dia Nas vidas Que, em palavras Sofridas, Ele com arte Recria... REMINISCÊNCIAS... ............... Se perguntasses Por que razão Eu te canto E te ilumino Era o que eu Te diria, Quentes Recordações Dos tempos De vibrante Epifania.

O TEU ROSTO É UM POEMA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Rosto”.
Original de minha autoria.
Setembro de 2023.

“O Rosto”. JAS. 09-2023
POEMA – “O TEU ROSTO É UM POEMA”
O TEU ROSTO
É um poema,
Pintei-o
E nada mais.
As cores
Que te vestem
A alma
Brilham lá
Como corais...
...............
E eu, encerrado
Em palavras,
Ofereço-te
Uma moldura
Toda feita
De cristais.
ASSIM TE TENHO,
Te contemplo
E te desenho,
Assim te vejo
E te recrio
À medida
Do desejo.
Assim sorrio...
................
E assim te sonho
Com estas mãos
Que te deslizam
Na alma
Em busca
Do imortal,
Com estes riscos
Com estas cores
E com palavras
Na geometria
Do meu espaço
Vital.
CONSTRUO
Uma utopia
Levitando
No real,
Escolho bem
A minha via
Com asas
De fantasia
E pinto-te
Com luz divina
Coada
Por um vitral.

PERGUNTA O POETA À MUSA… (II)
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Perfil de uma Musa”(II). Original de minha autoria. Setembro de 2023.

“Perfil de uma Musa” (II). JAS. 09-2023
POEMA – “PERGUNTA O POETA À MUSA…” (II)
E O POETA PERGUNTOU: - Mas se o amor É mistério (Como dizes), É viagem em alto mar, Se há sempre Tempestades E risco de naufragar, Por onde andas, Ó musa, Que o poeta, Vagando Nas “imperiosas
Ondas” Do teu mar, Te vai sempre Procurando Pra mais uma vez Te cantar? - NO MEU LONGO Vaguear Por roteiros De poeta (É essa a minha Missão), Sempre ouço O seu cantar Nesse inútil afã (Qual piedosa Ilusão) De me querer Encontrar. - MAS QUE DESTINO É o teu, Ó musa do alto Mar, Não proteges O meu barco Neste infindo E incerto Navegar? - EU DEIXO A VIDA Correr (Já uma vez Eu to disse), Mas sou fonte D’inspiração, Assim cumpro O meu destino, O que os deuses Me marcaram Em decreto Que é divino E regra da tua Canção. - PALAVRAS LEVA-AS O vento, Ó musa Dos meus pecados, Mas o vento Sopra no barco Que leva Ao alto mar Onde componho O meu canto E me sinto A naufragar. - INSPIRA-TE No meu silêncio, No sussurro Inaudível Da minha velada Voz Se te encontrares À deriva Nas águas revoltas Do mar Sem bússola Nem perspectiva Na arte De navegar. - E É ESSA A salvação? Em teu silêncio Cai a verdade, A que ouves Nas palavras Que devolvem O meu eco Com sabor A eternidade? POIS “EU, Uma reminiscência Da terra”, Naufrago Sempre em ti Nesse mar do teu Silêncio Onde navego à deriva No meu “barco Solitário”, Que de palavras É feito, As tábuas Do meu calvário... AH, SIM, Mas feito Com remos De fantasia Que me resgatam Do mar Quando me ponho A cantar E encho todo O meu peito Com a tua maresia Para assim me salvar...

PERGUNTA O POETA À MUSA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Perfil de uma Musa”. Original de minha autoria. Agosto de 2023.

“Perfil de uma Musa”. JAS. 08-2023
POEMA – “PERGUNTA O POETA À MUSA…”
PERGUNTOU O POETA À sua musa Amada: - O que sabes tu Fazer? Ao que ela Respondeu: - Nada, Foi meu destino, Ao nascer. ENTÃO, COMO É O teu viver? E ela, serena, Lhe respondeu: - Eu deixo a vida Correr... - E NÃO CORRES, Com a vida? Perguntou, de novo, O poeta. - Não, porque é sempre Em subida... O POETA Lembrou-se, Então, Da cantora Da suave Melodia, Da pintora De cores quentes E da bela Bailarina, Lembrou-se Da emoção Que sentia Quando em surdina Ouvia As quentes Tonalidades Que o faziam Vibrar Ou do palco Onde via, Como riscos Numa tela, Aqueles corpos Voar... INCONFORMADO, Logo o poeta Insistiu: - Porque vibro eu Com elas, Mas só a ti Posso amar? Ao que ela Respondeu: - Porque o amor Não se aprende Nem se pode Ensinar, É simplesmente Mistério Ou incerto navegar Entre vagas Altaneiras Em pleno alto mar Onde há sempre Tempestades E risco de Naufragar.

É ESTRANHO, NÃO É?
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Um Arbusto no Jardim”. Original de minha autoria. Agosto de 2023

“Um Arbusto no Jardim”. JAS. 08-2023
POEMA – “É ESTRANHO, NÃO É?”
É FREQUENTE Sonhar-te Em ambiente idílico, Natural, Mas se nada tens De romântico E te cobres De mistério, Porque te sonho, Assim, Deste modo Tão banal? MAS É AQUI Que te vejo, Onde o céu Parece um lago E as grades Do terraço são, À vista Do casario Que me veste O olhar, A minha libertação, As janelas Sobranceiras Onde gosto De cantar. É AQUI QUE Eu te tenho, É aqui que eu Te sonho, Que te canto E me demoro, Nas palavras, A pintar, É aqui que Sobrevivo, Onde mais eu Me liberto Do castigo, Navegando Em alto mar. PINTO E CANTO O lugar Onde te vejo, O lugar Onde te quero, O lugar onde Te sinto, Mesmo quando Desespero. ESTRANHO, NÃO É? É um sítio Onde só vives Sob forma De arbusto, Onde te respiro O perfume Quando adormeço Ao relento, Te sonho Com as estrelas E viajo Com o vento... SINTO-TE PERTO Quando te canto E me liberto, Me aninho Na ideia que De ti Eu consigo figurar E onde mais Me abandono Pra, depois, Te procurar... PERCO-ME, SIM, Nestas cores, Nestas palavras, Nesta minha Fantasia, Enquanto tu Te perdes Num silêncio Programado, Tal como eu, Afinal, Nesta minha Teimosia, Meu destino E meu fado, Tão sofrida Nostalgia.

OS SEIOS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Corpo”.
Original de minha autoria
sobre fotografia em contraluz,
de anónimo, da minha colecção
privada. Agosto de 2023.

“Corpo”. JAS. 08-2023
POEMA - "OS SEIOS"
ERAM OS SEIOS
Dessa mulher
A sua atracção
Fatal,
O que ela lhe dizia
Para ele
Era banal,
Mas a forma
Do seu peito
Era desenho
Perfeito
De um corpo
Sensual.
CONTOU-ME,
Em tarde
De melancolia,
Da arrebatada
Paixão,
Quando nesse dia
A perdera
E ali mesmo
Morrera
Essa fatal
Atracção.
ERAM SEIOS
Generosos
(Disse-me,
Com certo brilho
Nos olhos,
Mas serena
Amargura)
Os desta linda
Mulher,
Uma imensa
Alvura
Em formas tão
Sensuais...
............
Era a física
Dos corpos
Que se atraem
Em seus embates
Fatais.
CONFESSOU,
Com olhar
Um pouco vago,
Que o seu corpo,
Insistente,
O convidava
A olhar,
Bem de frente,
Com a libido
A ferver...
........
E, então,
Estremecia,
Ficava paralisado,
Não sabia
O que fazer.
MAS NADA MAIS
Ele queria
(Foi o que sempre
Lhe disse)
Do que vê-la
Em pose
De maternal
Sedução,
Alimento
Dessa sede
Tão faminta,
Dessa irresistível
Pulsão...
SENTIA-OS
Como fetiche,
Como se a vida
Lhe pedisse
Apenas um seu
Olhar,
Criança perdida
No mundo,
Náufrago
Em alto mar...
MAS, AGORA,
Já sem a visão
Que desde sempre
O atraíra
(Foi o que logo
Me disse),
Só sentia
Melancolia
E uma doce nostalgia
Desse corpo
Sedutor
Onde naufragara
Um dia
Em busca de
Salvação
Ou talvez mesmo
De amor.
MULHER-MÃE
Era destino
Que só nela
Se cumpria,
Fruto de uma longa
Solidão
Que se consumou
Nesse dia,
Como se tudo
Só fosse
Uma doce ilusão,
Fruto da fantasia.

O SILÊNCIO E O TEMPO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Renascer”. Original de minha autoria. Agosto de 2023.

“Renascer”. JAS. 08-2023
POEMA – “O SILÊNCIO E O TEMPO”
O QUE, É, AFINAL, O silêncio? É nada, Por ausência Da palavra, Do corpo e do olhar Na memória E no espaço Onde não têm Lugar? É INDIFERENÇA? É castigo Ressentido? É a alma Em negação Do que lhe foi Proibido? É retiro Ideal Ou o nada Em gestação Com a perda De sentido? O que é ele Afinal? É UM NADA Que tudo Te quer dizer, Uma mensagem Cifrada Que te convida A sofrer? COMO TODAS As mensagens, O silêncio É sofrido Quando for Interpretado, Mas se não Acontecer Será somente Vivido Como pura Negação, Como acto Fracassado. EXPRESSÃO Pelo silêncio, O que quer isso Dizer? Que alguém Já não existe, Que nada há A fazer Quando a ausência Persiste? IR EM FRENTE Sem passado Como tempo Não vivido, Ver na vida O pecado Que é preciso Esquecer Para não ficar Refém De um falhado Acontecer? DIGAS SIM Ou digas não Ficou tudo lá Gravado Pois foi tempo Partilhado, Um tempo De comunhão, Ainda que Fracassado Quando alguém Ficou cansado E decidiu Dizer não. MAS O MEU (Quero que saibas) Vou buscá-lo Com palavras, Entrego-me À poesia Para o levar Ao futuro, Aos que sentem Nesta arte O tempo Da utopia, Onde o passado É mais puro. NÃO O ENJEITO, Portanto, Não pratico Exorcismo Que avive A negação, Ficando assim Como está, Um tempo Sem solução... O TEMPO É escultor Do que houve No passado, Mas também ele É moldado Por desejo E vontade De o sentir Recriado Como dom De liberdade. NÃO SE CONSTRÓI Uma vida Com silêncio Ressentido, Mas com palavras Que acolham O tempo Que já se foi, Pra que seja Revivido E deste modo Fruído Quando ele Já menos dói.

ROSTO PROIBIDO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Deusa das Camélias”. Original de minha autoria. Julho de 2023.

“Deusa das Camélias”. JAS, 2021 – 85×91, em papel de algodão e verniz Hahnemuehle, 310gr, Artglass AR70 em moldura de madeira. 07-2023.
POEMA – “ROSTO PROIBIDO”
QUIS DESENHAR O seu rosto, Pintar-lhe A alma Com as cores vivas Que ainda tinha Consigo, Trazê-la Ao presente Como se não Houvesse Passado, Reinventar-se Com a força Do desejo, Pondo o tempo Do seu lado. A SUA IMAGEM Habitara-lhe A memória Desde que ele
A perdeu,
Resistira Ao frio cinzel Do tempo Com a beleza Que a deusa Lhe concedeu. QUIS ENTREGAR A alma A esse tão belo Rosto Que prà vida O cativou, Mas o destino Não quis E foi por vontade Dos deuses Que partiu E a deixou. MAS PINTOU-A Para si, Pra dar notícia Ao mundo Da beleza Que ainda O comovia, Fixá-la
Pra sempre No tempo, Entregá-la ao Futuro,
Assim, Como ele a via. MAS ELA Não permitiu, Cumprindo O infausto Destino Uma vez mais,
Esse mesmo Que marcara As suas vidas Com indeléveis Sinais. E ASSIM Se consumou O triunfo Do tempo Sobre o tempo Do desejo, O inexorável
Destino...
............. Na vida Ele mais não fora Que um errante Peregrino.

ÀS VEZES
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Caminhos”. Original de minha autoria. Julho de 2023.

“Caminhos”. JAS. 07-2023
POEMA – “ÀS VEZES”
ÀS VEZES TENHO Saudades Do tempo Que não vivi, Dos encontros Que falhei, Das coisas Que eu não fiz Ou que, fazendo, Errei. CONSTRUÍ-ME Como quis, À medida Do desejo, Em cada passo Que dava Fazia nascer Um passado Que neste poema Não vejo. MAS TENHO MESMO Saudades, Que mais posso Eu fazer? Quem vive Daquilo que faz E dá uma voz Ao que sente, Vai construindo O futuro Pra libertar O presente. NÃO ME QUEIXO Do passado, Do que nele Construí E da vida Que levei... .......... Com ventos E tempestades Muitas vezes, Sim, falhei... HUMANA Imperfeição, Quero dizer, Porque se fosse Perfeito Não estaria O poema Pronto Para nascer Com palavras Que resgatam Do que não soube Fazer. É VERDADE, Bem sei Que um dia Tropecei E me perdi No caminho; Procurava, Procurei, Fazendo O percurso Sozinho, Mas voltava A tropeçar, Até que um dia Parei... ........ Para não Recomeçar. MESMO ASSIM Recomecei E voltei A caminhar, Mas não mais Eu tropecei Porque em palavras Peguei Para me poder Salvar... .......... Foi assim Que me salvei. SALVARAM-ME Essas palavras Compostas Em poesia Porque fiz Do tropeçar Matéria De fantasia.

ESTRANHA ENCRUZILHADA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração – “A Rua”. Original de minha autoria. Julho de 2023.

“A Rua”. JAS (104×118, em papel de algodão e verniz Hahnemühle, 310gr, 2022)
POEMA – “ESTRANHA ENCRUZILHADA”
CRUZEI-ME COM ELA Numa esquina Da vida, Nessa rua Onde inventei Uma estranha Despedida. NÃO A VI, Como a via Da janela Sobranceira Quando passava Na rua
Abraçada À beleza Como rosa Perfumada De uma viçosa Roseira. AGORA, Se eu a vi, Foi duma janela Vidrada Que me devolveu A imagem Como num espelho De fada. MAS SEGUI-LHE A silhueta,
Embaciada Com o meu sopro De alma, E pensei Que não ia Por ali, No meio Da multidão, Que não a via, Por falta De nitidez Do meu campo De visão, Nessa rua paralela Onde sempre Imaginamos O que já Não vemos nela. ANÓNIMO Me assumi, Peregrino, Como a gente Que se cruza No caminho Sem se jogar O destino. MAS VERTI Lágrimas secas, Das que Não saem de nós, Não banham O nosso rosto, Dor íntima, Já sem voz Para cantar Esse rio De que ela era A foz. QUE ESTRANHA Sensação, Caminhar A seu lado, Perdido Num horizonte Que se esfuma E se dissolve Como espuma Que morre Na areia branca Da praia... ENTÃO ENCONTREI
Estas palavras Escritas na água Remexida Pelo vento, Também elas Esmorecendo Na praia De um lamento Como onda Noutra rima De um poema Simulado Para dar voz Ao silêncio, Para a ter A meu lado. E OLHEI, Mas sem a ver, Imaginando-a Regressada Dos confins De uma memória Invocada Para logo Me acolher. E GOSTEI Que me visse Sem olhar (Achava eu), Pensando Que não pressentia Sequer O anónimo Que a seguia Para logo A perder. TUDO TÃO Estranho, Que até este poema Espanta Por contar O que nunca Aconteceu Com a nostalgia De quem sente O que canta... ............ Mesmo aquilo Que perdeu.

RUA DESERTA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Mulher com Turbante"
Original de minha autoria.
Julho de 2023.

“Mulher com Turbante”. JAS. 07-2023
POEMA – “RUA DESERTA”
ENCONTREI-A
Por ali,
Ao cair da tarde,
Numa rua deserta
Da minha cidade,
Como se o destino
Tivesse marcado
Um feliz encontro
Pra me resgatar
De tanta saudade.
OLHEI-A
Nos olhos
E estremeci,
Era um brilho
Intenso
E nele me perdi...
LI-LHE
Um poema de amor,
Abracei-a
Com a voz,
Ondulei-me
Nos seus olhos
Como barco
Numa foz.
MAS FOI SUAVE,
A viagem,
E curta,
Como sempre
Ela quer,
Por isso
Logo a saudade
Entrou forte,
A doer.
DÓI SEMPRE
Quando a deixo,
Cai silêncio
Sobre mim,
Revejo-a, pois,
Na memória,
Reencontro-a,
É verdade,
E tem mesmo
De ser assim
Quando a tristeza
Me invade.
É A MAIS BELA
De todos os lados,
Do lado das mãos
Ou da suave voz,
Do lado dos olhos,
A luz qu’ilumina,
Do lado da boca,
Tão sensual,
Do lado do corpo,
A pele tão macia,
Os véus que a cobrem
Para me travar...
....................
Mas cresce o mistério
E a tentação
E cresce o desejo
De a abraçar,
Tirar-lhe os véus,
Unirmos os corpos
Para dar fogo
À minha paixão.
EU TENHO SAUDADES,
Sinto a sua falta
Sempre que a deixo
E vou por ali,
Por isso lhe escrevo,
Lhe digo
O que digo
Neste meu poema,
Ou noutro qualquer,
Mas, agora, sozinho,
Como em castigo,
Sinto-a bem perto
Como minha musa
E também a sofro
Por já não a ter.
MAS TENHO-A AQUI
Bem dentro
De mim
(Tenho a certeza),
Não há outro modo,
Mas é belo assim
(A pura beleza),
Renascer com ela
Neste mesmo
Instante,
Um absoluto
Em que eu mergulho,
Mas que para mim
Nunca é bastante.
O BEIJO
Poema de João De Almeida Santos. Ilustração: "O Beijo". Original de minha autoria para este poema. Seis de Julho: “Dia Internacional do Beijo”, que celebro, com este poema, todos os anos. Inspirado em"Lotte in Weimar" (1939), de Thomas Mann, a obra que continuou "Werther" (1774), de Goethe, e no meu romance "Via dei Portoghesi".

“O Beijo”. JAS. 06.07.2023
LEITMOTIV
“O amor é o melhor na vida, assim, no amor, o melhor é o beijo – Poesia do amor...”. “Beijo é alegria, procriação é luxúria” Thomas Mann
INSPIRADO TAMBÉM EM:
“Os beijos escritos não chegam ao destino, Mas são bebidos pelos fantasmas ao longo do trajecto” Kafka “Se para te beijar devesse, depois, ir para o inferno, fá-lo-ia. Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos, de ter visto o paraíso sem nunca lá ter entrado. Shakespeare “O primeiro beijo não é dado com a boca, mas com os olhos” Bernhardt
POEMA – “O BEIJO”
BEIJO FOI O que nunca Te dei A não ser Com o olhar, O primeiro, Esse beijo, Dei-to, pois, Sem te tocar. E DEI-TE MAIS, Com palavras, Quando olhar Já não podia... ............ Foste embora, Não estavas, E, por isso, Não te via. FORAM BEIJOS Que sonhei Na rotina Dos meus dias E desejos Que enfrentei Quando tu mais Me fugias. EU DOU-TE BEIJOS Escritos Que se perdem No caminho... ............. E se o poema Me falta Fico ainda mais Sozinho. O BEIJO É emoção, É razão Descontrolada, Se não o dermos A tempo Pouco mais Será que nada. SEM BEIJO Não há amor, Sem amor Perde-se o beijo, A vida perde Sentido Quando falta O desejo, Por isso o lanço Ao vento Pra que atinja Como brisa E suave melodia Essa alma Que precisa De afecto Em poesia. ESSE BEIJO Que me falta, De que nunca Fui capaz, Voa pra ti Em palavras Na sua forma Mais pura Para que no Seu trajecto Voe, voe A grande altura E fantasmas Não o bebam Enquanto o seu Voo dura. MAS SEI Dos escolhos Da via, Dos perigos Que ele corre, Capturado Por fantasmas É beijo Que já me morre. NO DIA DO BEIJO Canto em voz alta A poética do amor Pra me redimir Dessa falta Com palavras Desenhadas Com a arte Do pintor. E PORQUE O DIA É teu Ganha força, Intensidade, Mesmo que Fantasmas O bebam É um beijo De verdade. O BEIJO Que não te dei Foi pecado Original, Hei-de sofrê-lo Pra sempre Como chaga Corporal. NÃO HÁ PALAVRAS Que bastem Pra repor O que não dei, Elas voam, Mas não chegam... .............. E mesmo assim Eu tentei. É CERTO QUE SEMPRE O quis, Só que nunca To roubei, A culpa foi Desse tempo, Dos dias em que Te amei, Um tempo Em diferido, Sem presente Nem futuro, Talvez beijo Sem sentido Porque queria Do mais puro, Tangendo eternidade Às portas Do Paraíso, Um beijo De divindade, Mas simples Como um sorriso. ESSE BEIJO Impossível Que não é do Foro humano Vou tentando Construí-lo Cada dia, Cada ano, Perdendo-me Pelo caminho Como sagrado Em profano.
"TORRE DE MARFIM"
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Nostalgia”. Original de minha autoria. Julho de 2023.

“Nostalgia”. JAS. 07-2023
SINTO A TUA FALTA, Eu sinto, Por isso, canto, Por isso, danço Até cair exausto No palco De um poema. SINTO O TEU SILÊNCIO, Que já nem Murmúrio é, Sinto um vazio Profundo De que o meu canto Faz eco, Um sofrido Contraponto Que da nostalgia Dá fé. RECORDO, E ainda sinto, O teu veludo De pele E, por isso, Eu o pinto Numa folha De papel. NÃO OUÇO BEM Essa tua melodia E logo fico Em silêncio Para melhor Te ouvir... ............ Com a minha Fantasia. FAZ-ME FALTA A tua voz, Faz-me falta O teu sorriso E como te quero Ouvir E como te quero Olhar Desenho-te Nos meus poemas Pois é disso Que eu preciso Para em ti Naufragar. NA TUA AUSÊNCIA Vejo corpos Que dançam Abraçados Ao sabor da Fantasia Em andamentos Sem fim, Vejo luzes, Vejo cores, Vejo-te a ti, Vejo, sim. EM CADA DIA Que passa, Sinto aromas De flores Que me fazem Companhia Neste palco Onde sinto No meu corpo O poder Libertador Da poética magia. REVIVO-TE No canto e Na cor, Na dança E no amor Dito em palavras Que sempre lanço Ao vento, Viajo em poesia Construindo Belas pontes Entre as margens Invisíveis Desta minha Utopia, Feita, sim, De sentimento. TUDO RECRIO Pra te reencontrar À distância De um poema, Cantar-te Com a alma, Dançar Com palavras, Chamar-te Em surdina Na esperança Que me ouças, Encantada, Num intervalo Feliz Dessa vida Mastigada Pelo peso Da rotina. VISITO-TE, ASSIM, Em viagem, Em sonhos Sonhados Pelo desejo De te ter, Procuro-te Cá do alto Desta torre De marfim Para te ver, Na teia Que a arte tece, O mais belo Camarim Onde a vida Acontece.

POETAR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Confissões no Jardim”.
Original de minha autoria.
Junho de 2023.

“Confissões no Jardim”. JAS. 06-2023
POEMA – “POETAR”
EU GOSTO
De poetar
Mesmo em rima
Interpolada
Porque uma vida
Sem rima
Não é vida,
Não é nada.
POESIA
É coisa séria,
Se canto
É só por isso,
Mas não sei
Lá muito bem
Se é estro
Ou é feitiço.
MESMO ASSIM
Cá vou rimando,
Tenho mesmo
De o fazer,
Cantar tudo
O que sinto
É um doce
Reviver,
É um renovado
Olá
A quem não posso
falar,
É uma forma
De dizer
O que não posso
Calar.
PARA MIM
É coisa séria,
Não sei se
Pra ela o é,
Eu sinto-me
Como matéria
De que o poema
Dá fé.
DIGO TUDO
O que não posso
Se um dia
Lhe falar,
Mas não sei
Se ela ouve
Este meu
Triste rimar.
SÃO POEMAS
De primeira
Pra poeta
Popular,
Não são cultos,
Não senhor,
São um modo
De abraçar.
É VERDADE,
Eu vivo dela,
Da palavra
Que me anima,
Fito sempre
Uma estrela
E parto logo
Prà rima.
COM RIMA
Finjo melhor,
Brinco
Com o que sinto
No peito,
Dou mais música
Ao poema
E, assim,
Ponho-me a jeito,
Digo sempre
O que não devo,
Mas finjo
Que me atrevo
A dizer o que
Não sinto.
É a vida
De poeta:
Digo a verdade,
Mas minto.

IDENTIDADE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Auto-Retrato”. Original de minha autoria. 18 de Junho de 2023.

“Auto-Retrato”. JAS. 18-06-2023
POEMA – “IDENTIDADE”
EU SOU QUEM SOU, Dizia Jahvé, Mas eu, Que também sou, Sou aquele Que, afinal, Ainda não sabe Quem é. OU SABE, Ao ter sido, Pois cada um É o que é Pelo que foi E será, Pela vida Que fizer, Do que da vida Fará. PARA ALÉM Do que eu sou, É para fazer Que existo, Pois o simples Existir Não chega Pra definir Da vida O seu registo. O QUE FOR Ver-se-á No caminho Que escolher... ............ Mas, vagando Pela vida, Será só O que fizer? E EU, Quem sou eu, Afinal? Sou aquilo Que fui Ou continuo O caminho, Com os outros Ou sozinho, Como desejo Constante De me encontrar Por aí, Sempre livre, Sempre errante Desde que De mim eu saí? SOU POETA? Sou pintor? Vivo feliz Na cidade? Sou Cidadão Do meu mundo Com incerta Identidade? NÃO SEI, Como dizia O poeta, Pois se só for O que fiz Não existo Como tal, Não sou mais Que cena nua, Desenho Feito a giz Por pintor Da minha rua, Filho de arte Banal. MAS EU EXISTO, Ou não, Para além Do que faço E do que Me vêem fazer? Só existo Em seu olhar? Sou aquilo Que pareço E nada mais Posso ser, Nada mais Posso criar? A VIDA É MAIS Do que aquilo Que pareces E se não fores O que és Nunca ela Te dará O que, afinal, Não mereces... OS OLHOS Dos outros Teus espelhos Serão, Ajeitas-te Para lá fora Ver O que, afinal, Pode ser Uma pura ilusão, Pois quando Regressas a ti Quebra-se O teu espelho E volta a solidão. EU QUERO SER O que sou E também o que Pareço Mas para ser O que quero É a mim que Obedeço. SER E PARECER De uma só vez Eis a minha Solução Mas se o parecer Te domina É melhor que Digas não.

O JARDIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Folhas Caídas”. Original de minha autoria. Junho de 2023.

“Folhas Caídas”. JAS. 06-2023
POEMA - "O JARDIM"
ENCONTREI-TE Nesse jardim Onde nasci Para a arte Das cores Que Athena Me deu E, por dádiva Dos céus Ou brilho Da tua estrela, Logo meu estro Cresceu... NESSE JARDIM De mil azáleas, Jasmins, Aromas E matizes sem fim, Era intenso O perfume Que me bulia Na alma E dentro de mim Brilhavam Essas cores Em seda pura, Fascínio Irresistível De luxuriante Pintura. VERDE, Rosa, Vermelho Ou lilás São cores Vivas Do meu gosto E nelas Vejo pintada Em moldura De arco-íris A beleza Do teu rosto, Do luminoso Levante Ao crepúsculo Do sol-posto. A VIDA Que vem daí É arco-íris Que teço Com a alma No jardim, É quadro Que pinto E canto, Luz intensa, Alquimia, É pauta Onde inscrevo Os traços Do teu encanto, Numa feliz Liturgia. CONFUNDO-TE Com sete cores, Vou atrás delas, Imparável Correria, E o mundo Fica para trás Na vertigem De voar Lá para o alto Do céu Ao som Desta nossa Sinfonia. ÉS COR, Perfume, És som, És risco Ou traço, Eu sei lá... .............. Sempre a voar Com a luz Do teu olhar Nessa arte Que seduz Como o murmúrio Do mar. QUANDO TE VI No jardim Trazias flores Impressas No corpo, Em pele macia, E as cores Eram tão vivas Que nelas Eu me perdia Pois disseste Com carinho E um olhar Tão seguro Que me querias Com afecto Que fosse, sim, Do mais puro... CAMINHASTE, Depois, Nesse luxuriante Jardim, Levando-me Pela mão Com brilho No teu olhar E eu, Com submisso Prazer, Deixei-me ir Com ternura, Simplesmente Por te amar.

REGRESSO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Ícone”. Original de minha autoria sobre esboço de Leonardo da Vinci. Junho de 2023.

“Ícone”. JAS. 06-2023
POEMA: “REGRESSO”
POR VEZES É insistente O tempo Vivo Da memória... REGRESSA Como passado, Insinua-se Como futuro, Incerto, Mas desejado, E não é tempo Presente Porque flui, Intangível, Sempre, sempre, Noutro lado. IMPÕE-SE À memória, Aviva, Desperta, Aquece, É desejo, Acontece, É vontade, É real, Porque o tempo É inelutável, Impiedoso E fatal. O BELO Que um dia Me tocou E seduziu Regressa, Agora, Desmedido, Incendeia-me A alma Como se a Despedida Não tivesse Acontecido... CHEGA JÁ TARDE, Mas chega, Como chegam Os fantasmas Que vivem Das viagens De fantasia Ao mais remoto Passado, Em forma De poesia, A redenção Do pecado. HÁ UMA IMAGEM Que persiste, Que se projecta No ar Como matriz Do meu ser Ou ícone Do meu altar. SILENCIOSA, Permaneceu Lá no fundo Da memória Em aparente Letargia, Tocando-me A alma Em forma de Nostalgia. É IMAGEM De perda Que nunca Se consumou Na alma Errante De poeta Que o tempo Não calou... E AQUI Estou eu A cantar-te, Com saudade, Perdido No tempo Da nossa fria Cidade Onde o vento Nos parou, Esculpindo-me Na alma A marca De um tempo Quente, Mas que nunca Mais voltou.

OLHAR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Teu Rosto”. Original de minha autoria. Maio de 2023.

“Teu Rosto”. JAS.05-2023
POEMA – “OLHAR”
QUE ME DIZES, Tão frontal, Olhar fixo, Penetrante, É chamamento, Sinal? NO SILÊNCIO, A tua voz É murmúrio, Melodia Seminal, Sinto-a Cá dentro De mim Como ponto Cardeal. E SÃO BELOS Os teus olhos, Sabem-me Sempre A mar, São ondas Do teu encanto Como cristais A brilhar. NÃO É AZUL Sua cor Mas de sol Que ilumina, Olhas pra mim, Meu amor, Quando navego À bolina. ÉS SEREIA, Vou-te ouvindo Em sinfonia De cor, Melodia Que me aquece Como fonte De calor. CABELOS Castanhos, Sopra aragem Sobre ti, Um suave Respirar, E eu tão Longe daqui Como a montanha Do mar. QUE PROCURAM Os teus olhos? Tua boca Balbucia Palavras Que me resistem Quando nelas Eu já sinto O que nunca Te diria... DIZES, SIM, Que não me Sentes? Dizes que Do poema Não és? De saudades Esmoreço Se não te vejo Chegar Quando chegam As marés. OLHOS Húmidos Que fascinam, Uma boca Que seduz, Teus cabelos Desafiam E eu, Poeta d’outono, Na mais pura Contraluz. OLHAS-ME, POIS, Inquieta, Sem estar À tua frente, Numa dorida Distância Que no silêncio Se sente E por isso Eu te digo Que o teu olhar Não me mente...

A PORTA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Porta”.
Original de minha autoria.
Maio de 2023.

POEMA – “A PORTA”
OLHO A MONTANHA
Da porta
E o granito
Amarelo
Com inúmeros
Cristais,
Olho o ocre
De um telhado
Como se estivesse
À janela
De um palácio
Encantado
Que do sonho
Fosse cais.
CONTEMPLO
A linha do horizonte,
Mas é diferente
A visão:
Antes, eu via futuro,
Agora, vejo passado,
Essa tão bela
Ilusão
De a ter sempre
A meu lado.
ENTRE PASSADO
E FUTURO,
É a minha
Identidade,
Ficou quieta
À minha espera
Quando dela
Eu parti
Ao encontro
Da cidade.
ELA É PORTO
De abrigo
E é lugar de
Partida,
É, pois, mais
Que uma porta,
É fronteira
Que eu passo
No desafio
Da vida.
E É ETERNO
Retorno,
Um regresso
Renovado
Onde posso
Renascer
Quando visito
A memória
Do que não
Quero perder,
Vendo a vida
Desse lado.
ESTA PORTA
É magia,
Viajo sempre
Por ela
Porque é uma
Janela
De onde voa
A fantasia.
DELA ALCANCEI
O mundo
E o mundo veio
Até mim,
Ao passar por
Esta porta
Sinto o meu
Horizonte
Como fronteira
Sem fim...
POR ISSO REGRESSO
A ela,
Esse pilar
Do meu ser,
Quando chego,
Logo amanhece,
E quando estou
De partida
Sinto que
O mundo
Acontece
Como a montanha
Da vida.

ORÁCULO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Luz”. Original de minha autoria. Maio de 2023.

“Luz”. JAS. 05-2023
POEMA – “ORÁCULO”
NO ORÁCULO Há uma árvore Iluminada Nos dias de ritual. Essa árvore és tu E eu a luz Que alumia Com o ceptro De cristal Do templo sagrado De Athena, Da arte A catedral. ÀS VEZES BRILHAS, Sim, Incendeias-me O estro No poema Em construção, Outras convocas A sombra E o silêncio, A árvore Entristece E também eu Me apago Em infausta Comoção. É BELA A ÁRVORE, Mas não dá frutos, Só beleza Luminosa E fugidia Quando em dias De ritual Te canto Com vigor E fantasia E o brilho Dos teus olhos Me acende Esta paixão Como pura Energia. SE NÃO TE VEJO, Apago-me Em submissa Tristeza, Falta-me o teu Olhar, De cada poema A luz, Do afecto A Incerteza. FLUI O TEMPO, Gasta-se a vida, Fogem de nós As palavras, O olhar Empalidece, Esmorece A alegria, O oráculo Já não acolhe O meu canto E, depois, Ah, depois, Regressa A rotina De cada dia... MAS A DEUSA Aguarda-me Impaciente E eu hesito Em chamar-te Ao ritual Com medo Que não me ouças E eu perca, Do oráculo, A magia Do seu ceptro De cristal... MAS EU TENHO-TE Dentro de mim E convoco-te Ao poema Para acender, Com a luz Do teu olhar, A árvore Inspiradora, Enquanto o canto Durar. NÃO RECUSES O chamamento, Não apagues Essa luz Que quer sempre Renascer, Deixa que eu Te cante E celebre Em cada amanhecer, Te acenda Na fantasia Nem que seja Por um instante Ou na voragem De um dia.

“Luz”. Detalhe
PERFIL
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Espanto”
(2021, 91x115, em papel
de algodão Hahnemuehle, 310 gr).
Original de minha autoria.
Maio de 2023

“Espanto”. JAS. (2021, 91×115, em papel de algodão Hahnemuehle, 310 gr). 05-2023
POEMA – “PERFIL”
AS LINHAS
Do teu perfil,
Tão singelas
Ao olhar,
Lembram-me
A tua voz
Quando te
Ouvia falar.
POETA,
Logo pintava
Essa tua silhueta
Com um secreto
Pincel,
Os traços eram
Palavras
Desenhadas
A caneta
Na brancura
Do papel.
PALAVRAS
Leva-as
O vento
(Era o que eu
Te dizia),
Mas ditas
Por um poeta
Gentil
(E eu nunca te
Mentia)
Ficam gravadas
Na alma
Se pintar
O teu perfil.
CRESCESTE
Como camélia,
Flor branca
Nas folhagens
Do Jardim,
E sempre que
Tu me olhas
Iluminas
De alvura,
Brilho intenso,
Cintilante,
Essa imagem
Que perdura
Mesmo quando
Estás distante,
Mas sempre
Tão perto
De mim...
PORQUE VIVES
No Jardim
Em ciclo
De natureza,
Regressas
Em cada ano
Para afastar
A tristeza...
DEPOIS PARTES,
Mas fica sempre
O teu perfil
Que me fala
Ao olhar...
..........
A ausência
Já não pesa
E as saudades
Esmorecem
Porque tenho
A certeza
Que um dia
Vais voltar.

OÁSIS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Sonho”.
Original de minha autoria.
Abril de 2023.

“Sonho”. JAS. 04-2023
POEMA – “OÁSIS”
SONHEI-TE.
Atravessava o deserto
Há muito,
Nada via
À minha frente,
Areia, só areia
No caminho...
.............
E uma miragem
Ardente.
NEM SABIA SE
Encontraria
Um oásis
Onde molhar
As palavras
E os lábios
Já gretados
Da aridez
Do deserto.
MAS HOJE SONHEI-TE,
De novo,
E reencontrei
O oásis perdido...
....................
Nas pupilas dos teus
Olhos.
TIVE-TE ASSIM
A meu lado,
Ofereci-te
Uma história
Onde conto
Como te perdi
E te conservei
No meu fio
De memória.
FALÁMOS DE ARTE,
Imagina,
E de como a vida
Nela se resolve
E se lê
Quando na força
Do sonho
Se confia
E absolutamente
Se crê.
SONHEI-TE
Esta noite
E acordei de ti
Embriagado,
Mesmo sem te ter
Comigo,
Ali mesmo,
A meu lado.
AH, HABITUEI-ME
A estar contigo
Em sonho
E em palavras,
A dizer-te
Em poemas,
A ouvir
O teu silêncio,
A procurar-te
Com o vento
Que te sopra
Na alma
Meus poéticos
Murmúrios...
TENHO-TE
Em palavras
Um pouco
Já gastas
E nem sei
O que seria
Encontrar-te,
Olhar de perto
Teus olhos
Negros
E profundos,
Sentir
O teu perfume,
Perdido
No mistério
Insondável
De tão enigmático
Rosto.
TALVEZ TE VOLTASSE
A perder,
Nesse instante,
Nesse dia,
Por excesso de ti
Ou por só já
Te reconhecer
Nas estrofes
Da minha confessada
E melancólica
Nostalgia.

LIBERDADE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Liberdade”. Original de minha autoria. 23 de Abril de 2023.

“Liberdade”. JAS. 04-2023
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE, Num dia De sol: “Voas comigo Prà linha Do horizonte?". Deste-me a mão E sorriste: “Voo, sim, Pois preciso De ar puro Lá bem no alto Do Monte”. E PARTIMOS. Tu levaste O arco-íris Que tinhas Dentro de ti E eu as letras Que tinha Comigo, Guardadas Na alma, Seu porto De abrigo. ENREDÁMOS Todas as cores Com linhas De palavras Deslaçadas, Construímos Asas em forma De verso E voámos No céu De um poema Pintado todo De azul... ANDEI CONTIGO Por lá Anos a fio, Vagueando Ao sabor da Inspiração, Levados Pela brisa Que sopra fria No Monte, Mas afaga O coração. E COMO GOSTEI De voar contigo, Livres como Pássaros Sobre o vale Onde te encontrei Um dia, Construindo Castelos Na areia Com a força Da magia. É ASSIM QUE EU Te vejo, Tecendo a vida Com sopro De alma E as cores Do arco-íris Pintadas Por tua mão Como pauta Colorida Da nossa bela Canção. FOI ASSIM Que nos dissemos Nesse tempo, Livres de amarras Que não nos deixam Voar, Traçando Em arte Um destino Marcado Pela vontade De fazer Da nossa vida Caminho De liberdade.

INESPERADO ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos inspirado no romance “Via dei Portoghesi”. Ilustração: “Piazza Navona”. Original de minha autoria. Abril de 2023.

“Piazza Navona”. JAS. 04-2023
POEMA – “INESPERADO ENCONTRO”
CHEGASTE SÓ, Em silêncio, Austera, Rosto crispado, Ficaste, triste, À espera Que te servissem Gelado... ............ Era outono Profundo E os sinos De Sant’Agnese Tocavam ali, A meu lado. VI-TE DISCRETA Chegar A esse bar Onde estava, Mudei logo De lugar, E, ao ver-te, Estranhava, Eras ilha No meu mar, Mas o brilho Dos teus olhos Fascinava, Não deixava Navegar. E DE NOVO Estremeci Desse olhar Tão penetrante Que, sem me ver, Me fitava Como olhar De amante. QUIS DESENHAR Essa tua silhueta, Tremeram As mãos do pintor, Voltou a voz Do poeta. Com palavras E com dor Voltei a ser O que era: Artista Com vocação De asceta. ESFUMOU-SE No olhar A beleza Do teu rosto E não pude Desenhar Esse perfil De que gosto. FICOU-ME A poesia Com as palavras Que tinha, Com elas, Eu bem sabia, Pintava quadros Em tela E pautas Com melodia. DEPOIS, PARTISTE E ombro a ombro Caminhámos, Estranhos Numa só via Por onde nunca Passámos. E ASSIM EU VOU Sonhando Histórias da utopia, Terão fim, Só não sei quando, Até chegar esse dia.

REENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Magnólia Branca”.
Original de minha autoria.
Abril de 2023.

“Magnólia Branca”. JAS. 04-2023
POEMA - REENCONTRO
ELA FASCINA-ME Como a magnólia Branca, Em Março, Lá no alto Da Montanha, Ali, a meu lado, Mistério Da natureza No meu Jardim Encantado. BRANCO SOLTO Em farrapos Delicados Que me libertam Do silêncio Invernal E convidam A voar Suspenso Num rio de luz Desenhado Num poema Onde a possa Cantar. E RESPIRO Com as cores Que ela Em silêncio Compõe Sobre folhas De papel Em forma de Aguarela Ou pintadas A pastel, Rápida E certeira, Como Hermes E Athena, Perfeita Geometria Que a alma Me serena Em suave Liturgia. É BELISSIMA E gosto De a olhar Cá de baixo, Da gruta Luminosa Das minhas Metáforas, Quieto, Em sintonia Com seu sorriso Doce Como um beijo De criança. ELA É MAGNÓLIA Branca Que me atrai Para encontros Fatais Com palavras Rebeldes, Vitais, Lá no alto Desse azul Infinito Onde sinto Que à beleza Proibida Falta a palavra Sentida Que um dia Se perdeu. POR ISSO, Nestes meus versos Regressa O que há muito Vou sentindo Como longa Melancolia Na forma De uma sofrida E tantas vezes Cantada Forte e doce Nostalgia.

SINESTESIA
Entre Riscos e Palavras
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Voo da Magnólia”- 91x115, em papel de algodão Hahnemühle. JAS, 2021. Abril de 2023.

“O Voo da Magnólia”. JAS, 2021. 91×115, em papel de algodão Hahnemühle.
POEMA – “SINESTESIA – Entre Riscos e Palavras”
RISCOS E CORES Saem espontâneos De minhas mãos, Voando Para dentro Da estrofe, Celebração Da beleza Em tempo de Primavera. BELEZA Que se expande Em poemas Filhos De um encontro Fatal Que fez nascer O poeta. DEPOIS, AH, Depois, Mais encontros Em verso E versos Em cor E traços E ruas Ou praças E amor Em corpos Desenhados À procura Do céu, Movidos Pelo desejo. CRESCEM Juntos, Os riscos E as palavras, Entrelaçados Em fugazes Diálogos Atirados Às nuvens. DEPOIS,VOAM No espaço Onde o poema Pousa Em equilíbrio Precário Sobre um ténue Risco Desenhado No azul Que se esfuma, Lento, No fio do Horizonte. PERDERAM-SE No real? Encontram-se Nas nuvens, Espaço Em forma De elipse E cores Em fuga Que deslizam Para o infinito. PINTOR, SALTO Para cima De um risco E nele voo Colado ao azul Do céu Com o poeta, Esse outro De mim. E PERDEMO-NOS Nas nuvens, Enlaçados Em raios De Luz À procura De formas Que projectem O olhar E a inquietude Da alma. SÃO ENCONTROS Imaginados Que nos elevam Ao céu Da inspiração Para recriar O que deles Nos sobrar. AH, SE TUDO FOSSE Harmonia Cá em baixo No vale Da nossa vida Não haveria Dor Nem riscos Nem cor Nem poeta Ou pintor Não haveria Palavras Nem resgate De almas Em constante Sobressalto...

SONHEI-TE COM PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Rubor” Original de minha autoria. Março de 2023.

“Rubor”. JAS. 03-2023
POEMA – “SONHEI-TE COM PALAVRAS”
ESTA NOITE EU Sonhei-te Num poema, Que no sonho Não te encontrava, Socorri-me De palavras Pra melhor Te evocar, Fantasia
Não faltava, Tinha mesmo De cantar. JÁ PASSARA Tanto tempo Que partira Do nordeste, Da terra Da utopia Onde um dia Te encontrei Perdida nesse Teu mundo, Ambiente Um pouco agreste, Um poço quase Sem fundo. COMO SE NA VASTIDÃO Do espaço Entre o sonho E a vida Já não houvesse Lugar Nem pra uma Despedida. QUE ESTRANHO Este sonho Em palavras, Não sabia Se sonhava Ou se compunha Um hino À alegria Por assim Te encontrar, Pois julgava-te
Perdida No poço Feito de sombra Onde eu sempre Te via, Onde te ia Buscar. QUE BOM FOI Ter-te sonhado, Recriar O que perdi, Virar tudo Do avesso, Reviver O teu sorriso E ficar-me por ali. ESTA NOITE Eu sonhei-te E gosto De o dizer, Foi como ter-te A meu lado, Como não mais Te perder. AH, QUE SONHO Eu sonhei, Com todas aquelas Palavras Onde logo te Encontrei, Ficaste colada A meu corpo Mesmo quando Acordei, Senti-te Dentro de mim, Uma brisa perfumada Que nunca mais Tinha fim... MAS DEPOIS Desapareceste No poço fundo Do tempo, Tua imagem Esbateu-se Na minha retina Já gasta, Tua voz era Silêncio De um som Que não ouvia, Teu olhar Foi desviado Para nunca Mais me ver, Braços caídos No corpo Para não me Abraçarem Nem que fosse Na memória Do que da vida Sobrasse, Do que resta Do teu querer. FOI ASSIM QUE Te sonhei, Ver-te um pouco Perdida, Comigo sozinho No cais, Tua alma Adormecida Em sonhos
Que pra ti eram
Mais do mesmo, Sempre iguais. ESTA NOITE Eu sonhei-te Em palavras Porque estás Longe de mim, Não foi por Vontade minha, Foi a vida Que o quis Porque a vida É assim...

“MARÇO”
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Neve e a Primavera”
(Pintura em papel de algodão e
verniz Hahnemuehle, 68x93, 2022).
Original de minha autoria.
Março de 2023.

“A Neve e a Primavera”. JAS2022. 03-2023
POEMA – “MARÇO”
GOSTO DE MARÇO,
Entre a neve
E a primavera,
Entre o branco
E as flores,
A chegada
De Perséfone,
O mistério
Que me atrai
Nessa fronteira
Do tempo
Que ainda não
Passou.
GOSTO DO BOTTICELLI,
Dos rostos
E dos corpos
Das três
Graças,
Feminis,
Volúpia de
Transparências,
Sensuais,
Primaveris.
GOSTO DO BRANCO
Da magnólia,
Dos seus farrapos,
E do branco frio
Da montanha,
Gosto
Dessa cor que
Que brilha
Nos meus olhos
E que sempre
Me acompanha.
GOSTO DE MARÇO
(Porque gosto),
Entrei nele
Contigo,
No signo do
Desencontro
Que se repete
Neste silêncio
Fatal,
Marcado
Contraponto
Desse tempo
Do meu canto,
Um “triste
Destino”
Que quase
Parece irreal.
PARA TI COLHIA,
Em Março,
Flores luminosas
E a inspiração
Crescia
Em estrofes
Desenhadas
Com a força
Da magia,
Fingindo sentir
O que dizer
Não podia,
Fosse só
Por duas horas
Ou fosse
Por todo um dia.
NO SIGNO
Do desencontro
Marcado como selo
Lá vou eu
Mais uma vez
Por aí,
Nem sei porquê,
Ou por falta de ti,
De braço dado
Com Botticelli,
Lá em cima,
Na Galleria,
Oráculo de arte
E templo
Da fantasia.
SINTO-TE PERTO,
Ah, eu sinto,
Depuro
A tua imagem
Em bissetriz
De mil rostos
Até se tornar
Ideia
De corpo ausente,
Dialéctica
Animada
De opostos.
DEPOIS REINVENTO-A
A cada instante,
Abraço-a
Com alma
De amante,
Pinto com
Palavras
O seu perfil
Ideal
E fixo-a
De novo
Neste meu
Jardim
De jogral.
AO ACORDAR,
No amanhecer
De cada poema
Verei que continuas
Em mim,
De olhos fechados
(Lembras-te?),
Como se fosses
Sonho do que
Nunca aconteceu
Naqueles dias
Passados.
ANDAREI
Por aí
(Os astros o dirão),
Vagando
E pousando
O olhar
No pólen
Da beleza
Sensível
À procura
De seiva fresca
Para desenhar
Poemas
E dar vida
Ao impossível.
LÁ NO ALTO
Te encontrarei,
Imitação
Dos dias
Da criação,
A construir infinito,
Onde, num adeus
Já sem fronteiras
Nem cais de partida,
Hás-de desenhar
Com a alma
As mil silhuetas
Ainda inacabadas...
...............
Ou talvez não!
MEU DEUS,
Como gosto de ti,
Em Março,
O mês da floração,
Quando a magia
Renasce
Para renovar
A vida,
Com a força da
Paixão.

MARMELADA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “ A Dança da Combustão”. Original de minha autoria. Março de 2023.

“A Dança da Combustão”. JAS. 03-2023
POEMA – “MARMELADA”
COMO GOSTO Da tua marmelada, Doce e acre Como tu, Sintonia No sabor Que me embriaga Os sentidos Como seiva Do teu corpo. GOSTO DA METAFÍSICA De confeitaria Porque me adoça A alma, Excelsos
Sabores Produzidos Com magia Nas tuas tardes De calma... SOU GULOSO, Como sabes, E como é doce E macia Esta tua Marmelada, Sinto-a Como alquimia, Como pura arte De fada. COMO, COMO, Sem parar, Sabe-me sempre Ao brilho Desses teus olhos, À espuma branca Do mar, Ao perfume Do teu corpo, Onde hei-de Naufragar. NESTA TUA Marmelada, Eu vejo-te Artesanal, Com os marmelos Nas mãos, Sabores Em harmonia, Receita conventual, Polpa moldada Por ti Com segura Maestria Na dança Da combustão, Cor intensa, Iguaria De frutos Abençoados Em doce Composição. TALVEZ A TENHAS Criado Em tempo De quietude Ou mesmo de Solidão (Que às vezes É virtude), Quando esvaece Esse lado Mais agreste E mais crispado Que te oculta A beleza Dos momentos De paixão. AH, ESSA TUA Marmelada É leve, É pura, Há pássaros Que te voam Na alma, Que dançam no Calor da Combustão, Um bailado Divinal Com frutos De perdição. VAI FICAR-ME Sempre vivo O sabor Por ti criado, Carícia Da fantasia, Dádiva, Prazer, Harmonia, Quase pecado, A vida Como reino Da magia Por deuses Iluminado.

TEU CORPO NUMA CATEDRAL DE PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Luz”.
Inspirada em Man Ray:
"Electricité:
Salle de Bains", 1931.
Original de minha
autoria. Março de 2023.

“Luz”. JAS. 03-2023
POEMA – “TEU CORPO NUMA CATEDRAL DE PALAVRAS”
VEJO-TE Desenhada A sépia, Nua, Numa catedral De palavras E ecoa Sobre mim, Entre altas Colunas Argênteas, O silêncio De uma poética Do pleno E do vazio Que me interpela Como metáfora. TEU ROSTO Esculpido Por sons Inaudíveis É a imagem Perfeita Para o oráculo De Athena, A deusa Que, em ti, Inspira A melancolia De meus poéticos Murmúrios. UMA DESCARGA Intensa De riscos E de luz Caiu sobre ti (Lembras-te do Man Ray?), Estampando-te Numa folha Nua, Onde expôs Esse teu corpo Aos ecos Do silêncio Para que o ouça Com a alma. SÃO RAIOS DE LUZ, São palavras Ou serão Os fantasmas De Kafka Que acariciam Com sofreguidão Esse corpo Que já saiu De ti E se perde, Levado Por eles, Levitando Sobre um caminho Que trilha, Sem saber, Ao sabor Do vento E de incerto Destino. E EU A VÊ-LO Levitar Para lugar Nenhum E a segui-lo (Não sei porquê) Com este rasto De palavras, Ponte Sobre um imenso Vazio Que une O desejo E o impossível. NÃO OUVES A minha Voz Interior Que responde Aos ecos Do teu silêncio E te chama? Não vês Que te procuro Sempre, Derramando Riscos E palavras Sobre um destino A que nunca Chegaremos? NÃO! BEM SEI Que não vês, Bem sei Que não ouves, Talvez porque Os fantasmas Bebem Os meus murmúrios Escritos Ao longo Do trajecto. Se visses E ouvisses Eu não estaria Aqui À procura Da sublime Redenção. Sem pecado.

A VELHA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Pintora e o Tempo”. Original de minha autoria. Poema inspirado numa frase atribuída a Clint Eastwood: "Don't Let The Old Man In". Fevereiro de 2023.

“A Poetisa e o Tempo”. JAS. 02-2023
POEMA – “A VELHA”
DISSESTE-ME UM DIA: “Não deixo A velha entrar, Da arte, É o segredo, Pois se a intrusa Chegar Vai o estro Declinar E eu entro Em degredo”. E ATÉ PODE SER Teimosa, Bater à porta As vezes que ela Quiser, Mas eu nunca Abrirei, Nem quando o sol Se puser. É ARTE A minha vida, E é cedo demais, É cedo, Pra ver A velha cantar O fado Da despedida. QUANDO O TEMPO Te captura Com a tenaz Da velhice, Pode tornar-se Sombrio E caíres Em solidão, Morte lenta, Indiferença, Uma implacável Descrença E não haver Redenção. A PENUMBRA É sempre lenta E dói, O tempo Não te socorre, Na sombra Ele corrói E quando os olhos Não choram É o futuro Que morre. A VIDA É movimento, Poesia, É canto, É choro, É melodia, Namoro, É ver pássaros Voar, É sentir “vento No rosto”, É receber E é dar, É construir O futuro Para nele Viajar Com asas De fantasia Para nos céus Navegar. MAS A VELHA Está cansada, Já só pensa No passado, Nada mais Lhe dá prazer, Só vê na vida Doença, Só vê na vida Pecado, Já nem sabe O que é viver. FICO VELHA Como ela Se a deixo Em casa Entrar, Recuso A atimia, Pois há vida Pra fruir, Há futuro Em cada dia E há tanto Para dar... E QUANDO Um dia Partir Para nunca Mais voltar, Parto jovem, Com a vida, E deixo A velha ficar.

TEMPO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Musa”. Original de minha autoria, Apud Gustav Klimt (Jovem Mulher, 1885). Fevereiro de 2023.

“Musa”. JAS. 02-2023
POEMA – “TEMPO”
QUE FARIA Se te encontrasse, Olhos nos olhos, Numa margem Deserta Do nosso passado? Que te diria Se te visse Caminhar, Airosa, Mas circunspecta, Ali mesmo A meu lado, Com esse rosto Tão belo, Tão brilhante, Acetinado? NÃO SEI, Porque não sei O que o tempo Fez de nós, Se petrificou Nas encostas Da memória A tua tão bela Imagem, Ficando Ainda mais sós Nesta já longa Viagem. TALVEZ ENCONTRO Impossível, Porque o tempo Transbordou E apagou As margens Do rio que Navegámos Entre escolhos Perigosos, Rápidos Sempre, sempre Imprevistos E como tu Revoltosos. MAS O RIO Já não tem água Nem murmúrios De corpos Por ela abaixo A vagar Até à foz Quente do mar, Melodia Do desejo A clamar Por um simples Lampejo Pra iluminar A viagem. E SE UMA FOZ Encontrasse Seria de um rio De palavras Em turbilhão A entrar Nesse teu mar Com a força Da paixão. MAS O NOSSO Já é um barco Fantasma Sem foz À vista E sem mar, Sem leito Pra navegar, Sem água Nem margens Para onde Transbordar. POR ISSO, Se te encontrasse Numa margem Deserta Desse tempo Já perdido Ou num porto De abrigo Do passado Que persigo Talvez eu Estremecesse, Mas seguiria Caminho, Com palavras E com contigo, Mesmo que fosse Sozinho.

O POETA E A MÁSCARA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Transfiguração”. Original de minha autoria para este poema. Fevereiro de 2023.

“Transfiguração”. JAS. 02-2023
POEMA – “O POETA E A MÁSCARA”
ENCONTREI UMA MÁSCARA Numa esquina Da minha vida, Pu-la no rosto Do poeta E ele não a Enjeitou. Ainda por cima Me disse: “Sou eu, sou, Como nas palavras Que digo Também meu corpo Mudou”. “NÃO ESPERAVAS Ver-me assim... É grande o teu Espanto, Vá, confessa! Ganhei um corpo De rosa, Tanta cor (A que apeteça), Um rosto Dissimulado Pra me curar Desta dor Sempre que ela Apareça A pedir o meu Cuidado”. “ADOPTEI Esta figura, Agora Mostro-me assim, As outras Nada te dizem, Com esta, Olhas pra mim”. “PALHAÇO É o que sou, Falo a Surdos e mudos Que não ouvem O que digo Nem respondem Ao que quero, Tratam-me como Mendigo Do que, afinal, Nem espero”. “VALHA-ME, POIS, Esta máscara, Assim rio Desta vida, Rio de ti E de mim, Da chegada Ou da partida, Dos abraços, Das palavras E, por fim, Da despedida”. “SOU PALHAÇO, É o que sou, Entretenho-me A cantar E se ouvires Este meu canto É poeta O seu autor, Por isso, tu Não t’importes, O que diz É, de certeza, Pra espantar Sua dor”. A MÁSCARA É o seu rosto, Colou-se-lhe Logo à pele Com a cola Do desgosto E por isso Já nem sabe Se esse rosto É o dele. ENCONTREI Uma máscara Vermelha No mercado Da minha vida, Ponho-lha sempre Que posso, À chegada E à partida, E se puder Não lha tiro Pra não lhe rasgar A alma Pois se o canto O liberta É a máscara Que o salva.

OCASO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Rasto de Luz”. Original de minha autoria. Fevereiro de 2023.

“Rasto de Luz”. JAS. 02-2023
POEMA – “OCASO”
CAMINHAVA SÓ No paredão E sentei-me, À tardinha, A olhar A solidão, O oceano E o sol Lá ao fundo A brilhar Sobre a linha Do horizonte, Em tempo de Baixa-mar. O SOL CRIARA Um caminho De luz, Mar fora, A entrar P'los olhos Dentro Nessa já Tardia hora. E CONVIDAVA-ME A segui-lo Com o olhar Em gesto De despedida. Era hora De sol-posto, Era hora De partida. A LUZ INTENSA Do sol, Longo rasto Luminoso, Incendiava O olhar De tão forte Ser a luz A refractar-se No mar. FIXEI Esse caminho E ouvi Da sua água Um suave Marulhar, Murmúrio Terno Das ondas, Melodia Luminosa Criada Para embalar. ERGUI DE NOVO O olhar Para o sol Que s’esvaía, Respirei E voltei A respirar Uma intensa Maresia. RUA DE LUZ Marinha A levar-me Ao horizonte Por círculo De fogo Aceso Em urgente Despedida, Ocaso Que anuncia Noites Passadas De sonho, Estranhas Formas De vida. ASSIM ME PARECE Ter sido A história breve Que contigo Eu vivi, A mesma faixa De luz, O mesmo círculo De fogo Que o horizonte Engoliu, O serpenteio De corpos No luminoso Caminho Que a ti Me conduziu... ATÉ QUE O SOL Se pôs Pra regressar De manhã, Metáfora Luminosa Do nosso encontro Fugaz Já tão perdido No tempo, Esse tempo Tão voraz. E O SOL Lá regressou, Mas vinha De outro lado, Sem suave Marulhar, Sem ondas Pra navegar Nesse brilho Ondulante Que um dia Me encantou A lembrar-me O teu mar, Esse ondear Cativante.

POEMA PARA UM ROSTO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria. Janeiro de 2023.

“S/Título”. JAS. 01-2023
POEMA – “POEMA PARA UM ROSTO”
ESTÁ LÍVIDO O teu rosto, Será sinal De pecado? É alvura Inocente, É espanto, É súplica Penitente Esse olhar Que me acende A alma E me faz sentir A teu lado? É SANGUE, É vinho Consagrado Esse rio Que desliza E te enlaça, Volúpia Ardente, Que abraça, Intensa Torrente De púrpura Sobre teus Cabelos de seda? AH, FORAM Estas mãos Lascivas Que te pintaram Como pecado De porcelana, Em brancura Irreal, Alma tingida De cal E em fuga Desta vida Para um mundo Venal Onde te sentes Perdida. PORQUÊ ESSE Sangue Ou vinho Mosto, Doce e quente, Espesso Como libido Ardente A brotar Da tua alma? ASSIM, SENTES-TE Gueixa Lá dentro De ti, Na cidade Proibida, Desde que eu Te perdi, Ao torno da arte Recriada Como imagem Em fina Porcelana Moldada. INVENTÁMOS, Eu e tu, Em tempos D’epifania, Esse perfil Em que te vias Na cidade Proibida, Eco do meu
Secreto desejo De te ter, Nua, despida. PECADO Em porcelana, A lividez De quem ama E sublima Quando a divina Beleza É rasgada Por intensa Volúpia carnal. MAS É BARRO, Frágil Como o amor, Como tudo O que vive Envolto Pelo manto Diáfano Do pudor. É PÚRPURA Essa alma Inquieta E incerta Que aflora, Intensa, Como desafio, Na tua boca Sensual... MAS AGORA Imagino-te Já liberta Desse rosto De porcelana, Alma quente, Corpo fremente, Magia Que brota, Insistente, Desta minha Fantasia. E VEJO-TE A fumar, Lânguida, Com esse bâton Já gasto A transbordar De teus lábios Carnudos, Ao rubro, Em insinuante Preguiça De abandono, Pronta Para te dares Com o corpo, Não a mim, Mas ao olhar Mágico Que recria Milagres íntimos Sobre a tua alma Tão incerta E fugidia. ENTÃO QUEBRO Em mil pedaços Essa porcelana E recrio a beleza Singela De um rosto Que me sorri Sempre que O acaricio Com as palavras Dos poemas Com que te vou Celebrando Nos dias incertos Da minha vida.

NEVA-ME NA ALMA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Montanha e a Neve”. Original de minha autoria. Janeiro de 2023.

“A Montanha e a Neve”. JAS. 01-2023
POEMA – “NEVA-ME NA ALMA”
ESPEREI POR ELA, A bela adormecida, Na montanha, Nesse dia, Lá no alto, Branca e fria, Finos Farrapos De seda A vestir-me A fantasia. ESSE BRILHO Cintilante Que sempre Desce Do céu E engole o Horizonte Pra me cobrir Como véu... A CHUVA MIUDINHA Caía E as finas Gotas geladas Pareciam Farrapinhos A descer Das cumeadas. ERA A MINHA Fantasia Que na alma Me fazia Esse intenso Nevar De tão forte Ser o desejo, De sempre Com ele sonhar. ESPEREI Pela tarde, Pelo brilho Envolvente
E a brancura cintilante Que sempre Desce do alto E me abraça Como amante. MAS NÃO, De manhã O céu Era azul e Transparente E a esp'rança Findou ali, Com o sol A despontar Quando triste Eu parti, Saudades De com a neve Brincar, Dos bonecos Que com ela Estava sempre A moldar. DISSE ADEUS À montanha, Mas prometi Lá voltar, O desejo É intenso, Mas não quero Que só na alma M'esteja Sempre a nevar.

A TURBA
Conversas com Manuel Bandeira
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Palácio das Artes
na Ilha da Utopia”.
Original de minha autoria.
Janeiro de 2023.

“Palácio das Artes na Ilha da Utopia”. JAS. 01-2023
POEMA – “A TURBA”
AH, MANEL,
Cedo demais
Eu cantei,
Dei vivas
À liberdade
Nas ruas e
Nas praças
Da cidade
Quando o tumulto
Da turba
Já se fazia
Ouvir
Nas catacumbas
Da vida,
Nesses lugares
Perigosos
Onde não
Podes sorrir,
Onde a cor
É proibida.
ERAM HORDAS
Revoltosas,
Caíram
Pesadas na praça,
Destruíram
A calçada,
Esse sagrado
Lugar
Onde estávamos
A ver
A nossa banda
Passar.
NÃO SAIO DAQUI,
Manel,
É melhor viver
De brisa,
Ao lado da
Anarina,
A fúria dos
Invasores
Não me deixa
Respirar,
Metralha
Os meus sentidos,
Já nem consigo
Voar.
CÁ NA ILHA,
Manel,
Há sempre
Uma brisa fresca,
Mulheres lindas
A sorrir,
Há flores,
Há rios
E também mar,
Há pintores
De tinta fresca
Que estão sempre
A pintar,
Há poetas,
Trovadores,
Há baladas
De embalar,
Há alegria
Sem fim
E música
Para dançar.
E POR ISSO
Eu cá fico.
Há muito frio
No ar,
Há muita arte
Perdida
Que temos
De recriar.
PROCURO, POIS,
A magia
Para celebrar
A vida
Em nome
Da liberdade
Com as cores
Da nossa ilha
Cantadas
Em poesia,
Que é canto
De verdade.
NA ILHA
Prossegue
O sonho
Em serena
Acalmia,
Por isso daqui
Não saio
Para cantar
E dançar
A valsa
Da liberdade
No palco
Da fantasia.

A VIAGEM
Conversas com Manuel Bandeira
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “S/Título”
Original de minha autoria.
Janeiro de 2023.

“S/Título”. JAS. 01-2023
POEMA – “A VIAGEM”
MANEL,
Tenho história
Pra contar,
O homem
Foi pròs steites,
Tinha pressa,
Desespero,
Tinha, pois,
De viajar...
É OUTRO MUNDO
O nordeste,
A vida é dura,
Pois é,
Mas tem muita
Brisa fresca,
À Anarina
Disseste,
Não faz de ti
Jacaré.
MAS VOLTÁMOS
Ao planalto,
Foi o povão
Que o quis,
O outro
Ficou irado,
Queria fogo
No país.
PLANALTO
Não é ilha
Nem sequer
É utopia
Como em terras
Do Piauí,
É barco
De grande porte
Onde agora
Viajamos
Com bússola
Que aponta
O norte,
Mas sem as
Belezas daqui.
FALTAM LÁ
(Eu bem sei)
As mulheres lindas
Da ilha
(Embora amigo
Do rei)
E não há um
Burro brabo
Nem pau-sebo
Pra subir...
...............
Ah, mas o outro
Já se foi
E voltámos
A sorrir.
ESTOU FELIZ,
Eu confesso,
E a Pasárgada
Voltarei,
Ao mar calmo
Da nossa terra,
A que, livre
Como o vento,
Sempre escolheu
O seu rei
Para não fazer
A guerra.
AGORA
Já somos livres
E não sibilam
No ar
Silvos de armas
Perigosas
Que nunca
Quisemos
Ouvir
Nesse fúlgido
Jardim
Onde as rosas
Estão sempre
A florir.

“S/Título”. Detalhe
ÊXTASE
Poema de João de Almeida Santos Inspirado em “Le Phenomène Futur”, de Stéphane Mallarmé. Ilustração: “O Sonho”. Original de minha autoria. Um de Janeiro de 2023.

“O Sonho”. JAS. 01-2023
POEMA – “ÊXTASE”
QUANDO TE SONHO Eu vejo sempre Esse teu corpo Maduro Num tempo Que já passou, Êxtase de ouro puro, Riqueza Que já findou. TEUS CABELOS Negros São moldura viva De um rosto Que ilumina A nudez cruenta De teus lábios... ............. E me seduz. É VÃO O VESTIDO Que te desenha O perfil, Teu corpo nu É mais leve, Como vento, É macio, É veludo, Levita Em perpétuo Movimento. TEUS OLHOS SÃO Pedras raras Em refracção, Vitrais Iluminados, Liturgia, Oração. MAS TEU OLHAR É reflexo intenso Da tua carne Viçosa, Fremente, E põe-me Sempre febril, Agitado E ardente. SEIOS NUS... Ah, teus seios Eriçados, A transbordar De leite eterno, Halos Apontados ao céu, E eu, criança, Aninhado No teu ventre, Como em Ventre materno, Num tempo Que é só meu. TUAS PERNAS Macias e quentes Sabem ao sal Do primeiro mar Onde navegámos Ao sabor Do desejo Em ondas Alterosas De tanto em ti Eu pecar. TUDO SONHO E volto a sonhar, Já desperto, Com o sol Nas pupilas Fascinadas, A brilhar. E SINTO-ME AINDA Em teu colo, Sorvendo A branca Eternidade Que brota Abundante de ti, Com o mundo Para lá da Vaga alta da Montanha Onde os deuses Me devolvem O que de ti Eu perdi.

SINFONIA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Rapsódia”. Original de minha autoria. 25 de Dezembro de 2022.

“Rapsódia”. JAS. 12-2022
POEMA – “SINFONIA”
ENCONTREI-AS, As palavras, Dispersas No meu jardim Sob frondoso Arbusto Num dia quente De verão. Aguardavam Que chegasse Pra insólita Missão. EU NADA SABIA Delas, Nesse lugar Encantado Onde o sol chega Intenso, Mas por ramagem Coado. FORAM TAMBÉM As palavras Lapidadas Pelo tempo Que passa Na folhagem Do arbusto? A FOLHAGEM É como o tempo, Coa a força Do sol Quando ele é Mais queimante, Quando o verão Aperta mais, Quando a terra Nos oferece Os seus frutos E o mais. O QUE ELAS Mais queriam Era asas De fantasia Pra serem Lançadas Ao vento, Mensageiras Devotadas, A liturgia Do tempo. QUANDO CHEGUEI Estavam Em sobressalto, A vaguear Por ali, A trepar nas Cameleiras, Nas hortênsias, No jasmim, Nas magnólias E roseiras, Esse outro lado De mim. AGUARDAVAM O maestro Para uma prova De orquestra Com ritmo Bem entoado Ao sabor Desses aromas Do meu jardim Encantado. FEZ-SE SILÊNCIO, Então, Eu levantei A batuta De maestro Inspirado E logo o poema Nasceu, Sinfonia De palavras, Nesse templo Consagrado. VIERAM Mil borboletas Pintadas De vivas cores A ouvir A melodia, A toada dos Meus versos, Uma bela Sinfonia. E, HOJE, No inverno Deste dia, E nos deuses Inspirado, Aqui as lanço Ao vento Para cumprir Seu desejo E para cumprir O meu fado. AH, SE NÃO HOUVESSE Palavras, Que destino O meu seria, Como recriar O passado, Esse tempo Em que sentia As dores frias Do pecado? FELIZMENTE HAVIA Riscos, Havia cores E melodia, Havia Flores E aromas Pra pintar O que sentia No mais profundo De mim, Com arte, Com poesia, E tudo o mais Que havia Na magia Do Jardim.

“Rapsódia”. Detalhe
O ECO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Montanha”. Original de minha autoria. Dezembro de 2022.

“A Montanha”. JAS. 12-2022
POEMA – “O ECO”
QUE ESTRANHO, Este sonho, Ver-te só, Perdida Na vastidão Da montanha, A vaguear, Perfil de mulher Que tenteia À procura do eco Libertador Que tarda sempre A chegar. PROCURAS, Ó deusa Dos meus sonhos Revelados, A melodia Lá no alto Como eco Ou como brisa Que te há-de Inspirar, A que um dia Se cobriu de De uma espessa Neblina Sem farol Pra na arte Navegar? EU SEI Que te procuras Do lado de lá Da rotina Que nunca Te abandona E te oprime Como fado Ou como sina. ÉS IMAGEM Da beleza Que sofre Dentro de si A mais funda Solidão Lá no alto Do desejo, Com vida Em gestação. É PURO SONHO, Bem sei, Mas os sonhos Anunciam Fantasia, A que sempre Procuramos Nos lugares Que visitamos Pra que ela Nos seduza Com a sua Melodia. E O MUNDO Vem logo atrás E entra Pela porta Ou mesmo pela Janela Para pintarmos A vida Como se a vida Fosse Uma bela Aguarela. NESSE DIA Subiste À montanha, Sozinha, Com a criança No ventre A clamar Para o vale Que o mundo Ia chegar Com a forma De um eco E com intenso Vibrar... E CHEGOU Como eco Do desejo Ou do sonho Que inventaste Para quebrar A rotina E pintar A tua alma Numa tela Que encontraste Perdida Na neblina. ELE CHEGA SEMPRE, O mundo, Não sabemos É como chega, Se é tela Ou papel, Se é pauta Ou é pedra Onde esculpir O desejo Com aquilo Que nos sobra Do que perdemos Um dia, Do que fomos Ou até do que Seremos Nos voos Da fantasia.

SOLIPSISMO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Parousía”.
Original de minha autoria.
Dezembro de 2022.

“Parousía”. JAS. 12-2022
POEMA – “SOLIPSISMO”
PROCURO
Reinventar-me
Sobre os escombros
De uma cidade
Invisível,
Perdida
Num tempo
Que não é meu.
OS DEUSES
São meus amigos,
Sustêm
A vertigem
Com que me pinto,
Alma inquieta
De poeta
Ou de pintor
Invocativo
Do que sinto,
Em traços,
Em cores
Ou em palavras
Que resistem
Na fronteira
Das rugosas vielas
Da vida,
Tão banal e
Rotineira,
Lugar de uma
Eterna
Despedida.
E COM ELES VOO
Por dentro
De mim,
Enlevado,
Para além
Do agreste
E estreito
Sendeiro
Que encolhe
A liberdade
Nas ruínas
Do passado...
.............
Pra não ficar
Prisioneiro.
VEJO-ME, AGORA,
Triste por fora,
Mas sinto-me
Quente por dentro,
A transbordar,
Ao rubro,
Em viagem
Ao centro
De um magma
A flamejar
Que me alimenta
O desejo
Em eclosão,
Que se acende
Em cores vivas
No mar
Encrespado
Da minha
Imaginação.
QUE SONHO,
Nesta viagem?
Que entro no meu
Mundo
Mais recôndito
Por uma nesga
Escondida
Nas muralhas subtis
Da minha alma,
A sonhar,
E que viajo
Sob um azul
Que me cobre
Como véu
O desejo de voar...
E ENTÃO VOO
E sigo
O luminoso
Caminho
Que se acende
Nos meus olhos,
A brilhar,
E me leva
Aos céus
Da fantasia...
...........
Para te
Reencontrar.
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ENTRE RISCOS E PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Voo da Magnólia”. Original de minha autoria (91x115, em papel de algodão Hahnemuehle, 2021). Dezembro de 2022.

“O Voo da Magnólia”. JAS. 2021.
POEMA – “ENTRE RISCOS E PALAVRAS”
MOVIDO Pela musa fugidia, Riscos e cor Saem Das mãos Do pintor Voando para o Poema Onde o verso E a estrofe São a sua melodia. SÃO ENCONTROS Em ruas E praças Lá no alto Da emoção, São cores E traços De união, São abraços E são rostos Esboçados, É sentir
Muito lá fundo Em poemas Figurados. CRESCEM JUNTOS Os riscos E as palavras Enlaçados Em fugaz Sinestesia, Lançados Às nuvens No céu Do desejo, Em voo De fantasia. RISCOS Sobre cores, Palavras Com sabores, Melodia Com a alma Desenhada, Amores Caídos No poço fundo Do nada. MAS VOAM, Oh, se voam, No espaço Onde o verso Pousa Em equilíbrio Precário Sobre um ténue Risco Preso ao azul Que se esfuma, Lento, Por entre Seus dedos Famintos... ........... Como se fosse
Espuma. PERDEM-SE No real, Mas encontram-se Nas nuvens, No espaço Sideral. E ELA, A musa fugidia, Belíssima, É rápida A saltar Para cima De um risco E nele voar Colada ao azul, Com o poeta Cá em baixo A murmurar: - "Deus meu, Como se pode Não amar!" ELA RESPIRA Nas nuvens, Em raios De luz Enlaçada, Voando No horizonte À procura... ........ De nada. E LÁ REGRESSA, Uma vez mais, Dorida, Em eterno retorno, Ao cais, O seu ponto De partida. SÃO ETÉREOS Os encontros Que acontecem No céu Da inspiração E o poeta Desenha Com palavras Coloridas O que sobrou Do que lá Aconteceu... ....... Em vão. AH, SE ELE A encontrasse No tempo certo Fora do poema, A tiritar De emoção, Não haveria Cor, Não haveria Riscos, Nem dor, Nem chão Que alimentasse As palavras Com que o poeta Corre Atrás do infinito Onde nunca Há-de chegar, A não ser Com as linhas Em fuga Que lhe saem Da alma E do olhar...

O POETA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Poeta no seu Jardim Encantado”. Original de minha autoria. Novembro de 2022.

“Poeta no seu Jardim Encantado”. JAS. 11-2022
POEMA – “O POETA”
O POETA Perdeu a musa Porque alguém Lha levou, Conta, por isso, Histórias Que para si Inventou. RENASCE Na fantasia Essa musa Que já teve E desenha Em palavras Sua figura De neve. MAS ELA DERRETE Ao sol Com esse brilho Fatal E o poeta, Desnudado, Sai do trilho, Perde o rumo, Cai em tristeza, Calado, Em seu pobre Ritual. VOLTA COM ELA Ao poema, Quer trazê-la Ao regaço, Com melodia A chama Lá de cima Do terraço Pra se curar Do seu drama. MAS ELA Não lhe responde, Fica muda, Olhar baço, E ele, com alma Vazia, Lá vagueia No jardim, Respirando O aroma Do seu eterno Jasmim. E ASSIM ELE RESISTE De poema Em poema Construindo O futuro, Alimentando A alma De um vaguear Do mais puro Onde a palavra Liberta Desse vazio Escuro Quando a solidão Mais aperta. LIBERTA, SIM, Da pressão Que o poeta Sente no peito, É liberdade A valer E por isso É mais que jeito, Não é flor, É jardim, O seu abrigo Perfeito, Clama Por fantasia E ouve a voz Do passado, Não é mar, É maresia, Da vida É mais que Fado, Não é prosa, É poesia O que canta Nesse jardim Recamado. DEBRUÇADO Na janela, Em seus vidros A revê E com espanto Pergunta: - A que vejo É mesmo ela? Mas nisso Já ele nem crê, Pois a musa Do poema É a sua aguarela, Pintura Que sempre vê.

O VÉU
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Musa”. Composição minha sobre desenho de Gustav Klimt (1885, Zwei Studien einer jungen Frau). Novembro de 2022.

“Musa”. JAS. 11-2022
POEMA – “O VÉU”
FOI UM RAIO Fulminante, Havia sombras No Céu, Atingiu-me Nesse instante, Fiquei preso A um Véu Invisível Ao olhar, Feito de Seda fina Que ninguém Pode rasgar. UM CLARÃO Foi o que vi Lá bem no alto Do céu, Temi que fosse Castigo, Pois a terra Até tremeu, Mas era de seda O abrigo, Refúgio Que era só meu. NESSE INSTANTE Te inventei, Julgando saber O que queria, Esculpir-me A teu lado Nesse véu Onde vivia. COBRIA Todo o meu corpo Era prisão Que não via, Feito de fios De seda, O véu Era o que Sempre sentia. FOI INTENSO O momento Em que inventei O caminho, Fui levado Pelo vento Pra não me sentir Sozinho. COMO ERA MACIO O véu, Desenhava Os movimentos E quando olhava O céu Voava Por uns momentos E então eu lá subia Para ver Se te alcançava, Mas de tanto Te olhar Já nem o céu Me chegava... FOI DESSE CLARÃO Que saiu O meu encanto De vida Que resiste Às tempestades Como a paixão Proibida. E ASSIM EU VOU Tecendo A malha do Meu viver, Vivo em exaltação Simplesmente Por te querer.

VENTO DO DESERTO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria. Novembro de 2022.

“S/Título”. Jas. 11-2022
POEMA – “VENTO DO DESERTO”
IRROMPESTE No meu poema Como Rosto Esculpido Em pedra lisa, Num dia De encruzilhada Entre o que foi E o que será. TEU ROSTO Marmóreo Resiste, Impenitente, Ao vendaval De palavras Que o vento, Insistente, Vai soprando Sobre ti. SCIROCCO, Vento espesso, Areia Quente Vinda de longe, De um deserto De palavras Que não tem Fim... MAS É MACIO O turbante Que te cobre Suavemente Como tecido De mensagem Cifrada De quem te chama E te sente Como deusa Ou como fada. E TU ESCULPES Com tuas mãos Essa mensagem Que pousou Levemente Sobre ti, Pó do deserto, Palavras Sem oásis À vista, Aridez, Areia fina Vinda do céu... SAIU UM GÉNIO Da lamparina E o vento Trouxe consigo A Medusa Para te petrificar? É, SIM, AREIA FINA A que te marca O perfil Neste longo Poema Que, eu, Do lado de cá De onde o vento Sopra, Vou construindo Dentro de mim, Com estas letras (Os meus riscos De areia), Iluminado Pelos mil espelhos Do caleidoscópio Onde observo O teu luminoso, E lento Entardecer. MAS OS TEUS São riscos A três dimensões E assim te afago De longe Com estas mãos De poeta triste Em busca De um rosto Que dê forma Ao desejo. TALVEZ SEJAS Pedra esculpida, Medusa De ti própria, Sem saber Que quanto mais Te desenhares Com areia fina Do deserto Mais poderás Subir Ao Olimpo E levitar Sobre estas mãos Que, de longe, Vão acariciando Com palavras Esse teu rosto De pedra, Em busca De redenção.

RIO DE PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Cascata”. Original de minha autoria. Novembro de 2022.

“Cascata”. JAS. 11-2022
POEMA – “RIO DE PALAVRAS”
NO MEU JARDIM De cristal Fluía, Torrencial, Entre Rosas (Em “arabesque”), Magnólias, Camélias E um Arbusto (Que tu me deste), Um Rio De Palavras Para uma foz Onde nunca haveria De chegar (Nem sequer Com um de nós). METÁFORAS Líquidas, Revoltas, Corriam Vertiginosas Em seu leito Até embaterem Em feixes de riscos, Ilhas de cores, Traços dispersos, Fugas, Amores (Ditos em versos, A meu jeito). E TRANSBORDARAM Do leito Para as margens, Espraiando-se Em liberdade E sem destino, Atraídas Pelo perfume Difuso E subtil De novas cores Que se desprendiam, Intensas, Do pincel de seda Com que esboçavas Um novo leito Por onde o rio Correr, Suavemente, Como murmúrio Líquido De palavras Inventadas Num qualquer Alvorecer... MAS O PERFUME Foi levado Pelo vento Que te soprava Forte Na alma Para incertas Paragens Onde cantar Eu não podia. AH, COMO É FLUIDA A vida E imprevista A despedida De um rio Que sai de nós, A vagar, À procura De foz Onde possa E onde queira Suavemente Chegar. MAS NO MEU JARDIM De cristal Flui ainda, Intenso, Esse rio, Com seu caudal De palavras, À procura De leito macio Por onde possa Livremente Navegar E de suaves Margens Inundadas De cores vivas, Luminosas, Para onde Transbordar. O MEU RIO De palavras Corre de novo, Corre sim, Pra foz incerta, Sem parar, Pois errante Na neblina Da vida É teu próprio Caminhar.

O TERRAÇO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Terraço”. Original de minha autoria (2022,
119x119, Mold/madeira/artglass, papel Hahnemuehle, 100% algodão). Outubro de 2022.

“O Terraço”. JAS. 2022 (119×119, papel Hahnemuehle, 100% algodão).
POEMA – “O TERRAÇO”
É DAQUI, Deste terraço, Que eu te vejo Com a forma Intangível Do desejo. SILÊNCIO, Essa tua melodia, Nuvens, Espelho
Da tua alma, Um lustre Que ilumina, Céu dourado, Utopia, Minha sina, Meu pecado, O que em ti Eu sempre via. MAS É DAQUI Que te sonho, Uma fresta Para o céu, Um olhar Que não tem fim, É daqui Que eu te quero Sem limites No poema E perfume No jardim... COM PALAVRAS Te olho sempre De frente E tão altiva Te vejo, És arbusto Que me sente Pois em ti Cai o desejo. É DAQUI Que eu não saio Quando parto Para longe, É aqui Que eu te tenho Nas raízes Do que sou, É pois aqui Que te quero Esteja ou não Onde estou. VER-TE Sem te tocar, Beijar-te Com os olhos Numa noite De luar, Dormir contigo Ao relento Para melhor Te sonhar... VÊS Como é simples E não Pecaminoso Gostar Assim tanto De ti? A mim basta, Neste encanto, Ficar-me, Simplesmente... .............. Simplesmente, Por aqui...

OLHAR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Olhar”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2022.

“Olhar”. JAS. 10-2022
POEMA – “OLHAR”
QUE ME DIZES,
Tão frontal,
Olhar inquieto,
D’espanto?
É chamamento,
Sinal,
É resposta
Ao meu canto?
A TUA VOZ
É murmúrio,
Melodia,
É música,
É sinfonia,
É orquestra
A tocar...
E são belos
Os teus olhos,
Porque me sabem
A... mar,
São ondas
Na minha alma
Por onde
Vou navegar.
NÃO É AZUL
Sua cor,
Mas de sol
Que ilumina,
Olhas pra mim,
Meu amor,
Se te navego
À bolina?
CABELOS
Desalinhados,
Sopra o vento
Sobre ti
E em seu intenso
Soprar
Ficas tão longe
Daqui
Como a montanha
Do mar.
QUE PROCURAM
Os teus olhos?
Tua boca balbucia
Palavras
Que ao silêncio
Se votam
Até que a alma
Sorria...
QUANDO NELAS
Leio a pergunta
Que nunca,
Ousando,
Faria,
Dizes, sim,
Que tu não sentes
O que eu
Nunca te diria?
DIZES QUE NO
Poema
Já saudade
Tu não és,
Algo que devo
Esquecer ...
.............
Se não vierem
Marés
Onde te sinta
Crescer?
TEUS OLHOS
Húmidos
Fascinam,
Uma boca que seduz,
Teus cabelos
Desalinham
E eu,
Poeta d’outono,
Na mais pura
Contraluz...
OLHAS-ME, POIS,
Inquieta,
Sem estar
À tua frente,
Uma dorida
Distância
Que no silêncio
Se sente,
Mas por isso
Eu te digo
Que o teu olhar
Não me mente.
QUE ME DIZEM
Os teus olhos
Hoje, assim,
Tão de repente?

ENCONTROS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Onírica Nudez” Original de minha autoria (sobre
foto, anónima, em contraluz, da
minha colecção privada). Outubro de 2022.

“Onírica Nudez”. JAS. 10-2022
POEMA – “ENCONTROS”
TARDO A ENCONTRAR-TE Porque já não sei Como procurar-te Levado Por um poema... NÃO É VONTADE Decidida, Mas destino que marca Os passos que Darei Na estreita Vereda da vida... ............... Ou aqueles que Eu nunca ousarei... E TU SABES Que não sei, Mas sabes Por onde andei E por onde Me perdi À procura Do que não Queria ter Para preservar O que o tempo (Ah, sempre o tempo) Haveria de Esculpir E em meus Poemas Guardar. UM DIA Encontrei-te No fim de um caminho Que já nem sei Se trilhei Antes de qualquer Início Ou se o abandonei Como se fora Vereda fatal De um tentador Precipício... ÀS VEZES, Reencontrava-te, sim. Encontros fugazes, Onde o teu brilho Começava a cegar Por fora, Mas a iluminar Por dentro... .............. Para te poder Cantar. MAS JÁ NÃO SEI Se te hei-de querer Para nunca Te ter, Sentir saudades Ao amanhecer Do teu perfume Na memória fresca Dos afectos Indefinidos, Os mais perfeitos E sentidos. SIM, DEIXO-ME IR Nas mãos lentas Do destino, Mas há sempre Um sobressalto Quando o real Nos atropela Por dentro E tudo se torna Inóspito... ......... Por fora. SE NÃO ME DEIXO IR Viajo para outros Lugares, Tenho sempre De viajar À procura de mim, Dum espelho onde Me veja por dentro A olhar-te Por fora, À espera do próximo Sobressalto... ................. Que nunca demora. AH, COMO ME FALTA Esse véu Que te dissimula O rosto Quando te quero Pintar com palavras E logo te vejo Nua, Com a alma A tiritar... MAS EU CONTINUO A procurar-te Com disfarçado E tímido olhar (Como quem Não te quer), Perscrutando-te, Na memória, A alma pura Que se aninha Em ti Para te proteger Do risco da beleza Exposta Como fractura, Aquela que os poetas Cantam Quando sentem a Liberdade Por perto. TALVEZ A NOITE Te sirva de véu E te cubra as cicatrizes Da vida, Luz coada Pela penumbra Que te amacie A pele Encrespada e Te devolva como Sonho Acetinado Onde te reinventarei Como mulher Desejada... ................. Para além do bem E do mal. MAS EU NÃO SEI, Tenho medo Dos sobressaltos, De ser atropelado Na esquina de um Inocente Jogo sedutor Que te cative a Alma em fuga Para o infinito Que se cruza Nos nossos olhares... .............. Cada vez mais Intermitentes. E AGORA TARDO Outra vez A reencontrar-te No bulício dos Meus dias Até que no amanhecer De um poema Perfumado Te surpreenda De novo Simplesmente nua E te diga, Com olhar submisso: "Esta visão matinal É o sonho revelado De um poeta-pintor Que nunca ousou Desenhar-te Como prova (Não provada) De seu tão incerto (E obstinado) Amor..."

FUI CONTIGO PRA PASÁRGADA
Poema de João de Almeida Santos. Recriação do diálogo com o poeta brasileiro e nordestino Manuel Bandeira (Poemas: “Vou-me embora pra Pasárgada” e “Brisa”), quatro anos depois da primeira publicação, em Novembro de 2018. Ilustração: “Pasárgada II”. Original de minha autoria (119×119, c/mold., 2022). Outubro de 2022.

“Pasárgada II”. JAS, 2022 (119×119).
POEMA – “FUI CONTIGO PRA PASÁRGADA”
FUI CONTIGO Pra Pasárgada, Para o teu mundo, Irmão, Eu não me sentia Livre, Faltava Inspiração Porque a brisa Do nordeste Ficou lá No Maranhão. NÃO TENHAS, Manel, Saudades, Nostalgia do futuro, Temos passado Que baste E foi, sim, Foi muito duro. FUI CONTIGO Pra Pasárgada, Não quis Ficar por aqui Porque a brisa Do nordeste Não passou Do Piauí. PRA PASÁRGADA Eu quis ir, Prà terra da Liberdade, Por aqui Já me faltavam As cores vivas Da verdade. EU GOSTO DE TI, Ó poeta Do reino Da utopia, O teu tempo É o futuro e Lá se faz Poesia, Se pinta, Se canta E se dança Porque o ar É do mais puro E cheira A maresia. NÃO GOSTAVA D’estar aqui, O ruído Era demais, Esta terra Já não servia E lá partimos Do cais... FUI CONTIGO No teu barco, À procura De mar calmo, Céu sereno E tudo o mais, Navegando No azul, Peixes voando No mar, No horizonte Uma ilha, Mulheres lindas A acenar... EM PASÁRGADA Fui feliz Cantei e Dancei Até alta Madrugada, O corpo Deixava-se ir Com alma Apaixonada Em regaço De mulher E ao ritmo De balada. POR AQUI Era grande O ruído, Com armas A crepitar, Matavam poemas Com gritos, Já não se podia Cantar... FUI CONTIGO Pra Pasárgada, Meu mestre De poesia, Lá cantei Os teus poemas Fosse noite Ou fosse dia... AGORA QUERO Ficar, A esperança regressou, Quero contigo Cantar O que o vento Me levou. MAS NÃO SEI Se o vento traz Céu sereno Às canções, Por isso contigo Rezo Minhas pobres Orações Pra que a brisa Chegue aqui E não fique Lá retida Nas terras do Piauí.

PRESSENTIMENTO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Travessia”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2022.

“Travessia”. JAS. 10-2022
POEMA – “PRESSENTIMENTO”
MAIS UMA VEZ, Ao entardecer, Te pressenti, Numa rua de Lisboa... .................... Mas não te vi. AH, ESTA LISBOA Que amas... .................. Uma silhueta fria Na cidade, Uma travessia, Um homem Que passa, Perdido Em memórias Que se esfumam No tempo E deixam A alma vazia. DEUS EX MACHINA Que desce No caos Em que a vida Se tornou, Nos afectos E na dor... ............... Para pôr ordem Nas desordens Do amor... CAÍSTE-ME, Como num palco Ou numa encruzilhada Improvável, Quando vinha Da imensa planície Onde os deuses Se anunciam No horizonte A cada amanhecer... UM SÚBITO CLARÃO, Um sobressalto... E eu estremeci. Irrompeste, Intempestiva, Das brumas Da memória... .......... Mas apenas Te pressenti. INCAUTO, Aproximei-me Do teu mundo, Sem saber? Foi o destino, Adormecido Que andava De nunca, Mas mesmo nunca, Te rever? ESTRANHOS Desencontros Que desabam Sobre nós, Com os astros A governarem O labirinto Insondável Das nossas vidas. SILHUETA FUGIDIA, É o que és, Nesta longa Travessia, Neste ver-te De través, Nesta minha Liturgia. VI UM NÚMERO, A única certeza Que tenho, Mas incerto Como todos Os números Deste "mundo Inumerável". INCERTO, SIM, Porque tu Não és número Que me dê Certezas, Para além da dor... .............. És mais quatro Do que sete, Meu amor. TALVEZ TENHA SIDO A minha fértil Imaginação, Já um pouco doentia, A cruzar-se Contigo Num inesperado Lance de magia. MAS NEM SEI Se é por ali Que tu andas, Porque de ti Nada sei, Só o que me sobrou Daquele tempo E do tempo Que criei Para nunca Te perder, A história Que te conta Para nela Renascer. QUE ESTRANHOS Lugares de Desencontro, No meio da multidão, Um instante Que irrompe Quente Como lava De vulcão, Um regresso Improvável Cada vez mais Espectral Em película subtil E transparente De memória Outonal! AH, COMO NO FIM Deste poema Sofro a falta Desse olhar A iluminar-me A alma De ternura, Mas nem o sol Se descobre, O acende E o inunda De beleza Da mais pura...

“Travessia”. Detalhe.
RENÚNCIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Poesia”.
Original de minha autoria.
Setembro de 2022.

“Poesia”. JAS. 09-2022
POEMA – “RENÚNCIA”
RENUNCIEI
Para nunca
Te perder,
Mas nesta
Distância sofrida
Vai lentamente
Declinando
O que pra sempre
Eu quis ter.
VÊS, BERNARDO,
Que destino?
Que desassossego
O meu?
Quis seguir
O teu caminho...
.........
Perdi-me,
Já não sou
Eu.
TU AMAS
A poesia
(Bem sei),
Mas não te ajeitas
Com ela,
Senti-la é
Doce sofrer,
Entras na porta
Da vida,
Não a vives
À janela
Como quem
Só sabe ver.
ELA DIZ TUDO
Com nada,
O seu canto
É prazer,
É melodia
De fada,
Se a sofres
Docemente
Já não a sentes
Doer,
Sua dor
É quase nada,
Nela podes
Reviver.
NO POEMA
Eu até finjo,
É poeta
Quem o diz,
Mas se sentir
O que digo
Talvez até seja
Feliz,
Pois poema
É como a vida,
Posso ouvir
A minha alma,
Seus desejos,
Com palavras,
É um modo
De me ter,
É remédio
Que me salva
De em solidão
Me perder.
ESTE CANTO
É, pois, meu,
Nem tu
Mo podes
Roubar,
Se disserem
Que é pra ti
É verdade...
............
De enganar.
O VERSO
É o meu beijo
Nesse rosto
Que perdi,
É quente
Como o desejo
E resiste
A quem te diz
Que o poeta
Já não ama
Porque as palavras
Desenha
Com um pedaço
De giz.
AH, O AMOR
Em poesia
Vai mais longe,
Mergulha
Na utopia,
Vai mais fundo,
É doce
Melancolia,
Com palavras
Aquece a alma
E faz delas
O seu mundo
Aquele que
Sempre o salva
Porque só nelas
Confia.
EU NÃO GOSTO
Da renúncia,
Mas que posso
Eu fazer?
Se não cantar
O que sinto
Depois de tudo
Perder
É certo que desatino
Perco o norte
E a noção
Fica quase tudo
Igual,
É da vida
Deserção.

SONHO
Poema Triste
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Um Sonho no Jardim”. Original de minha autoria. Setembro de 2022.

“Um Sonho no Jardim”. JAS. 09-2022
POEMA – “SONHO”
SONHEI Que as palavras Se gastaram, Desfiaram, Desataram, Sobrando fios Para tecer O silêncio. SONHEI Que a tinta Perdeu cor, Que já não havia Poemas E que não era Pintor. SONHEI Que não eras tu, Que foi tudo Ilusão,
Os encontros,
O teu nome
E as marcas
De paixão. SONHEI Que te procurei No mundo Da fantasia Onde as flores Caminhavam, Sabiam a maresia, Tinham rostos De mulher... ............ Mas surdos Ao que dizia. SONHEI Que não sabia Onde estás, O que fazes E o que sonhas Nas noites Do teu luar, O que vês Nesses momentos Fugazes Em que olhas Para ti. SONHEI Que já não me lês, Que não ouves A melodia Num lugar
Que não alcanço
Com a minha
Fantasia. NO SONHO, Fui à memória, Que também Perdeu a cor. Ficou tudo A preto e branco E nela já não Te via... ............. Foste embora, Meu amor! SONHANDO, Procurei cor Num outro Lugar qualquer, Mas só encontrei O cinzento E por falta De vermelho Meus versos Tão desbotados Já nem iam Com o vento... “FOSTE EMBORA Para onde Que eu não sei Onde estás?”, Perguntei, Quando do sonho Acordei. SAÍSTE De onde estavas E agora resta O desejo De te cantar Sem palavras Pra que ouças O silêncio Com que antes Me chamavas... MAS NÃO ME CHEGAM Sinais, Vivo num poço Profundo E nele Eu vou caindo (Cada vez mais) Como um triste Vagabundo. O SOL TAMBÉM Já se foi As sombras Tomaram conta De mim, Meus dias São sempre Iguais, Sinto um vazio Sem fim... AH, MAS PINTO, Agora pinto, É hora de Redenção, Tenho cores, Tenho aromas E regressa A emoção, Há flores Por todo o lado, Volto outra vez
A sonhar,
Tenho luz, Tenho um destino E já navego Em alto mar... OH, SIM, Eu tenho tudo, Quase tudo, E retomo O meu caminho... .......... Mas perdi A minha Musa, A fonte D’inspiração. Foi-se embora Com o vento E em meu triste Pensamento Nem me sobrou Ilusão. TENHO TUDO, Talvez tenha, Mas gastaram-se As palavras, Gastou-se tudo, Afinal...
.............. Só ficou o teu Cinzento, A tinta com que Me lavras O peito E me afundas Nesta dor, A que canto Em surdina Para ouvires O silêncio Com que te pinto Sem cor.

“Jardim Espectral”. Detalhe
A CARTA
Por João de Almeida Santos.
Ilustração: “Melancolia”,
JAS2022.
Setembro de 2022.

“Melancolia”. JAS. 09-2022
POEMA – “A CARTA”
DIZEM-ME
Que vagueias
Por aí,
Incerta,
À procura de ti,
Sem saber
Que te vais
Perdendo
Nas rotinas
Inventadas
Dos teus dias.
SENSÍVEL
À incerteza
Do teu caminhar,
Inundei-te
Com rios
De palavras
Quentes e
Sedutoras,
Setas falhadas
Ao coração
Do silêncio
Que te cobre
O rosto
Como véu
Translúcido...
................
Para te resgatar.
SEI QUE VIAJAS
Cada vez mais
Para dentro de ti,
Aninhando-te
Nessa melancolia
Sem fundo
Que sempre
Me cativou.
E DIZEM-ME
Que quanto mais
Te resguardas
Na sombra
De ti mesma
Mais procuras
Ver tudo
Sem ser vista,
Seguindo,
Invisível,
O meu rasto
Desenhado
Com palavras
Ao longe
Na neblina
Que se esfuma
E dilui
Lentamente
No frio
Horizonte
Da Montanha
Sagrada.
E ATÉ O VENTO
Amigo
Que sopra
Lá do alto
Me segreda:
“Curiosa de ti,
Abre
De par em par
As janelas
Das tuas estrofes,
Ar puro
Que respira,
Esse canto
De sereia
Que finge
Não ouvir,
E procura
Decifrar
As tuas ondulações
De alma
No muro
Das lamentações
Poéticas”.
EU SEI BEM
Que te cobres
Com o véu
Escuro
Do silêncio
Para te resguardares
Do olhar
Indiscreto da vida
Sobre ti.
MAS A VIDA,
Meu amor,
É fugaz,
O tempo passa
E deixa marcas
Indeléveis,
Sulcos profundos
Que só o futuro
Desvelará
Porque o passado
Fica inscrito
Num destino
Que só conhecerás
Ao virar
Da esquina da
Tua vida,
Onde só o passado
Brilhará
(Ou não)
Como futuro.
AH, SIM,
O reencontro
Acontecerá
Nesse momento,
Quando eu
Já só for
Um sinal
Impresso,
A branco e negro,
Uma vaga memória
Escrita
Perante teus olhos
Húmidos
De me terem
Perdido
Sem saber
Porquê...
................
Ou simplesmente
Como inútil
Expiação
De um pecado
Que nunca
Aconteceu.
ESTAREI LÁ,
Sim,
Nesse destino
À tua espera
Para te dar
Conforto,
Aninhado
Nas palavras
Que ainda
Não sabes
Declinar,
As mesmas
Em que vou
Viajando,
Invisível,
Por dentro
De ti
À procura
Da eternidade
Possível,
Tua e minha
Salvação
Da voragem
Do tempo.

A OFERTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Fantasia". Original de minha autoria. Setembro de 2022.

“Fantasia”. JAS. 09-2022
POEMA – “A OFERTA”
DESSE ENCONTRO Fatal Em tão cinzento Dia Quis libertar O meu corpo Sem saber se Conseguia... ........... Fui correr Junto à praia À hora da maresia... CORRI, SALTEI Dancei, Respirei Com essa brisa Do mar, Libertei-me Desse aperto Que me ia Sufocar. FIQUEI LIVRE, Mas sozinho, À deriva, Nesse dia, Mas no regresso Da praia Encontrei-te No caminho... ......... Milagres Da fantasia. LOGO TE FIZ Um poema Pois correr Já não chegava, Pus palavras A sorrir Quando a alma Regressava Pra te poder Seduzir. PARTI COM ELA Prà Montanha, Quis trazer-ta Num cabaz... ............ Colhi frutos Lá no alto Guardei-os Todos no peito Pra esse encontro Fugaz Que eu queria O mais perfeito Se disso fosse Capaz. LEMBRAS-TE Dessa cesta E dos frutos que Trazia? Vinham todos Da Montanha, Eram frutos De alegria, Poemas Que derramavam Aromas Em palavras de Embalar E contavam Mil histórias Que te fariam Sorrir... ........... Era oferta Singela De quem te Queria sentir. NA CESTA HAVIA Estrelas Às centenas, Vermelhinhas... .............. Não viste nelas Cintilas Que voavam Tão juntinhas? ERAM MIL CORES E aromas Que desses frutos Brotavam, Colavam-se À minha pele, Mas era por ti Que passavam. MAS PARTISTE Com essa cesta Ao colo, Rápida, Sem me olhar... ............. Não esperava Protocolo (Como sabes), Mas foi grande O meu espanto Desse teu Estranho ar. SÓ À NOITE Me disseste “Obrigada, Meu amigo, Estes frutos Que me deste São belos E tão gostosos, Mas não são O teu abrigo”. PRA ME CURAR Da desfeita E resistir
À tristeza
Fui correr Em poesia, Pois soa sempre Em meus versos, Contraponto
Da frieza,
Uma quente Melodia. LIBERTEI O CORPO Outra vez, Mas a alma (Como vês) Ficou sempre Presa a ti, Ninguém pode Devolver-ma, Mas, assim...
............. Não te perdi.

“Fantasia”. Detalhe
O PAVÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Azul no Parque”.
Quadro n.º 1 (2021, 92x123;
não exposto) do
Catálogo da Exposição
“Luz na Montanha”,
aberta ao público até 25.09,
no Centro Cultural de Cascais.
Agosto de 2022.

“Azul no Parque”. Quadro n.º 1 (2021, 92×123; não exposto) do Catálogo da Exposição “Luz na Montanha”, aberta ao público até 25.09, no Centro Cultural de Cascais.
POEMA – “O PAVÃO”
FUI AO PARQUE Do Marechal Logo ao amanhecer (Melancolia De outono) À procura do pavão, Eram muitas As saudades... Já passara mais De um verão. ENCONTREI-O Por ali, Sozinho, Talvez triste Como eu, E vi nele, Ao caminhar, As cores Que sempre Invoco Neste incerto Vaguear. PORQUE É Tão belo O pavão? Soberbo Em sua pose, Captura-me Os sentidos Com a vertigem Da cor E logo sinto
O poder Desse grande
Sedutor. ALTANEIRO, O pavão Fascina-me O olhar Com a beleza Cativante Do solene Caminhar. O SEU PORTE Austero É grave E até quase Marcial, Celebra-se Como filho De arte Viva Sempre em pose Triunfal. SEGUI-O, Nesse dia, Parque fora, No silêncio Luminoso Da manhã...
............. Folhas caídas No chão Acolhiam O nostálgico Passeio Do poeta E do pavão... NESSE JARDIM De remota Evocação A beleza Despontava Em seu ritmo Natural, Passos lentos
E medidos, Desenhados Em perfil, Pose austera, Altivez.... ............. Momentos De um ritual. CAMINHEI COM ELE Horas a fio, Lado a lado, Sem destino, Revendo As cores que Um dia Me emprestou Pra levar À tua arte (Em jogo De sedução) Fragmentos De arco-íris Que derramei No teu chão. JÁ NO ALTO De um muro, Oráculo, Arte pura, Aparição, Perguntei-lhe Qual a cor Da tua alma E ele mostrou-me Esse azul Tão luminoso Onde sempre Se esfumam Os traços Da tua mão... ........ E logo, E por encanto, Eu vi Espelhado O teu rosto Nas cores vivas Do pavão.

A AGUARELA
Poema de João de Almeida Santos
inspirado no poema de
Manuel Bandeira
“Tema e Variações”.
Ilustração: “O Retrato”
(n.º 24; 68x80).
Pintura que integra
a Exposição “Luz na Montanha”,
aberta ao público até 25.09,
no Centro Cultural de Cascais.
Agosto de 2022.

“O Retrato”. JAS. 2022. (n. 24. 68×80). Pintura que integra a Exposição “Luz na Montanha”, aberta ao público até 25 de Setembro, no Centro Cultural de Cascais.
POEMA – “A AGUARELA”
SONHASTE, MANEL,
Que havias sonhado
Estar à janela,
Sonhando a cores
Que estavas com ela.
TAMBÉM EU SONHEI
Que tinha sonhado
E que no sonho
A tinha encontrado,
Passando por ela,
Ali, lado a lado.
MAS LOGO ACORDEI
Do primeiro sonho.
Sonhando, eu vira
O seu belo rosto
Numa aguarela
Pintada a cores
Que tinha guardado
Para uma tela.
SONHEI, OUTRA VEZ,
Que era pintor,
Mas que sempre
Pintava
Esse seu rosto
A uma só cor.
DIZIA, SONHANDO,
Que não podia ser.
De tão expressivo,
Era um arco-íris
Ao amanhecer,
Um belo sorriso
Para o mundo ver.
MAS EU SÓ O VIA
Com a minha cor.
De seda tecido,
Ele me seduzia
No sonho sonhado
Onde sempre a via
Ali, a meu lado.
NÃO QUERIA ACORDAR
Do sonho feliz
E nele fiquei
De olhos fechados
Porque nessa cor
Fiquei enleado
Com todo o meu ser...
................
Talvez por amor.
NO SONHO OLHEI
Para o meu espelho
E logo eu vi
Que essa minha cor
Era o vermelho.
NO ÚLTIMO SONHO
Voltei a sonhar
Que tinha sonhado
Que o encontrei,
Esse rosto amado,
E logo lhe disse,
Neste novo sonho,
Que a tinha sonhado.
DISSE-ME QUE NÃO,
Que nunca me vira
Sequer acordado...
E logo acordei
Desse pesadelo.
Foi assim que vi
Que tinha sonhado
E que ela
Já lá não estava
Ali, a meu lado.
QUIS ADORMECER
Para a encontrar,
Mas não consegui
Sonhar que a via,
Pôr os olhos nela,
Viver o meu sonho
Como alquimia,
Porque, acordado,
Logo descobri
Na minha parede
Aquela aguarela
Que do sonho
Passado
Eu já conhecia...
................
Era o rosto dela.

ESTRANHA ENCRUZILHADA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Rua” (2022; 104x118).
Pintura que integra
a minha Exposição “Luz na Montanha”,
aberta ao público até 25.09, no
Centro Cultural de Cascais.
Agosto de 2022.

“A Rua”. JAS. 2022. 104×118
POEMA – “ESTRANHA ENCRUZILHADA”
CRUZEI-ME CONTIGO
Numa esquina
Da vida,
Nesta rua
Onde inventei
Uma estranha
Despedida.
NÃO TE VI
Como te via
Da janela
Sobranceira
Quando passavas
Na rua
Abraçada
À beleza,
Teu perfeito
Avatar,
Quadro vivo
De ti
Que o tempo
Quis desenhar.
SE TE REVI
(Mas não sei),
Foi numa janela
Vidrada
Que me devolveu
A imagem
Reflectida
Como num espelho
De fada.
E, ASSIM, ESTREMECI.
Pressenti-te
Fugidia,
Nesse acaso
Do destino,
A meu oblíquo
Olhar
Em nova
Encruzilhada
Deste incerto
Caminhar.
DEPOIS SEGUI
Com a alma
Em alvoroço
Essa tua silhueta
Embaciada,
No meio
Da multidão...
...........
Não via bem
O perfil
Por falta
De nitidez
Do meu campo
De visão.
ANÓNIMO
Me assumi
Como essa gente
Comum
Que se cruza
No caminho
Sem jogar
O seu destino
Num encontro
Casual.
QUE ESTRANHA
Sensação,
Caminhar
Lado a lado
Com uma vaga
Silhueta,
Fixado
Num horizonte
Que se esfuma
E desfaz
Como espuma
Em areia
A marcar uma
Fronteira
Traçada
Pelas marés.
ATÉ QUE CHEGUEI
Às palavras
Escritas na água
Da praia
Remexida
Pelo vento,
Derramando
Na areia
Um murmúrio,
Um lamento,
Um poema
Simulado
Para dar voz
Ao poeta
Que sofre
Do seu pecado.
MAS GOSTEI
Do olhar
Oblíquo
Com que te vi
Na janela
De vidros baços,
Fumados,
Apenas imaginando
Que aquela silhueta
Era tua,
Regressada
Dos confins
Dessa remota
Memória
Dos felizes
Desencontros
Que tinha
Na outra rua.
E GOSTEI
Que me visses
Sem olhar,
Pressentindo-me
Apenas,
Anónimo
A seguir o teu
Caminho
Para logo
Se perder
Nas veredas
Do destino.
TUDO TÃO ONDULANTE
E tão normal,
Estranhamente
Banal,
Que até o poema
Espanta
Por cantar
O que nunca
Aconteceu
A não ser
Na fantasia
De quem com ele
Renasceu.
CRUZEI-ME CONTIGO
Ao lusco-fusco
De um estranho
Entardecer,
Numa encruzilhada
Da rua
Que um dia
Inventei
Pra desenhar
O caminho
Onde te ia
Perder.
É A VIDA
De um poeta
Que se alimenta
Da dor.
Se não a sente,
Procura,
Nem que seja
No amor.

“A Rua”. Detalhe
SONHEI-TE, NAQUELA NOITE
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Teus Olhos”.
Pintura em Exposição
no Centro Cultural de Cascais,
nº. 14, 66x89, 2022.
Original de minha autoria.
Agosto de 2022

“Teus Olhos”. JAS – 2022 – 66×89. N.º 14 em exposição no CCC.
POEMA – “SONHEI-TE, NAQUELA NOITE”
SONHEI-TE,
Naquela noite.
Atravessava o deserto,
Há muito,
Sem nada no horizonte,
Areia, só areia
No meio
Do meu caminho
E uma neblina quente,
Lá ao fundo,
Na fronteira
De quem o percorre
Sozinho.
NEM SABIA
Se na longa
Caminhada
Encontraria
Um oásis
E uma fonte
De água pura
Onde molhar
Os lábios e a alma
Já gretados
De tanta aridez
E secura.
MAS HOJE VOLTEI
A sonhar-te.
Passara essa fronteira
E encontrara
O oásis...
...............
Nas pupilas
Dos teus olhos.
SACIEI-ME EM TI,
Sereno
Como nunca
Estivera
Desde que te conheci.
Ofereci-te
A história
De papel
Onde te conto
E me conto
À exaustão,
No limiar
Do impossível
E dessa insólita
Paixão,
Com réstia
De esperança
De não ter de
Regressar
À torreira
Do deserto,
A essa cáustica
Erosão.
FALÁMOS DE ARTE
(Imagina),
Do seu poder
Curativo,
De como a vida
Se lê
E resolve
Quando é forte
O motivo.
ABANDONEI-ME
Nos teus braços
Irreais,
Perdi-me
Em misteriosos
Sinais
E em quentes
Memórias
De ternura
E caminhámos
Sobre nuvens
De cintilante
Alvura.
SONHEI-TE
Esta noite.
E, sabes?
Acordei de ti
Embriagado
De felicidade,
Uma doce
Tontura
Com sabor
A liberdade.
HABITUEI-ME
A estar contigo
Em sonho,
A dizer-te
Em poemas,
A interpelar-te
De longe,
A ouvir o teu eco
Ressoar-me
Na alma,
Melodia
Do amanhecer.
APRENDI
A ouvir
O teu silêncio,
Essa fronteira
Inultrapassável
A não ser
Pelo vento
Que passa
E te cicia os
Meus poéticos
Murmúrios.
TENHO-TE
Em mim
E já nem sei
O que seria
Encontrar-te
Fora do meu
Íntimo,
Olhar de perto
Esses teus olhos
Profundos
E cintilantes,
Embriagar-me
(Já de partida)
Com teu perfume
E naufragar
Nesse mar
Insondável
Da tua vida.
TALVEZ TE PERDESSE,
Nesse instante,
Por excesso de ti.
Mas não quero
Perder-te,
Sentir de novo
O que nesse dia
Tão cinzento
Eu já senti.

“Teus Olhos”. Detalhe.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Perfil de Mulher”, 2022, 94X114. Pintura em exposição no Centro Cultural de Cascais até 25 de Setembro. Original de minha autoria. Julho de 2022.

“Perfil de Mulher”. JAS. 2022. 94×114. Pintura em exposição no Centro Cultural de Cascais.
POEMA – “TEMPO”
É TEMPO DE RECOMEÇO
Ao olhar
O teu perfil?
O que ontem
Eu já era
É o que hoje eu sou,
O afecto
Pediu tempo,
Mas o tempo resistiu
Ao que a vontade
Tentou.
É tempo
De recomeço
Quando o tempo
Não passou?
EM CADA MOMENTO
Procuro
O tempo
Que, no passado,
Eu, poeta,
Não cumpri
Porque sempre
Reinvento
Tudo aquilo
Que perdi,
Num poema
Ou em pintura
Para saber
Quem eu sou
Antes de lá
Me perder,
Nos lugares
Pra onde vou.
ENTRE O HOJE
E o ontem
Há algo
Que já mudou?
Fui ao baú
Das memórias
E vi logo
O que sobrou:
A imagem
Bem precisa
Desse tempo
Que passou.
TUDO MUDA
Amanhã,
Quando, tenso,
Eu passar
Na curva
Do teu caminho?
Encontro o que antes
Nunca vi?
Mulher com futuro
No olhar
E que sempre
Me sorri,
A repetir com carinho
Um terno
E tão antigo “Olá!”,
Cabelos negros
Ao vento,
Corpo esguio
Em movimento,
Resolvendo um passado
Que nunca mais
Voltará?
NÃO, TEUS OLHOS
São uma janela
Fechada,
O tempo
Passa por ti
Sem destino,
É ritmo
Sem melodia,
Caminho
Sem fim
À vista
Que percorro
Dia-a-dia
Na vertigem
De um passado
Que cedo
Cristalizou,
Mais tristeza
Que alegria
Como peso
Do meu fado
Só liberto em
Poesia
Do tempo que
Não passou.
E TEM TEMPO,
A poesia?
Talvez tenha
(Eu não sei),
Com ela voo
No céu,
Sem limites
Nem fronteiras,
Num tempo que é
Só meu.
AH, SIM,
A poesia tem tempo,
É tempo de salvação,
Perdi-te,
Mas eu não queria
Passado
De negação.
É TEMPO
De recomeço?
Sopra vento
De feição?
Sou feliz em poesia
Pois escrevo
O meu poema
Na pauta
De uma canção.
NÃO É O TEMPO
Que salva,
Mas as palavras
Que digo
Enquanto fores
Alimento
Desta minha
Inspiração
Porque é assim
Que te canto:
Da dor
Sai alegria
Que cura
Da solidão.

EXPOSIÇÃO DE JOÃO DE ALMEIDA SANTOS
Inauguração a 23.07
CENTRO CULTURAL DE CASCAIS
De 23.07 a 25.09.2022

“O TERRAÇO” em observação
FOI ONTEM, 23 de Julho, entre as 18:00 e as 20:00, a inauguração da minha Exposição individual “Luz na Montanha”, no Centro Cultural de Cascais. Presentes cerca de 70 amigos que quiseram partilhar este momento comigo. O meu obrigado a todos. Tive oportunidade de dirigir algumas palavras aos presentes e de ler o poema “A Janela” junto do quadro com o mesmo nome, dando assim testemunho directo da íntima conexão entre a poesia e a pintura.
QUERO AGRADECER publicamente ao Senhor Presidente da Câmara de Cascais, Carlos Carreiras, ao Senhor Presidente do Conselho Directivo da Fundação D. Luís, Prof. Salvato Teles de Menezes, e à Senhora Coordenadora do CCC, Arquitecta Isabel de Alvarenga, a oportunidade de realizar, no prestigiado Centro Cultural de Cascais, esta minha Exposição. Estando o meu trabalho plástico intimamente ligado à poesia, entendeu-se fazer também a apresentação do meu livro de poesia (João de Almeida Santos, Poesia, Lisboa, Buy The Book, 2021) durante a Exposição, precisamente um dia antes do encerramento, ou seja, no dia 24 de Setembro. A apresentação será feita pela Professora Annabela Rita, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
ESTA EXPOSIÇÃO representa o ponto de chegada de um longo processo de trabalho diário dedicado à poesia e à pintura, que foi sendo divulgado através do meu site todos os Domingos e durante anos, sem interrupção.
A MINHA PROPOSTA consolidou-se como exercício de convergência entre a poesia e a pintura, onde o ponto de partida da pintura é a própria poesia. Adoptei a sinestesia, ou seja, a convergência de duas artes em torno de um tema ou de uma história, de forma sistemática, e assim fui caminhando até chegar aqui, a esta primeira Exposição, e à publicação de um livro de poesia, que exibe algumas (14) ilustrações demonstrativas da profunda relação entre a poesia e a pintura. O livro também está em exposição na segunda sala, 3 exemplares, numa vitrine, e também é consultável num volume disponibilizado para tal. Na verdade, a cada quadro (32, visto que os programados 37 seriam excessivos para o espaço disponível) corresponde um poema.
TODOS OS QUADROS expostos podem ser adquiridos, à excepção dos números 20 (“Março”), 30 (“Ketrof”, exposto só no catalogo), 35 (“Romã”) e 37 (“Magia”). A Exposição tem um Catálogo – que contém um texto do Prof. Salvato Teles de Menezes, dois textos meus sobre a minha pintura e a reprodução de 37 quadros – que pode ser adquirido no Centro Cultural de Cascais (valor: 7 euros).
PUBLICO AQUI várias fotografias do evento. Outras se seguirão durante o dia de hoje. Fotos de Ronald van Middendorp.

Durante a minha intervenção na abertura da Exposição.

Outro momento da minha intervenção, dirigindo-me à Senhora Arquitecta Isabel de Alvarenga, Coordenadora do CCC

Chegada à Exposição

Comentando “Teus Olhos” com uma Amiga

Quadros na Sala 1: “Pasárgada”, “Luz na Montanha”, “Rua do meu Jardim”, “Pasárgada II”, “A Montanha Encantada” e “Deusa das Camélias”

Texto “Sinestesia”, entre as Salas 1 e 2, e quadro “Pasárgada”

“Perfil de Mulher”

“Teu Olhar”.

O Autor

“Paraíso”

“O Desejo”

Fachada do CCC com o Cartaz da Exposição “Luz na Montanha”
#Jas@07-2022
EXPOSIÇÃO DE JOÃO DE ALMEIDA SANTOS
Centro Cultural de Cascais
23 de Julho - 25 de Setembro
Inauguração: 23.07, 18:00

CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO – CAPA
SINESTESIA
“LUZ NA MONTANHA” é o título desta minha Exposição. É o título de um quadro que a integra, mas é também uma alusão ao ambiente natural que me inspira na pintura e na poesia.
Em exposição estarão as 37 obras aqui reproduzidas e que foram criadas em diálogo com a poesia. Elas são, pois, parte do processo sinestésico que adoptei na experiência estética.
Com riscos e cores, procuro dar forma plástica ao discurso poético e à matéria de que se alimenta: esse fluxo torrencial de pulsões existenciais que interpelam, estimulam e desafiam o poeta. A pintura continua o discurso poético por outros meios que, depois, seguem a sua própria gramática. Trata-se de paisagens interiores, pintadas, num primeiro andamento, com palavras em registo melódico, mas, depois, recriadas e figuradas em expressão cromática quente e intensa.
Uma dialéctica que torna a experiência estética mais rica e complexa, mas ao mesmo tempo mais leve e sedutora. Fragmentos cromáticos de um originário discurso poético que o projectam para fora de si e o oferecem ao olhar no interior de uma nova gramática. Como um magnetismo que atrai a palavra e a converte em cor, propondo-a, já transfigurada, ao olhar de quem frui.
O processo sinestésico permite, depois, um novo regresso ao poema, já com a alma cheia de cor, banhando e iluminando os versos e as estrofes com o brilho cromático das pinturas. E assim se sobe a um novo patamar a partir do qual se inunda de sentido a pintura.
Na verdade, nem a pintura ilustra o poema nem o poema descreve a pintura, mas ambos dão origem a um diálogo virtuoso que se eleva dialecticamente, através da sinestesia, em planos superiores mais complexos e exigentes. A densidade do poema é convertida em leveza na pintura e a leveza da pintura é densificada pela semântica poética.
É isto que eu pretendo, independentemente da interpelação e do chamamento a que ambas as artes estão necessariamente votadas. Se ambas respondem, na sua génese, a um originário impulso dionisíaco, para o dizer com Nietzsche, elas também têm como vocação a interpelação, procurando seduzir e chamar à experiência estética os que se cruzam com elas.
No essencial, foram estas as razões que me moveram nas 37 propostas que exponho.
João de Almeida Santos


ENCANTAMENTO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “La Diseuse” Original de minha autoria Julho de 2022

“La Diseuse”. JAS. 07-2022
POEMA – “ENCANTAMENTO”
SÃO ECOS Da tua alma Estas cores Intensas Com que te Pintas E te revelas Nestes dias De tão incerto Encantamento. CONVIDAS-ME A ler-te Nas cores Quentes Com que Teus olhos E tua boca Me convocam
E aguardas, Expectante, Que pinte A tua alma Com a devoção De poeta De alma Errante E com palavras Ambiguamente Certeiras Que saiam Do fundo Desta timidez Em sobressalto Que eu, Inseguro, Sinto Cada vez que Te vejo Lá no alto. SÃO CASTANHOS Os teus cabelos, Mas a tua alma, A que eu leio Em teu rosto, Está impressa Como coroa De cor Efémera, A das giestas Floridas Na primavera Dos nossos Fugazes Reencontros. A TUA BOCA Sensual, Lábios Ao rubro, Carnal, Oferece-se Ao beijo Das minhas Palavras Nestes poemas Lançados Ao vento... ÉS BELA Como eles, Estes dias Do eterno retorno Em que me Deixas Abraçar-te Com palavras De ousado Desafio No meu regresso A ti, Ó deusa Tão ausente Do meu viver. MAS EU VEJO No reencontro Feliz Uma leve Tristeza Que em teu Rosto Aflora Em contido Espanto, Nessa hora Em que te sinto Quase como Choro De não te ter. É OLHAR Que roga, Boca suspensa Da pergunta Que não ousa Sair sequer Como murmúrio De teus lábios... AH, ENTÃO, Pergunta, Sim, pergunta, Pra que eu Te diga, Cá de longe, Sem hesitar, As minhas Certezas Sobre ti Sob o fascínio Desse teu Cintilante Olhar. E DIR-TE-EI Que os astros (Sim, os astros) Estão alinhados Sobre nós, Suspensos De teus riscos e Das minhas palavras, Das nossas cores, Dos sinais que, Como sóis, Iluminam, Ardentes, A nossa vereda Tão estreita Sobre o precipício Fatal Da arte. POR ISSO, Com o poema Te seguirei Mesmo que Um dia (Que nunca virá) Se esfumem No horizonte As tuas cores E te perca ali, Na rua Do desencontro, Onde eu Te conheci, E meu rosto Escureça Sob as negras Nuvens Dos destinos Não cumpridos. MESMO ASSIM, Continuarei Em busca Dos mil rostos Da tua Metamorfose, Essa que sinto E pressinto Como beleza Oferecida No teu olhar Cintilante, Na tua boca Suspensa De tanta Incerteza Nesse imenso mar Onde se ouve O canto Das sereias. PROCURAREI Então, Mais rostos, Mais cor, Mais riscos, Com dor, Usarei palavras, Sinais, Desenhar-te-ei Cada vez mais, Com meus poemas Irei ao cais Ao pé do rio Saber se vais À outra margem Da nossa vida... ............. Talvez cantar, Nem sei Que mais... TANTO BRILHO No teu olhar, Ó deusa Do meu destino, Sempre a navegar...
A PINTORA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Olhar” Original de minha autoria Julho de 2022

“Olhar”. JAS. 07-2022
POEMA – “A PINTORA”
QUANDO TE VEJO, Vejo-te a cores, Sinto aromas, Provo sabores Na fantasia E vejo traços E tantas fugas Pró infinito Nos sete céus Dessa magia... .............. E eu respondo Sobre o que sinto Se me perguntas: - Epifania! AO LONGE, O horizonte Do teu olhar Aqui ao perto Uma ponte Desenhada Que me leva Ao pé de ti Quando o rio Me transborda E eu sinto Que me perdi. QUANDO TE VEJO, Eu vejo ruas, Eu vejo praças E catedrais, Vejo figuras A levitar, Vejo vitrais E vejo sóis Em refracção Que aquecem A minha alma Quando me olhas E estremeço De emoção. VEJO TEU ROSTO, Vejo-te a ti Nesses poemas Que escrevi, Sentir-te perto É o desejo, Ver o teu céu No horizonte, A utopia... ......... E eu ando É por aqui Sempre à procura Da tua doce Companhia. VEJO MONTANHAS E vejo cores A brilhar No horizonte, Eu vejo casas Nesses vales E esses rios Por onde corre A água pura Com que eu rego O meu jardim Pra que germinem Os meus poemas E te desenhe Só para mim. SINTO NO AR O teu perfume Cabelos soltos A esvoaçar E sinto o vento Nesse teu rosto E altas vagas No nosso mar Mesmo que chegues Já no sol-posto Com o teu barco A navegar Nesse horizonte Onde se perde O meu olhar. EU VEJO TELAS E teus pincéis Eu vejo tinta Na tua mão, Vejo-te a ti, Doce pintora, Tão concentrada Em mil desenhos Em construção. VEJO QUADROS E vejo letras, Nessa pintura Vejo sinais E sou feliz De assim te ver Porque te vejo Neste pontão Do nosso cais... ............ E tudo isso É o que vejo E o que basta Pois não preciso De muito mais. EU VEJO TUDO (A deusa ajuda), Mas não te vendo É grande a dor... Vem ter comigo A este rio Passar a ponte Pro outro lado Dar-me a mão E um sorriso, Fazer de mim Um desejado Mesmo sem teres A tua ponte Bela e leve Já desenhado. EU VEJO TUDO, É uma certeza, Mas faz-me falta O teu sorriso... ............... Mesmo que minta Nada mais quero Pois é só disso Que eu preciso.

O BEIJO
Poema de João De Almeida Santos.
Ilustração: "O Beijo". Original
de minha autoria para este poema.
Dia Internacional do Beijo -
- Seis de Julho, dia que celebro,
com um poema, todos os anos.
Inspirado em "Lotte in Weimar"
(1939), de "Thomas Mann, a obra
que continuou "Werther" (1774),
de Goethe, e no meu romance
"Via dei Portoghesi".

“O Beijo”. JAS. 07-2022
LEITMOTIV
“O amor é o melhor na vida, assim,
no amor, o melhor é o beijo –
Poesia do amor...”. “Beijo
é alegria, procriação é luxúria”
Thomas Mann
Inspirado também em:
“Os beijos escritos
não chegam ao destino,
mas são bebidos pelos
fantasmas ao longo
do trajecto”
Kafka
“Se para te beijar devesse,
depois, ir para o inferno,
fá-lo-ia. Assim, poderia
vangloriar-me, com os diabos,
de ter visto o paraíso
sem nunca lá ter entrado”
Shakespeare
“O primeiro beijo não é dado
com a boca, mas com os olhos”
Bernhardt
POEMA – O BEIJO
BEIJO FOI
O que nunca
Te dei
A não ser
Com o olhar,
O primeiro,
Esse beijo,
Dei-to, pois,
Sem te tocar.
E DEI-TE MAIS,
Com palavras,
Quando olhar
Já não podia...
............
Foste embora
Para longe
E eu, triste,
Não te via.
FORAM BEIJOS
Que sonhei
Na rotina
Dos meus dias
E desejos
Que enfrentei
Quando tu mais
Me fugias.
MAS DOU-TE BEIJOS
Escritos
Que se perdem
No caminho
E se o poema
Me falta
Fico ainda mais
Sozinho.
O BEIJO
É emoção,
É razão
Descontrolada,
Se não for dado
A tempo
Pouco mais
Será que nada.
SEM BEIJO
Não há amor,
Sem amor
Perde-se o beijo,
A vida perde
Sentido
Se me faltar
O desejo
De na alma
Te beijar
Por assim te ter
Perdido.
AQUI O LANÇO
Ao vento
Pra que atinja
Como brisa
E suave melodia
Esse rosto
Que precisa
De afecto
Em poesia.
ESSE BEIJO
Que me falta,
De que nunca
Fui capaz,
Voa pra ti
Em palavras
Na sua forma
Mais pura
Para que
Em seu trajecto
Voe, voe
A grande altura...
.............
Que fantasmas
Não o bebam
Enquanto
Seu voo dura.
MAS SEI
Dos escolhos
Da via,
Dos perigos
Que ele corre,
Capturado
Por fantasmas
É mensagem
Que me morre.
NO DIA DO BEIJO
É hora
De te cantar
Em voz alta
A poética do amor
Pra me redimir
Dessa falta
Com palavras
De poeta
Desenhadas
Para ti
Com mestria
De pintor.
E PORQUE O DIA
É teu
Ganha força,
Intensidade,
Mesmo que fantasmas
O bebam
É um beijo
De verdade.
O BEIJO
Que não te dei
Foi pecado
Original,
Hei-de sofrê-lo
Pra sempre
Como chaga
Corporal.
NÃO HÁ PALAVRAS
Que bastem
Pra repor
O que não dei,
Elas voam,
Mas não chegam,
E mesmo assim
Eu tentei.
É CERTO QUE SEMPRE
O quis,
Só que nunca
To roubei,
A culpa foi
Desse tempo,
Dos dias em que
Te amei,
Um tempo
Em diferido
Sem presente
Nem futuro,
Talvez beijo
Sem sentido
Porque queria
Do mais puro,
Tangendo eternidade
Às portas
Do Paraíso,
Um beijo
De divindade,
Mas simples
Como um sorriso.
ESSE BEIJO
Impossível
Que não é do
Foro humano
Vou tentando
Construí-lo
Cada dia,
Cada ano,
Perdendo-me
Pelo caminho
Como sagrado
Em profano.

SEM REMÉDIO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Afrodite”. Original de minha autoria. Julho de 2022.

“Afrodite”. Jas. 07-2022
POEMA – “SEM REMÉDIO”
“VOU TOMAR OS MEUS REMÉDIOS...” .............. Palavras De antigamente Que ela gostava De usar Quando se via Doente Com maleitas Que não tinha, Em que não acreditava, Mas que a ele Muito doíam Sempre que delas Falava. NÃO ERAM SUAS As maleitas Que exibia, Fingindo ser Alma gémea De quem com elas Sofria. ENTRE UMA COISA E OUTRA Era assim Que ele a via, Aprendera A sofrê-la, Lentamente, Cada dia, Como se as dores Fossem dele Num jogo De aparência Com sabor A fantasia, Porque assim era Feliz, Regressava À inocência Quando nela Se perdia. INOCÊNCIA Que perdera Um dia na sua vida, Vira a ternura Morrer Num olhar De despedida. PRECONCEITO E submissão Mataram O que nascia, Transformando Em solidão A beleza De um dia. SOLIDÃO TRISTE, Quase eterna, Que nunca mais O largou, Sem remédios Para ela Quase, quase Sufocou... CAMINHA AGORA EM TRISTEZA Com passo lento E pesado, Transportando O mundo às costas Como fardo De pecado, Mas tenta sempre Vencê-la Com as palavras Que tem, Versos, rimas, Sons e letras Que o vento leva Consigo... ............. Para a terra De ninguém. NÃO PODE Nem quer dizê-la Essa dor Que o devora, Prefere, pois, Combatê-la Com as palavras De outrora...
"VOU TOMAR
OS MEUS REMÉDIOS..."
Saudades de a
Ouvir,
Vontade
De a encontrar Pra nunca mais A perder, Contemplar Seus olhos Negros, Ser feliz Só de a ver, De a ter Por companhia Nem que seja Em aguarela Que pinte Em cada dia. BOCA, OLHOS, CABELOS, Esse rosto que Não esquece, Imagem De uma mulher Que, ausente, O entristece Até ao fundo Da alma... ....... Solidão, Melancolia, Dessa dor Ninguém o salva, Vai sofrê-la Noite e dia. ERA ASSIM QUE A SENTIA, Esse alguém que O não amou E que sempre Lhe fugia Embora fingisse Que não Por saber Que lhe doía. MAS FOI ELE Que lhe mentiu Quando lhe disse Em vão Que já não queria Vê-la, Não a ter ali Por perto, Estar sempre longe Dela, Coração A descoberto, Não lhe ficar Amarrado, Inventando Outra mulher Com quem ir A todo o lado. MAS ERA FOGO De vista, Vontade De a esquecer, Divagava Em palavras Pra deixar De a sofrer. A OUTRA NÃO A sentia, Era coisa De momento, Sem grande Profundidade...
.............. O que mais ele Queria dela Era só Cumplicidade. MAS ERA FUGAZ Momento, Depressa ela O cercava, Capturando-lhe O alento Sempre que a Encontrava.
E FICAVA SUBMISSO, Vergado Ao que dizia, Nela só via Verdade Mesmo quando Lhe mentia. "VOU TOMAR OS MEUS REMÉDIOS”, Era a sua Melodia E ele ficava Dorido Com maleitas Que não via, Mas até disso Gostava, Era prazer Negativo Sentir-se Tão perto dela Mesmo sem haver Motivo. “VOU TOMAR OS MEUS REMÉDIOS...” E ele não se Importava Porque a sentia Doente Mesmo quando Não estava. E ASSIM Ia vivendo, Sofrendo Em cada dia. Não sabia O que fazer... .............. Só sabia O que sentia.

“LUZ NA MONTANHA”
Exposição individual de JOÃO DE ALMEIDA SANTOS
FUNDAÇÃO D. LUÍS CENTRO CULTURAL DE CASCAIS Aven. Rei Humberto II de Itália 2550-642 Cascais Inauguração a 23 de Julho, às 18:30. A Exposição estará aberta ao público até ao dia 25 de Setembro de 2022 e mostra 37 obras do Autor.

JAS, “Evocação de uma Magnólia”, 2021. Imagem da capa do Catálogo, disponível em breve.
“LUZ NA MONTANHA” é o título de uma minha Exposição individual que a Fundação D. Luís/Centro Cultural de Cascais acolhe e promove entre 23 de Julho e 25 de Setembro de 2022. O título é o de um quadro que integra a Exposição, mas é também uma alusão ao ambiente natural que me inspira na pintura e na poesia.
Em exposição estarão 37 obras de média dimensão que foram criadas em diálogo permanente com a poesia. Elas são, pois, parte do processo sinestésico que adoptei na experiência estética. Com riscos e cores, procuro dar forma plástica ao discurso poético e à matéria de que se alimenta: esse fluxo torrencial de pulsões existenciais que interpelam, estimulam e desafiam o poeta. Como se a pintura continuasse o discurso poético por outros meios, que, depois, seguem a sua própria gramática. Trata-se de paisagens interiores, pintadas, num primeiro andamento, com palavras em registo melódico, mas, depois, recriadas e figuradas fisicamente em vibração cromática quente e intensa. Uma dialéctica que torna a experiência estética mais rica e complexa, mas ao mesmo tempo mais leve e sedutora. Fragmentos cromáticos de um originário discurso poético, poder-se-ia dizer, mas que não ficam confinados no seu interior porque o projectam para fora de si e o oferecem fisicamente ao olhar no interior de uma nova gramática. Como um magnetismo que atrai a palavra e a converte alegremente em cor e em riscos, oferecendo-a, já transfigurada, ao olhar de quem frui. O processo sinestésico permite, depois, um novo regresso ao poema, já com a alma cheia de cor, banhando e iluminando os versos e as estrofes com o brilho cromático das pinturas. E assim se sobe a um novo patamar a partir do qual também se inunda de sentido a pintura. Na verdade, nem a pintura ilustra o poema nem o poema descreve a pintura, mas ambos dão origem a um diálogo virtuoso que se eleva dialecticamente, através da sinestesia, em planos mais complexos e exigentes. A densidade do poema é convertida em leveza na pintura e a leveza da pintura é densificada pela semântica poética. É isto que eu pretendo, independentemente da interpelação e do chamamento a que ambas as artes estão necessariamente votadas. Se ambas respondem, na sua génese, a um originário impulso dionisíaco, para o dizer com Nietzsche, elas também têm como vocação a interpelação, procurando seduzir e chamar à experiência estética os que se cruzam com elas. No essencial, é isto que me move nas minhas propostas.
João de Almeida Santos
NA BRUMA DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Magia”
Original de minha autoria
Junho de 2021

“Magia”. Jas. 06-2022
POEMA – “NA BRUMA DA MEMÓRIA”
QUERIA LEVAR-TE
Uma rosa
Branca
Aos sete céus
Do meu afecto,
Desci fundo
Na memória
Onde ainda te
Guardava
Como se fosse
Teu tecto.
PROCUREI-TE
Na bruma
Espessa
Que caía
Sobre mim
E quase não te
Encontrei,
O tempo gastara
O passado,
Ficou uma saudade
Sem fim.
PERDERA-TE
O rasto
E o perfil,
Até teu nome
Perdeu cor,
Teu olhar
Só luzia
Intermitente
Numa neblina
De dor.
NO MEIO DA NEBLINA
Esfumava-se
O teu rosto
De tanto eu
Te perder,
Era incerto
O cintilar
De teus olhos
Na vontade
De te ver.
ERAS BRUMA
Indefinida
Nos sete céus
Onde te quis
Encontrar,
Mas sobraste
Como imagem...
..............
A que eu soube
Desenhar.
PERDI-TE A VOZ
E a tua
Melodia,
Quase tudo,
Meu amor...
...............
Ah, mas, no fim,
Não te perdia...
Ficou-me de ti
O sabor.
PORQUE JÁ ERAS
Imagem
Que me sobrou
Desse afecto
Que por ti
Sempre senti,
Construção
De arquitecto
Para nunca
Te perder
Desde o dia
Em que te vi.
E VOLTEI
(Eu volto sempre),
É desejo
De te ver,
Dar-te corpo
Nas palavras
Com que te quero
Dizer
Ainda que
Do poema
E dos céus
Do meu afecto
Acabe por
Te perder.
AGORA, DESENHO-TE
Com palavras e
Com cores,
Com paisagens
Que tenho dentro
De mim,
Com rostos,
Com aromas
E flores
Deste bendito
Jardim,
Um passeio
Com pavões,
Uma delicada
Utopia,
Gritos de alma,
Emoções..
...............
Pra te recriar
Com magia
E contigo
Caminhar
No alto
Da fantasia
Onde vive
Essa imagem
Que desejo
Encontrar.
VOO, POIS,
Com uma rosa,
Vestido como
Arcanjo,
Pra te ver
Ali ao perto,
Olhos negros,
Cintilantes,
Mas um pouco fugidios
Ao jogo da sedução
Numa noite
De luar...
............
Ou talvez
De perdição.
É UMA ROSA
De brancura
Transparente
Pra que sintas
Lá bem alto
O aroma
Desta minha fantasia.
Talvez assim
Te encontre
Envolta na neblina
Que nunca
Se dissipou
(Mas agora
Cristalina)
Desde aquele
Incerto dia
Em que o nosso
Olhar se cruzou.

“Magia”. Detalhe
MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração - "Magia" Original de minha autoria Junho de 2022

“Magia”. Jas. 06-2022
POEMA – “MEMÓRIA”
FUI AO BAÚ Das memórias De mais intenso Afecto, Voando em Fantasia Pra te escrever Um poema Com arte De vate inspirado Por poética Magia. ENCONTREI Teu rosto Triste (Mas cativante) E quis enganar A saudade Num jogo De sedução Como se fosses A deusa Das cidades Que invento Em cada minha Canção. NESSE DIA Em que te vi Na fita Da minha memória Quis trazer-te Ao luminoso Mundo da arte, Caminho De liberdade, Utopia de quem Parte Em busca Do tempo perdido. ERA TRISTE, Mas era belo Esse teu rosto. Desenhei-o Em tensão, Cravei palavras E cores No meu peito, Lentamente, Com a mão, Centrei-as No lado esquerdo, Onde bate A emoção, Mas quando Me olhei Ao espelho... ............ O que vi foi Solidão. PEDI AJUDA Ao vento Que levasse O meu poema Até à tua janela Pra te lembrar O que sinto... ................ Que ele pousasse Nela Como se fosse O destino A bater À tua porta... E OUVISTE A melodia Que soava Para ti Pois logo vieste À janela A recolher As palavras Que o vento Te levou E eu senti Que renascia Na fita Da tua memória... .............. Quando o vento Regressou.

EM CERTOS DIAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Beija-Flor em Magnólia Branca”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2022.

“Beija-Flor em Magnólia Branca”. JAS. 06-2022
POEMA – “EM CERTOS DIAS…”
EM CERTOS DIAS, Teu macio rosto De veludo Alterna Entre suave doçura e Vincos marcados Como sulcos, Aspereza de Sensualidade Sustida À flor da pele Para que não Transbordes Em excesso De ti. COMO SE FOSSES DUAS MULHERES, As faces de Janus, Decidida E evasiva, Passado e futuro, Espartilho Que quase anula O teu fértil Húmus anímico Que remotamente Te inspira, Desde a raiz. MAS TU ÉS UMA SÓ, Aquela que Ficou Sentada Na soleira da tua Alma Quando, em solidão, Saíste, decidida, Para a rua Da tua vida À conquista Do mundo... ACORDA, MULHER, Vai à procura De ti Na fronteira Do teu destino, Olha o mundo Da janela, Mas sai Pela porta da tua Alma De braço dado Com o sol que Tantas vezes Te ilumina O olhar Com as cores Do arco-íris. HÁ TANTAS MAGNÓLIAS (Como tu) No meio do caminho Da tua vida Que basta olhá-las Pra que ela Te sorria. AH, NÃO SABES Quanta metafísica Há numa magnólia Branca! Fala-lhe com os teus Olhos, Acende-a com Teu sopro quente, Acaricia-a com Mãos macias E verás que ela Te apontará o caminho Do reencontro Contigo Na brancura De suas pétalas. E VERÁS TAMBÉM Que tu vives (Como eu) Num intervalo entre ti E o mundo De onde te podes Reconhecer No regresso À tua soleira vital, Para repartires Aconchegada, Contigo no regaço. NA FRONTEIRA - Sabias? - Vemos melhor Para dentro e para fora De nós, Vemos Os demónios E os anjos... VÁ, CANTA A VIDA Com teus olhos, Demora-te um pouco Na janela sobranceira Do teu íntimo A ver passar Aquela que já Não queres ser Porque apaga O rasto do teu Acontecer... .................... E sai com o vento Pela porta do Teu destino. E VAI AO JARDIM Falar com as magnólias E come chocolates E canta E dança E grita se for preciso Até que o eco Te devolva Identidade E teus olhos Se cubram Daquele verde Que nasce nas Encostas, Nos verões Das nossas vidas, Quando o sol Já brilha no horizonte... MAS BRILHA? - Perguntarás. E eu digo-te Que sim Se o brilho Se acender também No teu inquieto Olhar!

“Beija-Flor em Magnólia Branca”. Detalhe.
O BENFEITOR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Um Homem das Arábias”.
Original de minha autoria
para este poema. Junho de 2022.

“Um Homem das Arábias”. JAS. 06-2022
POEMA – “O BENFEITOR”
COMO TE VEJO,
Ó benfeitor,
Filho dilecto
Da tua Ilha,
Nosso Jardim.
Há mil quadros,
Rara beleza,
Espelhos do teu
Amor,
Todos pra mim,
Aqui tão perto,
À minha beira.
Sinto-me rico
De tanta cor
No ouro luzente
Das molduras
De Madeira.
COMO TE SINTO,
Meu benfeitor,
Sempre de negro,
Artista grande
Que nem Dali,
Noites d’Inverno
Onde o preto
É a beleza
E o dinheiro
(Que foi pra ti)
O meu Inferno.
VERMELHO E NEGRO,
Como Stendhal
Ou Julião
(Tens o Sarmento...)
A palpitar
Do coração
(Sem um lamento).
A TUA VIDA
É um Natal,
Com tantas prendas
Dos teus banqueiros,
Mas a minha
É tempestade
Com aguaceiros,
Sempre a pagar...
..........
É natural.
DA ARTE TU ÉS
O Mago,
A colecção
Vai aumentar,
Banqueiro dá,
Finge
Qu'empresta,
É aos milhões,
Mas logo chega
O meu castigo...
..............
É sempre assim,
Sempre a cobrar
(Põe-me mendigo)
O que pra ti
São só tostões.
EU GOSTO D’ARTE
Da que eu faço,
Sem a vender
Nem a comprar,
Mas vou ao banco
(Vou muitas vezes),
Acerto o passo,
Eu tenho contas
Para pagar.
O MEU PAÍS
É muito culto,
Jeff Koons,
Lucio Fontana,
Henri Michaux,
Mas no balcão
(Não sei porquê)
O meu banqueiro
É um sacana...
................
Foi sempre assim,
Vem do avô.
ANSELM KIEFER,
Gerhard Richter.
Frank Stella...
É muito bom!
Pois tem de ser.
Se o banqueiro
Olha pra ela
(Prà colecção),
Fica pasmado
Com tanta arte
E dá-lhe tudo
Por gratidão.
E DUBUFFET,
Não gostas dele,
Ó fruidor?
Piero Manzoni,
George Segal,
Chamberlain,
Morris Louis...
É a beleza
Da colecção
Feita pra ti.
Não percebeste?
Chegas e vês
Gostas e pagas,
És devedor.
Não rogues, pois,
Crente da arte,
As tuas pragas
Ao benfeitor.
GOSTO DE TI,
Da tua arte,
Ficou humana
A nossa banca,
Mas sem milhões.
Que nos importa?
Temos beleza,
Temos amor
Temos as contas
Aos trambolhões,
Temos-te a ti,
Tão generoso...
.................
São os banqueiros
Os aldabrões.
MAS QUE M’IMPORTA,
Ó benfeitor,
Fizeste bem
Mais uma vez,
Pois ajudaste
Os teus banqueiros...
..............
Tinham excesso
De liquidez.
GERALD LAING,
Alain Jacquet
Pauline Boty...
...............
Bem acertaste,
Ó benfeitor,
A liquidez
Ficou pra ti.

ENLACE
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração - “Pasárgada”
Original de minha autoria
Junho de 2022

“Pasárgada”. Jas. 06-2022
POEMA – “ENLACE”
ERA UMA VEZ
Uma videira
De seu nome Cardinal
Que vivia na Latada
Que me cobre
O Jardim
E me protege do sol
Nas quentes tardes
De Verão.
SEM APARENTE
Razão,
Enrolou-se
Nos seus ramos,
Numa certa
Madrugada,
E trepou
Loureiro acima
Como amante
Apaixonada.
QUANDO CHEGUEI
E a vi tão lá
No alto,
Na ramagem
Enrolada,
Subindo
Por ele acima,
Trepando
Pela pernada,
À procura
De carinho
Ou até mesmo
De nada...
...............
Foi tão grande
O meu espanto
Que parti
Para o poema
Pra cantar
Essa videira
Que ficou
Apaixonada.
LOUREIRO COM UVAS...
Aconteceu
No Jardim,
Neste lugar delicado
Repleto de carmim,
De poeta,
O recanto,
Lugar d'inspiração
Com aroma
De jasmim,
De surpresa
E de espanto.
ERAM UVAS
Ou palavras?
Arbusto
Ou poesia?
Eu fiquei
Muito confuso
Da estranha
Alquimia
Nessa tarde
Inesperada
E perguntei
Ao loureiro:
Aqui anda
Mão de fada?
OH, LOUREIRO
Com tantas uvas...
Tinha de ser
Mesmo assim
No recanto e
Nesse dia?
Uma videira-em-verso
Num só passe
De magia?
MAS ERAM UVAS
E palavras,
Era arbusto
E poesia
E poeta me
Tornei
Pra dar asas
Ao encanto
Pois nascera
Um novo dia,
Aquele que
Um dia
Sonhei.

“Pasárgada”. Detalhe
A PORTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Porta”. Original de minha autoria. Maio de 2022.

“A Porta”. Jas. 05-2022
POEMA – “A PORTA”
¡Qué trabajo nos cuesta / traspasar los umbrales / de todas las puertas! / Vemos dentro una lámpara / ciega / o una niña que teme / las tormentas. La puerta es siempre la clave / de la leyenda. / Rosa de dos pétalos / que el viento abre / y cierra. Federico García Lorca, Puerta Abierta, 1921
ILUMINADA Em generosa Cascata De cores, Nesta porta Fria e nua Há mistério Que oculta O outro lado Da rua... .......... O lado Dos sonhadores.
MAS NÃO SEI Se é porta De rua, Se me leva A tua casa Ou se abre Para o mundo, Se é porta De sacrário Que guarda Corpo De deusa, Acesso A templo Sagrado, Lugar de ecos De um poema Sufocado.
BATO LEVE, Levemente, Como quem Chama Por ti Com as cores Do meu jasmim... Silêncio É o que ouço Do princípio Até ao fim.
AH, A VERTIGEM Do mistério Que barra O passo Do lado de cá Do desejo... ................ Por isso o pinto De cores Do generoso Jasmim, Uma profusa Cascata Que brota sempre Das fontes Do meu amado Jardim.
FOSSE ELA, Transparente, Como a minha Janela, Raios de sol, Feixes de luz A entrarem Dentro dela Como seiva Na raiz... .............. Ah como seria Tão belo, Como seria Feliz!
HÁ UM SILÊNCIO Frio Do lado de lá Dessa porta E tropeço No vazio Que não me deixa Passar.
MAS A PORTA É ombreira De mistério E fascina O olhar, É fonte D’inspiração Que me leva A cantar A vida Imaginada De uma tão doce Ilusão.
POR ISSO Eu a componho Sob forma De poema Que logo lanço Ao ar, Fingindo que Sofro o que Sinto Em palavras Que não tenho Para mais tarde Te dar.
NO POEMA, Eu pinto Dessa porta A soleira Porque não posso Passar Esse lado Da fronteira Que encerra O mistério Do outro lado De ti... ............. O lado escuro Da vida, Que sempre Desconheci.
AH, ESSA PORTA, Lugar De invocação, Na memória Permanece Porque é nela Que mais sinto O fascínio Do oculto Que inspira E entretece O poema Na canção.

“A Porta”. Detalhe
A OUTRA JANELA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Outra Janela”.
Original de minha autoria
para este poema. Maio de 2022.

“A Outra Janela”. Jas. 05-2022
POEMA – “A OUTRA JANELA”
DAQUELA JANELA
Já não te vejo,
Mas se visse
O que diria?
Um destino,
Um caminho
Que não sei
Onde me leva
Nesta incerta
Travessia...
SÓ SEI QUE
Parto
Com o olhar
E uma discreta
Dor
Para destino
Ignoto...
...........
Mas por isso
Sedutor.
HÁ SEMPRE
Outra janela
Dentro de nós,
Vê-se
O mundo
Através dela
Para não ficarmos
Sós.
VIAJAR
Ao sabor do vento,
Sentir-se
Um pouco
Vagabundo,
Amigo da evasão,
Perder-se, sim,
Neste mundo
Como alguém
Que não tem chão.
OUTRA JANELA
Sobre a rua,
Sobre um rio,
Sobre o mar
Ou traçado virtuoso
Para meu vale
Abraçar;
Marcas
De passos remotos
Escritos
Na água fria
Ou recanto
Sem passado
Num futuro
Desejado
Como pura utopia;
Um trilho
A desbravar:
Encontrar-te
Lá no fim
Do meu longo
Caminhar...
SIM, OUTRA JANELA,
A que a musa
Desenhou
Pra que eu
Te visse
Nela,
Na montanha
Ou no mar,
Numa praça
Da aldeia,
Numa rua
Em qualquer
Outro lugar...
OUTRA, SIM,
De onde veja
O teu rosto
Assomar
Quando o sol
Me acende
A alma
De tanto no alto
Brilhar.
O MUNDO
Quando acorda,
A nascente,
E entardece,
A poente,
Muda de cor
E de luz
E vê-se
De uma janela
Como algo
Que reluz.
E EU, A TI,
Com esta luz
Interior,
Com outra janela
Na alma,
Vejo-te sempre
A sul,
Antes do
Entardecer,
No infinito
Azul,
Nesse céu
Onde gosto
De te ver.
EU CANTO-TE
Aqui,
Do alto
Desta janela,
Deste meu lado
Da rua
Com alma
Cheia,
Mas nua,
Pra que me vista
De ti...
HÁ SEMPRE
Outra janela
Por onde te possa
Olhar,
A que é feita
De palavras
Lá no alto
Da montanha
Ou no embalo
Do mar...
.............
Onde o poeta
Quiser,
Onde sentir
Que é nela
Que mais te pode
Encontrar.

“A Outra Janela”. Detalhe
O ESPELHO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Perfil de Mulher”. Original de minha autoria. Maio de 2022.

“Perfil de Mulher”. Jas. 05-2022
POEMA – O ESPELHO
“Tu prima m’inviasti verso Parnaso a ber ne le sue grotte, e prima appresso Dio m’alluminasti”. Dante Alighieri. Purgatorio. Canto XXII.
ENCONTREI-TE No Parnaso, Lá em cima, Intangível, Sem te poder Tocar A não ser com As palavras De um poema Sensível às cores Da tua alma.
E VESTI-ME Com elas, As palavras, E senti-me Quente, Afagado No meu canto Porque tu as Escutavas.
SIM, ENCONTREI-TE Lá em cima No Monte. Em ti Eu via a costa E via o mar No horizonte Com nitidez E via O meu mundo Interior Em sonhos De azul, A tua cor, Em toda a sua Nudez.
A NEBLINA Cobria-te O corpo, Como Graça de Botticelli, Pra te refrescar A alma, Morrinha Lenta e fina De palavras Húmidas Caídas Lá do alto Do meu céu De nuvens brancas... ......... Sobre ti.
EU ERA Espelho Que te devolvia Fantasia Contra a Petrificação Fatal Que espreitava Nos olhares Indiscretos Do teu círculo Vital.
MAS TU Não sabias.
SUBITAMENTE, Decidiste declinar O espelho Porque, Dizias, Começava A embaciar-te A alma.
E NÃO ERA DA NEBLINA Que te envolvia, Mas dos desenhos Que tuas mãos Esboçavam Timidamente Nesse espelho Já tão húmido De ti.
E DEIXASTE O Monte. Desceste Apressadamente, Sob os olhares Das mil górgones Que sempre Ameaçam Petrificar Os que vivem No vale. E sucumbiste. Ou talvez não...
NO MONTE, Disse De mim Para mim: De tanto te reveres No espelho, Ficou-me, de ti, O cintilante Reflexo. E sabes o que se Vê Na minha superfície Plana? Beleza. Toda a que me sobrou Quando, Em tristeza, Desceste o Monte.
MAS ESTA NÃO PETRIFICARÁ Porque ficou Guardada No meu corpo Vítreo Onde todos Se revêem Sem saber Que no reflexo Levam, gravada Em transparência, A tua imagem... ................... Embaciada.
E POR CÁ FIQUEI, Espelho do mundo, A olhar para O escuro espaço Sideral À espera que um Cometa Me alumie O caminho Para te devolver O teu reflexo Original E prosseguir A caminhada Solitária A que me votaste.

VEJO-TE NO POEMA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Ponto Cardeal”.
Original de minha autoria.
Maio de 2022.

“Ponto Cardeal”. Jas. 05-2022
POEMA – “VEJO-TE NO POEMA”
VEJO UMA ESFERA
Tingida
De cores
Que me faz
Vibrar
Os sentidos,
Mas há um
Silêncio
Frio
Que me chega
Lá de longe...
...........
Então parto
Para o poema,
Refúgio
Dos meus pecados,
Onde vivo
Como monge.
MAS TREME O CHÃO
No poema
Quando passas
Na estrofe,
Rápida como o vento
Que tudo o resto
Varreu
E em silêncio
Esvoaças
Num círculo
Que é só meu.
MEU SILÊNCIO
É composto
De palavras,
Diz muito mais
Do que quer
E se o poema
Te abriga
Nascem desenhos
Perfeitos
Do teu perfil
De mulher.
MESMO QUE TE ESCONDAS
Ou finjas
Que não és tu,
Te diluas na estrofe
Onde sempre
Fico nu,
Sinto sempre
Esse teu rasto,
Invisível
Como tu.
E TREME A TERRA
Quando passas
No desenho
Que te ofereço,
Mas não te vejo
Tremida.
O traço
Não é banal
(Como sabes),
É nele que eu
Te dou vida.
É FORTE
O meu desejo
De um encontro
Virtual,
Invocar-te
Num poema
Como musa
Ideal
E mesmo que
Os versos
Tremam
Serás sempre,
De certeza,
O meu ponto
Cardeal.

ÍCARO DO TEU SOL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Paraíso”. Original de minha autoria. Maio de 2022.

“Paraíso”. Jas. 05-2022
POEMA – “ÍCARO DO TEU SOL”
TANTA LUZ, Meu Deus! Vejo o brilho Intenso De um azul Que incendeia. É o teu céu, Esse imenso mar, O espelho Refrangente Dos meus sonhos Que dá asas Ao olhar.
O MEU É BRANCO E cintilante Para te iluminar E lá brilham Os teus olhos, Estrelas De navegar.
E QUANDO Nos sonhos Te vejo Iluminada, Divinal, Entro sempre Na porta Branca Que me leva Ao paraíso Levado por uma Fada Em quadriga Sideral.
E VOAMOS, Voamos, Deixando Para trás O meu Jardim Encantado, Os bailéus Da Casa-Mãe Desenhados A rigor, A quelha da minha Infância, Manhãs brancas, Cintilantes, De imenso E fascinante Alvor.
NOS SONHOS, (Em todos eles) Caio das nuvens Brancas Como Ícaro Do teu sol, Quase cego Dessa luz, Sobre as flores Do Jardim, O meu eterno Farol.
MAS A LUZ Reacende-me E ilumina O que me sobra De ti, Em sonhos Escritos Ou pintados A pastel, E, assim, Resisto À voragem Do tempo Com palavras Desenhadas, Fazendo da alma Pincel.

LIBERDADE
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Liberdade”.
Original de minha autoria.
24 de Abril de 2022.

“Liberdade”. Jas. 04-2022
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE,
Num dia
De sol:
“Voas comigo
Prà linha
Do horizonte?".
Deste-me a mão
E sorriste:
“Voo, sim,
Pois preciso
De ar puro
Lá bem no alto
Do Monte”.
E PARTIMOS.
Tu levaste
O arco-íris
Que tinhas
Dentro de ti
E eu as letras
Que tinha
Comigo,
Guardadas
Nesta alma
Solitária
Feita seu porto
De abrigo.
ENREDÁMOS
Todas as cores
Com linhas
De palavras
Deslaçadas,
Construímos
Asas em forma
De verso
E voámos
No céu
De um poema
Pintado todo
De azul...
ANDEI CONTIGO
Por lá
Anos a fio,
Vagueando
Ao sabor da
Inspiração,
Levados
Pela brisa
Que sopra fria
No Monte,
Mas afaga
O coração.
E COMO GOSTEI
De voar contigo,
Livres como
Pássaros
Sobre o vale
Onde te encontrei
Um dia,
Construindo
Castelos
Na areia
Com a força
Da fantasia.
É ASSIM QUE EU
Te vejo,
Tecendo a vida
Com sopro
De alma
E as cores
Do arco-íris
Pintadas
Por tua mão
Como pauta
Colorida
Dessa doce
Melodia
Da nossa bela
Canção.
FOI ASSIM
Que nos dissemos
Nesse tempo,
Livres de amarras
Que não nos deixam
Voar,
Traçando
Em arte
Um destino
Marcado
Pela vontade
De fazer
Da nossa vida
Caminho
De liberdade.

“Liberdade”. Detalhe
ESMORECER
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Teus Olhos".
Original de minha autoria.
Leitmotiv de K. Kavafis
(Poemas: "Cinzentos"
e "Dias de 1903").
Abril de 2022.

“Teus Olhos”. JAS. 04-2022
LEITMOTIV
“Ter-se-ão desfeado (...)
os olhos cinzentos;/
Ter-se-á estragado o belo rosto.
Memória minha, guarda-os
tu como eram./
E, memória, o que podes
deste meu amor,/
o que podes traz-me
de volta esta noite."
.............................
"Não voltei a encontrá-los –
esses tão depressa perdidos.../
Esses olhos poéticos,
Esse pálido/
rosto... no anoitecer da rua...
(...)
e que depois com ansiedade queria."
(Kavafis, K., Poemas e Prosas.
Lisboa: Relógio d’Água, 69-71)
POEMA – “ESMORECER”
JÁ GASTEI Todos os poemas Cantando O que nunca Te ouvi, Já me fogem As palavras E fico mais Pobre de ti. JÁ NEM SEI Se é silêncio Ou são notas Dissonantes Com que desenhas A pauta Dos melómanos Amantes. NEM PALAVRAS, Nem cores, Talvez notas Invisíveis Nessa pauta Desenhada Do silêncio Com que falas... ............. Talvez nada. AH, NEM EU Já saberei Nomear-te Na hora Da despedida, No encontro Que nunca Marcaremos Nessa baça Encruzilhada Onde sempre Te perdi Numa incerta Caminhada. PRA QUE SERVE A poesia Se não a Sentes Por dentro? Pra que serve A pintura Se não a contemplas Com alma? Pra que serve Gritar Se não ouves Com o peito? Pra que sirvo eu, Poeta-pintor, Se não te vejo Por fora, Mesmo que te pinte E te cante Por dentro? PARA NADA, A não ser Para celebrar O futuro De um passado Que logo esmoreceu Para nunca Lá chegar, Perder-se Na rotina Dos ecos Silenciosos Da alma, Enganar-se Com desencontros Inventados, Ir por aí Sem saber Pra onde vou, Desaparecendo Na montra Dos meus inúteis Passeios Pela arte Que desenterrei Das vísceras E de teus sofridos Enleios, Fazendo a minha Parte. AO MENOS DANÇO Em pas de deux Com poemas Desenhados, Enredado Nos mil fios Da fértil Fantasia De um poeta Que levita Sobre escombros De um palco Que nunca construiu Sobre as pedras Da sua poesia. É A DANÇA Da solidão, Contigo Suspensa Nos fios Da teia Em que vou Enredando A minha vida, Até tombar exausto, Ao cair do pano (E do poema)... ........... Que tarda, Sim, que tarda, Para iludir O derradeiro Momento De uma longa E interminável Despedida.

“Teus Olhos”. Detalhe
NEVE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Neve e a Primavera”. Original de minha autoria.
Abril de 2022. E uma bela canção de Milva, "Catarì", sobre Poema de Salvatore di Giacomo (Letra em napolitano e português,
no fim do Poema). Link: https://www.youtube.com/watch?v=8LOYOOPmBzI

“A Neve e a Primavera”: Jas. 04-2022
POEMA – “NEVE”
SE ME PERGUNTASSES PELA NEVE, Que te Responderia? “Tenho-a pura Na alma, Sinto-a quente Por dentro, É vida, É energia”. ENTRA A NEVE NA PRIMAVERA, Cai suave Lá do alto E alimenta-me O jardim, Rega-me fundo A alma (Sem sobressalto) E entra, suave, Em mim. DELA CONSERVO A brancura Fria Do manto Que me ilumina Por dentro, Magia do seu Encanto, Beleza Que me fascina E celebro No meu canto. E QUANDO O INVERNO Me deixa Nascem cores e Voam riscos, Expandem-se Mil perfumes No sagrado do Do meu chão, Tudo brota Para mim E em grande Profusão Na frescura Do jardim. MAS EU PERMANEÇO NA NEVE E a neve fala-me Assim: "Corpo frio, Alma quente, Banho-te Como rio Que nasce Dentro de mim Pra que a arte Germine Como uma bela Semente Que desponta No jardim". EXPLODEM OS MEUS RISCOS Em girândolas De cor, É festa Na minha aldeia, É intenso O clamor, Crepitam foguetes No ar E nós, felizes, Gritamos: “Girândolas Na nossa festa Nunca nos hão-de Faltar...” SE ME PERGUNTARES PELA NEVE Eu ouço-te A voz Cá em cima, Respiro ar Da montanha E respondo-te Em rima, Devolvo Inspiração Que da arte É a vida, Um poema Ou canção Que não é De despedida, Mas de feliz Liberdade Da palavra Proibida.

“A Neve a a Primavera”. Detalhe
A LETRA DO POEMA DE SALVATORE DI GIACOMO:
"Marzo: nu poco chiove e n’ato ppoco stracqua: torna a chiovere, schiove, ride ’o sole cu ll’acqua. Mo nu cielo celeste, mo n’aria cupa e nera: mo d’ ’o vierno ’e tempeste, mo n’aria ’e primmavera. N’auciello freddigliuso aspetta ch’esce ’o sole: ncopp’ ’o tturreno nfuso suspireno ’e vviole... Catarì!… Che buo’cchiù? Ntienneme, core mio! Marzo, tu ’o ssaie, si’ tu, e st’auciello songo io". "Março: um pouco chove e logo deixa de chover: volta a chover, pára, ri o sol com a água. Ora um céu celeste, ora um ar escuro e negro: ora tempestades d’inverno, ora um ar de primavera. Um pássaro com frio Espera que espreite o sol: na terra ensopada suspiram as violetas... Catarina! Que queres mais? Entende-me, meu amor! Março, sabes, és tu, e aquele pássaro sou eu". NOTA - "Marzo" (ou "Catarì").
“Arietta” (1898) do poeta napolitano Salvatore di Giacomo, 1860-1934, em dialecto napolitano. Ouça MILVA em: https://www.youtube.com/watch?v=lMKDSnJEadc).
POEMA PARA UM ROSTO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “O Retrato”.
Original de minha autoria
Abril de 2022

“O Retrato”. Jas. 04-2022
POEMA – “POEMA PARA UM ROSTO”
ENCONTREI-TE,
Por acaso,
Na rua
Da galeria.
Foi Athena,
Foi destino?
.............
Há muito que
Não te via.
E VI-TE
Em contraluz,
O sol batia
De frente
Como tudo
O que seduz
E que me turba
A mente.
EU JÁ NEM SEI
O teu nome
Nem se a deusa
Te mandou,
Mas as cores
Desse teu rosto
Brilham,
Brilham
Como a luz
Que um dia
Me beijou
Num incerto
Mês de Agosto.
RETOQUEI-TE
Com as cores
Com que me
Pinto,
Dei-te mais vida,
Foste musa
Do meu cantar,
Levei-te comigo
À montanha,
Fiz do teu
Corpo
Encanto do meu
Olhar.
E CANTO-TE
Nos meus poemas,
Teu olhar
É como o meu,
Tu falas-me com
O teu rosto,
Eu respondo-te
Com arte,
A que o destino
Me deu.
ÉS GIESTA
Da montanha,
Arbusto
Do meu jardim,
Olho-te
Neste lugar
Onde cresceste
Pra mim.
ÉS ÂNCORA
Da minha arte,
Nunca te hei-de
Perder,
Se eu parto
Para o monte
Volto ao
Anoitecer,
Depois durmo
Ao relento
Sob teu olhar
Demorado,
Porta aberta
Prà montanha,
Sonhar-te, ali,
A meu lado...
..........
E logo que
Amanhece
É sonho que
Me acompanha,
É sentir-me
Iluminado,
Rio de luz
Que me banha.
A MINHA MUSA
É retrato
Que encontrei
Na galeria,
Olho para ele
Como poeta
Que sou,
Cantá-lo
Dá-me alegria,
É poética
Magia,
É vida o que
Lhe dou.

“O Retrato”. Detalhe
CANTA, POETA, CANTA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: "Perfil de um Poeta"
Originais de minha autoria
Março de 2022

“Perfil de um Poeta”. Jas. 03-2022
POEMA – “CANTA, POETA, CANTA”
“Ora al nuovo sole si affidano i nuovi germogli” Virgílio.
CANTA, POETA, CANTA Até que a musa Te ouça, Nem que a palavra Te doa E a alma Estremeça. CANTA, POETA, CANTA Que o teu poema Tem dor Que te baste, Mas tem cor Que alumia E tem sabor A cerejas, Que as dá A Primavera. SE NO CANTAR Tu quiseres Atingir o infinito, Agarra No teu pincel, Salta pra cima Dum risco, Dá-te asas De azul E voa Nesse teu céu Até que a musa Te veja, Te pinte Numa cereja E murmure O teu nome Quando se tinge De cor. CANTA, POETA, CANTA Que o teu cantar Te embala Como água Cristalina Que corre Lesta No rio Que nasce Dentro de ti. CANTA, POETA, CANTA Que contigo Cantarei A alvorada Do dia, Se chorares, Eu chorarei, Por não sentir Alegria, Se sorrires Eu pintarei As cores Do teu sorriso E para ti Dançarei Uma valsa De Strauss Às portas Do Paraíso. CANTA, POETA, CANTA, Para ti E para o mundo Que o teu cantar Enobrece Quem ouvir A tua prece, Quem sentir O teu lamento Que, de ser Já tão profundo, Não o leva Nem o vento Pois ele em ti Entardece. E SE O VENTO O levar Vai procurá-la A ela, Voa lento Sobre a rua E pousa No parapeito Da sua bela Janela. CANTA, POETA, CANTA, Que um dia Há-de ouvir, Deixa que o Tempo passe E a razão Se esclareça, Confia, pois, No porvir Sem que teu estro Esmoreça. NÃO CHORES, POETA, Não, Neste teu Entardecer, Tens arte Na tua alma, Inspiração a crescer E mesmo que ela Não ouça É um modo De a ter.

A FESTA DA MÚSICA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Doce Ciúme”. Original de minha autoria. Março de 2022.

“Doce Ciúme”. Jas. 03.2022
POEMA – A FESTA DA MÚSICA
CERTOS DIAS, Quando a música Me atrai (Irresistível Pulsão), Entro em alvoroço E até sinto Alguma dor, Doce ciúme De amor, Quase rebelião Pelo silêncio Que faz eco A meus versos Diletantes, A solitária Paixão. DOCE CIÚME Do turbilhão Interior Que seu ritmo Produz, Dos arrepios Que faz E do veludo De alma Que a música Me traz. CANTA-SE Do lado de lá, Sinto Calor intenso, Ovações, Danças Extenuantes E expressivos Sinais, Corpos Em êxtase De tão intenso Prazer Em festivos Rituais. É FESTA, SIM, E é baile, É um tremor Corporal Que me liberta A alma Deste mundo Tão banal. É LIBERDADE Em forma de Emoção, É rito, É vibração, Ondas Que me projectam No ar E transportam O meu corpo Para, feliz, Levitar. É LIBAÇÃO, Bebida Contagiante, Bebedeira Sensual, É, como apelo De amante, Um poema Corporal. MAS EU SÓ SINTO Silêncio Do lado de cá Dos meus versos, É ausência Permanente E sem recurso, Melodia Do silêncio Em poético Discurso. INTERPELO Não sei quem No poético Instante, Sabendo que Há alguém Que não ouve E que não sente Este canto Diletante. DOU COR Às minhas palavras E ponho-me Sempre a pintar Pra que as ouçam Com alma, Mas também Com o olhar. QUAL QUÊ? (Penso eu) É só fantasia A fervilhar De emoção No silêncio De um recanto Como se fosse Oração Que redime De uma vida Devorada Com paixão. SINTO CIÚME, Quase inveja, De uma festa Onde o corpo Vibra, Onde a palavra É som Que me convida A dançar E segreda Ao ouvido O que ele Traga consigo Para me arrebatar. MAS SOFRO De melancolia Do lado de cá Dos meus versos, Vejo danças, Vejo corpos Aquecidos Ao som De uma guitarra, Ouço o timbre De uma voz Que me prende Os sentidos, Ouço ecos lá Ao longe, Na memória Já perdidos... .............. E recolho-me Em solidão Para compor Com palavras Meu silêncio Pontuado Nos versos De uma canção.

“Doce Ciúme”. Detalhe
O JARDIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Chakra”. Original de minha autoria. Março de 2022.

“Chakra”. Jas. 03-2022
POEMA – “O JARDIM”
NAQUELE DIA EU vi um estranho Enlace No jardim Onde nasci Para a arte Com que a deusa Me prendou, Uma dádiva Dos céus Ou o brilho De uma estrela Que sempre Me ilumina Nesse mágico Lugar Onde a vocação Despertou. NESSE JARDIM De mil azáleas E do meu vasto Jasmim, De perfumes E matizes Que tomam conta De mim Há cores Que brilham Em fundo De seda pura, Luxuriante Pintura e Exótica magia, Desafio Permanente A poética Ousadia. VERDE, Azul, Vermelho, Amarelo Ou lilás São cores vivas Que me vestem O olhar, Nelas vejo O arco-íris Que nasce Dentro de mim Quando me Ponho a sonhar. É ARCO-ÍRIS, É sim, O que teço Com a alma No Encantado Jardim, É quadro Que pinto Com cores E com palavras, É luz intensa, Embriaguez, Alquimia, Acre perfume De jasmim, Minha secreta Magia. PERCO-ME Nas sete cores, Vou atrás delas, Imparável Correria, Vertigem De voo livre No céu, Redentora Catarsia De quem sempre Se perdeu. SÃO CORES, São riscos, São traços, Palavras Que me procuram, É tudo E é mais Do que a luz Do meu olhar Nesta arte Que me leva Como alta Vaga do mar. REGRESSO SEMPRE Ao Jardim Onde cresci, Levo flores Impressas No corpo, São cores São quentes, São vivas, Até ardentes Em demasia, E nelas Eu me diluo Levado pelo poder Desta minha Fantasia.

“Chakra”. Detalhe
O REGRESSO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Talismã”. Original de minha autoria. Março de 2022.

“Talismã”. Jas. 03-2022
POEMA – “O REGRESSO”
DISSESTE-ME Que partias, Que o coração Em tormento Já te pulava No peito... ............. E que ficar Não podias... “TENHO DE PARTIR, Não me sinto Muito bem, É distante daqui (Bem sei), Como as memórias D’infância E o olhar De minha Mãe." “MAS OUÇO-AS
Lá longe,
Ouço bem As amigas De outrora Que fogem Das bombas Na hora, Mas lembram Hordas antigas Nas ruas do Meu país.” DISSESTE-ME,SIM, Que andavam Por lá Perdidas Na tragédia Consumada, Na procura Impotente Dessa paz Que foi Roubada. “EU GOSTO Das praias De areia branca, Gosto das praças E das ruas Do teu país, Mas é mais forte A raiz, O apelo Que o vento Me traz Do sagrado Chão natal, Poderoso Chamamento, Alvorada Marcial.” “GOSTO DA PRAIA, Oh, se gosto (Acredita), Mas já não a posso Sentir Porque me pula De dor O meu pobre Coração E me leva De regresso Às origens, Ao sagrado Do meu chão.” “JÁ NEM ADORMEÇO Ao som Das meigas ondas Do mar, O cheiro a maresia É vaga Recordação E a paz Em que vivia Eu já não
A posso ter Porque é forte O sobressalto Logo ao Amanhecer.” “ENEVOA-SE A memória, Há muito ruído No ar, Crepitam armas No solo Da minha infância, No abrigo Do meu lar.” “VOU-ME EMBORA, Vou lutar Para o meu solo Materno E se um dia, Caída No chão Sagrado E eterno, Eu não voltar Só te peço Que me cantes Em voz alta, Com alegria (A que agora
Me falta), Num poema Desenhado À beira Do nosso mar.” VAI SIM, Minha Amiga, A paz Há-de voltar E, numa tarde De verão Em tempo de Preia-mar, Sentar-me-ei Contigo n’areia Pra esse poema Cantar.

“Talismã”. Detalhe
VEM COMIGO…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Exaltação”. Original de minha autoria sobre foto (de autor
anónimo) em contraluz. (Quadro da minha colecção privada). Fevereiro de 2022.

“Exaltação”. Jas. 02-2022
POEMA – “VEM COMIGO…”
EU CANTO E pinto O meu destino, Sonhos velados, Minha vida, Meu desatino... PERDI A CHAVE Do meu futuro E só me resta A despedida, Por isso canto Com as aves, Voo mais longe E com mais cor Porque no céu Há mais azul E em meus sonhos Tens mais sabor. HÁ UM SEGREDO Não revelado, Dizê-lo Eu não podia Porque cantá-lo Era pecado E certamente Mentiria. E NÃO O DISSE, Mas eu pequei Com murmúrio Apaixonado Em poemas Inocentes Que levaram O meu canto A ouvidos Impudentes Que estão Por todo o lado. POR ISSO VOO Sempre mais longe Trepo nas cores Pra lá chegar, O céu azul Dá-me alento Para mais alto Voar E meus segredos Pôr a reparo Dos vigilantes Do meu cantar. LEVO PALAVRAS Comigo, Procuro inspiração. Levo cor, O meu abrigo, Levo musas E tudo o mais E quando parto Lá pra cima É sempre festa Neste meu cais. EU CANTO E PINTO Por tudo isto, Pra resgatar O meu pecado De exaltar Esse teu corpo, Pra projectar Em aguarela Esse enleio Do meu olhar E por te ver Na nossa rua Debruçado Na janela Com vontade De te pintar. POR ISSO EU CANTO, Por isso voo, Por isso subo Lá para o alto, Já não os vejo, Já não os ouço, E já não vivo Em sobressalto. MAS VEM COMIGO (Eu dou-te asas), No infinito Do céu azul Voamos Ao mesmo tempo E o nosso rumo Será o Sul. VÁ, VEM COMIGO, Se tu vieres Voaremos No nosso céu, Seremos livres Lá bem no alto E nossa arte Será perfeita Com tudo aquilo Que Deus nos deu.

FUGAZ ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Travessia”
Original de minha autoria
Fevereiro de 2022

“Travessia”. Jas. 02-2022
POEMA – “FUGAZ ENCONTRO”
ÀS VEZES
Passas
Por mim
Como vento
Intangível,
Sonho
Espectral,
Impossível,
E voas
Por entre os dedos
Dessas mãos
Com que te pintas...
VOAS, SIM.
Mas eu não sei
Se vais
Para o pontão
Deste cais
Donde sempre
Nós partimos
Para viagens
Fatais
À procura
D’infinito.
SOPRA-TE
O vento
Na alma?
Desenhas
Com ele
O teu rosto?
Ah, pareces
Triste demais
E é disso
Que eu não gosto.
NA RUA
Do desencontro
Encontrei-te
Apressada...
Fiquei feliz
De te ver,
Embora por um
Instante,
Um pouco mais
Do que nada.
FIZESTE-ME
Renascer
De vaga
Melancolia...
.......
Imagina
O que seria
Se te visse
Duas horas
Ou te tivesse
Um dia.
AH, QUE DOCE
Sensação
Sentir saudades
De ti...
..........
Prevendo
Que não virias
Mesmo assim
Eu não parti
Tão grande
Era o desejo
De te encontrar
Por ali...
E FALEI-TE
Da minha janela,
Olhei, fascinado,
Pra ti:
“Minh’amiga
Como és bela...”
...........
Nem sabes
O que senti...
MAS, NUM SÚBITO
Ímpeto,
Disse pra mim:
“Eu não canto
Esta cantiga
De te ver
Tão pouco assim.
Vou-me embora,
Pois se te
Encontro
Logo me foges,
Se te quero,
Não te procuro...
.........
Eu vivo
Num intervalo
Que mais me parece
Um muro”.
AH, SIM,
Entre ti
E os teus riscos
Eu estou
Entrincheirado,
Caminho só,
Em poemas,
Nunca passo
Deste lado.

O TERRAÇO
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Terraço” Original de minha autoria Fevereiro de 2022

“Terraço”. Jas. 02-2022
POEMA – “O TERRAÇO”
É DAQUI, Deste terraço, Ó deusa, Que te alcanço E te vejo Com a forma Intangível Do desejo. SILÊNCIO, Nuvens, Um lago, Uma luz Que rompe O escuro Da partida E acende O dourado, Elementos Que compõem O teu muro, Meu pecado. É DAQUI Que eu te sonho, Uma fresta No teu céu, Um olhar Que não tem fim... ........ É daqui Que eu te quero Sem limites No poema, Quando Com palavras Te olho E te vejo Como se fosses O fruto Daquilo que eu Mais desejo. É DAQUI Que eu não saio Quando parto Para longe, Pois é aqui Que te tenho Nas raízes Do que sou. ERA AQUI Que eu te queria Se aqui não te Tivesse, Ver-te Ao perto Sem te tocar, Beijar-te Com os olhos Numa noite De luar. VÊS, Meu amor, Como é simples Gostar de ti? A mim basta, Neste encanto, Ficar-me Docemente Aninhado Num recanto... .............. Reinventar-te Por aqui.

“Terraço”. Detalhe
TEU ROSTO ARCO-ÍRIS
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Rubor”
Original de minha autoria
Fevereiro de 2022

“Rubor”. Jas. 02-2022
POEMA – “TEU ROSTO ARCO-ÍRIS”
O TEU ROSTO
É arco-íris,
Dança, dança
Nos meus olhos,
Fascinados
Pelos teus,
É luz intensa
Que brilha
E domina
Como um deus.
É FULGOR,
É raio
Que me fulmina,
Com essas cores
Tão intensas
O meu rosto
Se acende
E de ti
Se ilumina.
HÁ CHEIRO
A maresia,
Sinto sal
Na tua boca
Que me sabe
A poesia
E, quando a digo
Em voz rouca
De tão frio
Ser o mar,
É tão quente
O meu desejo
Que eu quero
É navegar
Para ver
Se lá te vejo.
TUA BOCA
É mar profundo,
Tão azul
Como o infinito
Do céu
Onde gosto
De voar,
Se te beijo
Vou ao fundo,
Mas respiro
Lá bem dentro
Nas profundezas
Do mar.
COM TEU ROSTO
Arco-íris
Brilhas ao sol
Logo ao
Amanhecer,
Mas sempre
Caio em tristeza
Por tão pouco
Te rever.
A TRISTEZA
É saudade
Desse encontro
Tão fugaz,
Meus olhos
Perdem-se
Em ti,
Mas em ti
Encontram paz.
O TEU ROSTO
É arco-íris,
Se te vejo
É alegria sem fim,
Não vás, por isso,
Embora,
Que eu fico triste,
Na hora...
................
Espera um pouco
Por mim.

“Rubor”. Detalhe
DESPEDIDA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração - “Rosas”
Original de minha autoria
Janeiro de 2022

“Rosas”. Jas. 01-2022
POEMA – “DESPEDIDA”
NUM CERTO DIA
(Banal)
Acordei
De um sonho
E lembrei-me
Logo de ti.
Só então eu
Pude ver
(Como no sonho)
Que o teu rosto
Perdeu brilho
E que já
Nem me sorri.
ESSE TEMPO
É passado
Que o tempo
Resolveu.
Aquele que agora
Te evoca
É outro,
Já não sou eu.
NÃO QUERO
Ver-te
Nem ouvir
A tua voz,
Entre mim
E o teu rosto
Já não encontro
Um nós.
AGORA
(E mesmo em sonho),
Teu perfil
Não me fascina
E o olhar
Já não me brilha,
Tudo em ti
Sabe a passado
E nada me diz
Do futuro,
Vejo tempo
Sem raízes
(É destino,
O meu fado?)
No qual já não
Me depuro.
VÊS COMO A VIDA
Vai direita
Por linhas tortas
Seguindo?
Vês
Como o canto
Fortalece?
Saio de ti
Lentamente
Para que o tempo
Resolva
O que num sonho
Acontece.
FICAM TÃO-SÓ
Alguns versos
A marcar
O meu passado,
Registos
Da caminhada
Que num sonho
Fui fazendo
Sem nunca te ter
A meu lado.
MAS O TEMPO
É escultor,
Lapida
As nossas vidas
Deixando apenas
Sinais
Pra que não fiquem
Perdidas.
AH, ESQUEÇO-TE,
Mas não te perco,
Perdi-te,
Mas não t’esqueço,
Lembro-te,
Mas não te quero,
Revejo-te,
Não reconheço,
É mundo
Que já partiu,
Não se pode lá voltar
A não ser com
Um poema
Para com arte
O fechar.

“Rosas”. Detalhe
DUAS HORAS
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Jardim”
Original de minha autoria
Janeiro de 2022

“Jardim”. Jas. 01-2022
POEMA – “DUAS HORAS”
OLHEI-TE NOS OLHOS,
Eram negros,
Intensos
E tão profundos...
Toquei teus cabelos
Com o olhar,
Caminhei a teu lado
Nesse jardim,
Senti o teu corpo
Bem perto de mim
A respirar
O acre perfume
Dessa ramagem
Do vasto jasmim.
INEBRIOU-ME
Esse intenso
Aroma
Do belo jasmim
E eu enredei-te
Num tão doce enleio
Que me parecia
Nunca mais ter fim.
BRILHARAM
Pra mim
Tão docemente
Duas horas inteiras
Esses teus olhos.
E neles me perdi.
ESTIVE NO CÉU
Ao lado de deus
E lá vi dois sóis
Que não eram dele
(Uma luz intensa)
Porque eram teus.
MAS O TEMPO
Correu
Depressa
Demais.
E é sempre assim.
Todos os dias
Se tornam iguais
Quando tu partes
E, em nostalgia,
Eu fico no cais.
VOLTEI A OLHAR-TE
Três horas seguidas,
Parecia verdade
Mas era ilusão
Porque tu partiste
Deixando-me só...
...............
E o que sobrou
Foi a solidão.
SUBIU A TRISTEZA
A saudade irrompeu
Colou-se-me
Ao rosto...
.............
E como doeu!
SE EU NÃO TE VEJO
Sinto
Falta de ti,
Mas se te encontro
Logo te perco
Porque o tempo
Voa
E logo te leva
Pra longe dali.
TER-TE DEMAIS
Aumenta a saudade
E quando te vais
São negras
As nuvens
Da nossa cidade.
AINDA QUE TRISTE
Sinto-me feliz
E com estas mãos
Te vou escrevendo
O que quero dizer,
Mas este meu tempo
Volta a correr
E cresce a vontade
De logo te ver
Mesmo que saiba
Que é nesse instante
Que te vou perder.
EU TENHO SAUDADES,
Saudades de ti,
Desse virar
Da nossa esquina
Na rua de sempre
Onde eu te vi,
Da nossa janela
Donde espreitámos
O que do mundo
Sobrará para nós.
EU JÁ NEM SEI
Que hei-de fazer,
Ter-te demais
É puro prazer,
Mas quando te vais
Eu fico tão triste
Que o brilho do sol
Mais me parece
Um anoitecer.
Olhei-te nos olhos,
Era já saudade
Da tua partida,
Gravei-te na alma
Pra melhor te ter
Porque já sabia
Que não regressavas
A esse lugar
Onde eu te vi
E me encantou
O brilho intenso
Desse teu olhar
Onde me perdi.

A JANELA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Janela”.
Original de minha autoria.
Janeiro de 2022.

“A Janela”. Jas. 01-2022
POEMA – “A JANELA”
NOS VIDROS
Desta janela
Se espelha
Todo o meu ser,
É neles que
Eu te revejo
Quando deixo
De te ver.
DA JANELA
Vejo o mundo
E o mundo
Vê a janela,
Debruçada
No parapeito
Olho o céu
E olho a rua
Para ver
Se passas nela.
NOS VIDROS
Desta janela
Há reflexos
Da vida,
Olho pra eles
Pensativa
Mas não me sinto
Perdida
Se puder
Falar contigo
Quando estás
De partida.
NESTES VIDROS
Da janela
Se espelha
Todo o teu ser
Quando passas
Nesta rua
E me sinto
Estremecer
Da falta que tu
Me fazes
Por ainda
Não te ter.
SE TE AFASTAS
Da janela
E vislumbro
Silhueta
Lá ao fundo,
Longe dela,
Eu sofro
Por te perder...
........
Na rua
E também nela.
VOA PRA LONGE
Essa tua
Silhueta
Que s’esgueira
Na esquina
Como se fosse
Cometa
A passar
Na minha rua,
Mas também eu
Me diluo
E me sinto
Um pouco nua
Na imagem
Transparente
Dos vidros
Desta janela
Como se fosse
Já tua.
FOSTE EMBORA
Do meu mundo
Onde eu
Te queria ter
Ao alcance
De um olhar
Para nunca
Te perder.
MAS NÃO DEIXEI
A janela,
Esperei sempre
Por ti,
Hora-a-hora,
Dia-a-dia,
Até que, por fim,
Eu te vi.
VI-TE
Da minha janela,
Desenhei-te
Com alma
E olhar
De devoção,
Pintei-te todo
A vermelho
Da cor da minha
Paixão...
...............
Mas mesmo assim
Tu partiste
Sem me dar
A tua mão.
DA JANELA
Sempre te vejo
Mesmo ausente
Da nossa rua,
Nos vidros
Fica imagem,
Perfeita
Como a tua,
Mas é sempre
Transparente
E não lhe posso
Tocar,
Guardo-a, então,
Com ternura
Em meu inocente
Olhar.
E GOSTO
Da Primavera,
Confundir-te
Com aromas
Que me chegam
À janela,
Anunciando
A chegada
Do melhor
Que sinto nela.
A JANELA
Não tem cortinas
Pra te ver
Na nossa rua,
Ver-te chegar
E partir,
Ficando um pouco
Mais nua,
Querer que
Me vejas
Assim
Tão brilhante
Como a Lua.
AH, QUANTAS VEZES
Eu desci
Da janela
Para a rua,
Olhava de baixo
Pra cima,
Mas eu nela
Não me via,
E, assim,
Não era tua.
O MEU MUNDO
É a janela,
O da rua
É o teu,
É dela que
Eu te vejo,
Na rua
Já não sou eu.
DA JANELA
Do meu mundo
Olho pra ti
Com calor,
Sem ela
Eu não te sinto,
Fica um muro,
Meu amor.

VESTIDA DE CORES
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Campainhas do Paraíso”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2022.

“Campainhas do Paraíso”. Jas. 01-2022
POEMA – “VESTIDA DE CORES”
VESTES CORES Garridas No palco Desse teu mundo Em danças De luz Como quem grita A beleza Que leva Dentro de si... ......... E seduz. COBRES-TE DE TI, Agasalhas-te A alma, Repetes,
Feliz, Em mil poses O teu rosto Em perfil... .......... E sorris. MAS QUANDO Regressas A ti É como o fim De um sonho Que levou Ao paraíso, A queda De um anjo Na rotina Do viver Convertida... ............. Em sorriso. MAS EU SIGO-TE, Vou E voo Atrás de ti Com poemas Sempre feridos Em cor viva, Por aí, Com versos Em voz Rouca De tanto Eu te dizer, Murmúrios De quem te sente, Palavras De não te ter. NÃO IMPORTA Que a fuga Para a boca De cena À procura De autor Que te cante e Que te conte Ao mundo Seja fuga De ti própria Para a luz Da ribalta, Rituais De celebração Onde a cor Nunca te falta.
EU GOSTO De te ver assim, Luminosa, Oficiante Desse rito Pagão Que celebra A arte E a liberdade Como pregão Nas ruas De uma cidade. MAS EU CONTINUO Por aqui, Na solidão Sideral da Montanha A olhar O horizonte Sem fim, Ao crepúsculo, Pagando Com poemas E rapsódias de cor O meu tributo Aos rituais Da redenção Pela arte
E por amor. AH, COMO GOSTARIA De te rever Na praia Da meia-lua, O nosso cais, No baile Da meia-noite, O brilho Da lua-cheia A acender-te A alma... .................. Mas já é tarde Demais!

PERFIL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Silhueta” Original de minha autoria. Janeiro de 2022.

“Silhueta”. Jas. 01-2022
POEMA – “PERFIL”
AS LINHAS Do teu perfil Tão singelas Ao olhar Lembram-me A tua voz Quando te ouvia Falar. POETA, Logo pintava Essa tua silhueta Com um secreto Pincel, Os traços eram Palavras Desenhadas A caneta Na brancura Do papel. PALAVRAS Leva-as O vento (Era o que eu Te dizia), Mas se ditas Sobre ti Por um poeta Gentil (E eu nunca te Mentia) Ficam gravadas Na alma Quando pinta O teu perfil. CRESCESTE Como camélia, Flor branca Nas folhagens Do Jardim, E sempre que Tu me olhas Iluminas De alvura, Brilho intenso, Cintilante Dessa imagem Que perdura Mesmo quando
Estás distante. PORQUE VIVES No Jardim Em ciclo De natureza Regressas Em cada ano Para afastar A tristeza. DEPOIS PARTES, Mas fica-me O teu perfil Que me fala Ao olhar, A ausência Já não pesa E as saudades Esmorecem Porque tenho A certeza Que um dia Vais voltar.

PARTIR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Melancolia”. Original de minha autoria. Dezembro de 2021.

“Melancolia”. Jas. 12-2021
POEMA – “PARTIR”
ESTOU SEMPRE A partir Do mesmo lugar Onde nunca estou, Por isso não sei O que te dizer Ou então segrede Para onde vou... JÁ NÃO SEI Onde estou Nem quero Partir, Não tenho Lugar De onde sair Porque nem Cheguei A ver-te Entrar Onde já Não vou. TU FOSTE Pra onde, Que eu já Não te vejo? Tenho os olhos Baços de tanto Chorar, Gastou-se O meu rosto De tanto Te olhar, Mas tu não Me vês. Sempre desencontro Na rua perdida... ............ E não somos Três! NÃO HÁ TEMPO E não há lugar Para onde Eu possa ir Porque já nem sei Como cá ficar Ou como partir. TU FOSTE Pra onde? Não sei Onde estás. Só de te sonhar Eu serei capaz, Mas perdi Teu rosto, Só há neblina Neste sonho meu, É fumo espesso Pra cá da cortina Deste teatro Que a vida me deu... ................ E esta tristeza A que me destina. NEM ASSIM POSSO Sonhar-te Porque já perdi A intensa cor Desse teu olhar Por onde Entravam As minhas Palavras Para te cantar. NÃO SEI Onde estás Nem posso Chamar, Dizer o teu nome Com delicadeza Pra te soletrar. PARTISTE DE VEZ Pra outro lugar Que não sei Dizer Nem sei Desenhar, Fogem-me As palavras, Tenteia-me a rima, Procuro cantar Mas já não consigo, Perdi o teu rasto E o teu abrigo. NEM SEI Se me ouves Lá onde Te encontras Em busca Dos sonhos Que te desenhaste Em tinta-da-china... .................. Onde te encontrei Para te cantar Com a melhor rima. MAS TU FOSTE EMBORA E a minha alma Logo entristeceu E por isso chora, Mas esse que tu Já perdeste Serei sempre eu. TU FOSTE PRA ONDE, Mulher dos meus Sonhos? Fugiste de mim , Disseste que sim, Foste na maré Revolta nas ondas Que dão vida Ao mar Onde te espraias Cada amanhecer Sem nunca parar Em todos os dias Desse teu viver. TU FOSTE PRA ONDE Na hora sombria Desse entardecer?

OLHAR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Teu Olhar”. Original de minha autoria para este poema. Dezembro de 2021.

“Teu Olhar”. Jas. 12-2021
POEMA: “OLHAR”
QUE ME DIZES, Quando olhas De través E procuras Ver em mim O que tu lês Nas marés? NO SILÊNCIO Do meu canto, Sinto poder No teu olhar, Fascinam-me Esses teus olhos Porque me sabem A mar. NÃO É AZUL Sua cor, Mas de sol Que ilumina, Olhas pra mim, Meu amor, Quando navego À bolina. ÉS SEREIA No meu mar, Vou-te ouvindo Em sinfonia De cor Com música Da minha Pauta Mas que tem O teu sabor. QUE PROCURAM Os teus olhos? Ler nos meus Desejo De navegar? Mas eu vivo Neste cais De partidas E chegadas Para contigo Embarcar... TEUS OLHOS Verdes Fascinam, A tua boca Seduz... .......... E eu, Pobre Poeta de Outono, Na mais pura Contraluz Que me acende O olhar E a teu barco Me conduz. OLHAS-ME, Então, Inquieta, Ergo-me À tua frente, É fascínio O que sinto E por isso Eu te digo Que o olhar Nunca me mente Seja de bênção Ou castigo. QUE ME DIZEM Os teus olhos?

“Teu Olhar”. Detalhe
VER
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Colibri”.
Original de minha autoria.
Dezembro de 2021.

“O Colibri”. Jas. 12-2021
POEMA – “VER”
QUANDO TE VEJO,
Vejo-te a cores,
Sinto aromas,
Provo sabores
Na fantasia
E vejo traços
E vejo riscos
E tantas fugas
Prò infinito
Nos sete céus
Dessa magia
E eu respondo
Sobre o que
Sinto
Se me perguntas...
...........
- Epifania!
AO LONGE,
O horizonte
Desses teus riscos,
Aqui ao perto
Uma ponte
Desenhada
Que me leva
Ao pé de ti
E se o rio
Transbordar
Sei que te alcanço
Voando
Num colibri.
QUANDO TE VEJO,
Eu vejo ruas
E vejo praças
E catedrais,
Vejo desenhos
Na tua mão,
Vejo vitrais
E vejo sóis
Em refracção.
VEJO O TEU ROSTO,
Vejo-te a ti,
Sentir-te perto
Era o desejo
Nesses poemas
Que escrevi,
Ver o teu céu
Azul profundo
Pra onde voa
O colibri.
VEJO MONTANHAS
E vejo cores,
Eu vejo casas
E vejo amores
Por esses vales
E esses rios
Por onde corre
O fio d’água
Com que regas
O teu jardim
Pra nele nascerem
Os meus poemas
E ter-te sempre
Perto de mim.
SINTO NO AR
O teu perfume,
Cabelos negros
A esvoaçar
E sinto o vento
Nesse teu rosto
E altas ondas
No nosso mar
Mesmo que venhas
Só ao sol-posto
Com os teus barcos
A navegar
Nessas águas
Cristalinas
Onde se perde
O meu olhar.
EU VEJO TELAS,
Os teus pincéis,
Doce pintora,
Vejo a tinta
Na tua mão,
Vejo-te a ti
Tão concentrada
Nesses desenhos
Em construção
A pintar
Um colibri.
VEJO QUADROS
E vejo letras,
Nessa pintura
Vejo sinais
Para eu ler,
Vejo-te a ti
Neste pontão
Do nosso cais
E sou feliz
De assim te ver.
Isso me basta.
Não quero mais.
EU VEJO TUDO,
Eu vejo,
Mas faz-me falta
O teu sorriso.
Nada mais quero
Como desejo
Pois é só disso
Que eu preciso.

LUZ
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Arbusto”. Original de minha autoria. Dezembro de 2021.

“O Arbusto”. Jas. 12-2021
POEMA – “LUZ”
LUZ DO CÉU, Tanta luz Descia por uma Fresta No coração Do arbusto, Raio Na escuridão Que caíra No poeta Como noite No jardim. LUZ, MAIS LUZ, Era o que sempre Pedia, Era luz que lhe Faltava Quando ela Esmorecia No seu olhar Já cansado. MAS ELA CHEGOU Sob forma de poema E desenho Esboçado, Cores quentes e Traços Ao infinito, Palavras Murmurejadas, Num movimento Sem fim Até a luz
Se apagar No arbusto Do jardim. LUZ, MAIS LUZ, Insistia o poeta Ao entardecer De um dia Quando a luz Esmoreceu E, com ela, Também ele já Se perdia. ERA VIDA Que findava, Tempo De despedida Que cedo demais Lhe chegava E obrigava À partida... E A LUZ Reavivou Nas cores E nas palavras Que lhe saíam Do peito E do fundo Da memória Pra recriar A preceito Tudo aquilo Que sobrou De uma paixão Sem glória. SÃO POEMAS Que lhe canta, São cores, São riscos Com que desenha A alma, São sons Dessas palavras Com que Escuta o seu Silêncio, É pauta de melodia Que da tristeza O resgata Como secreta Alquimia. É ASSIM QUE A luz Regressa, O arbusto Ilumina E sua alma Tempera Como harpa Em surdina. VOLTA, POIS, Ao dia em que Tudo começou, Tropeça na Luz intensa, Alumia a sua Alma E põe um fim À tristeza Dessa perda Capital, Descobrindo Nos poemas Remédio Para o seu mal.

O SILÊNCIO E A MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Voo da Rosa”. Original de minha autoria. Novembro de 2021.

“O Voo da Rosa”. Jas. 11-2021
"Para que tú me oigas / mis palabras / se adelgazan a veces /como las huellas de las gaviotas en las playas" Pablo Neruda
POEMA – “O SILÊNCIO E A MEMÓRIA”
NO TEU SILÊNCIO Profundo Entrevejo-te Com palavras Sufocadas, A preto E branco, Com a linguagem Do tempo Que passa Inexorável E erode A suave geometria
Dos traços Com que nos fomos Desenhando Nos dias De festa. E, AGORA, SOBREVIVO, Oblíquo, Neste intervalo Sofrido De onde Vislumbro A tua silhueta Esculpida Pelo crepúsculo De um fugaz Encontro De despedida. “VOU-ME EMBORA Pra Pasárgada”, Diria o saudoso Poeta, “Porque aqui Anoiteceu”. MAS, NÃO, Desta vez Eu não parto, Porque na memória Dos teus Mil rostos Posso ver-te a cores, Aquelas com que Te evadias Em cúmplice Caminhada À procura Do belo... .......... E em troca De nada. NESTA MEMÓRIA Acaricio-te, Em epifania, Com as mãos Invisíveis Da alma E o azul Do céu Que ainda Me sobra Como manto Transparente Da minha Fantasia. PRESSINTO-TE, Adivinho-te Em riscos que Deslizam Dos teus dedos, Dádivas Que me chegam Como brisa Do amanhecer Na praia Da meia-lua. E ESTREMEÇO Quando Te reencontro Nestas veredas Estreitas Da fantasia Com que Te vou reinventando... .............. Com insuspeita Teimosia. VISTO-ME, ENTÃO, De vermelho, Por dentro, A rigor, Solene. E pinto-me A alma Ao sabor do vento, Cubro de rosas Vermelhas O chão etéreo Por onde caminho Suavemente Com o olhar, Dou mais sabor À liberdade, Voando com Uma rosa Pra te poder Alcançar. AH, SIM, Duplico-me Neste intervalo Onde te sonho E te canto Com palavras Que te chegam Desfiguradas Pelo siroco que, No trajecto, Sopra forte Nas ásperas areias Deste deserto Que habitamos. SIM, MAS SE A BRISA Do mar Ainda me acaricia O rosto No amanhecer De cada poema Que me importam A areia
E o deserto?

RENÚNCIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Rua”. Original de minha autoria. Novembro de 2021.

“A Rua”. Jas. 11-2021
POEMA – “RENÚNCIA”
RENUNCIEI Para nunca A perder, Mas nesta Longa privação Vai declinando No tempo O que pra sempre Eu quis ter... VÊS, BERNARDO, Que destino, Que desassossego, O meu? Este que agora Te fala É outro, Já não sou eu. QUE DESENCONTRO Foi esse
Na rua
Da minha vida Desde o dia Em que a vi? Dei-lhe errados Sinais Nos momentos Cintilantes Que com ela Eu vivi? TALVEZ NEM AME Esta minha poesia Porque senti-la É como um
Doce sofrer, É um canto
De pesar
E é canto
De prazer,
É tudo Em quase nada, É melodia De fada Mesmo quando Faz doer. NO POEMA Eu até finjo, É poeta Quem o diz, E mesmo Que sinta O que digo Nunca hei-de Ser feliz. O POEMA É como a vida, Posso ouvir A sua alma Em desejos Com palavras, É um modo De a ter, É remédio Que me salva De em solidão A perder. ESTE CANTO É, pois, meu, Nem ela Mo pode Roubar E se disserem Que é seu, É verdade... ............ De enganar. O VERSO É o meu beijo Nesse rosto Que perdi, É quente Como uma chama E resiste A quem lhe diz Que o poeta Não a ama Porque desenha As palavras Com um pedaço De giz. O AMOR Em poesia É parte nobre
Do mundo, Sofrê-lo Como utopia É ir mais longe, É ir a fundo, Porque poeta Que ama Não é pobre Vagabundo,
Mas luz
Que brilha
Na chama. NÃO GOSTO Desta renúncia, Não gosto, Mas que posso Eu fazer?
Se não cantar O que sinto É certo que A vou perder.

SILÊNCIO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Som do Silêncio”.
Original de minha autoria.
Novembro de 2021.

“O Som do Silêncio”. Jas. 11-2021
POEMA – “SILÊNCIO”
OUÇO O SILÊNCIO
Que me cerca,
Adentro-me
Na multidão
E ele cresce
Por dentro,
Na alma
Me cresce
E, quase, quase,
Como grito
Sufocado...
..............
Me ensurdece.
AH, É DEMAIS,
Este silêncio,
Caustica-me
A pele
Macia da
Memória,
Uma moinha
Na alma,
Silvo
De vento
Cortante
Nas janelas
Destroçadas
Da emoção.
E EU FUJO
Para o ermo,
Lá em cima,
Na montanha,
Solidão de
Eremita
Que procura
A melodia
Do nome
Silenciado,
Aquele que nunca
Ousaste
Pronunciar,
Palavra em degredo
Que só o poema
Pode resgatar.
MAS, LÁ NO ALTO
(É sempre assim),
Ouço uma harpa
Dedilhada
Por ti,
Notas musicais,
E vejo riscos
Esvoaçando
No teu azul
De Lisboa
Em direcção
Ao infinito...
VEJO-TE SAIR
Da neblina
Cintilante
Do rio
Que te veste
E sacio-me de
Palavras
Até que a inspiração
Chegue
E as componha
Em poema
Que te cante
E que te conte
Às nuvens
E ao vento
Que passa...
NOMEIO-TE
E sussurro
Uma pequena
Palavra
Que nunca ousei
Pronunciar,
Mas que ouviste
Ressoar-te
Na alma
Mil vezes,
Em mil poemas
Sufocados...
O SILÊNCIO
É a tua fala
(Bem sei),
Mas eu não sairei
Deste poema
E do ermo reparador
Até que me ouças
E soletres
Finalmente
Esse nome
Com as cores
Da tua fantasia...
FICO PRISIONEIRO
De um poema
Em construção,
Resgate
Desse nome
Perdido
Na ilha remota
Da tua memória,
Como âncora firme
Da minha própria
Salvação.

ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Silhueta”.
Original de minha autoria.
Novembro de 2021.

“Silhueta”. Jas. 11-2021
POEMA – “ENCONTRO”
OS ASTROS
Alinharam-se
Uma só vez,
Passados anos
E anos
De sofrida aridez
Que roubou
Tempo
À fantasia,
Luz
À vida,
Cada instante,
Lentamente,
Cada dia...
ENCONTREI-TE
Sem querer,
Astros
Ou destino,
Quero lá saber,
Se é tão bela
Esta forma
Tão singela
De te ver.
ABANDONEI-ME
Ao destino
E o acaso
Chegou.
Vi-te estranha
Em tardio
Reencontro,
Com a fita
Da memória
A rodar
Em moviola...
ERA INCERTA
A tua imagem,
O olhar
Levemente
Embaciado...
..............
Um arco-íris
Descera
Com o sol
Dessa manhã,
Dourado,
Gotículas
Brilhantes
Como lágrimas
De nostalgia
Cobriram-me
O olhar
Pra te ver
Como se fosse
Magia.
FICOU-ME
A alma cheia,
Cintilante,
A transbordar...
............
Mas o vazio
Também logo
Regressou,
Um sorriso,
Um instante,
Duas palavras
Pra enganar
O silêncio...
.........
E o ânimo
Quebrou.
VISLUMBREI-TE
A caminho do
Destino,
Raptou-me
O acaso
A incerta
Silhueta
Que não pude
Desenhar
No meu campo
De visão,
Como se fosse
Castigo
Sem ponta de
Compaixão.
E AQUI ESTOU EU
Devolvido
À solidão,
Novas saudades
De ti,
Um poema
Em gestação...
SÓ ASSIM TE SEI
Falar,
Fico incerto
Se te vejo,
Troco o passo
A cada instante,
Hesito nesse
Momento,
Finjo aquilo
Que não sinto
E, por fim,
Fico tão-só
Amante da poesia
Que me dá o que
Não tenho...
............
Uma réstia
De alegria.
OS ASTROS
ALINHARAM-SE
Pra te voltar
A perder...
...........
Dois minutos,
Um sorriso,
Pouco mais.
Este novo
Entardecer
Chegou cedo
Ao meu cais.

DESTINO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Voar no Jardim Encantado”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2021.

“Voar no Jardim Encantado”. Jas. 2021
POEMA – “DESTINO”
PINTO E CANTO
O meu destino,
Sonhos velados,
A minha vida,
Perdi a chave
Da tua porta
E só me resta
A despedida.
POR ISSO CANTO
Com as aves,
Voo mais longe
E com mais cor
Porque no céu
Há mais azul
E nos meus sonhos
Há menos dor.
HÁ UM SEGREDO
Não revelado,
Dizê-lo
Não deveria
Porque seria
Grave pecado
E certamente
Mentiria.
E NÃO O DISSE,
Mas eu pequei
Com murmúrio
Apaixonado
Em poemas
Tão inocentes
Como estar só
A teu lado.
POR ISSO VOO
Sempre mais alto,
Trepo nas cores
Pra lá chegar,
O céu azul
Dá-me alento
Pra meus segredos
Eu dissipar.
LEVO PALAVRAS
Comigo,
Procuro inspiração,
Levo cor,
O meu abrigo,
Levo musas
E tudo o mais
E quando parto
Lá para cima
É sempre festa
Nesse meu cais.
LEVO-TE A TI
E deste jeito
Voo sempre
Sobre o teu mar
Para que sinta
Lá bem no alto
Ar rarefeito
E assim te possa
Abraçar.
EU CANTO
E pinto
Por tudo isto,
Pra resgatar
O meu pecado
De exaltar
Esse teu rosto,
Iluminar
Em aguarela
O enleio
Do meu olhar,
Por te ver
Na nossa rua
Debruçado
Na janela
Com vontade
De te pintar.
POR ISSO CANTO,
Por isso pinto,
Por isso voo
Lá para o alto
Em liberdade,
Eu lá não vivo
Em sobressalto
Porque te sinto
Como verdade.
MAS VEM COMIGO,
Eu dou-te asas,
Prò infinito
Do céu azul,
Voamos juntos
Ao mesmo tempo
E o nosso rumo
Será o Sul.
VÁ, VEM COMIGO,
Voa mais alto,
Ah, meu amor,
Se tu vieres
Eu já não sofro
E ganho vida,
Vai-se embora
A minha dor
E já não sabe
A despedida.

VOU CONTIGO PRA PASÁRGADA
A Manuel Bandeira
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Pasárgada”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2021.
(Primeiras versões
do poema e da pintura:
Novembro de 2018).

“Pasárgada”. Jas. 10-2021
POEMA – “VOU CONTIGO PRA PASÁRGADA”
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada,
É outro mundo,
Irmão,
Eu não fico
Por aqui,
Falha-me
Inspiração
Porque a brisa
Do Nordeste
Ficou lá,
No Maranhão.
TENHO SAUDADES,
Manel,
Nostalgia do futuro,
Não quero
De volta
O passado,
Foi um tempo
Muito duro,
Foi um tempo
Confiscado.
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada,
Há tempestade
No ar,
Não quero
Ficar aqui
Porque a brisa
Do teu berço
Não passou
Do Piauí.
PRA PASÁRGADA
Quero ir,
Lá todos
Falam verdade,
Por aqui
Não ficarei,
Já me falta
Liberdade,
Lá sou amigo
Do rei,
É muito bela
A cidade.
GOSTO DE TI,
Ó poeta
Do reino
Da utopia
Em busca
Da liberdade
No país da
Poesia
Onde se canta
E se dança
Porque o ar
É do mais puro
E cheira
A maresia,
Perfume
De divindade.
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada,
Não gosto
D’estar aqui,
Há ruído
Que é demais,
Esta terra
Não me serve,
Eu espero-te
No cais...
..........
Navegamos
No teu barco
À procura
De mar calmo,
Céu sereno
E tudo o mais,
Viajando
No azul,
Peixes voando
No mar,
No horizonte
Uma ilha,
Mulheres lindas
A acenar...
EM PASÁRGADA
Sou feliz,
Canto e
Danço
Na madrugada
Até que o corpo
Se canse
Com alma
Apaixonada
E adormeça
No regaço
Da mulher
Que for
Amada.
POR AQUI OUÇO
Ruído,
Há armas
A crepitar,
Matam poemas
Com gritos,
Já não podemos
Cantar...
VOU CONTIGO
P’ra Pasárgada
Meu mestre
De poesia,
Cantarei os teus
Poemas
Seja noite
Ou seja dia,
Alegram-se
As nossas almas
No reino da utopia.

O POETA-PINTOR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Musa”.
Original de minha autoria.
Outubro de 2021.

“Musa”. Jas. 10-2021
POEMA – “O POETA-PINTOR”
O POETA BRINCAVA
Com suas palavras,
Cantava-te sempre
Quando não estavas.
ERA UM POETA,
Era fingidor,
Não te desenhava,
Cantava-te
A cor.
SUAS CORES
Eram as palavras,
Fazia pincel
Da sua caneta,
O pintor riscava,
Mas a sua tinta
Já não era preta.
POR ISSO COMPROU
Um belo pincel...
.................
Pintava, pintava,
Era a granel,
E a sua tela
Deixou de ser
O velho papel.
DESCOBRIU A COR,
Que o fascinou.
Azul, vermelho
E tanto amarelo...
...............
Tudo ele pintou,
Procurando sempre
O que era belo.
ATÉ QUE O ENCONTROU
Na cor dos
Teus olhos.
Era luz da pura
Que iluminava
O novo papel
Onde desenhou
O teu fino rosto
Com o seu pincel.
DEU CORPO À COR
Com que te dizia,
As suas palavras
Tornaram-se riscos,
Mais que poesia.
PINTAVA-TE ASSIM,
Os poemas
Já não lhe chegavam,
Pintor de palavras
De cor as compunha
E versos voavam
No azul do céu...
..................
“E o que tu fazias
Faço agora eu”
(Dissera-lhe um dia)
“Porque sou poeta
Mas também pintor.
Deixaste-me só
Entregue à palavra
E eu,
Tão pobre de ti,
Pintei-me de dor.”
“MAS EU FAÇO DELA
O meu arco-íris
Pra subir ao céu
A ver se t’encontro
Atrás duma cor,
Pintando o teu rosto
Para um poema
Que vou escrever
Com este pincel
Que trago comigo
Enquanto viver."
O POETA BRINCAVA
Mas era séria
Essa brincadeira,
Perdido em palavras
Encontrou a cor
E nos seus poemas
Dela fez bandeira...
.................
Tornou-se pintor.

TARDO A ENCONTRAR-TE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Mulher,
a Janela e o Espelho”. Original de minha autoria. Outubro de 2021.

POEMA – “TARDO A ENCONTRAR-TE”
TARDO A ENCONTRAR-TE Porque não sei Como procurar-te Levado Por um poema Com as asas Do desejo... NÃO É A VONTADE, NÃO, Mas o destino a marcar Os passos que Eu darei Ou que nunca Ousarei Nesta estreita Vereda Da minha vida. E TU SABES Que não sei, Mas sabes por onde Andei E me perdi, À procura do que Não podia ter Pra preservar O que apenas Me sobrava... ............... Dentro de mim. ÀS VEZES Encontrava-te... Encontros fugazes Onde o teu brilho Cegava Por fora E me iluminava Por dentro... ............... E cantava-te E pintava-te a alma Com palavras roubadas Ao arco-íris. MAS NÃO SEI Se te hei-de querer Para nunca Te ter, Sentir saudades, Logo ao amanhecer, Do perfume
Da aurora, Quando te reencontrava Na memória fresca E matinal Dos afectos
Indefinidos De outrora, Os mais perfeitos E contidos. SIM, DEIXO-ME IR Nas mãos do destino, Bem sabes, Mas há sempre Um súbito Sobressalto Quando o real Me atropela Por dentro E tudo se torna Inóspito... MAS SE NÃO Me deixo ir Por aí, Viajo para outros Lugares, Tenho sempre De viajar À procura de mim, De um espelho onde Me veja por dentro A olhar-te Por fora, À espera do próximo Sobressalto... ................ Que nunca demora. AH, COMO ME FALTA Esse véu que te cobre Quando te quero Pintar com palavras E te vejo Nua, Com a alma a tiritar, À mercê dos sobressaltos Que te marcam Como sulcos, Cicatrizes ásperas Da vida. MAS EU PROCURO-TE Com disfarçado E tímido Olhar, Perscrutando A alma Que se aninha Em ti Para te proteger Do risco da beleza Exposta Como fractura, Aquela que os poetas Sofrem, sim,
Mas cantam Quando sentem a Liberdade Ali por perto. TALVEZ A NOITE Te sirva de véu E te cubra
As cicatrizes Da vida, Luz coada pela Penumbra Que te amacia A pele Encrespada E te devolva como Sonho Acetinado Onde reinventar-te Como mulher Desejada, Para além do bem E do mal, Para além do pecado. MAS EU NÃO SEI, Tenho medo Dos sobressaltos, De ser atropelado Na esquina de um Inocente Jogo sedutor Que te cative a Alma Já em fuga Para o infinito Que, ao longe, Se cruza Nos nossos olhares... .............. Intermitentes. TARDO A ENCONTRAR-TE No bulício dos nossos Dias, Até que no amanhecer De um poema Te volte a visitar E te diga, Com olhar Submisso: "Ah, que saudades Eu tinha de ti..." Mas talvez já seja Tarde demais.

CATEDRAL
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "A Fonte".
Original de minha autoria.
Outubro de 2021.

“A Fonte”. Jas. 10-2021.
POEMA – “CATEDRAL”
VIAJEI NO TEMPO
Até à cidade,
Encontrei-te
Por ali,
Rosto sereno,
Inocente,
Como quem
Sempre sorri.
FOMOS AO TEMPLO
Da rua
Da minha vida,
À cúpula
Da catedral...
..............
Não te abracei
Nessa noite,
Era sagrado
O lugar,
Seria abraço
Fatal.
MAS FICOU-ME
O prazer
De te ter ali
A meu lado,
A sonhar-te
Nos meus braços,
Nos beijos
Que não trocámos
Numa noite
De luar,
Quando o amor
É mais intenso
E o corpo
Se desnuda
De tanto a lua
Brilhar.
FOMOS À PRAÇA
NAVONA,
Escutámos
As águas
Da "Fonte
Dos Quatro Rios"
(Essa dádiva
Do Bernini),
Íntimos,
Em sintonia,
Antevendo um futuro
Que nunca mais
Chegaria...
ATÉ QUE ME PROCURASTE
Nessa fita
Da memória,
A noite perdida
De afectos
No alto da catedral,
Corpos tensos,
Sem palavras,
Na fronteira
Do amor...
TORNOU-SE MAIS VIVO
Que nunca
O que não aconteceu
Como se fosse
Futuro
Que, afinal,
No teu passado
Ainda não se
Perdeu.
E CÁ ESTAMOS DE NOVO
À procura
Dessa noite,
Dos beijos
Que não te dei,
O passado já é
Futuro
E desse tempo
No limiar
Do sagrado
Já não sei
O que farei.
TALVEZ FAÇA UM POEMA
Para te reencontrar,
Cantar esse
Sorriso terno
De que sempre
Eu gostei,
Voar no tempo,
No espaço sideral,
Pousar de novo
Contigo,
Numa noite de luar,
Na cúpula
Da catedral...

“A Fonte”. Detalhe.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Oráculo".
Original de minha autoria.
Setembro de 2021.

“Oráculo”. Jas. 09-2021.
POEMA – “TEMPO”
É TEMPO DE RECOMEÇO?
Talvez seja,
Talvez não.
O que ontem
Eu já era
É o que hoje
Eu sou,
Não é tempo
De mudança
Nem tempo
De negação
Porque gosto
De cantar
Neste lugar
Onde estou.
O DESEJO
(Sempre instável)
Pediu tempo,
Rituais,
Celebração,
Mas o tempo
(Insondável)
Resistiu
Ao que a vontade
Tentou...
..............
É tempo
De recomeço
Quando o tempo
Não passou?
EM CADA MOMENTO
Da vida
Procuro
O tempo
Que antes
Eu não vivi,
Procuro
Reinventar
Tudo aquilo
Que perdi,
Num poema
Ou em pintura
Para repor
O que sou
Antes que volte
A perder-me
Nos lugares
Pra onde vou.

“Oráculo”. Detalhe.
INFORMAÇÃO AOS LEITORES

A TODOS OS AMIGOS E LEITORES QUE AQUI ACOMPANHAM A MINHA POESIA, A MINHA PINTURA, OS MEUS ARTIGOS E ENSAIOS, INFORMO:
1. Durante o mês de Agosto suspenderei a regularidade das minhas publicações. Foram vários anos sem interrupções e chegou a altura de fazer uma curta pausa de reflexão.
2. Entretanto, antecipo a capa de um Livro de Poesia de minha autoria, João de Almeida Santos, Poesia (Lisboa, Buy The Book, 2021), prestes a entrar em tipografia. O livro inclui 67 poemas, um capítulo “Sobre a Obra de Arte” e, outro, com “Diálogos com os Leitores Digitais” sobre vinte dos poemas aqui publicados, tendo alguns destes poemas ilustração no livro. Tem 438 páginas (contando com as ilustrações), capa rija, cosido, com 12 ilustrações de minha autoria reproduzidas em papel couché mate. A capa reproduz uma obra minha: “O Aurífice”, criada para o poema “Esculpir-te”.
3. Prevejo que o livro esteja disponível ainda este mês ou no início de Setembro.
4. Será uma edição limitada (150 exemplares) e só pode ser adquirido por encomenda, via WhatsApp, Messenger ou E-mail, feita ao autor.
5. É editado pelas Edições Buy The Book.
6. Aqui fica uma antevisão da Capa e do Índice.
7. Índice do livro: João De Almeida Santos, Poesia, Lisboa, Buy The Book, 2021
NOTA INTRODUTÓRIA I - SOBRE A OBRA DE ARTE II - POESIA 1 - CANTAR Sou o que sou Palavras O poema Canta, poeta, canta O poeta que se fez pintor Pintei-te Não sei se te chegam, as palavras A carta Segredo I Solidão Esculpir-te Invocação Lua O poeta e a máscara O poeta e o vendaval Elas fogem, as palavras A palavra proibida Confissões de um confinado Geometria O benfeitor 2 - TEMPO Tempo A porta do tempo A reinvenção do tempo Espelho do tempo A fronteira Na bruma da memória Março Mudam os ventos e mudam as palavras Catedral Rituais Para Leonard 3 - RAÍZES Jasmim Romã Tentação Teu corpo de cristal Casta diva Mandei podar o loureiro O pavão O jardineiro 4 - VIAGEM Viagem Liberdade 5 - MUSA Musa Cor, dá-me cor A flor de papel O meu nome Marmelada O brinco O beijo Não sei A janela À janela Certos dias Encontrei-te lá em cima, no monte Origem Segredo II Caminhos paralelos Valsa Pas de Deux Nostalgia 6 - SONHO E UTOPIA Sonhar A aguarela Quase Alma Um sonho na aldeia Vou contigo pra Pasárgada Vã utopia III - REFLEXÕES EM TORNO DOS POEMAS Diálogo com os Leitores Digitais IV - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAs
#JAS@08-2021
FLOR DE PAPEL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Fleur de Papier en Vol à la recherche du Poème perdu dans un Jour d'Hiver"”. Original de minha autoria. 25 de Julho de 2021.

“Fleur de Papier en Vol à la recherche du Poème perdu dans un Jour d’Hiver”. Jas. 07-2021.
POEMA – “FLOR DE PAPEL”
NUM DIA DE INVERNO Uma flor de papel Voou Para longe, Levada pelo vento, Rajadas fortes Quebraram Os subtis Filamentos Que a ligavam À raiz de onde Nascera... ........... Seu alento. CONTINUA A VOAR, A flor de papel, Ao sabor do vento, Pousando Aqui e ali E logo voando Para outros Destinos, Num perpétuo Movimento. PERDEU AS CORES Luminosas Que exibia E a fonte D’inspiração (Sua seiva De cada dia), Borboleta Já sem pólen Para nova Gestação No jardim Da fantasia. MAS NUM DIA Quente De Verão (Eu bem sabia) Encontrei-a, Por acaso, Aninhada Num arbusto, À espera que O vento A levasse Prà ilha Da utopia. PEGUEI-A Na minha mão E levei-a Ao Jardim Do meu poeta Pintor, Nosso chão E recanto Inspirador. DEU-LHE COR, O meu poeta, Alisou suas Rugas De papel, Mostrou-lhe O horizonte Lá em cima Na Montanha Nesse dia de Verão E logo a lançou Ao vento, Ao encontro De raiz Que nutrisse Com a seiva Uma nova Floração...

A MONTANHA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Mulher”. Elaboração
de minha autoria, apud Gustav Klimt
(“Estudo de uma Jovem”, 1885).
Julho de 2021.

“Mulher”. Jas. 07-2021.
“I live not in myself, but I become / Portion of that around me; and to me, / High mountains are a feeling....” LORD BYRON Childe Harold’s Pilgrimage (1812-18). Canto III, 72 (1816).
POEMA – “A MONTANHA”
ESTOU A PERDER-TE, Meu amor, O estro Esmorece, Vai perdendo Lentamente O seu fulgor, O poema Empalidece E eu, Em poética anemia, Já sinto Um suave E sonolento Torpor. SUBI A MONTANHA Contigo E, feliz De lá chegar, Com palavras Que me deste Eu aprendi A cantar. CANTEI A TUA PARTIDA Quando desceste O vale E eu, Triste, caminhei Por veredas Sem destino A que nunca Mais voltei. PERDIDO De ti, Vagueei À procura De eco Do meu canto Derramado, Som puro E cristalino Que pra ti Foi desenhado. MAS O ECO Era silêncio Profundo Vindo do azul Quase irreal Da abóbada Celeste Na montanha Seminal. NEM SEQUER O CLARÃO De um cometa Fugaz Me visitava, Pinhal abaixo, Rumo ao horizonte Do meu inquieto Olhar. O AR RAREFEITO Da montanha Tomara conta De mim, Desfalecia A emoção De te rever, Reinventar E cantar Em surdina Perante o Silêncio Cortante Que me negava, Impenitente, O eco da Minha canção. ERA POÉTICA Anemia, Nos sentidos Desmaiados Calava A melodia, O som Era murmúrio Inaudível, Sem ponta De comoção, Alma ferida Que já nem A dor sentia De tão gasta Nesse tempo Por excesso De paixão. AGORA DESÇO Também eu Ao vale Da minha vida E regresso À triste monotonia, Sem ti, Sem corpo Imaginado, Semente De poesia. O VALE ESPERA-ME, Já tem sabor A rotina Porque sei Que não te vejo E estremeço, Que já não Sobram sinais Da rua do Desencontro, Fugas Irreais Para os teus Infinitos Nem janelas De onde te veja Passar Ou sequer imaginar Na esquina Esquecida Do nosso Contentamento. ESTOU A PERDER-TE, Não há janela Nem infinito Ou cor, Não há tempo Nem lugar, Não há poema Nem mar Que suspenda O vazio De não te poder Encontrar... ............. Eu perdi-te, Meu amor.

ARTE AO VIVO – 8
NO MEU JARDIM ENCANTADO
“O VOO DA MAGNÓLIA”, 2021
Partilho a imagem de mais um quadro já pronto para a Exposição em preparação, 90,5×115,5, em papel de algodão Hahnemuehle e com vidro de museu (70%). Este quadro pode ser adquirido, mediante comunicação de eventual interesse via E-mail, WhatsApp ou Messenger.
JAS – “O VOO DA MAGNÓLIA”, 2021


PAS DE DEUX
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Penché”.
Original de minha autoria.
Julho de 2021.

“Penché”. Jas. 07-2021.
POEMA – “PAS DE DEUX”
SOU COREÓGRAFO
Da minha alma,
Desenho-me
No espaço,
Embalado
Pela suave
Melodia do teu
Silêncio.
IMAGINO-ME,
Às vezes,
Num "Pas de Deux”
Contigo
Num palco
Em noite
De luar
Ali, na praia
Da meia-lua,
A dançar
O murmúrio
Desse mar
Com que te
Pintas
E ouves
Dentro de ti.
DANÇAMOS
Com palavras,
Enleados
Pelos fios
Dos poemas
Com que
Teimosamente
Ilumino
Os caminhos
Por onde nunca
Ousarás passar.
O SILÊNCIO
É a tua
Sinfonia,
O teu canto
De sereia,
A melodia
Que ressoa
Nesse mar
Murmurejante
De linóleo
Onde nos desenhamos
Em suave
Bailado,
Numa despedida
Que nunca
Terá fim.
GOSTO DESTA DANÇA,
Contraponto
Dos sinais
Invisíveis
Com que pontuas
A tua assinalada
Ausência,
E imagino-te
Num bailado
A solo
Com o som
Da minha poesia
Na praia
Da meia-lua,
Numa noite
De luar
E perfume
A maresia.
CANTO-TE, SIM,
Mas neste meu
Canto
Eu conto-me
Como espelho
Onde podes
Rever
O passado
Desse futuro
Que nunca
Existirá.
AGORA, SOZINHO
No linóleo,
Acendo um sol
Com as minhas mãos
E procuro
O que nunca
Encontrarei...
..........
A não ser
Sombras
De mim próprio
Gravadas
Na areia branca
Da baixa-mar.
ESTE,
O que te celebra
Em arte,
Já não sou eu,
Mas o coreógrafo
Da minha
Melancolia

O BEIJO
Poema de João De Almeida Santos.
Ilustração: "O Beijo". Original
de minha autoria para este poema.
Dia Internacional do Beijo -
- Seis de Julho, dia que celebro,
com um poema, cada ano.
Inspirado em "Lotte in Weimar"
(1939), de "Thomas Mann,
a obra que continuou "Werther"
(1774), de Goethe, e no meu
romance "Via dei Portoghesi".

“O Beijo”. Jas. 07-2021.
LEITMOTIV
“O amor é o melhor na vida, assim,
no amor, o melhor é o beijo –
Poesia do amor...”. “Beijo
é alegria, procriação é luxúria”
Thomas Mann
Inspirado também em:
“Os beijos escritos
não chegam ao destino,
mas são bebidos pelos
fantasmas ao longo
do trajecto”
Kafka
“Se para te beijar devesse,
depois, ir para o inferno,
fá-lo-ia. Assim, poderia
vangloriar-me, com os diabos,
de ter visto o paraíso
sem nunca lá ter entrado”
Shakespeare
“O primeiro beijo não é dado
com a boca, mas com os olhos”
Bernhardt
POEMA – “O BEIJO”
FOI O QUE NUNCA
Te dei
A não ser
Com o olhar,
O primeiro,
Esse beijo,
Dei-to, pois,
Sem te tocar.
E DEI-TE MAIS,
Com palavras,
Quando olhar
Já não podia,
Foste embora
Para longe
E eu, triste,
Não te via.
FORAM BEIJOS
Que sonhei
Na rotina
Dos meus dias
E desejos
Que enfrentei
Quando tu mais
Me fugias.
MAS DOU-TE BEIJOS
Escritos
Que se perdem
No caminho
E se me falta
O poema
Fico ainda mais
Sozinho.
O BEIJO
É emoção,
É razão
Descontrolada,
Se não for dado
A tempo
Pouco mais será que
Nada.
SEM BEIJO
Não há amor,
Sem amor
Perde-se o beijo,
A vida perde
Sentido
Se me faltar
O desejo
De na alma
Te beijar
Por assim te ter
Perdido.
AQUI O LANÇO
Ao vento
Pra que atinja
Como brisa
E suave melodia
Esse rosto
Que precisa
De afecto
Em poesia.
ESSE BEIJO
Que me falta,
De que nunca
Fui capaz,
Voa pra ti
Em palavras
Na sua forma
Mais pura
E desejo que,
No trajecto,
Voe, voe
A grande altura,
Que fantasmas
Não o bebam
E minha dor
Tenha cura.
MAS SEI
Dos escolhos
Da via,
Dos perigos
Que ele corre,
Capturado
Por fantasmas
É mensagem
Que me morre.
NO DIA DO BEIJO
É hora
De te cantar
Em voz alta
A poética do amor
Pra me redimir
Dessa falta
Com palavras
De poeta
Desenhadas para ti
Com mestria
De pintor.
E PORQUE O DIA
É teu
Ganha força,
Intensidade,
Mesmo que fantasmas
O bebam
É um beijo
De verdade.
ESSE BEIJO
Que não dei
Foi pecado
Original,
Hei-de sofrê-lo
Pra sempre
Como chaga
Corporal.
NÃO HÁ PALAVRAS
Que bastem
Pra repor
O que não dei,
Elas voam,
Mas não chegam
E mesmo assim
Eu tentei.
É CERTO QUE SEMPRE
O quis,
Só que nunca
To roubei,
A culpa foi desse tempo,
Dos dias em que
Te amei,
Um tempo em diferido
Sem presente
Nem futuro,
Talvez beijo
Sem sentido
Porque queria
Do mais puro,
Tangendo eternidade
Às portas
Do Paraíso,
Um beijo
De divindade,
Mas simples
Como um sorriso.
ESSE BEIJO
Impossível
Que não é do
Foro humano
Vou tentando
Construí-lo
Cada dia, cada ano,
Perdendo-me
Pelo caminho
Como sagrado
Em profano.

“A Ponte”. Jas. 07-2021. Detalhe.
METAMORFOSE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Ponte”. Original de minha autoria para este poema. Julho de 2021.

“A Ponte”. Jas. 07-2021.
POEMA – “METAMORFOSE”
CAMINHAS Suavemente, Tão irreal, Sobre todas As cores Que te dei. És planta De Jardim Com perfume Que eu sempre Procurei... TENS FLORES Brancas No corpo, Aquelas de que Cuidei, Alimento De meus olhos E aroma Dos poemas Que para ti Cantarei. CAMELLIA É o teu nome. Encontrei-te, Desta vez, Em profunda Solidão, Alvura Tão luminosa Que quase Te desejei Na palma Da minha mão. QUIS TRAZER-TE Para dentro Do poema, Disseste Logo que sim, O encanto De um abrigo Que é cuidado Por mim. FALEI CONTIGO, Dei-te palavras, Apontei-te O caminho Pra vencer A solidão Pois, tu, Divina brancura, Não sofrerias A dor Se viesses ao Abrigo E me desses A tua mão... CAMINHÁMOS Juntos Numa ponte Prà outra margem Da vida Com passos De liberdade Que nunca Pra nós seriam Passos de Despedida, De tristeza E de saudade. VEJO EM TI Uma mulher Deslumbrante, Recrio-te Com afeição, Pinto-te Em movimento, Quero-te livre A voar Ao sabor Da inspiração, É azul o teu Caminho, Levo-te eu Pela mão. ESSA PONTE De papel Que parece um Arco-íris Vai levar-te Ao Jardim Onde a cor É alimento, É como favo De mel, De meus olhos O sustento Quando pinto O teu rosto Com palavras... .......... A pincel. COMO VÊS, A solidão De uma flor Pode ser libertação Se a pintarmos Com palavras E lhe dermos Muita cor Com a força da Paixão.
ARTE AO VIVO – 5
No meu Jardim Encantado
“Pasárgada”, 2021
Partilho a imagem de mais um quadro já pronto para a Exposição em preparação, 108×138, em papel de algodão Hahnemuehle e com vidro de museu (70%). Este quadro pode ser adquirido, mediante comunicação de eventual interesse via E-mail, WhatsApp ou Messenger.
JAS – “PASÁRGADA”, 2021

JAS – “PASÁRGADA”, 2021

AUSÊNCIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Silêncio”. Original de minha autoria. Junho de 2021.

“Silêncio”. Jas. 06-2021.
POEMA – “AUSÊNCIA”
SINTO A TUA FALTA, Ah, eu sinto, Por isso canto e danço Até cair exausto No palco De um poema. SINTO O TEU SILÊNCIO, Que já nem Murmúrio é, Um vazio cá No fundo De que o canto É o eco E sofrido Contraponto. RECORDO, Mas já não sinto, O veludo Da tua pele E, por isso, Eu a pinto Numa folha De papel. EU NÃO OUÇO A tua melodia. Caio, pois, Sempre em silêncio Para melhor Te sentir Cá dentro Da fantasia. FAZ-ME FALTA A tua voz, Faz-me falta O teu sorriso E como já nem Me pintas O nome Eu canto-te No meu poema Pra que te possa Inventar. DA TUA FALTA Nasceu em mim Uma orquestra Para uma Sinfonia, Contraponto Do silêncio Que teimas Em desenhar Como tua melodia. NA TUA AUSÊNCIA Eu vejo corpos Que dançam Abraçados Ao sabor da Fantasia Em andamentos Sem fim, Vejo luzes, Vejo cores, Sinto aromas De mil flores Que me fazem Companhia Neste palco De um poema Inacabado Porque lhe falta Alegria. TU FALTAS-ME E eu revivo-te No canto e Na cor, Na dança E no amor... ............ Em poesia. São palavras Que lanço Ao vento, Construindo As pontes Invisíveis Desta minha Utopia. TUDO RECRIO Pra te reencontrar À distância De um poema, Cantar-te, Dançar Com as palavras, Dizer-te Em surdina Para melhor Ouvir O que nunca Me dirás. VISITO-TE, ASSIM, Das mil maneiras Com que te Procuro E te digo, Encerrado Nesta torre De marfim, Numa teia Enredado Pra melhor Te reviver Com a leveza Da arte Cá bem mais Dentro de mim.

NA BRUMA DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Magia”. Original de minha autoria. Junho de 2021.

“Magia”. Jas. 06-2021.
POEMA – “NA BRUMA DA MEMÓRIA”
QUERIA LEVAR-TE Uma rosa Branca Aos sete céus Do meu afecto, Desci fundo Na memória Onde ainda te Guardava Como se fosse Teu tecto. PROCUREI-TE Na bruma Espessa Que caía Sobre mim E quase não te Encontrei, O tempo gastara O passado, Ficou uma saudade Sem fim. PERDERA-TE O rasto E o perfil, Até teu nome Perdeu cor, Teu olhar Luzia Intermitente Numa neblina De dor. NO MEIO DA NEBLINA Esfumava-se O teu rosto De tanto eu Te perder, Era incerto O cintilar De teus olhos Na vontade De te ver. ERAS BRUMA Indefinida Nos céus onde Te quis encontrar, Mas sobraste Como imagem... .............. A que eu soube Desenhar. PERDI-TE A VOZ E a tua Melodia, Quase tudo, Meu amor... ............... Ah, mas, no fim, Não te perdia... Ficou-me de ti O sabor. PORQUE JÁ ERAS Imagem Que me sobrou Desse afecto Que por ti Sempre senti, Construção De arquitecto Para nunca Te perder Desde o dia Em que te vi. E VOLTEI. (Eu volto sempre). É desejo De te ver, Dar-te corpo Nas palavras Com que te quero Dizer Ainda que Do poema E dos céus Do meu afecto Acabe por Te perder. AGORA, DESENHO-TE Com palavras e Com cores, Com paisagens Que tenho dentro De mim, Com rostos, Com aromas E flores Deste bendito Jardim, Um passeio Com pavões, Uma delicada Utopia, Gritos de alma, Emoções... ................ Pra te recriar Com magia E contigo Caminhar No alto Da fantasia, Onde vive Essa imagem Que desejo Encontrar. VOO, POIS, Com uma rosa, Vestido como Arcanjo, Pra te ver Ali ao perto, Olhos negros, Cintilantes, Mas um pouco fugidios Ao jogo da sedução Numa noite De luar... ............ Ou talvez De perdição. É UMA ROSA De brancura Transparente Pra que sintas Lá bem alto O aroma Desta minha fantasia. Talvez assim Te encontre Envolta na neblina Que nunca se dissipou (Mas agora cristalina) Desde aquele Incerto dia Em que o nosso Olhar se cruzou.

“Magia”. Detalhe.
ARTE AO VIVO – 4
NO MEU JARDIM ENCANTADO
Partilho a imagem de mais um Quadro, dimensão 66×83, já pronto para a Exposição em preparação, em papel de algodão Hahnemuehle e vidro de museu (70%). Este quadro pode ser adquirido, mediante manifestação de interesse via E-mail, WhatsApp ou Messenger.
Título da Obra - “MARÇO” (2021)


ELAS FOGEM, AS PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Letras”. Original de minha autoria. Junho de 2021.

“Letras”. Jas. 06-2021.
POEMA – “ELAS FOGEM, AS PALAVRAS”
QUERIA FAZER-TE Um poema, Ser feliz, Sentir nele A liberdade E as palavras Endoidaram Quando te queria Cantar Invocando A saudade. FUGIRAM Numa revolta Sentida Sem conhecer A verdade, Deixando-me Só Nesta vida, À deriva, Sem dó Nem piedade. EU ESTAVA A MENTIR Sem pensar Na crueldade De as usar Como queria Só porque Tinha saudade... ESGUEIRARAM Rua fora, Cada uma Por seu lado, Espavoridas, Em fuga Deste poema Tentado. UMAS ESVOAÇAVAM No fio Do horizonte, Outras Aninhadas No passeio Desta rua E eu a tentar O versejo Enredado Num enleio Para dar vida Ao desejo. PALAVRAS em correria, Letras Perdendo forma Como fios De novelo Já desfeito De sentido Como a água Do gelo. SÃO FIOS Emaranhados, Letras Que se deslaçam E procuram Outras formas Para lá da minha Rima, Como riscos Numa tela A subir Por ela acima. QUERIA FAZER-TE UM POEMA Com palavras Desenhadas, Mas as palavras Fugiam E corriam Assustadas, Não se viam Alinhadas Nesse recanto Feliz Onde resisto À saudade. ELAS GOSTAM De cantar Quando me sentem Em dor, Elas gostam De vibrar Se me assalta A emoção, Mas se me vêem Feliz Fogem de mim, Dizem “Não”. O POEMA PASSARINHO Procura-te Pra cantar Mas quando A dor esvaece É ele que foge A voar. E HOJE É mesmo assim, Fogem todas As palavras Sem procurar Um destino, Já não consigo Agarrá-las Num poema Genuíno. NÃO SABEM Da minha dor E por isso Vão embora. Estou sem palavras, Amor, Estou muito triste, Agora.

“Letras”. Detalhe.
O POEMA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Auto-Retrato
de um Poeta”.
Original de minha autoria.
Junho de 2021.

“Auto-Retrato de um Poeta”. Jas. 06-2021.
POEMA – “O POEMA”
PARA QUE SERVE
O poema
Se ela,
Do outro lado
Da rua,
Não o vê e
Não o ouve,
Não lhe sente
O perfume?
AH, MAS EU SINTO-A
A ela
Do lado de cá
Do poema
E pinto-a
Em aguarela
Pra que veja
A minha cor,
Olho-a, pois,
Com palavras
E falo-lhe
Como pintor.
PARA QUE SERVE
O poema?
Aquece
A minha alma,
Digo tudo
O que sinto
Mesmo quando
Nos meus versos
Até parece
Que minto.
MAS NÃO ESCREVO
Pra ela
Que não a vejo
À janela
A ver passar
O poema
Na rua do
Desencontro.
O POEMA
É de quem
O possa ler,
Fruir-lhe
A melodia,
É a festa
Dos sentidos,
Da alma
A sinfonia,
É prazer
E emoção,
Só o ouve
Quem o sente,
O poema
É fremente,
Não é coisa de
Razão.
É CANTO
Em harmonia,
É pulsão
Que o sentimento
Desperta,
É sopro que me
Liberta
Das amarras
Da paixão
Porque voo
Em palavras
Ao sabor
Da emoção.
E SE A CHAMO
Ao poema
É pra ter
De volta
O meu eco,
Ouvir o som
De uma dor,
Decantá-la
Em palavras,
Convertendo-a
Em canto
Libertador
Dessa prisão
Que enleia
A que chamamos
Amor.
POR ISSO
EU SOU POETA,
Canto pra quem
Me ouve,
Não aguardo
Reacção,
Porque quando
Alguém nos deixa
Dá vida
À poesia
E asas
À solidão.
EU CANTO-ME
Nestes poemas
Pra resgatar
Minha dor
E se a poesia
Não chega,
As palavras
Não me bastam,
Pois que seja,
Sou pintor.

“Auto-Retrato de um Poeta”. Detalhe.
O POETA E A MÁSCARA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Transfiguração”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2021.

“Transfiguração”. Jas. 05-2021.
POEMA – “O POETA E A MÁSCARA”
COMPREI UMA MÁSCARA, Pu-la no rosto do Meu amado poeta E ele não a Enjeitou. Ainda por cima Me disse: “Sou eu, sou, Como nas palavras Que digo Também meu corpo Mudou”. “NÃO ESPERAVAS Ver-me assim, É grande o teu Espanto, Vá, confessa, Ganhei um corpo De rosa, Tanta cor (A que apeteça), Um rosto Dissimulado Pra me curar Desta dor Sempre que ela Apareça A pedir o meu Cuidado”. “ADOPTEI ESTA FIGURA, Apresento-me assim, As outras Nada te dizem, Com esta Olhas pra mim”. “PALHAÇO É O QUE SOU, Falo a Surdos e mudos Que não ouvem O que digo Nem me dizem O que quero Como se fosse Mendigo Do que, afinal, Nem espero”. “VALHA-ME POIS ESTA MÁSCARA. Assim,rio Desta vida, Rio de ti E de mim, Da chegada E da partida, Dos abraços, Das palavras E, enfim, Da despedida”. “SOU PALHAÇO, É o que sou, Entretenho-me A cantar E se ouvires Este meu canto Um poeta É seu autor, Por isso tu Tu não t’importes, O que diz É de certeza Para espantar Sua dor”. A MÁSCARA É o seu rosto, Colou-se-lhe Logo à pele Com a cola Do desgosto E por isso Já nem sabe Se seu rosto É o dele. COMPREI UMA MÁSCARA Vermelha No mercado Da minha vida, Ponho-lha sempre Que posso, À chegada E à partida, E se puder Não lha tiro Pra não lhe rasgar A alma Pois se o canto O liberta É a máscara Que o salva.

“Transfiguração”. Detalhe.
LA PORTA DEL TEMPO
Poesia di João de Almeida Santos. Pittura: "Trasparenza". Originale mio. Maggio 2021.

“Trasparenza”. Jas. 05-2021.
POESIA – “LA PORTA DEL TEMPO”
UN GIORNO DI PIOGGIA O di sole (Non saprei dirlo) Bussano Alla porta della mia Memoria, Bussano piano, Leggermente, Come chi ti chiama, Come chi ti dice Cosa sente. È TRASPARENTE La porta. Da li Si vede il mondo... E ti ho visto, Così, Ho visto il tuo viso Disegnato Como se fosse Un ritratto. HO VISTO LE TUE LABBRA Sensuali Tinte di porpora, Carnali, Ho visto il verde Brillante Dei tuoi occhi Quando il sole, Innamorato, Li accende E mi dà fuoco All’anima Perché sto Accanto a te, Anche io Ammaliato. NON SO SE Mi hai percepito Nel mondo magico Della mia Fantasia, Luogo di sogno E desiderio, Il mio riparo Dell’utopia. SEI ENTRATA Vibrante, Brillando Come l’arcobaleno, Scintilla Trasbordante Di colore Che arde E mi brucia... .......... D'amore. MA ANCHE TU Eri trasparente. Ti guardo E vedo in te Il cielo plumbeo E quieto Invocando Malinconia, Pace, Nell’inquietudine Del giorno, All’anima mia. ALL’IMPROVVISO Nella trasparenza Del tuo viso Irrompe il sole Dorato Tra il candore Sfumato Delle nuvole Sfuggevoli, In alto, Sulla Montagna Che sempre I miei giorni Accoglie. IL DORATO Diventa ambra E ti copre Il corpo Nudo Nell’intangibile Memoria Dove sempre Ti rivedo Quando si apre La porta Del tempo Con la chiave Del desiderio. TI GUARDO COSÌ, Un pò perso, In estasi, E provo a sfiorare Leggermente La tua pelle Di velluto Satinato... ............ Ma il sole Ti scolpiva Il viso Di luce E io rimasi Appena un riflesso Dei tuoi raggi Filtrati Che segnavano Il destino Dei miei desideri Sognati... MI SVEGLIAI Sentendo Delle dita Che bussavano Pian, piano Più in là, Alla porta Della mia camera Immaginata. Corsi ad aprirla... ......... Nessuno. Solo pura Nebbiolina Io vidi. SONO TORNATO, VELOCE, Ai colori Della mia memoria Per ritrovarti Nella magia Del mio mondo, Ma non c’eri più Neanche come riflesso Del tuo lato Più profondo... AVEVO LASCIATA APERTA La porta del tempo...

“Trasparenza”. Dettaglio.
A PORTA DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Transparência”. Original de minha autoria. Maio de 2021.

“Transparência”. Jas. 05-2021.
POEMA – “A PORTA DO TEMPO”
NUM DIA DE CHUVA Ou de sol (Eu já nem sei), Batem À porta da minha Memória, Batem leve, Levemente, Como quem chama Por mim, Como quem diz O que sente. É TRANSPARENTE, Essa porta. Vê-se o mundo Através dela... E eu vi-te, Assim, Vi teu rosto Desenhado Como se fosse Uma tela. VI TEUS LÁBIOS Sensuais De rubro Tingidos, Carnais, Vi o verde Brilhante De teus olhos Quando o sol Os acende, Apaixonado, E a minha alma Incendeia, Por estar ali A teu lado. NÃO SEI SE Me pressentiste No mundo Mágico Desta minha Fantasia, Lugar de sonho E desejo, Recanto De utopia. ENTRASTE NELE Vibrante, Com brilho de Arco-íris, A transbordar De tanta cor, Esse brilho Que me arde E que queima, Meu amor. MAS ERAS Transparente Também tu. Olho-te E vejo Através de ti Um céu plúmbeo E quieto A rogar Melancolia Que me pacifique A alma Na inquietação Deste dia. SUBITAMENTE, Na transparência Do teu rosto Irrompe O sol, Coado em dourado, Por entre a leveza Esfumada De nuvens brancas, Fugidias, A nascente, Lá no alto Da Montanha Que inspira Os meus dias... O DOURADO Ganha tons de Âmbar E veste-te o corpo Nu, Na intangível Memória Onde sempre Te revejo Quando se abre A porta Do tempo Com a chave do Desejo. CONTEMPLO-TE, Assim, Já um pouco Perdido, Extasiado, E quero tocar, Ao de leve, A tua pele De veludo Acetinado... ........... Mas o sol Esculpiu-te O rosto de Luz E eu já só era Um reflexo Dos teus Raios filtrados Que marcavam O destino De meus desejos Sonhados... DESPERTEI Ao som De dedos que batiam Levemente, Mais além, À porta Do meu quarto Imaginado. Corri a abri-la... ....... Ninguém. Era pura neblina O outro lado. REGRESSEI, RÁPIDO, Às cores Da minha memória Para te reencontrar Na magia Do meu mundo, Mas tu já não Estavas, Sequer como reflexo Do teu lado Mais profundo... DEIXARA ABERTA A porta do tempo...

“Transparência”. Detalhe.
A FRONTEIRA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Horizonte”. Original de minha autoria. Maio de 2021.

“Horizonte”. Jas. 05-2021.
POEMA – “A FRONTEIRA”
OLHO A MONTANHA Da porta De granito Amarelo, Com cristais, Sobre o ocre De um telhado Como se fosse Janela De um palácio Encantado Que do sonho Fosse cais. CONTEMPLO A linha do horizonte, Mas é diferente A visão. Antes, eu via futuro, Agora, vejo passado, Essa tão bela Ilusão De a ter sempre A meu lado. ENTRE PASSADO E FUTURO, É a minha Identidade, Ficou quieta À minha espera Quando dela Eu parti Ao encontro Da cidade. ELA É PORTO De abrigo E é lugar de Partida, É, pois, mais Que uma porta, É fronteira Que passamos No desafio Da vida. MAS É ETERNO Retorno, Um regresso Renovado Onde posso Renascer Quando visito A memória Do que não Quero perder, Ficando sempre A seu lado. ESTA PORTA É magia, Viajo sempre Por ela Porque é uma Janela De onde voa A fantasia. DELA ALCANCEI O mundo E o mundo veio Até mim, Ao passar por Esta porta Sinto o meu Horizonte Como fronteira Sem fim... POR ISSO REGRESSO A ela, Esse pilar Do meu ser. Quando chego, Logo amanhece, E quando estou De partida Sinto que O mundo Acontece Como a montanha Na vida.

“Horizonte”. Detalhe.
UM BRILHO NOS TEUS OLHOS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Teus Olhos”. Original de minha autoria. Maio de 2021.

“Teus Olhos”. Jas. 05-2021.
POEMA – “UM BRILHO NOS TEUS OLHOS…”
OLHEI-TE NOS OLHOS, Eram negros, Intensos E tão profundos, Toquei teus cabelos Com o olhar, Caminhei a teu lado Nesse jardim, Senti o teu corpo Tão perto de mim A respirar O acre perfume Dessa ramagem Do belo jasmim... INEBRIOU-ME Esse intenso Aroma E eu enredei-te Num tão doce Enleio Que não tinha fim... BRILHARAM Pra mim, Tão docemente, Duas horas inteiras, Esses teus olhos... .................. E neles me perdi. ESTIVE NO CÉU Ao lado de deus E lá vi dois sóis... .................. Que não eram dele (Uma luz intensa) Porque eram teus. MAS O TEMPO Correu Depressa demais... ................... E é sempre assim. TODOS OS DIAS Se tornam iguais Quando tu partes E, em nostalgia, Eu fico no cais. VOLTEI A OLHAR-TE Três horas seguidas. Parecia verdade, Mas era ilusão Porque partiste Deixando-me só E o que sobrou Foi solidão. SUBIU A TRISTEZA, A saudade irrompeu Colou-se-me Ao rosto... .............. E como doeu! SE EU NÃO TE VEJO Sinto Falta de ti, Mas se te encontro Logo te perco Porque o tempo Voa E logo te leva Pra longe dali. TER-TE DEMAIS Aumenta a saudade E quando te vais São tristes As ruas Da nossa cidade. AINDA QUE TRISTE Eu sou feliz E com estas mãos Te vou escrevendo O que quero dizer, Mas este meu tempo Volta a correr E cresce a vontade De logo te ver Mesmo que saiba Que é nesse instante Que te vou perder. TENHO SAUDADES, Saudades de ti Desse virar Da nossa esquina, Na mesma rua Onde te vi, Dessa janela Donde espreitávamos O que do mundo Sobrava pra nós. EU JÁ NEM SEI Que hei-de fazer, Ter-te demais É puro prazer, Mas quando te vais Fico sombrio, Quase a morrer. NEM SEI QUE TE DIGA. Quando me deixas Já nem sinto a dor Tão grande a tristeza De já não te ter Pois tu partiste Mesmo sem querer, Ah, meu amor.

“Teus Olhos”. Detalhe.
NÃO SEI
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Folhas Caídas"
Original de minha autoria
para este poema.
Maio de 2021

“Folhas Caídas”. Jas. 05.2021.
POEMA – “NÃO SEI”
SE ME PERGUNTARES
Por que razão
Eu te amo,
Respondo-te
Com timidez:
Eu não sei,
Mas sinto-te
Como dor
Que persiste
E que derramo
Nos poemas
Que te faço
E que sempre
Te farei.
SE ME PERGUNTARES
Pelo que dói
Neste tão estranho
Amor,
Respondo-te
O pouco
Que ainda sei:
Que sinto
Pungente dor
Esparsa
Sobre meu corpo
Como sentido
Penhor
De um rapto
Imprevisto
Que nunca há-de
Ter fim.
SE ME PERGUNTARES,
Depois,
Se sinto
A tua falta,
Respondo-te
Logo que sim,
Que tenho sempre
Saudades
Mesmo quando
Eu te tenho
Aqui bem junto
De mim.
“ - PORQUE SOU EU
A mulher
Que te merece
Atenção?”.
AH, ISSO EU SEI.
Foi o destino,
A salvação,
Um encanto
Repentino...
..............
E tudo o mais
Eu não sei
Quando te beijo
Na alma.
“- O QUE SABES
TU DE MIM,
Neste teu
Desejo ardente?”
POUCO OU NADA
Sei de ti
E sabendo
O que não sei
Não te amaria
Às cegas,
Assim tão
Intensamente...
AMAR-TE
É como beber
Tempestades,
É dor que
Não se sabe
Onde está,
É a alma
Sempre quente,
É mistério
Revelado,
É encanto
Permanente,
O reverso
Do saber,
Luz intensa
Que me cega
E também
Fascinação,
Tremor
Que nunca acaba,
Lado oculto
Da razão.
“- PRA QUE ME QUERES,
Então, meu amor?”
EU QUERO-TE
Para te querer,
Simples vontade
De ti
Como fim
Do meu viver,
Sentir saudades
Do que estou
Sempre a perder,
Olhar-te nos olhos
E ver neles
O teu mundo
E o mundo
Dentro deles,
O brilho
Embaciado
De um olhar
Onde um dia
Me revi...
...........
E se acaso
Eu souber
Por que razão
Te amei
Chorarei
Até ao fim
Porque então
Descobrirei
Que por isso
Te perdi.

“Folhas Caídas”. Detalhe.
LIBERDADE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Liberdade". Original de minha autoria para este poema. Abril de 2021.

“Liberdade”. Jas. 04-2021.
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE, Num dia De sol: “Voas comigo Prà linha Do horizonte?". Deste-me a mão E sorriste: “Voo, sim, Pois preciso De ar puro Lá bem no alto Do Monte”. E PARTIMOS. Tu levaste O arco-íris Que tinhas Dentro de ti E eu as letras Que tinha Comigo, Alinhadas Nesta alma Solitária, Feita seu porto De abrigo. ENREDÁMOS Todas as cores Com linhas De palavras Deslaçadas, Construímos Asas em forma De verso E voámos No céu De um poema Pintado todo De azul... ANDEI CONTIGO Por lá Anos a fio, Vagueando Ao sabor da Inspiração, Levados Pela brisa Que sopra fria No Monte, Mas afaga O coração. E COMO GOSTEI De voar contigo, Livres como Pássaros Sobre o vale Onde te encontrei Um dia, Construindo Castelos Na areia Com a força Da fantasia. É ASSIM QUE EU Te vejo, Tecendo a vida Com sopro Na alma E as cores Do arco-íris Pintadas Por tua mão Como pautas Coloridas Dessa bela Melodia Que era a nossa Canção. FOI ASSIM Que nos dissemos Nesse tempo, Livres de amarras Que não nos deixam Voar, Cantando Em arte Um destino Marcado Pela vontade De fazer Da nossa vida Caminho De liberdade.

“Liberdade”. Detalhe.
NOVO
PINTURA 3
DUAS OBRAS de minha autoria já expostas em espaços privados (1 - 48X60, papel de algodão Hahnemuehle, gram. 300 e 2 - 33X48, Cartol., 315). Abril de 2021.
1. FANTASIA DO POETA. 2019

2. O DESEJO. 2020

NOVO
CINCO OBRAS de minha autoria
já expostas em espaços privados
(33X48, Cartol. gram. 315).
Títulos por ordem numérica de
apresentação das obras infra.
-
Dame mit Ohrring. 2018. -
Bianco&Nero. 2020 -
Montanha Encantada. 2020. -
Horizonte. 2018. -
Letras. 2019.





ORIGEM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Voar no Céu de um Poema”. Original de minha autoria para este poema. Abril de 2021.

“Voar no Céu de um Poema”. Jas. 04-2021.
POEMA – “ORIGEM”
A SUA ARTE Nasceu contigo, Do mistério e do Silêncio Que te enchia a alma, A transbordar, Um inesperado Encanto Que o cativou, Para nunca Mais parar. FASCINADO Pelo teu olhar Profundo, O teu ímpeto Imparável, Fúrias Quentes, Cabelos negros Desgrenhados, À solta Sobre teu corpo Incerto, A arder... ................. Ele sentia-te, Mas não sabia Que fazer... NASCEU, ASSIM, No teu regaço, Em tormento, Aninhado Na bruma Densa E misteriosa Do encantamento. DEPOIS CRESCEU E quis a perfeição, Seduzir-te Através do vento Que te soprava Na alma, Palavras cálidas, Ritmadas À medida que te Ia perdendo No implacável Tempo Da renúncia. E TU COLHESTE A tormenta No dia-a-dia (Eu sei), Obsessão Martelante, Castigada Com palavras Repetidas E gastas À exaustão Até à fuga Para o nada, Cheia de tudo O que não tiveste, De tão sofrida E tão amada... MAS LEVASTE Contigo o poeta E muito mais, Grávida de palavras Não ditas, Olhares falhados, Imperceptíveis Sinais, Silêncios gritados, Quieta turbação, Lava oprimida No centro de um Vulcão Que te alimenta E consome Nessa tua inefável Solidão. E O POETA Capturou-te Dentro de si Para te libertar Com metódica Persistência Em poemas, Nuvens Cintilantes Que espalha No teu céu, Sobre ti, Para te refrescar A alma Incandescente. E EU, Seu confidente, Vejo-te Da minha Janela, ali, Só, A olhar O céu, As nuvens Brilhantes Do poeta, À espera Da chuva E dos trovões A troar Com raios de luz Sobre o teu Sempre inquieto Olhar... MAS UM DIA VIRÁ O tempo Do reencontro Sem clamor Nestes sofridos Poemas Onde o poeta Te reiventou Para o amor.

“Voar no Céu de um Poema”. Detalhe.
CINCO OBRAS de minha autoria expostas em espaços privados. (50X70, em papel Hahnemuehle, 300) Título das obras por ordem. No fim, 1 e 2 em sala de jantar.
-
"CRISTAIS". Jas2020
-
“S/TÍTULO”. Jas2020
-
“RUBOR”. Jas2020
-
“HÁ VIDA NO JARDIM”. Jas2020
-
“TERRAÇO”. Jas2020






MUSA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Desejo”. Original de minha autoria para este poema. Abril de 2021.

“Desejo”. Jas. 04-2021.
POEMA – “MUSA”
EU TENHO UMA MUSA Guardada No fundo Da minha memória, Perdi-lhe o rasto Ao corpo, Ficou-me dela O mistério Que me alimenta O estro Quando a saudade Me assola. SOBROU-ME Recordação, Marcas cá Dentro de mim, Desço ao fundo Da alma Mas nunca Lhe vejo O fim. E ASSIM NÃO A VISLUMBRO, Há uma certa Escuridão, Olhar de nada Me serve, Restam-me As cicatrizes E uma funda Solidão. ÀS VEZES DESENHO-LHE O corpo, Ponho-lhe cores Muito vivas, Pinto a alma Com palavras, Dou-lhe nome Que não é seu, Levo-a nos meus Poemas, Devolvo tudo O que resta Do que ela Não me deu. VALE-ME A POESIA Pra onde fujo Com ela, É como as ondas Do mar Que vejo Da minha janela. TENHO UMA MUSA Nesse mar Que não tem fim, Revolvo-me Nas suas ondas, Regresso depois Ao poema Onde sorri Para mim. NÃO IMPORTA Onde está, Musa é fonte De inspiração Desde que a tenha Na alma Esse lugar De paixão.

“Desejo”. Detalhe.
VOU CONTIGO PRA PASÁRGADA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Pasárgada".
Original de minha autoria
para este poema.
Abril de 2021.

“Pasárgada”. Jas. 04-2021.
POEMA – “VOU CONTIGO PRA PASÁRGADA”
A Manuel Bandeira
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada,
É outro mundo,
Irmão,
Quero ir-me
Embora,
Já me falta
Inspiração
Porque a brisa
Do nordeste
Ficou lá,
No Maranhão.
NÃO TENHAS,
Manel,
Saudades,
Nostalgia do futuro,
Temos passado
Que baste
E às vezes
Até foi duro.
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada
Não quero
Ficar aqui,
Há tempestade
No ar,
A brisa
Da liberdade
Não passou
Do Piauí.
PRA PASÁRGADA
Quero ir,
Lá todos
Falam verdade,
Por aqui,
Ah,
Eu já nem sei,
Falta-me
Liberdade,
Aquela que
Conquistei.
GOSTO DE TI,
Poeta
Do reino
Da utopia,
Onde se pinta,
Canta
E dança
Ao sabor
Da poesia,
Porque o ar
É do mais puro...
..........
E cheira
A maresia.
NÃO GOSTO
D’estar aqui,
Há ruído
Que é demais,
Esta terra
Já não me serve,
Eu espero-te
No cais,
Vou contigo
No teu barco
À procura
De mar calmo,
Céu sereno
E tudo o mais,
Navegando
No azul,
Peixes voando
No mar,
No horizonte
Uma ilha,
Mulheres lindas
A acenar...
EM PASÁRGADA
Sou feliz,
Danço poemas
Ao raiar da
Madrugada
Até que o corpo
Se canse
Com alma
Apaixonada
E adormeça
No regaço
Da mulher
Que for amada.
POR AQUI OUÇO
Ruído,
Há armas
A crepitar,
Matam poemas
Com gritos,
Já nem podemos
Cantar.
VOU CONTIGO
Pra Pasárgada
No barco
Da poesia,
Lá cantarei teus
Poemas
Seja noite
Ou seja dia
E pedirei
A Athena
Que me dê
Inspiração
E me ajude
A compor
Um hino
À liberdade
Que seja
A nossa canção.

“Pasárgada”. Detalhe.
SEGREDO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Deusa das Camélias” Original de minha autoria para este poema. Março de 2021.

“Deusa das Camélias”. Jas. 03-2021.
POEMA – “SEGREDO”
VOU CONTAR-TE Um segredo: Amei-te Em poesia, Oh, se amei! As palavras eram Graves (Bem sei) Mas sempre cheias De cor, As rimas Eram suaves Em melodia Com dor, Tudo o que De ti Me sobrou... .......... Meu amor. CONTEI-TE HISTÓRIAS De desencontros E dancei Com palavras Luminosas Que inventei Para por dentro Te ver Nesse jardim De camélias Que cultivas No teu peito E que eu pinto Com desvelo Pra deste modo Te ter. CANTEI Pra te aquecer Na fria dança Do silêncio E contigo levitar, Voando, Invisíveis, Sobre ruas E sobre praças, Ao luar, Para, depois, Pela manhã, Acordar E um arco-íris Erguer Como ponte Desse vale Exuberante Onde te sonho, Neste meu Entardecer. SONHO, SIM, Alheio ao bulício, Ao indiscreto Cochichar Dos que vivem Na rotina, Dos que Não sabem Voar. AH, QUE SONHO! Não sei se Pousaram No parapeito da Tua janela As palavras Que sonhei... ................. E se alguém te Contou Que andavam Borboletas No ar, Esvoaçando, Perdidas, À procura de pólen Nos jardins Verdejantes das Nossas vidas... MAS TU PERGUNTAS, Agora, Se ainda vivem As borboletas De vida breve, Se regressam Ou já pousaram Noutro jardim, Se há pólen, Se há vento Ou pensamento Que as traga De volta Desse incerto E imprudente Confim... E EU RESPONDO Que a sua vida E destino São o brilho Deste céu Que vive Dentro de mim.

“Deusa das Camélias”. Detalhe.
CAMINHOS PARALELOS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Voo da Magnólia”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2021.

“O Voo da Magnólia”. Jas. 03-2021.
POEMA – “CAMINHOS PARALELOS”
POR CAMINHOS Paralelos Nos seguimos Ao infinito, Pintei o meu De vermelho, Mas o teu É mais bonito. GASTEI As minhas palavras, Gastei cores, Eu já nem sei, Mas porque o silêncio É de ouro Só das palavras Cuidei. TIREI-LHES Logo o som Por saber Que te doía, O silêncio Ficou rei... ................. Até que falemos, Um dia. A ESTES SENDEIROS Cheguei Quando eu te Conheci Ao romper Da primavera. Foram-se anos, Bem sei, Desde que o Destino Me pôs Nessa rua À tua espera. AGORA SÃO Caminhos Paralelos, Nisto, naquilo, Talvez em tudo, Sei lá, Tu estás Do outro lado E eu não te vejo Por cá, Na rua Da poesia Que logo ficou Deserta Quando te Foste embora Dessa forma Inesperada... .................. Mas que o oráculo Previa, Pois a porta Estava aberta Sem fechadura, Sem nada. NO HORIZONTE Que alcanço Fica o ponto Destas linhas Paralelas, Convergimos No olhar, Mas não caminhamos Por elas Porque a vida Nos tirou Da rua Da poesia... .............. E das tuas Aguarelas.

“O Voo da Magnólia”. Detalhe.
OLÁ
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Evocação de uma Magnólia”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2021.

“Evocação de uma Magnólia”. Jas. 03-2021.
POEMA – “OLÁ”
PEDI-TE UM DIA Num poema Que te fiz Que me dissesses Olá. Eu ficaria feliz De ouvir a tua Voz Sussurrando O meu nome Como as águas Do rio Beijam as águas Da foz. E OLÁ TU ME Disseste, Mas rápido Como o vento Que sopra Na minha alma Quando cruzo O teu olhar E me sinto Estremecer, Não por fora, Mas por dentro, Onde sou livre De amar. BALBUCIEI O teu nome Já distante Do olá Sem saber O que fazer, Se chamar-te Até mim Ou para longe Partir, Por não saber Que fazer, Por não saber-te Sorrir. MAS QUANDO VIREI O meu rosto Vi-te de novo Austera, Muito fria E distante... ............ Ignoravas O passado Que passara Nesse instante. E, DEPOIS, Tantos olás Te pedi, Tantas vezes Te chamei, Os poemas Que escrevi, Palavras Que derramei Sabendo nada De ti, Mas sofrendo Intensamente Por tudo O que já sei, Por tudo O que perdi. TALVEZ O VENTO Te chame, Talvez esta flor Te seduza, As raízes te Comovam Ou o poema Te diga Que nunca É tarde Demais E que em seu Eco Te encontre E abrace Por sinais.

“Evocação de uma Magnólia”. Detalhe de outra versão.
VIAGEM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Espanto”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2021.

“Espanto”. Jas. 03-2021.
POEMA – “VIAGEM”
ERA UMA VEZ Uma camélia que, Num sonho, Me encantava, Uma fada Em busca Do que eu perdera No jardim Onde morava. FLOR DE ALVURA Deslumbrante Iluminou-me A vida, Nesse instante, Na procura das raízes Que sobraram De uma estranha Despedida De dias que não Voltaram. MOSTRAVA Um inocente Espanto De me ver Assim, sozinho, De repente E por encanto, Perdido Do meu caminho. E PARTIU. Levou A luz Que o seu corpo Acendia Nesse estreito Sendeiro Onde a solidão Não cabia. DEIXOU O JARDIM, Vida adentro Por caminho Original, Era um feixe De luz À procura Do que ficara Perdido Lá no fundo, Num recife De coral. MAS ENCONTROU-TE À tona, Vagueando No mar plano Da vida Sem saber Onde ficara A tua praia Perdida. E REGRESSOU Ao jardim, Triste De não te poder Resgatar Dessa vida, À deriva Em ondas De alto mar. FOI À PROCURA De cores, Queria muitas E vibrantes, E encontrou No jardim Umas luzinhas Brilhantes, Dessa luz Que não tem fim Como a que Guia os amantes. E LÁ FOI E anda ela, Umas vezes É pura luz E outras É aguarela, Sempre À procura de ti, Levada Pela corrente, Com timidez E espanto, Por aí, Até que um dia Te encontre, Talvez triste E conformada, Aninhada Num recanto De vida Desperdiçada. DAR-TE-Á As suas cores, Regressando Ao jardim Pra de novo Iluminar A minha melancolia E ser regada Por mim Nas tardes De cada dia. CAMÉLIA Encantada No poema E na pintura... ............. Assim te vou Recriando como Fada Que me cura!

“Espanto”. Detalhe.
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Último dia de Fevereiro de 2021.

“S/Título”. Jas. 02-2021.
POEMA – “MARÇO”
GOSTO DE MARÇO, Entre a neve E a primavera, O branco e E as flores, Na fronteira Uma quimera. GOSTO DO BOTTICELLI, Dos rostos E dos corpos Feminis, Volúpia de Transparências Sensuais, Primaveris. GOSTO Da pele macia, De seda e Suave cor, Gosto Dos traços Que desenham Alvura nas "Três Graças"... ............. E no Amor. GOSTO DO BRANCO Da magnólia E do branco Da Montanha, Gosto Dessa cor que Que brilha Nos meus olhos E me acompanha. GOSTO DE MARÇO. Entrei nele Contigo, No signo do Desencontro Que se repete Num longo Silêncio fatal, Marcado Contraponto Desse tempo Imprevisto De um “triste Destino”... ........... Quase irreal. PARA TI COLHIA Flores luminosas E a inspiração Crescia Em estrofes Desenhadas Com magia, Fingindo Sentir O que dizer Não podia, Fosse só Em duas horas Ou fosse Por todo um dia. NO SIGNO Do desencontro Marcado como selo Lá vou eu Por aí, Nem sei porquê (Ou por falta de ti), De braço dado Com Botticelli, Lá em cima, na Galleria, Oráculo De arte E fantasia. SINTO-TE PERTO, Ah, sinto! Depuro A tua imagem Em bissetriz De mil rostos Até se tornar Ideia De corpo ausente: Dialéctica Animada De opostos. DEPOIS REINVENTO-A A cada instante, Abraço-a Com alma De amante, Pinto com Palavras O seu perfil Ideal E fixo-a De novo Neste meu mundo Mental. AO ACORDAR, No amanhecer De cada poema, Verei que continuas Em mim, De olhos fechados, Como se fosses Sonho do que Nunca aconteceu Naqueles dias Passados. ANDAREI Por aí (Os astros o dirão), Vagando E pousando O olhar No pólen Da beleza Sensível À procura De seiva fresca Para desenhar Poemas E dar vida Ao impossível. LÁ NO ALTO Te encontrarei, Imitação Dos dias Da criação, A construir infinito, Onde, num adeus Sem fronteiras Nem cais de partida, Hás-de desenhar Com a alma As mil silhuetas Ainda inacabadas... ............... Ou talvez não! MEU DEUS, Como gosto de ti, Em Março, O mês da floração Quando a magia Renasce Para renovar A vida Com a força da Paixão.

“S/Título”. Detalhe.
COR, DÁ-ME COR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Policromia”.
Original de minha autoria
para este poema.
Fevereiro de 2021.

“Policromia”. Jas. 02-2021.
POEMA – “COR, DÁ-ME COR”
COR, DÁ-ME COR,
Fico mais perto
De ti
Se vieres
Com o vento.
Cor, dá-me cor,
Que as palavras
Coloridas
Já me sabem
A cinzento.
PALAVRAS
Nunca me faltam,
Nem vivo
Na escuridão,
Ainda consigo
Cantar-te,
Com palavras
Dar-te a mão.
TENHO-AS
Que me cheguem
Para gritar
Em vermelho
O concreto
Do teu nome,
Ver-te, assim,
Tão colorida
No vidro do meu
Espelho
Sem que a tristeza
Assome.
AH, MAS A COR
Se for intensa
E crescer
Em explosão,
Se tiver
Um contraponto
Em palavras
De paixão
Que dão ritmo
Ao azul
Dos teus sonhos
De papel...
............
É tudo
O que eu preciso
Pra t’esculpir
A cinzel.
DÁ-ME COR
Que eu sou
Sensível
Ao brilho
Do teu olhar,
Sinto-o nas
Flores que
Pinto
Quando vestes
O vermelho
Com azul
Como espelho
Ou te cobres
Com as cores
Do arco-íris
Que és.
TU ÉS COR,
Gota d’água
Suspensa
No fio
Do horizonte
Beijada por
Raios de sol
Que despontam
Lá em cima
No meu Monte.
DANÇAS COM ELA,
A cor,
E com ela
Adormeces,
Por amor.
É sopro
De liberdade
Quando a vida
É um sonho
E o poema
A verdade.
EU GOSTO DE
Te pintar
Com palavras,
Onde o azul é
Mais íntimo
E o verde
Te cobre
Como manto
De primavera,
Onde o vermelho
É pranto
Sem lágrimas
De enxugar
Nem sequer
Em amarelo
Porque me tolda
O olhar.
NA COR DAS MINHAS
Palavras
Te vejo e
Te revejo
As vezes
Que eu quiser
Pois és mais
Do que um desejo
Nos poemas
Que componho
Sobre um rosto
De mulher.
EU GOSTO
Da tua cor,
De me confundir
Com ela,
Dançá-la
Como vida
Em explosão,
Fogo de artifício
Que embriaga
Os sentidos
Como se fosse
Vulcão...
EVOCO
O poeta
Que pedia
“Mais luz!”
Já em seu leito
Fatal...
Tinha luz
Dentro de si,
Mas a cor
Já não entrava
No portal.
ERA CINZENTA
A cor
Que lhe restava
Até ao escurecer
Quando a janela
Se fechava
Ao seu desejo
De ver.
LUZ É COR,
Desperta da
Letargia,
Ressuscita
Do torpor,
É cântico,
É utopia,
Chilreio de
Passarinho
Que anuncia
Os meus voos
Aos azuis
Com que te
Pinto
E afago
Com carinho.
MAS A PALAVRA
Fascina,
É com ela
Que te canto
E leio
Na tua alma.
Na cor, tua
Roupagem,
Danço, sim,
E voo
Em liberdade,
Mas na palavra
Suspendo
O frémito
Dos meus sentidos
Para melhor
Te sonhar
Por todos os dias
Perdidos...
..............
À deriva
No teu mar.

“Policromia”. Detalhe.
CHÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Luz na Montanha”.
Original de minha autoria
para este poema.
Fevereiro de 2021.

“Luz na Montanha”. Jas. 02-2021.
POEMA – “CHÃO”
DESCESTE,
Não sei bem
De onde.
Cravaste raízes
Profundas
Neste meu
Sagrado chão.
AO LONGE,
Lá na montanha,
Surge, do nada,
Incandescente,
Um clarão.
São os meus olhos
Que te iluminam...
..............
Ou talvez não.
NUNCA VI
Chover do céu
Tanta luz...
.............
E no chão
Que sempre piso
Tão delicada raiz
Que cresce
Dentro de mim
E, suave,
Me conduz
Como quando
Me sorris.
ESTA LUZ
Que lá do alto
Ilumina
É magia,
É milagre,
É fogo
Que me fascina
Neste meu
Entardecer...
.............
Faz-me voar
Para ti
Apenas para
Te ver.
MAS NAS RAÍZES
Que crescem
Por dentro
E por fora
Como rendilhado
Neste meu chão
Seminal
Fica presa
A minha alma
Como se fosse
Prisão...
....................
Por pecado capital.
ELEVA-SE NELAS
A geometria
Perfeita de um
Monólito
Sideral
Para te invocar
Em ritual
De montanha
Onde possas
Renascer
Como a divindade
Da chama.
A MAGIA
Deste chão,
Despertada pela luz
Que vem lá
De cima,
Do alto,
Devolve-me
A liberdade,
Acende-me a fantasia,
Põe-me a alma
Em sobressalto
E o corpo
Em euforia...
ENTÃO, CANTO
Então, danço
Neste chão
Que é só meu,
Dou asas
À fantasia
E a fronteira é o céu.

“Luz na Montanha”. Detalhe.
“UM SONHO NA MINHA ALDEIA”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Rua do meu Jardim”. Original de minha autoria. Fevereiro de 2021.

“A Rua do meu Jardim”. Jas. 02-2021.
POEMA – “UM SONHO NA MINHA ALDEIA”
SONHEI-TE ESTA NOITE Numa rua Da minha aldeia. Não sei porquê (Os sonhos são Sempre assim), Caminhámos Lado a lado Sem dizer Uma palavra, Sem um olhar De través, Apenas Pressentimento, Cá bem no fundo De mim, Sentindo-te No que tu és. DUAS VEZES Lá estive A sentir-te Nesse tempo Diferido Dos encontros Intangíveis Que se desfazem Nas nuvens Quando o céu É proibido E os afectos Impossíveis. MAS VI-TE Com nitidez (Um pouco baça, É certo) No silêncio do meu Sonho, Em encantada Alvura A recordar Tempo antigo Quando a neve Regressava, Branca e leve Fria e pura. FOI NA RUA DO JARDIM (É assim que eu A chamo) Em frente Da minha casa, Onde me via Passar, Sendeiro da minha Vida, A caminho do futuro Sem medo Da despedida. CRUZÁMO-NOS Por pouco tempo, Como na vida real, Nem um olhar Nos trocámos, Tão fugaz foi Este sonho, Mas intenso E vital. E SE A VIDA É sonho Também os sonhos São vida, Pois senti que, Na verdade, Sonâmbula Me encontraste Na rua De uma aldeia Nunca antes Percorrida. E AQUI ESTOU A sonhar-te Outra vez Nos versos Com que te chamo, Recordando que Te vi Neste lugar Que eu amo. É SEMPRE ASSIM, Meu amor, Quanto mais tu Te esfumas Mais me cresce Esta dor... É POR ISSO Que te sonho, Pra desenhar O teu rosto Com palavras De poeta Que afunda No desgosto. MAS DE TANTO TE DIZER Acabei por Te encontrar Na terra Onde nasci, Onde a neve Derretia Quando o sol Já despontava E o manto Da saudade Logo de dor Me cobria. AGORA A NEVE És tu, Fugaz que foi A passagem No chão incerto Da vida, Como a brancura De outrora De saudades Me doía Em cada fatal Despedida. E SE EU TE Encontrar Talvez de novo Te sinta Qual cintilante Magia... .............. Terei então A certeza, Branca e leve Pura e fria, Que recriei Essa ausência Para nunca Te perder, Como a neve Da minha rua Que não há sol Que a derreta Na penumbra Da memória... ................. Que, no sonho, É como a tua.

“A Rua do meu Jardim”. Detalhe.
VÃ UTOPIA
Poema de João de Almeida Santos. À “desgarrada” com Manuel Bandeira (1886 -1968), inspirado em três poemas seus: “Desencanto”, 1912; “Versos escritos na água”, s.d.; “Renúncia”, 1906. (Obras Poéticas. 1956. Lisboa: Minerva, pp. 33, 40 e 101). Ilustração: “Cascata”. Original de minha autoria. Janeiro de 2021.

“Cascata”. Jas. 01-2021.
POEMA – “VÃ UTOPIA”
“OS POUCOS VERSOS QUE AÍ VÃO, Em lugar de outros É que os ponho. Tu que me lês, Deixo ao teu sonho Imaginar como serão.”
E OS MUITOS Que eu te dei Deixam claro O que sou. Se tu me leres Saberás que Não errei Mas que foi pouco Do muito Que agora Eu te dou.
“NELES PORÁS TUA TRISTEZA Ou bem teu júbilo, E, talvez, Lhes acharás, Tu que me lês, Alguma sombra De beleza...”
BELEZA, SIM, E algum sentido, Tristeza e dor Como castigo, Por isso eu canto O que perdi Pra que o verso Vá ter contigo Lá onde estejas, Queira o vento Ser meu amigo.
“QUEM OS OUVIU NÃO OS AMOU. Meus pobres versos Comovidos! Por isso fiquem Esquecidos Onde o mau vento Os atirou.”
NÃO OS AMOU, Mas eu bem sei Que é verdade Este amor Que aqui nasceu E que cantei Em liberdade Em versos Que o vento Leu E te levou Para matar A saudade... ........... Pudesse eu Salvar-me, assim, Do que não sou, Libertar-me Do silêncio Que me invade. OUTROS FARIA Se pudesse Para os pôr Na tua mão, Não pediria que Os sonhasses, Olhos cerrados, Mente desperta, Mas que os lesses Com afeição. AH, MANEL, Que bem me sabe Pôr minha dor Em poesia, Em palavras A emoção, No cantar Triste alegria Por ser intensa Esta paixão Mesmo que seja Vã utopia. DIZES TU Em poesia Que só a dor Te enobrece. E dizes bem, Meu bom poeta, Alma dorida Logo me aquece E com meus versos Entretece O que a paixão Já tanto afecta.
“A VIDA É VÃ COMO A SOMBRA QUE PASSA... Sofre sereno e de alma Sobranceira, Sem um grito Sequer tua desgraça. Encerra em ti Tua tristeza inteira. E pede humildemente A Deus que a faça Tua doce e constante companheira...”
POIS TENHO MEDO (Eu te confesso) Que a dor Me passe, Perca o poema Sua raiz, Essa, sim, A verdadeira (Sua matriz), E fique só Já sem palavras E caiam secas Todas as rosas Que me povoam Esta roseira. SOBRAM ESPINHOS, Ferem-me a alma, Saem meus versos E cai o sangue “Gota a gota, Do coração”, “Volúpia ardente” Já sem remédio “Eu faço versos Como quem chora” E chamo a dor A toda a hora E ela vem Por compaixão. AH, POETA, Ah, meu irmão, Tu fazes versos “Como quem morre” E eu procuro Neste meu canto A sua mão. TU, MANEL, És a bandeira E ela O meu refrão, Pra mim és verso No meu poema E ela é, Neste meu peito, Uma paixão.

“Cascata”. Detalhe.
A AGUARELA
Poema de João de Almeida Santos, inspirado no poema de Manuel Bandeira “Tema e Variações”. Ilustração: “O Retrato”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2021.

“O Retrato”. Jas. 01-2021.
POEMA – “A AGUARELA”
SONHASTE, MANEL, Que havias sonhado Estar à janela, Sonhando, a cores, Que estavas com ela. TAMBÉM EU SONHEI Que tinha sonhado E que no sonho A tinha encontrado, Passando por ela, Ali, lado a lado. MAS, QUANDO ACORDEI Do primeiro sonho, Sonhando, eu vi O seu rosto belo Numa aguarela Pintada a cores Que tinha guardado Para uma tela. SONHEI, OUTRA VEZ, No segundo sonho, Que era pintor, Mas que pintava Sempre o seu rosto A uma só cor. DIZIA, SONHANDO, Que não podia ser, Seu rosto expressivo Era arco-íris Ao amanhecer E era sorriso Para o mundo ver. MAS EU SÓ O VIA Com a minha cor, Esse rosto belo De seda tecido Que me seduzia No sonho sonhado Onde sempre a via, Ali, a meu lado. NÃO QUERIA ACORDAR Do sonho feliz E nele fiquei De olhos fechados. JÁ NÃO ACORDEI Do sonho sonhado Porque nessa cor Fiquei encerrado Com todo o meu ser... ................... Talvez por amor. NO SONHO OLHEI Para o meu espelho E logo eu vi Que essa minha cor Era o vermelho. E QUANDO ACORDEI Do primeiro sonho Voltei a sonhar Que desvanecia Nesse rosto amado E logo lhe disse, No segundo sonho, Que a tinha sonhado. DISSE-ME QUE NÃO, Que nunca me vira Sequer acordado... ................. E logo acordei Desse pesadelo Que me deixara O peito Esmagado. FOI ASSIM QUE VI Que tinha sonhado E que ela Já lá não estava, Ali, a meu lado. QUIS ADORMECER Para a encontrar Mas não consegui Sonhar que a via, Pôr os olhos nela, Chorar de alegria Porque descobri Na minha parede Aquela aguarela Que do sonho Passado Eu já conhecia: Era o rosto dela.

“O Retrato”. Detalhe.
ENCONTRAR-TE NUM POEMA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “La Diseuse”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2021.

“La Diseuse”. Jas. 01-2021.
POEMA – “ENCONTRAR-TE NUM POEMA”
ÀS VEZES Perco-me Em ti Quando te sonho No poema, Ondulas Entre tristeza E doçura Nos teus dias Mais incertos, Em momentos De ventura, Na fronteira Do dilema. SE ÉS TERNA, Eu estremeço Porque enleia, O teu olhar, Olhos castanhos Despontam No suave Amanhecer Quando em surdina, Vibrando, Partilhas Esse teu Acontecer. CONTEMPLO A tua imagem, Beleza Intermitente, Por instantes Muito breves, Mas logo regresso Ao murmúrio Sedutor, Encanto Tão inocente, E a tão meiga Ternura Que me afaga Com pudor. O TEMPO Corre sempre Contra nós E eu corro Contra ele Pra que a saudade Não chegue Antes de a partida Soar E em meu rio Desague Para logo Transbordar. VIVO No intervalo Do desejo De onde te ouço Dizer Que não há Excesso de tempo Neste efémero Viver, Destino Que te domina E me impede De te ter. MAS PERCO-ME No brilho Desses teus olhos, Bem cedo Pela matina, À procura Dessa cor Que logo assoma Bem viva Quando o sol Te ilumina. SINTO CALOR No meu peito E procuro o teu Regaço Pra que me vejas Por dentro No poema Que te canto E que ouves com Ternura Como se fosse Abraço. EU GOSTO Da doçura que te Invade Quando recusas O mundo Que te atropela Nas curvas Da tua vida Para sentires Com a alma O poema Que te deixo Quando chega A partida. AH, COMO GOSTO De te sonhar Dizer-te Em poesia... ........... É encanto, É prazer E é mistério... ......... É a vida Em sinfonia!

“La Diseuse”. Detalhe.
A CARTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Melancolia”. Original de minha autoria. Janeiro de 2021.

“Melancolia”. Jas. 01-2021.
POEMA – “A CARTA”
DIZEM-ME Que vagueias Por aí, Incerta, À procura de ti, Sem saber Que te vais Perdendo Nas rotinas Inventadas Dos teus dias. SENSÍVEL À incerteza Do teu caminhar, Inundei-te Com rios De palavras Sedutoras, Setas falhadas Ao coração Do silêncio Que te cobre O rosto... ................. Para te resgatar. SEI QUE VIAJAS Cada vez mais Para dentro de ti, Aninhando-te Nessa melancolia Sem fundo Que sempre Me cativou. E DIZEM-ME Que quanto mais Te resguardas Na sombra De ti mesma Mais procuras Ver tudo Sem ser vista, Seguindo, Invisível, O meu rasto Desenhado Ao longe Na neblina Que se esfuma E dilui Lentamente No frio Horizonte Da Montanha Sagrada. E ATÉ O VENTO Que sopra Lá do alto Me segreda: “Curiosa de si, Abre De par em par As janelas Das tuas estrofes, Ar puro Que respira, Esse canto De sereia Que finge Não ouvir, Procurando Decifrar As tuas ondulações De alma No muro Das lamentações Poéticas”. EU SEI BEM Que te cobres Com o véu Escuro Do silêncio Para te resguardares Do olhar Indiscreto da vida Sobre ti. MAS A VIDA, Meu amor, É fugaz, O tempo passa E deixa marcas Indeléveis, Sulcos profundos Que só o futuro Desvelará Porque o passado Fica inscrito Num destino Que só conhecerás Ao virar Da esquina da Tua vida, Onde só o passado Brilhará Como futuro. AH, SIM, O reencontro Acontecerá Nesse momento, Quando eu Já só for Um sinal Impresso, A branco e negro, Uma vaga memória Escrita Perante teus olhos Húmidos De me terem Perdido Sem saber Porquê ............... Ou simplesmente Como inútil Expiação De um pecado Que nunca Aconteceu. ESTAREI LÁ, Sim, Nesse destino À tua espera Para te dar Conforto, Aninhado Nas palavras Que ainda Não sabes Declinar, As mesmas Em que vou Viajando, Invisível, Por dentro De ti À procura Da eternidade Possível, Tua e minha Salvação Da voragem Do tempo.

“Melancolia”. Detalhe.
“O PAVÃO”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Azul no Parque”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2021.

“Azul no Parque”. Jas. 01-2021.
POEMA – “O PAVÃO”
FUI AO PARQUE Do Marechal Logo ao amanhecer Num triste dia De outono Na esperança de Te ver À procura do pavão, Eram muitas As saudades, Já passara Mais de um Verão. NÃO TE ENCONTREI Por ali, Mas logo vi O pavão, Sozinho, Também triste Como eu (Ou talvez não), Pois nele Reconheci As cores vivas Desta minha Solidão. PORQUE É Tão belo O pavão? Exibe-se Altaneiro E é assim Que seduz, Enche-me A alma De cor E inunda-me De luz. AH, O PAVÃO, Esse seu Porte austero Estremece-me Na alma E gela-me De emoção Porque te chama À memória E me afunda Sem perdão. MAS SEGUI-O, Nesse dia, Parque fora No silêncio Luminoso Dum despertar De aurora. FOLHAS CAÍDAS No chão, Tapete da Natureza, Acolhiam O nostálgico Passeio Do poeta E do pavão, Num vaguear D’incerteza. NESSE JARDIM Do simbólico Encontro A beleza Despontava Em seu ritmo Natural, Passos lentos E cuidados, Pose austera, Altivez, Um singelo Ritual Que vivi Com timidez Junto ao pavão Matinal. CAMINHEI COM ELE Horas a fio, Lado a lado, Sem destino, Procurando O teu rosto Num eterno Desatino Que sempre Acaba Em desgosto. JÁ NO ALTO De um muro, Oráculo, Arte pura, Aparição... ............ Com o olhar Lhe perguntei Qual a cor Da tua alma Nos jogos De sedução. COM POSE ALTIVA, Rigor E perfeição Logo exibiu Esse azul Tão luminoso Onde sempre Se esfumam Os traços Da tua mão... ................. E logo o encanto Surgiu Com teu rosto Espelhado Nas cores vivas Do pavão.

“Azul no Parque”. Detalhe.
SEGREDO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Porta” Original de minha autoria. Dezembro de 2020.

“A Porta”. Jas. 12-2020.
POEMA – “SEGREDO”
EU PINTO E CANTO O meu destino, Sonhos velados, A minha vida, Procuro a chave Do meu futuro E não a porta Da despedida. POR ISSO CANTO Como os pássaros, Voo mais longe E com mais cor Porque no céu Há mais azul E nos meus sonhos Há menos dor. ERA SEGREDO Não revelado, Se o dissesse Não deveria Porque dizê-lo Era pecado E certamente Até mentia. E NÃO O DISSE, Mas eu pequei Com um murmúrio Apaixonado Em poemas Tão inocentes Que foram alvo De um julgado. POR ISSO VOO Sempre mais alto, Trepo nas cores Pra lá chegar, O céu azul Dá-me alento Para assim Poder voar E meus segredos Nas nuvens Brancas Em liberdade Ir dissipar. LEVO PALAVRAS Comigo, Procuro inspiração, Levo cores Para o abrigo, Alimento Da minha arte E seiva pura Desta paixão. EU CHAMO MUSAS E tudo o mais E quando parto Lá para cima É sempre festa No nosso cais. LEVO-TE A TI Em fantasia E deste jeito, Levo-te sim, Para que sinta Lá bem no alto Ar rarefeito E menos peso Nesta dor Que cai em mim. EU CANTO E PINTO Por tudo isto, Pra resgatar O meu pecado De exaltar Esse teu rosto, Iluminar Em aguarela Esse enleio Do meu olhar Por te ver Na nossa rua Debruçado Na tal janela E com vontade De te pintar. POR ISSO EU CANTO, Por isso voo Por isso subo Lá para o alto, Já não os vejo, Já não os ouço E já não vivo Em sobressalto. MAS VEM COMIGO, Eu dou-te asas No infinito, No céu azul Voamos juntos A um só tempo E o nosso rumo Será o sul. VÁ, VEM COMIGO, Voa mais alto, Ah, meu amor, Se tu vieres Eu já não sofro E vai-se embora A minha dor.

“A Porta”. Detalhe.
O POETA E O VENDAVAL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “História de uma Janela". Original de minha autoria (inspirado em fotografia da autoria de Dulce Guerreiro). Dezembro de 2020.

“História de uma Janela”. Jas. 12-2020.
POEMA – “O POETA E O VENDAVAL”
VÊS OS DESTROÇOS Desta janela, Meu amor? Foi o vendaval, O vento zangado Que passou Numa tarde Aziaga De um frio dia De inverno... ............... Uma infeliz e Rogada praga Que o levou Ao inferno. ERA A JANELA Da sua vida, Olhava-te dela Quando passavas Na rua dos seus Encantos, Dali voava Para a terra De ninguém, Tendo-te por Companhia, Indo sempre Mais além Em busca de Utopia... NELA DESENHAVA A cores De incontida paixão A tua silhueta Delicada, Teu perfil Em contraluz, Como sombra Encantada Desse rosto Que ainda O seduz. JANELA, A sua casa, Banhada Por luz intensa E flores De aromas Inebriantes, Uma eterna Primavera, Jardim Onde crescia O desejo, De ti sempre À espera, Lugar de sonhos, Berço de poesia, Porta aberta Para o mundo, Templo De alquimia. FICARAM Apenas ruínas, Um rasto De memórias quentes, Cores desbotadas, Mãos que pedem Ajuda, Silhuetas Inacabadas, Uma criança A nascer, Mulher que Espreita o futuro Em incerto Amanhecer, Estranhos pássaros Que sopram vida, Figuras Que renascem Das cortinas, Um estranho mundo Que desponta Desta janela Em ruínas. MAS O POETA Resiste, Armado de fantasia, De palavras sedutoras, Versos, estrofes, Riscos e cor, Respirando melodia... ...................... Ajudado pelo vento Redentor, Lança mãos, Num certo dia, À história Interrompida Nas ruínas Desse amor Em vendaval Para recriar O templo Que perdeu Com a arte De jogral. E VOA E continua a voar, Passa pela janela E sobe ao Monte Para cantar O que em si Lhe sobrou dela E assim a recordar.

“História de uma Janela”. Detalhe.
“SOLIDÃO”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Fantasia”. Original de minha autoria. Dezembro de 2020.

“Fantasia”. Jas. 12-2020.
“Os poetas são impudentes em relação às suas vivências: exploram-nas” (Die Dichter sind gegen ihre Erlebnisse schamlos: sie beuten sie aus) "O que se faz por amor acontece sempre para além do bem e do mal" (Was aus Liebe gethan wird, geschieht immer jenseits von Gut und Böse). Nietzsche, Jenseits von Gut und Böse (Para além do bem e do mal), 1886. Sprüche und Zwischenspiele: 161. 153.
POEMA – “SOLIDÃO”
PERGUNTEI AO POETA Sobre a minha Solidão... ........ E sabes O que me disse? Que ela tem Sete véus Pra que ninguém Atravesse O sagrado Do seu halo... .................... Um oásis no deserto, Confessou. PERGUNTEI-LHE Pela dor Que me resta (E eu afago) Deste amor Que me veio Ao encontro Como amarga Dádiva do céu, Um sabor Muito intenso A algo que não É meu... E SABES O que me disse? Se já não tens Alegria Para encantar Quem tu amas Resta-te a dor, Sobra-te solidão Em humana Eternidade... .............. E uma longa Evasão Para cantar A saudade. MAS DISSE MAIS. Não a procures, Não lhe fales Nem a vejas A não ser como Poeta Nesse intervalo Da vida Que te torna Intangível Como pura Silhueta. FINGE Que não é ela (A que vês lá Da janela) O destino do teu Canto, Sobe às nuvens Pelas linhas Do seu rosto e Põe asas No seu nome, Mas finge (Como poeta) Para que não Reconheça A paixão Que te consome. E SE UM DIA Teus olhos Pousarem nela Finge outra vez, Finge que Não a vês, Que estás ali Por acaso, Como se fosse À janela, Que o destino Te levou Para fora Do seu mundo A satisfazer Um desejo Que resgate A solidão. PERGUNTEI, De novo, Ao poeta Sobre esta solidão Que cresce dentro De mim... E SABES O que me disse? Que também ele Ia nu, Viajando nas estrelas, Com asas De sete véus, Transparentes Como ar, Mergulhando no azul Para ver se A cantava, Sentado no horizonte, Tocando o infinito, Lá onde mais A amava. QUERO SER Como falou Zarathustra, (Sussurrou) Que da paixão Saia virtude, Dos demónios Nasçam anjos, Da solidão Liberdade, Que na dor Cresça alegria Cada ano E cada dia, Enquanto o poeta Viver, Enquanto a possa Cantar Com o céu Por companhia. ENCONTREI, Um dia, O poeta A caminho Das estrelas. Perguntei-lhe Sobre a minha solidão. Bateu as asas E disse: Voa da tua janela, Voa Pra junto de mim Como se fosses Pra ela Com asas De sete véus Que o azul deste Meu céu Te dará Libertação.

“Atelier”. Detalhe.
À JANELA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Outono”. Original de minha autoria para este poema. Dezembro de 2020.

“Outono”. Jas. 12-2020.
POEMA – “À JANELA”
COMO GOSTO De te ver, Tão singela, Daqui, Desta janela. DIZES, Com o olhar, “Olha, voltei!”. E eu pergunto: “É mesmo ela?” O MILAGRE Desta janela Repõe Em mim O que há muito Sobrou dela. SE A PERCO, Ela renasce E cresce, Mas logo Desaparece. É um sem fim, Lembra-se, Mas logo esquece. AH, FOI ARAGEM. Soprou tão forte Sobre o seu rosto Que lhe levou A doce voz Para o sol-posto. Perdeu o norte, Caiu silêncio, Foi sobre nós. MAS PORQUE ME DURA Este sofrer Se a encontro? É dor intensa Só de a ver, Mas não magoa E dá prazer. DA JANELA, Nesse seu jeito, Vejo-a singela, Com a ternura De quem ama E nem se cura Da chama Só de olhar E vê-la... ....... A ela. PORQUE NÃO FALAS E não me dás O teu “olá!” Mais uma vez? Vem por aqui, Passa por cá, Sem altivez, Pra te dizer O que já sabes Quando me vês... .............. E faz sofrer. “MAS EU NÃO POSSO”, Tu dizes sempre Com teu olhar: “Digo-te não. Mesmo que vá Não há perdão”. PORQUE T’ESCONDES Cada teu dia? Eu não te encontro, Perco alegria... ................. Depois regressas Pra eu te ver, Para que saiba (Tenho a certeza) Que não há modo De t’esquecer. VI-TE MIL VEZES, Sempre te disse Com o olhar: “Quero-te, sim, Mesmo que fujas Quando apareces Não é de mim, Mas de um outro Que desconheces”. PORQUE TE PERDES No meu olhar, Sempre me foges, Olhas em frente Pra não me ver E assim recordas O que tu sentes Por te querer. AH, COMO GOSTO Desta janela... Se me debruço, De vez em quando, Olho pra ela, Fico feliz Por logo a ver Mesmo que saiba Que nesse instante A vou perder.

“Outono”. Detalhe.
AZUL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Paraíso”. Original de minha autoria para este Poema. Novembro de 2020.

“Paraíso”. Jas. 11-2020.
POEMA – “AZUL”
TANTO AZUL, Meu deus, O teu céu, Esse imenso mar, É espelho Dos teus sonhos, Medida Do teu olhar. O MEU É BRANCO E cintilante Para te alumiar, Gotículas De cristal Que te acendam A alma Para melhor Te guiar. HÁ UM LEVE murmúrio De nuvens Que cobre, Como véu, O silêncio Que há muito Ouço, Insistente, Bater-me À porta Levemente, Como quem chama Por mim. E QUANDO NOS SONHOS Te vejo Vestida de azul Turquesa Entro numa porta Branca E voo, voo, A perder de vista, Até ao paraíso, Deixando para trás O jardim Inacabado, Portão aberto, Escancarado, Bailéus desenhados A rigor, A preto e branco, Onde um dia Eu te vi, Meu amor, Num estranho Enlace Que nunca mais Terá fim. NOS SONHOS, (Em todos eles) Caio das nuvens Brancas Como Ícaro Ou meteorito Incandescente E mergulho No azul Para te encontrar Num arco-íris Luminoso Onde vives Vestida de todas As cores Que povoam As cidades Invisíveis Dos poetas... É NESSE TEU AZUL Profundo e Denso Que respiro O que me sobra De ti, Nos sonhos escritos E pintados Com que te vou Soletrando, Insistente, Até cair exausto Para adormecer E me sonhar De novo No regaço Da tua alma... .............. Pintada A aguarela.
O JARDINEIRO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Alquimia”. Original de minha autoria para este poema. Novembro de 2020.

“Alquimia”. Jas. 11-2020.
POEMA – “O JARDINEIRO”
TORNEI-ME BOM Jardineiro, Troquei letras Por flores, Uma Rosa vale um Verso, A Camélia Mil amores, Um poema O universo. QUANTO VALE Amor-Perfeito? Fixo-me nele, Encantado, Meus versos Tornam-se cores E aquecem-me O peito... ................ Ponho a tristeza De lado. PALAVRAS Coloridas Amaciam-me A alma Quando ela fica Em ferida, São bálsamo Que me refresca E exalta A minha vida. POR ISSO VOU Ao jardim Cobrir-me de Mil flores, Nascem versos Para mim Com palavras Que são cores. OLHO-AS Com atenção, Fixo-as Com o olhar, Toco-as Com a mão, Fico ali A pensar No que acontece Com elas Em seu lento Germinar. NADA MAIS Quero saber, Só das cores Do meu jardim Que curam Da alma A dor, O que mais Me faz sofrer, Ver-te Tão longe, assim, Saber Que te estou A perder... MAS ESSAS FLORES Não duram, É mortal a natureza, Elas perdem-se No tempo E só me resta A saudade... ............... Vem ter comigo A tristeza. NÃO APAGAM Este triste Entardecer, Mas pego-as Com esta mão Pra suas cores Eu beber À procura de Evasão. NAS FLORES Há doce seiva, Alimento Da beleza, Nas palavras Mil perfis, Quieta, a natureza, Em cada folha Um matiz E até é bela A tristeza Quando olhas E sorris. UM SORRISO NATURAL Como pétala De flor, Uma palavra, Sinal, Pérola Que sempre brilhe No meu jardim De cristal. REGULAR É o seu tempo, Um ritmo Mais do que certo, Tudo nasce E tudo morre Sob o céu A descoberto. MAS RENASCE Sempre um dia Pra dizer “Aqui estou”, Natureza é alquimia Que me diz Pra onde vou. POR ISSO SOU Jardineiro, Com flores Aprendo sempre, Leio-te a alma No jardim, Pois natureza Não mente. TROCO LETRAS Por flores Mas às palavras Dou rima, No jardim Nascem amores Porque a beleza Aproxima.

“Alquimia”. Detalhe.
COR, DÁ-ME COR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Cor”. Original de minha autoria para este poema. Novembro de 2020.

“Cor”. Jas. 11-2020.
"Donde termina el arco iris, en tu alma o en el horizonte?" Pablo Neruda
POEMA – “COR, DÁ-ME COR”
COR, DÁ-ME COR, Fico mais perto De ti Se vieres Docemente Com o vento. Cor, dá-me cor Que as palavras Coloridas Já me sabem A cinzento. OU TALVEZ NÃO. Palavras Nunca me faltam Nem vivo Na escuridão, Ainda consigo Dizer-te E com elas Dar-te a mão. TENHO-AS Que me cheguem Para cantar Ao vivo O concreto Do teu nome, Ouvir assim O teu eco Quando a tristeza Irrompe E esta dor Me consome... AH, MAS A COR Se for intensa E nascer Por explosão, Se tiver Em contraponto Palavras De emoção Que dão ritmo Ao azul Dos teus sonhos De papel... ................. Ah, sim, é tudo O que eu preciso Pra te esculpir A cinzel. DÁ-ME COR Que eu sou Sensível À luz fulgente Do teu olhar, Vagueio nas Flores que colho Quando vestes O vermelho, A cor viva Com que brilhas No cristal Do meu espelho... ............... Ou te cobres Com o manto Do arco-íris Que és. AH, TU ÉS COR, Gota d’água Suspensa No fio Do horizonte, Iluminada De ouro Pelo sol Que já desponta Lá em cima, No meu Monte. DANÇAS COM ELA, A cor, E com ela Adormeces... .......... Por amor. É sopro Da tua alma Quando a vida Se faz sonho E lá no alto Do céu Logo te cobres De azul... MAS EU GOSTO De te pintar Com palavras, Onde o azul é Mais quente, O verde Esse teu manto E o vermelho Emoção Nos poemas que Te canto Com paixão... ............... Vibra o verso Em amarelo Dói-me o peito De amor E já treme A minha mão. É NA COR Destas palavras Que te revejo As vezes Que eu quiser Pois dou corpo Ao desejo Nos poemas Que fizer. CADA VEZ MAIS Gosto de cor, De me confundir Com ela, Dançá-la Como vida Em efusão, Fogo de artifício Que embriaga Os sentidos Como lava de Vulcão... EVOCO O Poeta-Mestre Quando pedia “Mais luz” Já no seu leito Fatal. Tinha luz Dentro de si Mas a cor Já não entrava No portal. Era cinzenta E ténue A cor Que lhe restava E logo escurecia Quando a porta Se fechava... LUZ É COR, Desperta da Letargia, Ressuscita Do torpor, Celebra vida Com magia, É canto, É alquimia, Chilreio de Passarinho Que anuncia O meu voo Aos azuis Que por lá pintas Como se fossem Meu ninho. AH, SIM! Mas eu gosto É de palavras, Foi com elas Que te vi Nas letras Que desenhei, Os rostos Que descrevi, Emoção Que não calei. E TU CABES Em quatro letras Quando teu Nome Tem sete E me sabe A Primavera No meu Jardim Encantado Onde tudo Me fascina Porque a beleza Impera E eu fico Apaixonado...

“Cor”. Detalhe.
“ENCONTREI-TE LÁ EM CIMA, NO MONTE”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração:”Palácio das Artes no Monte Parnaso”. Original de minha autoria para este poema. Novembro de 2020.

“Palácio das Artes no Monte Parnaso”. Jas. 11-2020.
POEMA – “ENCONTREI-TE LÁ EM CIMA, NO MONTE”
“Tu prima m’inviasti / verso Parnaso a ber ne le sue grotte, / e prima appresso Dio m’alluminasti”. Dante Alighieri. Divina Commedia. Purgatorio. Canto XXII, 64-66.
PERDI-TE Porque, afinal, Nunca Te abracei, Numa praça, Numa rua, Num jardim, Em lado algum, Eu já nem sei... MAS ABRACEI-TE No Parnaso, Lá em cima, Com palavras Em forma de poema, Enredado nas Mil cores Do jardim encantado Da tua alma. VESTIDO DE COR Senti-me Afagado No meu canto, Umas vezes Um pouco triste, Outras Em sufocado Pranto Por não ter O teu corpo Junto a mim, Por não te ter A meu lado. SIM, ENCONTREI-TE No Parnaso, No Monte Da luz divina, No Monte Da branca neve, Cristalina, E, abraçado a ti, Eu vi lá do alto A costa E o mar, Vi com nitidez O meu mundo Interior E como te devo Amar, Aprender A sonhar-te Em azul, A tua cor E, lá no alto, Voar... A NEBLINA Cobria-te Para te vestir E refrescar A alma Como chuva De palavras Húmidas Caídas do meu Céu Enublado E triste. EU NÃO ERA MAIS Que um espelho Que te devolvia Fantasia Contra a Petrificação Que espreitava Nos olhares Indiscretos E volúveis Que te espreitavam Em cada dia. MAS TU NÃO ME VIAS. Em mim, Especulavas (Dizias), E eu, espelho Da tua alma, Gastava assim Os meus dias... E DE TANTO Em mim Te reveres Declinaste O espelho que Começava A embaciar-te A alma... E NÃO ERA Da neblina Que te envolvia, Mas dos desenhos Que tuas mãos Esboçavam Nesse espelho Já húmido De ti... ............ E da minha Fantasia. DESPEDISTE-TE Do Monte, Desceste Em desconforto Sob os olhares Das mil górgones Que ameaçavam Petrificar-te No caminho Para o vale... .............. E sucumbiste. Ou talvez não... JÁ SÓ, NO MONTE, Disse: "De tanto te reveres Em mim Ficou-me, de ti, O repetido reflexo. E sabes o que Brotava Quando te olhavas Na minha superfície Luminosa? Beleza, Toda a que me sobrou Quando, triste, Desceste o Monte E a tua melodia Me faltou.” MAS TEU ROSTO Não petrificará Porque ficou Guardado No meu corpo Vítreo Onde todos Se revêem Sem saber Que no reflexo Levam, gravada Em transparência, A tua imagem... ................ Embaciada. E POR CÁ FIQUEI, Espelho do mundo, A olhar para O espaço Sideral À espera Que um cometa Me alumie o caminho Para ta devolver como Teu reflexo Original...

“Palácio das Artes no Monte Parnaso”. Detalhe.
O POETA QUE SE FEZ PINTOR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Evocação de um Arbusto em Flor”. Original de minha autoria. Novembro de 2020.

“Evocação de um arbusto em Flor”. Jas. 11-2020.
POEMA – “O POETA QUE SE FEZ PINTOR”
O POETA BRINCAVA Com suas palavras, Cantava o amor Porque a desejava... ERA UM POETA, Era fingidor, Não a desenhava, Cantava-lhe A cor. SUAS CORES Eram palavras, Fazia pincel Da sua caneta, O poeta riscava, Mas a sua tinta Já não era preta. POR ISSO COMPROU Um belo pincel E pintava, Pintava... ............. Era a granel... .............. E a sua tela Deixou de ser O velho papel. DESCOBRIU A COR, Que o fascinou: Azul, vermelho E tanto amarelo... ................. Tudo ele pintou, Procurando sempre O que era belo. ATÉ QUE O ENCONTROU Na cor dos seus Olhos, Era luz da pura Que iluminava O novo papel Onde desenhou O seu fino rosto Com o seu pincel. DESCOBRIU AS CORES Com que a dizia, As suas palavras Tornaram-se riscos... .................... Mais que poesia. PINTAVA ASSIM E os seus poemas Já não lhe chegavam, Pintor de palavras, De cor as compunha E versos voavam No azul do céu... ................... “E o que tu fazias Faço agora eu (Dissera-lhe um dia), Porque sou poeta Mas também pintor". "DEIXASTE-ME SÓ, Entregue à palavra, E eu, Tão pobre de ti, Pintei-me de dor". "MAS EU FAÇO DELA O meu arco-íris Pra subir ao céu A ver se t’encontro Atrás duma cor Pintando o teu rosto Para um poema Que vou escrever Com todas as cores Que trago comigo Enquanto viver”. O POETA BRINCAVA Mas era séria Essa brincadeira, Perdido em palavras Encontrou a cor E nos seus poemas Dela fez bandeira...

“Evocação de um Arbusto em Flor”. Detalhe.
TEU CORPO DE CRISTAL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Reflexos” Original de minha autoria para este poema. Outubro de 2020.

“Reflexos”. Jas. 10-2020.
POEMA – “TEU CORPO DE CRISTAL”
AGORA VEJO-TE Ao perto, Despida, Cada bago Me seduz Como cristal, Refracção Da luz Que desce Sobre ti E me atinge O olhar Como raio Fatal. CEGO De tanta luz, Entrevejo-te Num clarão, Multidão De cristais Que brilham E desafiam, Vermelho rubi De todas as paixões, Espelho de Alma Deslumbrada Que vive de Ilusões. MAS ÉS ROMÃ E faço o caminho Ao invés Pra te encontrar Ao alcance Da minha mão, Poder colher-te, Fazer caminho Contigo, Do inferno À primavera, Do fogo ardente Ao vicejar Dos campos, Aos frutos Da nossa terra Onde o teu Poder impera. ÉS DEUSA, SIM, Imortal, Teu corpo É cristal Que brilha No templo de Salomão E me convida A entrar Nessa bela Catedral Guiado por Tua mão? SAÍSTE DE TI E agora és Semente Múltipla Do futuro Que há-de vir, Deusa Da fecundidade, Do amor E da paixão A celebrar No fogo Ardente Desse teu lar Onde os bagos Do teu ventre São como Lava De vulcão.

“Reflexos”. Detalhe.
TENTAÇÃO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Cristais”. Original de minha autoria para este poema. Outubro de 2020.

“Cristais”. Jas. 10-2020.
“¡Quién fuera como tú,
fruta, / todo pasión
sobre el campo!”
Final do poema de
Federico García Lorca
“Canción Oriental” (1920),
dedicado à Romã.
POEMA – “TENTAÇÃO”
INQUIETO, Como sempre, Vi-te por dentro Depois de te ter Cantado Por fora, Feliz, Mas triste, Assim... ................... Como quem chora... CONTEMPLEI Teus cristais, Vi cintilar A tua alma E logo te pintei Por dentro, Sem mais, Numa tarde Leda e calma. E CEDI À TENTAÇÃO De te oferecer Aos lábios Da minha amada, Ao compromisso Fatal, Para que ficasse Enleada E se tornasse Imortal. MAS ELA É Concha fechada, Seus cristais São ouro negro, É mistério Bem guardado, Silêncio É o seu lema Porque dizem Que é dourado. MAS PARA MIM É ROMÃ. Quando a chamo Ao meu canto E a pinto De alma cheia Floresce No meu Jardim Como em ilha Encantada Nasce o canto Da sereia. NUNCA TOCOU Teus bagos Nem os comeu Como eu queria Para a ter Eternamente Cada noite E cada dia. POR ISSO TE PROCUREI, Meu fruto De tentação... És alimento Dos deuses E de Kore A perdição. TALVEZ ME ACENDAS O estro E a vontade de rimar Pois silêncio Não é d’ouro Quando o sorriso Me falta E não a posso Cantar.

“Cristais”. Detalhe.
ROMÃ
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Outubro de 2020.

“S/Título”. Jas. 10-2020-
POEMA – “ROMÔ
ROMÃ DOS CRISTAIS Vermelhos E cristalinos Que se aninham No seu ventre, Sabor acre Como acidulados Citrinos, Meu alimento de Sempre, Que nos une... ............ Os destinos. ROMÃ DE NOME Insinuante Que alude a cidades Ausentes E ao amor Que exala Do incerto sabor Dos bagos Da perdição, O alimento De Kore, De Hades A irresistível Paixão. ROMÃ, De onde vens? Do inferno, Da Pérsia Ou de Granada? És uma maçã Com grãos, “Melograno", Em Roma Reinventada, Cor vermelha E amarela Dos jardins Da minha amada? ÉS BELA, ROMÃ. Vou levar-te Para o meu Jardim Encantado, Para junto do arbusto, Ter mil cristais Em cada fruto, Como os beijos Que te dou Nestas palavras De amor Por deuses Iluminado. PERDI-TE QUANDO Nascias Naquele outono De longínquo Passado, Mas ficou-me Aquele arbusto Que já tinha A meu lado... VOU LEVAR-TE Para ter Junto de mim O rubor Desse teu rosto, Provar de teus Bagos O doce E acidulado Gosto... COMO GOSTO DE TI, Romã de Deméter E de Hades, Da tua cor, Das faces lapidadas De teus bagos, Da fecundidade E do amor Que em ti desperta Quando afago Com as mãos A tua pele... E a emoção Mais aperta: Um intenso E envolvente calor. VEJO-TE COMO TÍMIDA Romã, Doce, Mas acidulada E, qual Kore, Dividida, Como se cada parte De ti Não quisesse A outra Pra nada. MAS ÉS ROMÃ, A minha cidade, Meu Jardim Encantado, Presente Perfumado, Fruto da Mitologia E do amor, Filha de Deméter E da poesia, Que quero sempre A meu lado.

“S/Título”. Detalhe.
“ESCULPIR-TE…”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Aurífice”. Originais (novas versões) de minha autoria. Outubro de 2020.

“O Aurífice”. Jas. 10-2020.
POEMA – “ESCULPIR-TE”
ENTRE O BRANCO E O NEGRO Quis esculpir-te A alma Na flor que, Num acaso, Encontrei Perdida No jardim Da minha vida... ATRÁS DE TI, Ou em fuga (Já nem sei), Gastara Todas as cores do Arco-íris Que tinha Guardado Dentro de mim. SOBRARA Uma marmórea Pedra negra, Espelho oracular Onde me via Escuro na alma Por falta De cores Exuberantes Que me protegessem Do frio glacial Da tua ausência Suportada Nas longas Intermitências E contrapontos De uma melodia Inacabada. SOPREI FORTE Com a alma Desnuda E a flor Pousou suavemente Na pedra lisa E brilhante Da catedral Onde te queria Celebrar Como amante, Do oráculo Vestal. ESCULPI-TE Como filigrana De ouro preto Sobre branco-pérola, Aurífice da tua Alma sedutora No coração Alvoraçado Dessa flor Onde guardei O teu nome Gravado em letras Invisíveis. DESENHEI Alvas incrustações Em filigrana Como marcas Indeléveis Da arte Que um dia Me visitou Para te cantar. E, AGORA, A olhar para O branco e o negro Desse cântico Desenhado E esculpido, Ofereço-te Este poema Sobre pintura Imaculada Onde te celebro Com arte Minimal, Na forma E na cor, Sem fronteiras, E onde Te reinvento Em fuga: Um elegante Fio branco Que esvoaça, Livre, No marmóreo céu Do teu altar. A ÂNCORA, A sul, Desliza Suavemente Sobre ti E dilui-se, Como eu, Na negra Vastidão... EVOCO-TE, ASSIM, A branco e negro Sobre a flor Que um dia Encontrei Perdida No meu Jardim Encantado Quando visitava O impossível... ............... À tua procura.

“O Aurífice”. Detalhe.
A MONTANHA ENCANTADA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Montanha Encantada”. Original de minha autoria para este poema. Setembro de 2020.

“A Montanha Encantada”. Jas. 09-2020.
POEMA: “A MONTANHA ENCANTADA”
VÊS AQUELE ANIMAL Sagrado Lá no alto Da Montanha, Meu amor? Seus olhos Fulminantes São águias Que perscrutam O horizonte E te procuram Na vastidão Destes montes Transbordantes De cor. EU SOBREVIVO ALI, Diluindo-me nas Cores exuberantes E quentes Das encostas, Sob o azul profundo Da abóbada Sideral Que me inebria Nas vertigens De cada ritual. ASSIM TE ESPERO Em cada dia... ................ E ao primeiro Voo das águias Correrei nu por Esses campos Fora Para te ver passar Ao longe (E sem demora), Subindo o maciço Até tocares o céu Com as mãos, Numa bebedeira De azul Que te fará Levitar Sobre o meu vale Mais profundo. É A MINHA MONTANHA ENCANTADA, Refúgio de eremita Que te canta E recria Com a alma Para te levar Em poética Levitação Por veredas Verdejantes E luminosas Sem destino Ou direcção... NESTA PROFUSÃO De cores intensas Que te ofereço Uma vez mais Penso-te como Imanência, Esparsa Pelas encostas Abissais Que o semideus (Que vês Lá bem no alto) Protege Com as águias Do sagrado Planalto. VÊS PARA ONDE Te levo, Meu amor? Para o Monte De Athena, O Parnaso Que habito Por tanto eu Te amar E no poema Pintar Como sufocado Grito de dor.

“A Montanha Encantada”. Detalhe.
FANTASIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Rubor". Original de minha autoria para este poema. Setembro de 2020.

“Rubor”. Jas. 09-2020.
POEMA – “FANTASIA”
O TEU ROSTO Assomou Quando a luz Branca Irrompia No meu jardim, Num insólito Entardecer, Por entre a espessa Folhagem Do vasto e belo Jasmim... ................... E logo eu me perdi Nesse doce Acontecer Que descia Sobre mim. ASSOMAVAS Como flor Em súbito espanto, Despertada Pelo mundo, Com o rosto Em rubor Quando ouviste Este meu canto Profundo... ......... Invocar O teu amor. A LUZ ERA NEVE Derramada Sobre ti No coração da Primavera E o inverno Que te cobria Essa alma Atormentada Desceu Ao meu Jardim Encantado (Minha mágica Quimera), Nessa tarde Luminosa De um branco Imaculado. E EU FIXEI-O, Esse inverno Tão tardio, Que caía Sobre ti Lá do alto Do arbusto (Tão macio) Que me protege As cores Com que te pinto E as palavras Que te canto (Como ousado desafio). AH, ERAS MESMO TU Disfarçada De Flor Que germinou No húmus Desse Jardim E assomou ao Meu olhar Para logo Sussurrar: “- Oh, este amor Não terá fim...”

“Rubor”. Detalhe.
MUDAM OS VENTOS E MUDAM AS PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Encruzilhada”. Original de minha autoria para este poema. Setembro, 2020.

“Encruzilhada”. Jas. 09-2020.
POEMA – “MUDAM OS VENTOS E MUDAM AS PALAVRAS”
“MUDAM OS VENTOS E mudam as palavras”, Assim falava o poeta. De sinais Tudo sabia, Mas de ventos, Isso não, Sobre Éolo Nada podia. MUDAM AS VONTADES E também mudam As cores, Fortalece O desejo À procura De alimento, Tudo muda, Tudo gira E também muda O vento. O QUE CONTA São os ciclos Desta vida, Os que o tempo Desenhar Pra cada nova Partida Num eterno Movimento Como as ondas Do mar. HÁ ENCRUZILHADAS E é preciso Escolher Para logo decidir Ainda que seja Do mesmo Se não pudermos Fugir. E EU ÀS VEZES DECIDO E volto a decidir, Mas encontro Sempre o mesmo E logo volto A cair... TAMBÉM NÃO HÁ Muito a fazer Porque o vento Sopra sempre Numa certa direcção Para levar As palavras... .............. Quando sopra De feição. MUDAM OS TEMPOS Muda a vontade, Muda o vento De direcção (É verdade), Mas as cores Do arco-íris Viajam sempre Comigo Mesmo que digas Que não.

“Encruzilhada”. Detalhe.
ESTÃO CANSADAS, AS PALAVRAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Chorar”. Original de minha autoria para este poema. Setembro de 2020.

“Chorar”. Jas. 09-2020.
POEMA – “ESTÃO CANSADAS, AS PALAVRAS…”
LUTO CONTRA O CANSAÇO De te recriar, Aqui, Neste Jardim, Numa busca De palavras E de cores Que parece Não ter fim... AS PALAVRAS AMEAÇAM Nada dizer, Braços caídos, E as cores Já desbotam Nos cenários Coloridos. POR TANTO ME ESCONDER Atrás delas, Fingindo Nada saber, Arrisco Perder-me Neste Parnaso Onde te venho Cantando, Por certo, Não por acaso. DE NADA VALE Pedir-te Um simples sinal, A ti, Que os manejas Com mestria E sageza, Ao sabor dos teus Caprichos E de uma triste Dureza. TALVEZ ANDES Distraída Com futilidades Da vida, Mas já não sei bem Quem tu és De tão antiga Ser Esta nossa Despedida. AS PALAVRAS ESTÃO Cansadas De te procurar Com o vento Sem saber Onde pousar Nesse teu mar Tão cinzento. NÃO FOSSEM AS CORES Do arco-íris A pintar o rio Da tua vida E talvez já tivesse Procurado Outra foz Onde banhar O meu estro e Dar palco A outra voz. MAS SEI Que procuraria Sempre a tua Réplica (Que nunca Encontraria) E então regresso À memória Colorida Desta minha fantasia, Povoo-me De imagens, Construo catedrais, Afundo-me na arte... ............... E, olha, Pensa bem no que Eu te digo, Pois já não sei Em que mais, Para além deste Sofrido castigo.

“Chorar”. Detalhe.
POR UM SORRISO…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Há Vida no Jardim”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2020.

“Há Vida no Jardim”. Jas. 08.2020.
POEMA – “POR UM SORRISO…”
OFERECIA-TE O mundo Por um sorriso E um terno Olhar Desses olhos Negros Onde gosto De navegar. MAS É CERTO QUE Não terei, Foi promessa Para a vida, Eu bem sei. NÃO IMPORTA, Também o mundo Não é meu Para o oferecer... .................. Ah, mas dou-te As mágicas Paisagens Do meu olhar, A incandescer, Os frutos Da minha arte, Recrio-te Em ausência, Como diz a Yourcenar, E então ficas Mais bela Que tu mesma... ............... De tanto assim Te amar. DEI-TE HÁ DIAS Um talismã Pra que te guie Na vida. Fi-la eu, A alquimia, Com essas vibrantes Cores, Luz que brilha Cada dia... ............. Como em todos Os amores. SIM, EU TENHO O mundo espelhado No meu coração, Lugar de onde Te vejo À distância E à medida De uma insólita Paixão E de um intenso Desejo... ......... Profundo Como vulcão. MAS ESSE SORRISO E teu olhar Não os terei Para melhor Te amar... ................ Como eu sei. Então canto-te Para espairecer E comigo te Levar Como sempre Desejei. TENHO-TE ASSIM, Em fantasia, Este modo De te ter Cada noite em Cada dia...

“Há Vida no Jardim”. Detalhe.
“KETROF”
Pintura (Tela, 135x100, p.a.) By João de Almeida Santos PARTILHO hoje este quadro, de minha autoria, inspirado na “Quinta do Quetrofe”. A “Quinta do Quetrofe” encontra-se na vertente leste da Serra de Famalicão (Guarda), a mil metros de altitude, com uma belíssima vista para o Maciço Central.

“Ketrof”. Jas. 08-2020.
OFEREÇO-TE UM TALISMÃ…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Talismã”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2020.

“Talismã”. Jas. 08-2020.
POEMA – “OFEREÇO-TE UM TALISMÃ…”
OFEREÇO-TE UM TALISMÃ, Meu símbolo Do teu encanto, Como se fosses Irmã, Aqui, neste Jardim, Aqui, neste recanto. VOA ALTO O talismã, Procura-te, (Mas não sei onde), Tem poderes E tem magia, (Que esconde), Protege o teu Caminho Em cada nova Partida, A tua cartografia, O mapa da tua Vida. VOA, SIM, O TALISMÃ, Desenhei-o Para isso, Um sopro Forte Na alma, Lado belo do Feitiço. TEM AS CORES DO Arco-íris, Ilumina o Teu rosto, As margens Da tua vida, Tudo aquilo De que gosto... ................ Ver-te sempre Protegida. BRILHA Pela matina Com teus cabelos Ao vento, Um sorriso Em teus lábios Que acende O meu olhar Quando desperto Ao relento Do sonho De te amar. É GRANDE O seu poder E forte como o Amor, Bons auspícios Para ti, Remédio De alquimista Pra curar a Minha dor. OFEREÇO-TE O talismã, Aceita-o Com alegria, Protege O teu destino, Da vida A travessia, Um caminho Genuíno, Da alma A alquimia.

“Talismã”. Detalhe.
VALSA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Timidez”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2020.

“Timidez”. Jas. 08-2020.
POEMA – “VALSA”
DANÇAREI SEMPRE Contigo, Dançarei, Uma valsa (Só eu sei) Que não tem fim... ............ Mas que não Seja castigo Esta magia D'encanto Que tomou conta De mim! NÃO ME CANSO, Nesta valsa, Não me canso... ............. O corpo nada Me diz, Eu danço A vida contigo Porque és A minha fada, Da minha alma Matriz. VÊS? É uma dança Interior, Produto da fantasia, Procuro-te Onde quiser Para contigo Dançar Esta nossa Melodia... MAS ENCONTRO-TE Sempre, Austera e Imponente, Neste Jardim Encantado, Fada Em forma de Arbusto (Bem copado) Ou rutilante Flor... ............ E por isso Te dedico Uma longa E sofrida, Mas doce E desmedida, Sinfonia Ao amor.

“Timidez”. Detalhe.
ESTRANHO, NÃO É?
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Terraço”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2020.

“Terraço”. Jas. 08-2020.
POEMA – “ESTRANHO, NÃO É?”
É VULGAR SONHAR-TE Em ambiente idílico, Dirás. Sim, bem sei, Tu que nada terias De romântico Mesmo que eu fosse Um rei. MAS, FOI ASSIM Que te sonhei, Aqui, onde o céu Parece um lago E as grades são, À vista Do casario Que me veste O olhar, A minha libertação, O meu tão cantado Lar. É AQUI QUE Eu te tenho, É aqui que eu Te sonho, Que te canto E te choro, É aqui que Sobrevivo Porque é aqui Que te adoro. PINTO-TE, Sabes? Pinto o lugar Onde te vejo E te quero, Onde mais Eu já te sinto... .............. E desespero... ESTRANHO, NÃO É? É um sítio Onde só vives Sob forma De arbusto E te respiro O perfume, Adormeço Ao relento, Te sonho Com as estrelas E viajo Com o vento... ............ Como lume. SINTO-TE PERTO Quando te canto (Liberto) E me aprisiono Na ideia que De ti eu tenho E onde mais Me abandono. PERCO-ME, SIM, Nestas cores, Nestas palavras, Na minha fantasia, Enquanto tu Te perdes Num silêncio Programado, Tal como eu, Nesta minha Teimosia, Meu destino E triste fado, Tão sofrida Nostalgia. MAS EU ESCREVO E pinto Para ti, Meu amor, Alimento (Com dor) Do teu futuro Quando olhares Para trás E só vires Este meu canto (Já tão maduro) Na tua vida Porque não foste Capaz De manter A ilusão Por ti sempre Prometida...

“Terraço”. Detalhe.
UM SONHO NO MEU JARDIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Jardim Espectral”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2020.

“Jardim Espectral”. Jas. 08-2020.
POEMA – “UM SONHO NO MEU JARDIM”
NUMA TARDE QUENTE De Verão Adormeci No meu Jardim Encantado À sombra de um Loureiro E sonhei, Pensando em ti, Que era Um jardineiro... ........... Apaixonado. MAS ERA ESPECTRAL A luz Desse jardim, Era branca, Irreal, Algo estranho Para mim Neste lugar Seminal. SONHEI-TE. Nesta estranha Visão Tudo perdera Cor, Tudo era Ilusão e Voltou O que então Eu senti Naquela tarde De outono Quando Para sempre Te perdi... ........... Uma imensa Comoção. NO SONHO, Já não te vi, A memória Perdeu cor, Mas logo Te pressenti Nesse cíclico Retorno Da minha Remota dor. NÃO ERA Deste mundo Esse Jardim, Perdera O seu encanto, O perfume Já não era Do inebriante Jasmim Nem de outra Qualquer flor Que sorrisse Para mim. MAS LOGO ACORDEI Com a brisa fresca Da noite No meu Jardim Encantado E o sonho branco E pesado Logo teve O seu fim, Despertando Uma doce Nostalgia Quando o brilho Das estrelas Do mais profundo Do céu Cobriu Este meu rosto De um cintilante Véu Como se fosse magia.

“Jardim Espectral”. Detalhe.
A FLOR DE PAPEL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Fleur de Papier en Vol à la Recherche du Poème Perdu dans un Jour d’Hiver”. Original de minha autoria. Julho de 2020.

“Une Fleur de Papier en Vol à la Recherche du Poème Perdu dans un Jour d’Hiver”. Jas. 07-2020.
POEMA – “A FLOR DE PAPEL”
NUM DIA DE INVERNO Uma flor de papel Voou Para longe, Levada pelo vento. Rajadas fortes Quebraram Os subtis Filamentos Que a ligavam À raiz de onde Nascera... ............. Seu alento. CONTINUA A VOAR, Essa flor de papel, Ao sabor do vento, Pousando Aqui e ali E logo voando Para outros Destinos, Em perpétuo Movimento. PERDEU AS CORES Luminosas Que exibia E a fonte D’inspiração, A seiva De cada dia, Borboleta Sem pólen Para nova Gestação No jardim Da fantasia. MAS NUM DIA Quente De Verão (Eu bem sabia) Encontrei-a Por acaso Aninhada Num arbusto, Recolhida sobre si Em profunda Solidão. PEGUEI-A Com a mão E levei-a Ao Jardim Do meu poeta Pintor... ............. Nosso chão. DEU-LHE COR, O meu poeta, Alisou as suas rugas, Mostrou-lhe O horizonte Nesse dia de Verão E logo a deitou Ao vento, Ao encontro De raiz Que nutrisse Com sua seiva Uma nova floração....

“Dans un Jour d’Hiver…”. Jas. 07.2020.
RITUAIS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Templo Inacabado”. Original de minha autoria para este poema. Julho de 2020.

” Templo Inacabado”, Jas. 07-2020
POEMA – “RITUAIS”
IMAGINEI UM TEMPLO Revestido de vitrais, Celebrar-te Com palavras Em singelos rituais. EVOCO O tempo Em que sempre Me perdia Nesse teu olhar Esquivo... ............... E os silêncios Que sobravam Como se fossem Castigo. É O QUE RESTA Como alimento Da alma, O fervilhar De memórias, Inscrições Sensoriais, Silêncio Profundo A poético Chamamento... ............... E tudo o mais... UM FUTURO IMAGINADO De voluntário Amante, Construído Nas ruínas De um passado Que não é Muito distante. SIM, O QUE RESTA É este brilho Coado, Melancólico, Cinzento, O negro De teus olhos Inquietos E teus cabelos Fartos, Ao vento... TUDO FERVILHA Na minha sofrida Memória, Delicada criação Em palavras Com história. DOU-TE, ASSIM, Nova vida E renovo-me Também eu, Falo ao mundo Comovido De um templo Que é só meu. IMAGINEI-O, O templo, Para quando Regressar Do meu Jardim Encantado, Vibrante de cores E por fora Perfumado, Mas por dentro Melancólico e Sofrido Por te ter, Nesse tempo Já passado, Dolorosamente Perdido... ......... De tanto Te ter amado.

“Templo Inacabado”. Detalhe.
DEUSA NO MEU JARDIM ENCANTADO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Sonhei-te assim, no Poema”. Original de minha autoria para este poema. Julho de 2020.

“Sonhei-te assim, no Poema”. Jas. 07-2020.
POEMA – “DEUSA NO MEU JARDIM ENCANTADO
”SONHEI-TE ASSIM, Meu amor: Uma deusa no Jardim. Não te vendo, Recrio-te Com fantasia, Olhar Deslumbrado, Alma Devotada Que persiste Fascinada Como quando No passado Eu te via. QUE SAUDADES! Não nos gastámos Porque partiste Cedo demais. Sobrou-me De ti o melhor, Quando, ao ver-te, Estremecia, Olhos negros, Inquietos, Mistério Que seduzia. FICOU-ME A VONTADE De te desvelar Lentamente À medida Do desejo, De um forte Encantamento, Renovada Inspiração, Oráculo e Devoção E silente Chamamento. ESTA NOITE Sonhei-te assim, Amanhã Eu já não sei, Os sonhos vão Lá pra longe Ou vêm pra muito Perto, Noites longas e Profundas, Quando o amanhecer É incerto. POR ISSO SONHEI-TE Hoje, Pra te contar O meu sonho Amanhã, No dia em que Mais sinto Esta minha solidão, A ausência E o silêncio A que respondo Com poética Evasão. PROCURO-TE Na fantasia, Nos poemas, Na pintura, Nos sonhos Ou no Jardim Onde te vejo Altiva Aqui bem perto De mim. E QUANDO TE OLHO Vejo o mundo A partir desse teu Rosto, Mais belo E misterioso, Mais quente, Silencioso... CRESCE A VONTADE, O estro, A poesia, Vejo o futuro Risonho, Há uma certa acalmia Neste mundo Tão rugoso. SONHEI-TE Um dia antes Do beijo Que celebro Com a minha poesia, Ano após ano, Ao encontro da raiz Onde o poeta Nasceu Para o canto Que a dor Lhe prometeu Como pura catarsia.

“Sonhei-te assim, no Poema”. Detalhe.
ENCONTRO NO JARDIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração – “Cai a Noite no Jardim”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2020.

“Cai a Noite no Jardim”. Jas. 06-2020.
POEMA – “ENCONTRO NO JARDIM…”
CAI A NOITE No jardim E já nem sei Se amanheces Dentro de mim. Sobras-me Em incerteza Nos sonhos Breves Em que te encontro Como se fosse Eterna Esta nossa despedida, A versão já repetida De um desencontro Sem fim. MAS À NOITE O teu perfume É mais intenso No meu Jardim Encantado, O silêncio Mais profundo, Ouço mais A tua voz Cristalina Ecoar Na minha alma, Vejo o brilho De teus olhos Ausentes Acender magnólias Brancas E sinto o vermelho Das rosas Incendiar-me O corpo. MAS ANOITECE, Meu amor, Ah, como anoitece, Vai-se o sol E a vibração dos sentidos, Recomeça a viagem Para dentro de mim, Invoco-te Com a alma E trago-te Como pétala às minhas Palavras, Olho-te por dentro Quando a melancolia Toma conta de mim Neste cíclico Anoitecer. VOU AGORA A CAMINHO Da noite, Do sonho, Do imaginário Que entra sem pedir Licença E me arrasta Na corrente Onírica para um Incerto destino Onde não sei Se habitas. E O AMANHECER É sempre imprevisível, As ondas de luz que Chegam com o sol Ameaçam As cores suaves E quentes Com que te Sonho e te pinto Na minha alma Nas noites De luar. CAI A NOITE NO JARDIM E anoitece-me Na alma, Meu amor!

“Cai a Noite no Jardim”. Detalhe.
CASTA DIVA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2020

“S/Título”. Jas. 06-2020.
POEMA – “CASTA DIVA”
SONHEI-TE Nesta noite de Verão. Eras casta. Podias ser Casta Diva. Ou não. Casta, sim, De onde nasce O meu vinho, Milagre Da natureza, Sob forma de Mulher, Mas serás Diva também Se ao poema Te trouxer. SONHO-TE Muitas vezes, Voo contigo À procura Do passado, Mas nunca eu Te sonhei Como casta Em pecado, Trepando, Pela latada, No meu Jardim Encantado. AH, A LATADA Essa sim, Que um dia Trepou por ti Pernada acima Nesse enlace Fatal Onde me nasceu A rima, O canto Que te invoca Quando me torno Jogral. AGORA SONHO-TE ASSIM, Mulher-Rufete, Crescendo Bem alto Nas terras Do meu Jardim... ................. As voltas que O mundo dá, Neste recanto Encantado Com aroma Perfumado Da ramagem do Jasmim. CRESCES-ME Na alma Sob a forma de Enlace, Mas se agora És videira E ontem eras Jasmim, Amanhã Serás arbusto Mesmo que eu O não queira Por seres diva Para mim.

“S/Título”. Detalhe.
A EROSÃO DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Entardece no Jardim”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2020.

“Entardece no Jardim”. Jas. 2020.
ENTARDECE NO JARDIM, Entrevejo-te Por entre folhas De um arbusto, Ao longe, Uma imagem Desfocada... ............... O sol cai No horizonte, Vejo, apenas, Um perfil Esfumado, Nuvem cinzenta Arrastada Pelo vento Para lá desta Montanha, Meu alento, Minha fada. VIRO-ME Para dentro De mim E o meu olhar Interior Confunde-se Com o teu E já nem sei Se és tu Ou se essa imagem Um pouco baça Serei eu. O TEMPO Esculpe o rosto Na memória Dos afectos E só vejo O que de ti Me sobrou, Retrato De pouca cor Composto Ao ritmo De suspiros... ............ E tanta dor. NÃO FOSSE A POESIA E restarias Nuvem no céu Entre o azul E o branco Desta minha Fantasia, Ponte espectral Entre mim E a deusa que M’ilumina Por dentro e Por fora, Um clarão irreal Que cega E me comove... ............... Como quem chora. AH, MAS O POEMA Dá-te vida, Dá-te luz E dá-te cor, Enche-te a alma De emoção, Interpela Todo o teu ser E rompe Este minha Tão sofrida Solidão. MAS EU TEMO Encontrar-te E já não saber Quem tu és Por há muito Navegar Outras ondas E marés Tão longe Desse teu mar...

“Entardece no Jardim”. Detalhe.
A REINVENÇÃO DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A lua desceu sobre mim”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2020.

“A lua desceu sobre mim”. Jas. 06-2020.
POEMA – “A REINVENÇÃO DO TEMPO”
FOI INESPERADA A descida Ao vale Profundo Da tua vida, Reencontro Com o destino Que os deuses Te traçaram, Numa longa Despedida. TRILHOS NOVOS, Fim do ciclo Que corroía E já tardava... .............. Porque doía. UM RÁPIDO Bater de asas Aos ventos que Sopravam e Incendiavam O teu desejo De liberdade... ............... E o tempo Da reinvenção Aconteceu Na outra metade De ti. OS CICLOS Que a vida tem... .................. De repente, Assomam Personagens Que nos habitam E aguardam Em silêncio O dobrar de uma Esquina Para tomarem Conta de nós... É A VIDA Em sobressalto, Renascida, Ventos que sopram Forte na alma, Perfume de liberdade Que docemente Embriaga, O sorriso inocente Da criança que Desperta Para dar vida Às coisas inanimadas Que nos prendem O olhar... ............. Num luminoso Amanhecer. PRESSENTI Essa viagem, A partida Do túnel Ensombrado Do tempo, Sem bagagens, Apenas o teu corpo E a vontade De trepar pelo Mundo acima Como quem Já o respira Lá no alto Da montanha. E LOGO TE DISSE: “Nasce outro Personagem Em ti Que já se manifesta À procura de autor Que lhe reescreva O destino E o ponha em cena No teatro Da tua vida...” “VEM DAÍ, VEM, Que a vida acontece No grande teatro Do mundo Onde se viaja ao sabor Do vento E da fantasia Em levitação Sobre o vale De onde se vê A vida Do lado certo Do sonho.” “E TU, QUE PAGASTE O teu tributo, Abraça a autoria E procura esse palco Onde encenar A reinvenção do Tempo Com fantasia, A que nasce Da liberdade Que ilumina O caminho, A bússola Que já te guia.” VÁ, VEM DAÍ, Há muito Caminho para andar, Há azul No horizonte E brilho No teu luar, Há sol Na madrugada, Suave brisa No ar, Há flores No teu jardim, Água fresca Pra regar, Há mais mundo Que te espera E uma vida Para amar... ............... Vem daí, vem, Meu amor, Já nem sei Como esperar!

“A lua desceu sobre mim”. Detalhe.
ETERNO RETORNO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Encontrei-te no Jardim”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2020.

“Encontrei-te no Jardim”. Jas. 05-2020.
POEMA – “ETERNO RETORNO”
SE TE VEJO
Estremeço,
Se não te vejo
Caio em
Melancolia,
Assalta-me
O desejo
De voar
Contigo...
...........
Nesse dia.
EU NÃO SEI
Como se muda
O mundo
Para te ter,
Então voo
Sobre ele
Ao sabor do vento
Pra que tu
Me possas ver.
É ESTRANHO, NÃO É?
Esta moinha
Que me consome
Porque não te vejo,
Não te ouço
E nem sequer
Te procuro
Porque sei
Que a via
Da minha arte
Me levará
A esse teu lado
Mais puro.
É POR ISSO QUE
Só te espero
Na rua
Do desencontro,
No jardim
Da despedida
Que nunca parei
De regar
Com arte
E nostalgia,
Essa forma
De te amar
Cada noite
E cada dia.
É ACASO
Ou destino
Esperar-te numa
Esquina
Das tantas
Que a vida tem?
Foi dela
Que t'esgueiraste
Na densa
Neblina
Desse teu
Quotidiano
De que ficaste
Refém.
SIM, É VERDADE,
Mas se te encontro
Nessa esquina
Que me leva
Ao jardim
Eu de novo
Estremeço,
Caio em mim,
Sinto um profundo
Torpor
E adormeço,
Pondo fim
A essa dor...
AH, MAS DEPOIS
É o céu,
Sim, o céu,
A sonhar-te
Em azul profundo
E o desejo
A cumprir-se
Nas ondas
Do nosso mar
Até que a aurora
Desponte
Para ser acometido
Por nova melancolia
E desejo
De voar...

“Encontrei-te no Jardim”. Detalhe.
QUASE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Desejo”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2020.

“O Desejo”. Jas. 05-2010 .
POEMA – “QUASE”
DISSE-TE UMA VEZ Que o desejo É quase tudo E o que sobra Quase nada. RESPONDESTE Que, assim, Eu nunca Sairia de mim Pra conhecer O sabor Do quase Que sempre Sobra Do desejo Consumado. SORRI E com ternura Te disse Que é na posse Que se mata O desejo Encantado... ENCOLHESTE Os ombros, Olhaste-me De revés E foste embora Dali. FIQUEI SÓ, Com o desejo Nos braços, Nostálgico E pensativo, Quando dobraste A esquina Deste nosso Desencontro, Tão curto, Mas impressivo... RECORRI À memória Daquele instante Fugaz, Revi-te a beleza Do rosto, Expressivo E tão vivaz, Alma Estampada No corpo, Essa boca Sensual... ............ E o desejo Transbordou Das margens Deste meu Mundo Tecido De fantasia Numa bola De cristal. FIXEI-ME Na tua beleza E dei asas Ao desejo, Desenhei-te Numa tela E cantei-te Num poema (As armas Do meu poder), Cobri-te Toda de cores Para nunca Te perder. E FIQUEI-ME Por ali, A sonhar-te... .............. A matutar No destino Que cedo Me cativou Por achar que O desejo É quase tudo, Mesmo quando O mundo Te abraça E devolve Tudo o que dele Te sobrou.

“O Desejo”. Detalhe.
CONFISSÕES DE UM CONFINADO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2020.

“S/Título”. Jas. 05-2020.
POEMA – “CONFISSÕES DE UM CONFINADO”
ANDO PERDIDO, Por aí, Nas tardes De Primavera, À procura de mim, Neste estranho Tempo Que aviva O que perdemos Nas esquinas Da nossa vida. NÃO ME VENDO No espelho Dos outros, Já não sei Quem sou e Onde estou. Apenas suspeito. Uma vaga ideia. FALTA-ME O MUNDO Para dar conta De mim, Mas, coisa estranha, Ele entra-me Casa adentro E devolve-me O que perdi, Mais selectivo E profundo, Apenas o que é Remoto Da cidade Onde vivi. ESTRANHO MUNDO, Este, Que escolhe Por mim O que me sobrou Da voragem Do tempo... É POR ISSO Que me procuro Para saber Se o que me Bate À porta É meu Ou se a falta De mundo Me provoca Alucinações, Sonhos ou Sombras Do que nunca Aconteceu... ENTÃO PROCURO-ME No espelho Que trago comigo, Dádiva De Athena, Olho, Volto a olhar E descubro que Afinal sou eu, O esquecido Sem abrigo, Aquele que andou Por aí No bulício Da vida, Ao sabor do vento... ............. Mas contigo. E TAMBÉM SEI Que, por isso, Nesta errância, Eu não petrifiquei. AH, COMO É BOM Saber Que, afinal, O vento Me levou Para destinos Encantados Onde contigo Renasci, Quando o tempo Trazido pelo vento Que passou Na rua da Minha vida Me bateu À porta... ............ E eu abri.

“S/Título”. Detalhe.
É ASSIM QUE EU TE VEJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Uma Mulher”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2020

“Uma Mulher”. Jas. 05-2020
POEMA – “É ASSIM QUE EU TE VEJO”
DESDE SEMPRE Que te guardo No meu peito. Fixei-te melhor Naquele dia E guardei-te Na memória Profunda Quando te vi Perdida, Por encanto, A ouvir Essa nossa Melodia. UM BRILHO QUIETO Em teus olhos, Suspensa Nas nuvens, A suave paixão Maternal, Inefável, Quando as palavras Já não chegam Para te nomear Com a alma, De tão cheia De ti, A transbordar... A MINHA AUSÊNCIA Constante E tão cortante, O preço Para ser O que mais querias Que fosse, Fazia crescer Em ti O encantamento Que tinhas Contigo Desde aquele dia, Quando te nasci E tu renasceste Comigo. AQUI SEMPRE A meu lado, Este rosto Sedutor Nunca me Despertara O desejo De o cantar Para além da Memória Remota Do afecto... PALAVRAS E melodia, O olhar Penetrante Da alma, Um canto Devotado Que tocasse Em cada dia As fronteiras Intangíveis Do sagrado. FOI PRECISO Aprender Os ofícios Da arte Pra te poder Celebrar E dizer De todas as formas Que sei O que não quero Calar. E AQUI ESTOU. Esse dia Haveria de Chegar. E chegou.

“Flores do meu Jardim Encantado”.
MARMELADA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Dança da Combustão”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2020.

“A Dança da Combustão”. Jas. 05-2020.
POEMA – “MARMELADA”
COMO GOSTO Da tua marmelada, Meu amor... ........... E gosto de Chocolates, Dos que me Sabem a ti, A esse tão doce Sabor. GOSTO DA METAFÍSICA De confeitaria Porque me adoça A alma, É nela que eu te Encontro, Nesta minha Fantasia, Quando a noite Se faz calma. SOU GULOSO, Como sabes, E como é doce E macia Esta tua marmelada, Sinto-a Como alquimia, Como arte De uma fada. COMO, COMO, Sem parar, Sabe-me Sempre a ti, Ao brilho Do teu olhar, Ao perfume Do teu corpo, Onde hei-de Naufragar. NESTA TUA MARMELADA, Eu vejo-te Artesanal, Com os marmelos Nas mãos, Sabores Em harmonia, Uma receita fatal, Polpa moldada Por ti Na dança Da combustão, Cor intensa E profunda, Iguaria De convento Com teus frutos Em fusão. TALVEZ A TENHAS Criado Em tempo De quietude Ou mesmo de Solidão, Quando esvaece Esse lado Tão agreste E tão crispado Que te esconde A beleza Dos momentos De paixão... AH, A MARMELADA, A metafísica, Chocolates, Confeitaria... .............. A doçura Do teu jeito Vai ficar-me Sempre viva Como suave Suspiro Que se solta Do meu peito... ............... Por essa tua Magia...

“A Dança da Combustão”. Detalhe.
TRÊS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Geometria”. Original de minha autoria. Abril de 2020.

“Geometria”. Jas. 04-2020
POEMA – “TRÊS
SINTO TRÊS VEZES A tua falta Na sofrida Solidão Onde encerro O que não tenho No Monte, Oráculo Desta minha Invocação. TRÊS VEZES Eu sinto O teu silêncio, Na ausência Do teu rosto E do som Da tua voz, Do aroma Do teu corpo... ................ Minha foz. ATÉ A ALMA Escasseia... ............... Não lhe sinto Pulsação, Desmaiada Sobre mim, Inerte Nestes meus braços, Uma carícia Sem fim... TEU SILÊNCIO Cai pesado Sobre a minha Solidão, Meteorito Na alma, Inaudível Colisão. SOBRA-ME, De ti, O nome, Rasto da tua Passagem Na rua Que já foi minha, É nela que eu Te sonho E te pressinto Como deusa Nas noites Do meu luar E te canto Em poemas Onde os nomes São metáforas E sem limite O poder De nomear. EU SINTO A tua falta Três vezes De cada vez. É falta a mais, Eu bem sei, Mas o número Perfeito É o três. ABRAÇO O número Da perfeição, Desenho Triângulos Em liberdade Até que os sinta Vibrar, Instrumentos Musicais Que dão voz À minha dor Na exacta Geometria De teus breves Rituais. NELES OUÇO A tua melodia Como eco Desse nome Que no sonho Invoquei, Dou início Ao poema Para te sussurrar Baixinho A história Que sonhei.

“Geometria”. Detalhe.
ALMA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração – “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Abril de 2020.

“S/Título”. Jas. 04-2020
POEMA – “ALMA”
SE QUISESSE A tua alma Como anjo Do pecado, Que farias Do teu corpo Que eu sonho Imaculado? SE O TEU CORPO Pedisse O poeta Apaixonado Não lhe darias A alma, Tributo do teu Secreto Pecado? MAS EU QUERO A tua alma Mais do que quero O teu corpo, Do que de ti Eu mais gosto, Porque é ela Que me fala No brilho Desses teus Olhos, No veludo Do teu rosto. ÀS VEZES (Eu pressinto) Abandonas-te Ao ritmo Encantatório Das palavras Que te lanço, Da melodia que Embala, Da beleza Do meu pranto No poema Que te fala. É DIFERENTE O meu encontro Com teu rosto Tão macio, O brilho do teu Olhar... ................. Ou com sulcos Tão crispados, Espelho Da tua alma, Quando roubam O encanto Desse sorriso Esboçado De quem constrói O futuro Nas ruínas Do passado. O QUE EU Procuro em ti, É o lado Desta minha Perdição, A beleza Dos teus olhos Onde te fala A alma, Onde cresce Cada dia Uma incontida Paixão. TALVEZ O TEU SILÊNCIO, Linguagem Em forma pura, Me seduza E me cative Na fronteira De uma dor... ............... Que com poesia Se cura.

“S/Título”. Detalhe
VOAR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Pássaro de Fogo”. Original de minha autoria sobre desenho de Vera Sousa. Abril de 2020.

“Pássaro de Fogo”. Jas. 04-2020.
POEMA – “VOAR”
APETECE-ME VOAR Sobre o teu silêncio, Confinado que estou Entre paredes De um subtil E incerto afecto Que me vai capturando Pela sedução De uma ausência Insinuada... AH, MAS EU SEI Que estas paredes São do tamanho Da minha fantasia E que o voo, Livre como é, Não terminará Até que te sinta Pulsar finalmente Dentro de mim... E SEI TAMBÉM Que as minhas asas Terão sempre As cores Do arco-íris Para com elas Voar Sobre o vale da Tua vida, Montado num Pássaro de Fogo. VER-TE-EI Lá de cima Caminhar distraída, Perdida Nas encruzilhadas Que vais criando No sendeiro inóspito Da tua vida E lançar-te-ei Âncoras coloridas Que dêem mais luz À incerteza Que te vai na alma. E AGORA, Que o pintei, Já tenho um Mensageiro Que te levará, Com o vento (Ou num Inesperado E feliz reencontro De palavras), As cores Com que, docemente, Te vou pintando E as deixará No parapeito Da tua janela. MAS NÃO PRECISARÁS De abri-la De par em par Porque ele não Entrará... ............. Poderia Incendiar-te A fantasia e Engravidar-te A alma Com o fogo Que levará Consigo...

“Pássaro de Fogo”. Detalhe.
REGRESSO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Primavera”. Original de minha autoria para este poema. Abril de 2020.

“Primavera”. Jas. 04-2020
POEMA: “REGRESSO”
ESTÁS TÃO LONGE E tão perto Eu te sinto... ............. Neste tempo De fronteiras Eu sofro O teu silêncio Como espinho Cravado Da mais brava Das roseiras. MESMO ASSIM, Mesmo em dor, Regresso sempre Ao lugar Onde eu Te conheci, Ao mistério Do teu rosto, Quando por ele Me perdi... PERDI-ME,SIM, Mas encontrei O que julgava Não ter, Porque foste O espelho Onde me vi Renascer, Embora já Pressentisse Que por culpa Do destino Eu te iria Perder. AH, SE SOUBESSE Onde estás O vento Levar-me-ia Ao parapeito Da tua incerta Janela, Ver a tua Silhueta, Partilhar A solidão, Sonhar, Sentir-me Um passarinho Aninhado Docemente Na palma Da tua mão, Sem vontade De voar... MAS EU NÃO SEI Onde estás, O que fazes, Com quem andas, Se trabalhas, Se viajas, Se sonhas E fantasias, Se não ouves Ou não lês Os sinais que Eu te dou... .............. Poéticas Sinfonias Em pautas Onde transcrevo O que de ti Me ficou. OH, QUE DESTINO Me calhou, Ter-te Encontrado Um dia Para logo Te perder Nos caminhos Desta vida Que me levam A cantar Esta triste Melodia De eterna Despedida...

“Primavera”. Detalhe.
INVOCAÇÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Casas no meu Jardim
Encantado”. Original de minha
autoria para este poema.
Março de 2020. Veja a nota
no final do poema.

“Casas no meu Jardim Encantado”. Jas. 03-2020
POEMA – “INVOCAÇÃO”
QUE SINTAS
O pulsar
Do poema
No teu peito
Para te ter
No silêncio
De uma casa
Iluminada
Pelo brilho
Das magnólias
E da luz
Da primavera
Ao lusco-fusco
De um entardecer
...................
É o que mais
Eu desejo de ti.
SE CAÍRES EM SILÊNCIO
Profundo
Para melhor
Ouvir
O meu canto
E sentir o aroma
Das cores
Com que pinto
Para te encher
A alma
De Primavera...
...................
Ah, que feliz
Eu me sinto.
SE SENTIRES
Dentro de ti
O chamamento
Ao poema
E o ritmo do meu
Pulsar
Continuarei
A visitar
O oráculo
E a subir
À montanha
Onde a deusa
Espera
Notícias de ti.
SE O TEU SILÊNCIO
For o eco da
Minha voz,
A dança da melodia
Cantada
Em surdina
Saberei que
Abraçaste o tempo
À medida de um
Sonho
Revelado
Onde constróis
O futuro...
...............
Reinventando o
Passado.
E SE EU SENTIR
Uma suave
Tristeza
De tanta ausência
Sofrida
E uma doce
Nostalgia
Da luz
Desses teus olhos
Que m'incendeia
O olhar
Então isso
Quer dizer
Que te amo...
...........
Com a alma
A transbordar...
MAS NÃO SEI...
................
Não sei se
Tudo será
Uma cálida
Fabulação
Pr’alimentar
A sede
Insaciável
De teu corpo
Imaginado
Num poema
Em que sonhei
Ter-te, assim,
Tão intensamente
Amado...

“Casas no meu Jardim Encantado”. Detalhe.
TALVEZ MOVIDO POR ESTE POEMA,
tenho, nestes dias,
frequentado, mais do que o
habitual, as obras de Nietzsche.
Transcrevo, pois, aqui dois
aforismos (161 e 175)
tirados de “Para além
do bem e do mal", de 1886:
1. “os poetas não têm pudor
das suas aventuras; exploram-nas”
– os poetas vivem as suas
experiências íntimas como
alimento da sua fantasia;
2. “cada um ama o seu desejo
e não o objecto desse desejo” –
o que subsiste é o desejo,
tudo reside nele e é ele
que move montanhas.
Este poema remeteu-me para a
necessidade de ter
estes aforismos sempre presentes,
tal como o aforismo 153:
“o que se faz por amor está
sempre para além do bem e do mal”.
E não fosse a conversão interior
e o desenho estético das suas
pulsões naturais,
para além do bem e do mal,
a dor do poeta
seria irremediável
e talvez insuportável.
Assim, escreve, pinta
e segue em frente,
alheio ao (silencioso) ruído
exterior que ameaça
perturbá-lo.
O Nietzsche está mais perto
da arte do que
da filosofia. Sinto isso
na minha própria pele.
Eu, que não sou Zarathustra:
“Die Liebe ist die
Gefahr des Einsamsten” –
“O amor é o perigo
do mais solitário”
(“Assim falou Zarathustra”,
1883-85, III, Der Wanderer).
JAS#03-2020
BRILHAM OS TEUS OLHOS
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Oráculo”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2020.

“Oráculo”. Jas. 03-2020.
POEMA – “BRILHAM OS TEUS OLHOS”
NO ORÁCULO Há uma árvore Iluminada Nos dias de ritual... ................... Essa árvore És tu E eu a luz Que alumia Com o ceptro De cristal Do templo sagrado De Athena, Da arte A catedral. ÀS VEZES BRILHAS, Incendeias-me A alma e O estro No poema Em construção, Outras convocas A sombra E o silêncio, A árvore Entristece E também eu Me apago Em infausta Comoção. É BELA A ÁRVORE (Sem frutos), Beleza luminosa E um pouco fugidia Quando em dias De ritual Quero cantá-la Com vigor E fantasia Porque o brilho Dos teus olhos Me acende Esta paixão Como pura energia. SE NELA EU NÃO TE VEJO, Apago-me Em submissa Tristeza, Falta-me o teu Olhar, De cada poema, A luz E, do afecto, Delicada Incerteza... FLUI O TEMPO, Meu amor, Gasta-se a vida, Fogem de nós As palavras, O olhar Empalidece E esvai-se A alegria, O oráculo Não acolhe Este canto E, depois, Volta a rotina De cada dia E eu perco O teu encanto... MAS A DEUSA Aguarda-nos Impaciente E eu hesito A chamar-te Ao ritual, Tenho medo Que não ouças E perca, Do oráculo, A magia Do seu ceptro De cristal... AH, MAS EU OUÇO-TE Sempre Dentro de mim (És a minha Salvação) E convoco-te Ao poema Pr’acender Com a tua melodia A árvore Inspiradora Da minha deusa Athena Enquanto Meu canto Durar Nos dias Do ritual. NÃO TE ABANDONES TU Na perdição Da rotina, Não apagues Essa luz Que começa a Renascer Com brilho que M'ilumina, Deixa que eu Te cante E te celebre Em cada amanhecer, Te acenda A fantasia Nem que seja Num instante Duma noite Ou no acaso De um dia.

“Oráculo”. Detalhe.
RAÍZES
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Jardim Encantado”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2020.

“Jardim Encantado”. Jas. 03-2020
POEMA – “RAÍZES”
FUI PROCURAR-TE
Ao Jardim
(Vou sempre,
Quando te quero),
És planta
Seminal,
Magnólia,
O teu nome,
Erecta
Em mil raízes,
Encantado
Pedestal.
ÉS CÁLICE
D'AFECTO,
Cativas
O meu olhar,
Pedes palavras
Sem fim,
Cânticos,
Poesia
A brotar...
REVEJO-TE
Nela, mulher,
O seu porte
(Como o teu)
É altivo,
Desafia-me
O canto
Pra que o possa
Partilhar
E assim estar
Contigo,
Seduzido,
Por encanto,
Para logo
Te amar.
UMA GRAÇA,
É o que és,
Dessas três
Que sempre
Canto,
Com poemas
E alguma
Timidez
Que dissimula
O meu pranto...
UMA GRAÇA?
Ah, sim,
A que o poema
Resgata
Do futuro
Que perdeu,
Feita
De muitas raízes,
Desenhada
Com palavras
Onde o seu mito
Cresceu
Pra que o tempo
A conserve
E lhe marque
A ventura
Que a Moira
Concedeu.
NESTE JARDIM
Renasceste,
Acendeu-se
O verde
Desses teus olhos
De luz
(Ou castanho,
Já nem sei)
No brilho
Da primavera
Que vestirá
O teu corpo
Em tempo
De sagração...
APETECE-ME
Beber-te
Na seiva
Destas raízes,
Embriagar-me
De ti,
Deste cálice
D'afecto,
Enlaçar-me
Com elas
Pra te amar
Nas origens,
No lugar onde
Nasceste,
Onde sofro de
Vertigens
Por aquilo
Que me deste...
.................
Só aí eu sei
Quem és...

“Jardim Encantado”. Detalhe.
MARÇO
POEMA de João de Almeida Santos. Ilustração: "Fauno em Março" - Original de minha autoria. Oito de Março de 2020.

“Fauno em Março”. Jas. 03-2020
POEMA – “MARÇO”
GOSTO DE MARÇO, Entre o branco e As flores Que despontam Na fronteira Do tempo, Entre a neve E a primavera. GOSTO DO BOTTICELLI, Rostos e corpos Feminis, Volúpia de Transparências Sensuais. GOSTO DA PELE Acetinada Dos corpos, Dos traços E da cor Que desenham Alvura nas Três Graças... .............. E no Amor! GOSTO DO BRANCO, No alto da Montanha E das cores intensas Que interpelam, Insinuantes, O meu olhar Deslumbrado, Cá em baixo, Neste vale Por elas sempre Iluminado. GOSTO DE MARÇO, Ah, como gosto! Entrei nele Contigo, Ombro a ombro, Em contraponto Que se consumou Como silêncio Fatal, Marca de tempo Quase irreal, Face obscura Do meu rosto Entristecido. QUE O DIGAM Os astros Desalinhados... ............... Para ti colhia Flores luminosas, Crescia A inspiração Em estrofes Arrebatadas Com que sentir Fingia O que dizer Não podia. Contraponto. O outro lado Da tua melodia... MARCADO Como selo De inspiração Às avessas, Lá vou eu Por aí, Nem sei porquê (Ou por falta de ti), De braço dado Com Botticelli, Lá em cima, na Galleria, Onde quase morei, Transeunte Irreverente No incerto desafio De um dia. PROCURO-TE, SIM, Na laica oração À deusa Athena, A que trazes (Eu bem sei) No centro Do teu coração. SINTO-TE PERTO (É estranho, não é?), Depuro A tua imagem, Bissetriz de mil Rostos perdidos, Até se tornar Ideia precisa De corpo ausente... DEPOIS, AH, DEPOIS REINVENTO-A A cada instante, Abraço-a Com alma De amante, Pinto-a com Palavras De poeta Encantado E sonho-te Numa plácida noite Da primavera Que assoma... AO ACORDAR, No amanhecer De cada poema Verei que continuas Em mim De olhos fechados Como se fosses Memória profunda Do que nunca Aconteceu. ANDAREI Por aí (Os astros o dirão), Vagando Sobre o pólen Da beleza sensível Onde pousarei O meu inquieto Olhar À procura De alimento Para pintar O poema... ........................ E talvez o impossível! LÁ NO ALTO Te encontrarei, No fio do horizonte, Um risco, Projecção do teu Olhar A construir infinito, Onde, num adeus Sem fronteiras Nem cais de partida, Hás-de desenhar Com a alma As mil silhuetas Inacabadas... ................ Ou talvez não! MEU DEUS, Como gosto de ti... ............... Em Março!

“Fauno em Março”. Detalhe.
MANDEI PODAR O LOUREIRO…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Loureiro em Flor no meu Jardim Encantado”. Original de minha autoria para este poema. Março de 2020.

“Loureiro em Flor no meu Jardim Encantado”. Jas. 03-2020
POEMA – “MANDEI PODAR O LOUREIRO…”
MANDEI PODAR O LOUREIRO
Num dia de Carnaval,
Cada ramo que caía
Doía,
Fazia mal.
ESPALHAVA-SE O AROMA
Intenso pelo Jardim,
O podador a cortar
E, ele, triste
E tão dorido,
Sempre a olhar
Para mim...
“QUE FIZ EU PARA SOFRER,
Estou sempre
À tua frente,
Porque mandaste
Podar-me,
Assim,
Tão de repente?”
“FOI PARA ME RENOVAR,
Pra ganhar
Um novo alento?
Porque não paras
De olhar,
Acalmas o sofrimento?”
“JÁ NÃO APONTO PRÒ CÉU,
Fiquei mesmo redondinho
E, tu, quando me olhas,
Ficas sempre mais sozinho,
Mais longe do meu perfume
Que deitaste a perder
Com aparente azedume
Porque não podaste
A tempo
O que havia de crescer.”
“PERDI MUITAS
Das minhas bagas,
Estavam em mim
Às centenas,
Agora ficaram chagas
E não são muito pequenas.”
“LEVOU-MAS O PODADOR
As bagas que tu perdeste,
Já não sinto o teu calor
Por tudo o que não fizeste
Mas que podias fazer
Se tivesses mais coragem...
......................
Deitaste tudo a perder
Só porque era selvagem!”
“NÃO SÃO LOUROS
De glória,
Não são...
................
Por que razão
Me deixaste,
Ferido de
Tanta paixão?
Para teres
Uma vitória
Que não merece
Perdão?”
“AGARRA-TE A MIM
Agora,
Sou teu loureiro
Em Jardim,
Se não quiseres,
Vai-te embora,
Que eu fico-me assim,
Mais pequeno,
Mas robusto,
Mais redondo
E mais belo...
...................
Serei sempre
Mais que arbusto,
Não é preciso
Dizê-lo.”
O LOUREIRO DO JARDIM
É planta seminal,
Viajo com ele
No tempo
Como se fosse imortal.
É ÁRVORE DE POESIA,
É fonte d’inspiração,
Ajuda-me a renascer
Se vacila o coração.
É UM POSTO DE VIGIA,
Cresce, cresce
Para cima,
É com ele que
Eu resisto,
Declinando-me
Em rima...
POR ISSO MANDEI
Podá-lo
Para se fortalecer.
Se o não tivesse feito
Ia mesmo esmorecer
E com ele também eu
Caía em negação...
................
Não são fáceis
Estes tempos,
Mas loureiro é canção!

“Loureiro em Flor no meu Jardim Encantado”. Detalhe
SONHEI-TE, NAQUELA NOITE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Um Sonho”. Original de minha autoria. Fevereiro de 2020

“Um Sonho”. Jas. 02.2020
POEMA – “SONHEI-TE, NAQUELA NOITE”
SONHEI-TE, MEU AMOR. Atravessava o deserto, Há muito. Nada via no horizonte. Areia, só areia No meu caminho E uma neblina quente Lá ao fundo... Nem sabia se Na longa caminhada Encontraria Um oásis Onde molhar Os lábios Já gretados De tanta aridez... MAS HOJE SONHEI-TE. Saí do deserto E reencontrei o oásis Nas pupilas dos teus Olhos. ANINHEI-ME EM TI, Sereno como nunca Estivera Desde que te conheci. Ofereci-te uma história Em papel Onde te conto, Nos conto À exaustão, Até ao limiar Do impossível, Mas com uma réstia De esperança De não ter de Regressar À torreira Do deserto. FALÁMOS DE ARTE, Imagina, Do seu poder Curativo E de como a vida Se lê E se resolve Nela. ABANDONEI-ME Nos teus braços, Perdido em quentes Memórias, E caminhámos Nem sei bem por onde Ou para onde. SONHEI-TE Esta noite, Meu amor. E, sabes? Acordei de ti Embriagado De felicidade, Uma doce tontura... AH, HABITUEI-ME A estar contigo Em sonho, A dizer-te Em poemas, A interpelar-te De longe... HABITUEI-ME Ao teu silêncio, A uma fronteira Inultrapassável A não ser Pelo vento Que te cicia os Meus murmúrios... TENHO-TE Dentro de mim E já nem sei O que seria Encontrar-te, Olhar de perto Esses teus olhos Negros e profundos, Sentir o teu perfume E naufragar No mistério Insondável Da tua vida. TALVEZ TE PERDESSE, Nesse instante, Por excesso de ti. Mas eu não quero Perder-te, Meu amor.

“Um Sonho”. Detalhe.
A PALAVRA PROIBIDA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Beija-Flor em Magnólia”. Original de minha autoria. Fevereiro de 2020.

“Beija-Flor em Magnólia”. Jas. 02-2020.
POEMA – “A PALAVRA PROIBIDA”
OS GUARDIÕES Do sagrado templo Da palavra E da cor Emitiram edital: “O amor em poesia Fica assim proibido Porque pode ser Fatal. Os versos E as estrofes Banhados A luz e cor Ficam pra sempre Banidos Da arte E do amor.” DIZ O GRANDE HONORÉ, Balzac, de apelido, Certeiro, Como poeta, Na palavra destemido, Que o Amor É poesia, É a arte Dos sentidos, É perfume Que inebria E nos faz sentir Perdidos Se não houver Guardião Que decrete, Impenitente: “Também eles São proibidos!” PROIBIDOS? Ah, esses, Não, Poesia É emoção, É enlevo Dos sentidos Que resiste Ao edital Mesmo que seja Cantado Pelo mais belo Jogral. O POEMA LEVA Aos píncaros Da mais alta Fantasia, Sobem ao monte Os sentidos Com as asas E a leveza Da arte Em poesia. MAS É DIFÍCIL Ouvir E sentir Em verso Com alegria Pois há sempre Alguém Que me rouba A brisa Dessa tua Maresia, A que respiras Bem cedo, Logo ao Amanhecer Quando ouves O meu canto Para nunca Te perder. OLHAS O MAR, Ouves As ondas Dentro de ti A cantar Com versos Que o vento Sopra Pra te poder Ciciar O que por ti Eu já sinto Nesta canção Que compus Numa noite De luar. POESIA Dos sentidos... ...................... O amor é mesmo isso, Porque, queiras Ou não queiras, Tem a força De feitiço. ENCONTRO-A Sempre em ti E mesmo que Proibidos Escrevo sempre Poemas Desde o dia Em que te vi. EXALTARAM-SE Os sentidos (Não sentiste?) E para o poema Parti Com as asas E as cores De um belo colibri... DECRETARAM Edital. Ah, que o façam, Pois, cumprir. Mas poesia É como vento Que te leva Cada dia, Sopra Tão forte Na alma Que o silêncio É alento De poeta Que com palavras Se salva. À PALAVRA PROIBIDA Sempre o poeta Resiste, É livre no seu dizer Das razões Da sua vida Quando a dor Atormenta E o sofrimento persiste...

“Beija-Flor em Magnólia”. Detalhe.
ESTAVAS À MINHA FRENTE…
Poema de João de Almeida Santos. Reproponho, com ligeiras alterações, o poema – de Gianni para Paola, personagens do meu romance “Via dei Portoghesi” (Lisboa, Parsifal, 2019) – que publiquei há quatro anos. Ilustração: “Licht, mehr Licht...” - Original de minha autoria. 14 de Fevereiro de 2020.

“Licht, mehr Licht…”. Jas. 14.02.2020
POEMA – “ESTAVAS À MINHA FRENTE…”
PASSARAM ANOS E ANOS Que nem consigo contar, Estava feliz de te ver, Ouvias-me nesse Solar A dizer o que sentia A sentir o teu olhar. COM MEUS OLHOS TE DIZIA Que o mundo ia parar Se chegássemos um dia Nem sei bem a que lugar. ESTAVAS À MINHA FRENTE E pousavas o olhar Em mim, tão docemente... ..................... Nem podia acreditar, Havia um brilho diferente A iluminar o Solar... FOI ESSE UM DIA FELIZ Luminoso para mim Vi-te com outra roupagem Como se fosses cetim, Perfume e suave aragem, Um doce embalo sem fim... LANCEI ENTÃO O OLHAR Para a torre de marfim Onde te fui projectar, Tão bela eras assim, Nesse dia, Nesse lugar, A dizer o que sentias, Dando voltas às palavras Que timidamente dizias, Medindo bem os efeitos Que tu já bem Pressentias... ESTAVAS À MINHA FRENTE, Falávamos nesse Solar E eu estava feliz, Bastava-me o teu olhar. NA MEMÓRIA DO PASSADO Já não vejo esse lugar Onde possa estar contigo, Onde te possa falar, Cumprido esse castigo De não te poder encontrar A não ser com as palavras Em que me ponho a nu, Como se vê pelo dia Em que as lanço ao vento Tão fortes de meu soprar Para ver se é com elas Que te consigo alcançar... ESTAVAS À MINHA FRENTE, Lembro-me do teu olhar No bulício desse dia, Do teu leve respirar. AGORA FOGES DE MIM. Tens medo de soçobrar? Tu és mais forte que eu Resistes ao meu olhar, Às vezes com timidez, Outras sem me enfrentar... NOS DIAS EM QUE TE VEJO Ganha alento a minha vida, Fortaleço-me a alma Suspendo a despedida, Fico sereno, em calma, Cicatriza-me a ferida. SE OLHAR PARA O FUTURO E não te vir no caminho Fica a vida sem sentido E vazio o meu destino... NÃO ESQUEÇAS QUEM, Ausente, Ouve a tua melodia E em cada instante pressente O poder dess’alquimia Que funde tudo o que sente No sentir de cada dia. E ASSIM VOU REGRESSANDO A essa torre de marfim Que vou construindo Em palavras Do que persiste em mim... ESTAVAS À MINHA FRENTE…

“Licht, mehr Licht…”. Detalhe
O MEU NOME
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Teu Corpo” - Original de minha autoria. Fevereiro de 2020.

“O Teu Corpo”. Jas. 02-2020
POEMA – “O MEU NOME”
PORQUE NÃO ME NOMEIAS, Meu amor? Nome-ar. Tão simples. Quatro letras. Devolver-me Identidade, Aquecida Nos teus lábios Pelo ar quente Que respiras... ASSIM, PERCO-ME, Não sei de mim, Fico sem espelho Onde me ver A cores E em perfil De traço fino Nos teus doces Murmúrios... ................ Que sufocas... .............. E não desvelo O destino traçado Pelos deuses No chão arenoso Do caminho Da minha vida. TORNO-ME SOMBRA De mim Quando me interpelas Sem nome-ar, Não me reconheço, Sou outro, Pronome Indefinido ou Interjeição, Ideia vaga, Incerto perfil Que se dilui Como aguarela Em folha branca Manejada Por ti à procura De uma forma Que, afinal, Não tem nome. PORQUE CATIVAS O som De quatro letras E não cantas A minha melodia Com uma palavra Só? Ah, a tua boca Logo hesita Quando a palavra Assoma À flor dos teus Lábios, Como daquela vez Em que soou Timidamente Como sussurro, Murmúrio Imperceptível, Em surdina, Na fronteira Do silêncio. O MEU NOME Desata A tua alma E ameaça Levá-la consigo A voar sobre O mundo De mãos dadas No fio do horizonte? São vertigens, Meu amor? AH, SE ASSIM FOSSE Diria O teu nome Mais do que digo Até adormecer De cansaço.... ............. Só para te Sonhar. MAS TU NÃO ME DIZES Porque me desejas Como parte de ti, Sem partilha Nem confissão? Guardas O meu nome No silêncio Do teu peito, Como se fosse Pecado dizê-lo? Sentes perigo? Que o meu nome Se torne lava Ardente, Beijo verbal Proibido Pela gramática Do amor Logo ao primeiro Sinal? E foges Para dentro De ti Com o coração Aos pulos? OH, TAMBÉM EU NÃO TE DIGO, Como chamamento, No meu poema, Onde os nomes Se dizem De outro modo, Têm som E ritmo Diferentes, São notas De uma melodia Sofrida E cifrada... MAS AS TUAS LETRAS Estão lá, Todas, Uma a uma, E a cor Dos teus cabelos Em aguarela E o cetim Da tua pele Macia Por onde deslizam Os meus olhos À procura dos teus, Negros e profundos, E essas mãos Perfumadas Filhas da arte Que te desenham A alma Com riscos E cores Que atiras Ao vento Para que eu Os agarre E lhes dê Som, Ritmo E sentido Num poema... .................. Ao entardecer... E, ASSIM, EU CANTO O teu ser, Tudo O que foste, O que és e O que serás, O que sabes e O que sentes, O que vives e O que sonhas. O que dizes No que calas... ........... Tudo, Meu amor. MAS TU DIZES, Com a ironia Do silêncio Triste Que te cativou, Que também eu Não te digo Aqui, Em arte, Mesmo quando Te canto mais Do que ouves, Te nomeio Mais do que Posso, Te pressinto Mais do que Sentes... E TU Apenas te expões Às minhas palavras, À minha música, Silencias-me Porque balbucias O meu nome Só dentro De ti, Foges ao som Encantatório Que corre Atrás de ti Para se ouvir Nos teus lábios. BEM SEI Que o teu mundo Não é o dos nomes Ou das palavras, Sequer murmurejadas, Mas o das cidades Invisíveis Na tua fuga Permanente para O infinito... E SEI QUE AÍ Me vais Silenciosamente Interpelando, Como rosto Mutante, Essa tua forma De docemente Me soletrar. NOMEIAS-ME, SIM, Meu amor, Mas à tua maneira!

“O Teu Corpo…”. Detalhe.
ESCULPIR-TE…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Bianco&Nero”. Original de minha autoria para este poema. Fevereiro de 2020.

Bianco&Nero. Jas. 02-2020
POEMA – “ESCULPIR-TE…”
ENTRE O BRANCO
E O NEGRO
Quis esculpir-te
A alma
Na flor que,
Num acaso,
Encontrei
Perdida
No jardim
Da minha vida...
ATRÁS DE TI,
Ou em fuga
(Já nem sei...),
Gastara
Todas as cores do
Arco-íris
Que tinha
Guardadas
Dentro de mim.
SOBRARA
Uma marmórea
Pedra negra,
Espelho oracular
Onde me via
Escuro na alma
Por falta
De cores
Exuberantes
Que me protegessem
Do frio glacial
Da tua ausência
Nas longas
Intermitências
E contrapontos
Da nossa melodia.
SOPREI FORTE
Com a alma
Desnuda
E a flor
Pousou suavemente
Na pedra
Lisa e brilhante
Da catedral
Onde te ia
Celebrar...
ESCULPI-TE
Como filigrana
De ouro preto
Sobre branco-pérola,
Aurífice da tua
Alma sedutora
No coração
Alvoraçado
Dessa flor
Onde guardei
O teu nome
Gravado em letras
Invisíveis.
CRIEI PARA TI
Alvas incrustações
Em filigrana
Como marcas
Indeléveis
Da arte
Que um dia
Me visitou
Para celebrar
A beleza
Do teu rosto.
E, AGORA,
A olhar para
O branco e o negro
Desse cântico
Desenhado
E esculpido
Ofereço-te
Este poema
Sobre pintura
Imaculada
Onde te celebro
Com beleza
Minimal,
Na cor
E na forma,
Sem fronteiras,
E onde
Te reinvento
Em fuga...
---------------
Um elegante
Fio branco
Que esvoaça,
Livre,
No marmóreo céu
Do teu altar.
A ÂNCORA,
A sul,
Desliza
Suavemente
Sobre ti
E dilui-se,
Como eu,
Na negra vastidão...
EVOCO-TE, ASSIM,
A branco e negro
Sobre a flor
Que um dia
Encontrei
Perdida
No meu jardim
Encantado
Quando visitava
O impossível...
.................
À tua procura...

Bianco&Nero. Detalhe.
ESTOU A PERDER-TE…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Jardim das Memórias”. Original de minha autoria, com citações de Gustav Klimt (1912). Janeiro de 2020.

“Jardim das Memórias”. Jas. 01-2020
POEMA – “ESTOU A PERDER-TE…”
ESTOU A PERDER-TE Meu amor, O estro Com que te canto Esmorece, Vai perdendo Lentamente O seu fulgor, O poema Empalidece E eu, Em poética anemia, Sinto um doce E sonolento Torpor. SUBI CONTIGO AO MONTE, Ao meu jardim Encantado, Com as cores Que tu me deste Eu aprendi a cantar Contigo sempre A meu lado. CANTEI A TUA PARTIDA Quando desceste O vale, Mas, triste e Sem destino, Por veredas Caminhei Com saudades Do jardim Que contigo Cultivei. PERDIDO DE TI, Vagueei No monte À procura De eco Do meu canto Derramado, Mas o eco Era silêncio Profundo Sob o azul Irreal Da abóbada Celeste Desse monte Seminal. UMA TRISTEZA PROFUNDA Tomou conta De mim, Desmaiou A emoção De te ver Ou inventar Com as cores Do meu jardim Porque um silêncio Cortante Sufocava, Impenitente, O eco Dessa canção... TAMBÉM EU DESCI O VALE Da minha vida E regressei À triste Monotonia Sem teu rosto Desenhado, Semente Em gestação De cada palavra Que verso No poema Em construção Nesse jardim Encantado... ESTOU A PERDER-TE, É poética Anemia, Sinto vazio No peito, O estro já escasseia E vacila A melodia... O CÂNTICO É murmúrio Inaudível De alma ferida, Sem comoção, Que nem dor Ela já sente De tão gasta Nesta vida Por excesso De paixão. O VALE ESPERA-ME, Sinto-me vazio De ti Porque Não chegam sinais Da rua do Desencontro Nem das fugas Irreais Para o teu Infinito, Janelas De onde te veja Dobrar As esquinas Esquecidas Do nosso Contentamento. ESTOU A PERDER-TE, AMOR, Não há janela, Nem cor, Não há tempo Nem lugar, Não há poema Nem mar Que suspenda O vazio De não poder Navegar Nas águas Desse teu rio... .................... Eu perdi-te, Meu amor?

“Jardim das Memórias”. Detalhe.
“EU VI UM ANJO…”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Melancolia” Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2020

“Melancolia”. Jas. 01-2020
POEMA – “EU VI UM ANJO…”
EU VI UM ANJO Cair Docemente Sobre mim Com seu rosto Imaculado Num momento D’incerteza Que parecia Não ter fim... VINHA ELE Lá de bem alto Onde eu O pressentia, Estremeci, Um sobressalto, Porque esse anjo Imaculado Em mim Não caberia. SUA LUZ Era intensa, Ofuscava-me O olhar, O seu brilho Deslumbrava E eu senti-me Cegar... MAS NÃO SEI Se era anjo... ................ Talvez fosse Uma mulher, E se não fosse Arcanjo, Ah, Não era um Rosto qualquer... POR ISSO ME FASCINOU, Porque ao vê-lo Descer Desse trono Onde reinava, Quase, quase Me cegou A luz Que o transportava... .............. E levou-me Ao Olimpo Onde a arte Lhe sobrava... FIXEI-O, ENTÃO, Num quadro De memória, Traços leves, Cores intensas Que cativam O olhar. Pintei-o Da cor da Minha paixão Para nele Desvelar Essa mulher Sensual Que me veio Cativar Nesta tão bela Prisão. DESENHEI-A Como belo Avatar Que entrou Dentro de mim Para sempre Me lembrar Que era Uma mulher... ............ E não era Querubim. MAS VI UM ANJO, Ah, eu vi, Entrar bem Dentro de mim Sob forma De mulher, Porque anjo Imaculado, Uma grandeza Infinita, Não caberia No meu pequeno Jardim. EU VI UM ANJO DESCER Neste vale Da minha vida E ele fez-me Crescer, Recomeçar A partida... ............. Para logo me Perder... E COM POEMAS Parti Em viagem Ao Olimpo Para com ele Voar Em cada palavra Que digo, Em cada verso Que sinto... ............. Mas bem sei Que me perdi...

“Melancolia”. Detalhe.
“A COR DA MEMÓRIA”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Transparência”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2020.

“Transparência”. Jas. 01-2020
POEMA – “A COR DA MEMÓRIA”
NUM DIA DE CHUVA, Bateram levemente À porta da minha Memória... ERA TRANSPARENTE, A porta. Vi que eras tu. Reconheci a tua boca, O bâton púrpura Dos teus lábios. NÃO SEI SE ME PRESSENTISTE, Não sei. A porta Era um espelho, Através dela Só se via Do lado de cá. ENTRASTE, Cheia de cor, Que a chuva Humedecera, Mas deixara Intacta. Apenas com mais Brilho... ........ O teu! TAMBÉM TU ERAS TRANSPARENTE. Olhei-te E vi, através de ti, Um céu plúmbeo... E, NA TRANSPARÊNCIA, DESPONTOU O SOL, Coado em amarelo. Havia umas nuvens Escuras A nascente, Lá no Monte... ÀS VEZES, O AMARELO Ganhava tons de Âmbar E vestia-te o corpo, Nu, Na minha intangível Memória Fotográfica. VIA COM NITIDEZ, Sereno, Esse teu belo Sorriso Cristalino, Mas, quando te quis Tocar, Ao de leve, Um vidro desceu, Vertical, Sobre nós. Era frio E húmido, Esse vidro. Separou-nos. E eu chorei! AS LÁGRIMAS Escorreram Pelo vidro. Tentaste Agarrá-las Do lado de lá E fixá-las com Todas as cores Que tinhas contigo. Ficaram apenas Algumas gotas Amarelas Nesse vidro frio, Húmido E cortante... DE REPENTE, Tornaste-te sol E eu já não era Mais do que um Reflexo dos teus Raios filtrados Por algumas Nuvens... ......... Escuras! DESPERTEI Ao som De dedos que batiam Suavemente À porta Do meu quarto. Corri a abri-la... ............... Ninguém! REGRESSEI, RÁPIDO, À minha memória Para te reencontrar, Mas tu já não Estavas, Sequer como reflexo... ................... Deixara aberta A porta do tempo...

“Transparência”. Detalhe.
TEMPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Amanhã...”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2020.

“Amanhã…”. Jas. 01-2020
É TEMPO DE RECOMEÇO? O que ontem Eu já era É o que hoje eu sou, As festas Quiseram tempo Intenso, Mas o tempo resistiu Ao que a vontade Tentou... ................. É tempo De recomeço Quando o tempo Não passou? EM CADA MOMENTO Procuro O tempo Que, no passado, Eu, poeta, Não vivi Porque sempre Reinvento Tudo aquilo Que perdi, Num poema Ou em pintura Para saber Quem eu sou Antes de lá Me perder... ............ Nos lugares Pra onde vou... ENTRE HOJE E ONTEM Há algo Que já mudou? Acaso me libertei? A esperança regressou? Fui ao baú Das memórias E vi logo O que tu és: A imagem bem certeira Desse tempo Que passou... TUDO MUDA Amanhã, Quando, tenso, Eu passar Na curva Do teu caminho? Encontro o que antes Nunca vi? Mulher com futuro No olhar, Sempre a sorrir Para ti, A repetir com carinho Um terno E tão antigo “Olá!”, Cabelos negros Ao vento, Corpo esguio Em movimento, Removendo um passado Que nunca mais Voltará? NÃO, O SEU TEMPO É o silêncio, Já não o tenho Nas mãos, Ele corre Sem destino, É ritmo sem melodia, Caminho Da minha vida Que percorro dia-a-dia Na vertigem Do passado, Mais tristeza Que alegria Como este peso Do fado Só liberto em Poesia. TEM TEMPO, A POESIA? Talvez tenha, Eu não sei, Com ela voo No céu Sem limites Nem fronteiras, Um tempo que é Só meu. AH, SIM, O tempo da poesia É a minha salvação, Perdi-te, mas eu não queria Passado de negação. É TEMPO DE RECOMEÇO, Sopra vento de feição? Sou feliz em poesia. Não é o tempo Que salva, Mas as palavras Que digo Enquanto fores Alimento Desta minha inspiração Porque é assim Que te canto: Da dor sai alegria Que me cura Da paixão.

NÃO SEI SE TE CHEGAM
AS PALAVRAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “O Jardim das Palavras”. Original de minha autoria para este Poema. Dezembro de 2019.

“O Jardim das Palavras”. Jas. 12-2019
POEMA – “NÃO SEI SE TE CHEGAM AS PALAVRAS…”
NÃO SEI SE TE CHEGAM As palavras E, se chegam, Se te tocam. Não sei se As arrumas Nas gavetas Da rotina Ou as deitas Nos desperdícios Da vida... TALVEZ NEM CHEGUEM. Não sei. É esta a beleza Da minha invocação. Canto-te Sem saber se te Chegam as letras Com que vou desatando A sufocada Afeição Ou se o vento As leva Pra lugares De poética Virtude, Resgate Desta minha Solidão... TALVEZ NÃO INTERESSE Saber se chegam Ao destino. O que m’importa É dar forma À melancolia Do meu desejo de ti Como se fosse O primeiro dia Em que, fora do poema, Eu logo te pressenti. É POR ISSO QUE SÃO Palavras pintadas Com as cores Do meu jardim, Porque na beleza Das palavras E da cor Se cristaliza, Da vida, O amor E, da falta de ti, Se decanta A minha dor. SIM, ÉS TU Que me moves, Me inspiras E induzes perfeição. Sem ti Seria arte estranha, Simples adorno, Jogo de formas, Um canto De diversão. O POEMA É Uma forma de socorro, É magia Que invoca o teu Rosto Perdido nas Nas brumas Da memória e Coberto pelo Silêncio Do que nunca Me dirás. NADA A FAZER. Com arte Te quero seduzir E eleger. Não te chegam, As palavras? Só importa A ideia Que tenho de ti E a poesia Que decanta A minha vida Pra te ter Por companhia Nesta longa Despedida. MAS À ARTE Respondes Com o silêncio E o mistério Pra não quebrares O encanto Que faz de ti Galeria Do que em arte Eu senti Em forma de poesia. ESTRANHAS SAUDADES Virão Quando o estro Me faltar E à Torre De Montaigne Subir como refém... ............ Dela nunca Sairei Para novo Desencontro Lá para os lados De Belém...

“O Jardim das Palavras”. Detalhe.
“PRESSENTIMENTO”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Travessia”. Original de minha autoria para este poema. Dezembro, 2019.

“Travessia”. Jas. 12-2019.
POEMA – “PRESSENTIMENTO”
MAIS UMA VEZ,
Ao entardecer,
Te pressenti,
Numa rua de Lisboa.
E não te vi.
AH, ESTA LISBOA
Que amas!
Uma fria silhueta,
A travessia.
Um homem
Perdido em memórias
Que esfumam
No tempo
E deixam
A alma vazia.
DEUS EX MACHINA
Que desce sobre mim
No caos
Em que a vida
Se tornou,
Nos afectos
E na dor...
............
A invocar
As origens
Do amor.
CAÍSTE-ME
NUMA ENCRUZILHADA
Improvável
Quando vinha
Da imensa planície
Onde os deuses
Se anunciam
No horizonte...
UM SÚBITO CLARÃO,
Um sobressalto...
Estremeci.
Irrompeste,
Intempestiva,
Das brumas
Da memória...
...........
Mas apenas
Te pressenti!
APROXIMEI-ME
Do teu mundo,
Sem saber?
Foi o destino,
Adormecido
Que estava
De nunca,
Mas nunca
Te ver.
ESTRANHOS
DESENCONTROS
Que desabam
Sobre nós
Com o destino
A comandar
No labirinto
Insondável
Das nossas vidas...
SILHUETA FUGIDIA,
É o que és,
Afinal,
Porque tudo é plano,
Demasiadamente
Plano, em ti.
VI UM NÚMERO,
A única certeza
Que tenho,
A janela
De onde te vislumbrei,
Mas incerto
Como todos
Os números
Deste mundo.
Incerto, sim,
Porque tu
Não és número
Que me dê
Certezas,
Para além da dor.
És mais quatro
Do que sete,
Meu amor!
OU TALVEZ TENHA SIDO
A minha fértil
Imaginação
Já um pouco doentia
A cruzar-se contigo
Num lance de
Pura magia.
MAS NEM SEI
Se é por ali
Que tu andas,
Porque de ti
Nada sei,
Só o que me sobrou
Daquele tempo
E do tempo que criei
Para nunca te perder
Naquela história
Onde te conto
Longamente
Para em ti renascer.
QUE ESTRANHOS
Lugares de
Desencontro,
No meio da multidão!
Um instante,
Ambiente ruidoso
E improvável,
O regresso a ti,
Cada vez mais
Imaterial
Na película subtil
E transparente
Da memória...
Simulacro irreal.
AH, COMO NO FIM
Deste poema
Sofro a falta
De uns olhos verdes
A iluminarem-me a alma
De ternura,
Mas nem o sol
Se descobre
Para os acender
E me inundarem
De beleza
Da mais pura!

“Travessia”. Detalhe.
“O POETA-PINTOR”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Amanhecer”. Original de minha autoria para este poema. Dezembro de 2019.

“Amanhecer”. Jas. 12-2019.
POEMA – “O POETA-PINTOR”
O POETA BRINCAVA Com suas palavras, Cantava-te sempre Quando não estavas... ERA UM POETA, Era fingidor, Não te desenhava, Cantava-te A cor. E AS SUAS CORES Eram só poemas, Fazia pincel Da sua caneta, Enquanto poeta As letras riscava, Mas a sua tinta Já não era preta... ................ Escolheu a cor, Pintou a palavra. POR ISSO COMPROU Um belo pincel E como pintor Pintava, pintava, Era a granel E a sua tela Que ele adorava Já não era só O velho papel. DESCOBRIU A COR, Que o fascinou: Dourado, vermelho E tanto amarelo. Tudo ele pintou, Procurando sempre O que era belo. ATÉ QUE O ENCONTROU Na cor dos Teus olhos, Era luz da pura Que iluminava O novo papel Onde desenhou O teu fino rosto Com o seu pincel. DEU CORPO À COR Com que te dizia, As suas palavras Tornaram-se riscos... ...................... Mais que poesia. PINTAVA-TE ASSIM. Os poemas Já não lhe chegavam, Pintor de palavras De cor as compunha E versos voavam No azul do céu... ..................... “E o que tu fazias Faço agora eu”, Dissera-te um dia, “Porque sou poeta Mas também pintor. Deixaste-me só, Entregue à palavra E, eu, Tão pobre de ti, Pintei-me de dor". "MAS EU FAÇO DELA O meu arco-íris Pra subir ao céu A ver se t’encontro Atrás duma cor Pintando o teu rosto Para um poema Que vou escrever Com todas as cores Que trago comigo Enquanto viver”. O POETA BRINCAVA Mas era tão séria Essa brincadeira! Perdido em palavras, Encontrou a cor E nos seus poemas Dela fez bandeira.

“Amanhecer”. Detalhe.
NÃO DOBRES A ESQUINA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Variações”. Original de minha autoria. Dezembro de 2019.

“Variações”. Jas. 12-2019
POEMA – “NÃO DOBRES A ESQUINA…”
AH, ACREDITA, Já nem sei Quantos fazes... ................ A ti conto-te E canto-te Ao minuto De tão rápido ser O dobrar da Esquina, O regresso Fatal Ao lugar De onde nunca Sais, Desde menina... UM DIA DISSE (Lembras-te?): “ - Esquece a infância, Pára e ouve O silêncio Que espreita Para te desvendar O mistério da Vida! Dir-te-á: Nunca regresses Ao sítio onde já Não estás.” MAS TU NUNCA PÁRAS, Na louca correria Para fora de ti (Os lugares do costume) Em busca do Esquecimento Reparador... E EU A OLHAR Para o tempo Quando o tempo Já é pouco E a saber que Te hei-de sempre Reinventar Com os fios Soltos Da memória... MAS O DIA Em que renovas O contrato Contigo mesma Representa (Acredita) Um recomeço Para o reencontro Com o silêncio... .................. E, uma vez mais, Ele acaba Esquecido Nos aplausos Vibrantes E calorosos Com que todos Te celebram... ............. Por fora! ACORDA, Meu amor, Porque o silêncio Quer falar-te De celebração Da alma, Da tua relação Íntima com o Mundo, Antes da queda Na rotina Dos enganos! DESPERTA, Que o passado Se escreve a partir Do futuro Que antecipas Cada ano Quando renasces A caminho da Última fronteira... PORQUE HÁ, SIM, Um derradeiro Espelho vital Onde revemos O passado Que construímos Sobre as ruínas Do presente... ............ Sabias? AH, SIM, Mesmo que não saibas, No dia da celebração O silêncio Espera-te sempre À esquina Das tuas ruínas Na mais profunda Solidão... NÃO DOBRES, Em fuga, Essa esquina. Escuta-o, nesse dia. Talvez seja A tua salvação...

Variações. Detalhe.
AS PALAVRAS SÃO OÁSIS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Oásis”. Original de minha autoria para este poema. Dezembro de 2019.

“Oásis”. Jas. 12-2019
POEMA – “AS PALAVRAS SÃO OÁSIS…”
PORQUE NÃO TE DÁS Um pouco, Meu amor? A minha Sede de ti É tão grande Como a dor Do dia Em que, no fim, Te perdi. PENSA NO DESERTO E no oásis Que o suspende De tão longo E árido ser O caminhar Sobre areia Escaldante Na procura Infindável De te alcançar Como amante... OS MEUS LÁBIOS, Áridos de ti, Não se saciam Com uma gota De água Ou com o aflorar Da seiva Exausta Do meu caule, Gasto de tanto Te esperar... ................. Mas quando falam (O pouco que te Falam) Humedecem, Porque as palavras Pousam neles, São oásis Verdejantes No imenso deserto De um amor Em longa Despedida... E QUANDO CHEGO Ao fim, À última estrofe Do teu poema, Já sei Que tenho de retomar O arenoso caminho Do canto Em solidão... OS OÁSIS São parte do deserto Que atravessamos Na nossa vida, São bátegas Que banham A alma ressequida De tanto Clamar por uma Saída Nesse mar de areia Em que o viver Se tornou. MAS TU Nem gotículas Me dás Quando clamo Por ti Na miragem Do deserto... O QUE TALVEZ Não Saibas (Ou sabes Em demasia?) É que a vida É mais Deserto do que Oásis, Mais areia do que Gotículas Que brilham Ao sol ardente... ................. E que os lagos E as fontes Onde refrescamos A alma São pura Alucinação Que nos deixa Mais entregues Ao silêncio... ................... E à fria solidão. AH, QUE FALTA SINTO Da tua fonte A jorrar Cores vivas Sobre mim, Das bebedeiras De palavras Sobre ti, Da densa neblina No deserto A coar o sol que Me bate no peito Onde mais te sinto. IMAGINO-TE, ENTÃO, Como meu oásis, Chuva no deserto Sobre esta minha pele Seca e encrespada... ..................... Mas bem sei Que não passa de Alucinação! PORQUE HÃO-DE SER ASSIM As nossas vidas, Sem gotículas Que banhem O nosso corpo Por falta de alma Que as acolha? O QUE ME SALVA, Meu amor, É este oásis Verdejante Que construí Como palco Para te cantar Ao entardecer Da nossa melancolia...

“Oásis”. Detalhe.
PAIXÃO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Cascata”. Original de minha autoria para este poema. Reproposição (com alterações) de um poema publicado há três anos, em resposta a um soneto de Ana de Sousa (09.2016). Novembro de 2019.

“Cascata”. Jas. 11-2019
MOTE – SONETO
“Vinde cá meu tão certo Secretário”, Confirmai meu gosto de espelhar À Musa que recusa Amor notório Gritando ao Mundo o que não quero calar! De rosas, de loureiro, de jasmim De astral, de amargor, de doce fel As bagas, a folhagem, no jardim Onde abelhas obreiras fazem mel! Dizei o que tanto quero ouvir Que o que pensais, não quero, não! Escrevei que meu engenho repetir Só quero na rima, mil dores de coração. Enlace, ponto final, sem remédio é ir Do próprio veneno provar... em edição.”
POEMA – “PAIXÃO”
ESPELHO MEU, Espelho meu, Vês dor mais forte Do que a minha? Não sabes que Sem palavras Nem tu me salvas, Rainha? PROVAR FEL Em edição? Tomei-o, Nestes meus dias. Castigo Por afeição, Derramado Em poesias, Palavras ditas Em vão, Estreitas sendas Vazias... INCAPAZ De as trilhar Fui procurar Novas vias, Mas gastas As encontrei, Incertas Em seu destino... .................... Senti-me um pouco Estranho E perdi-me Do caminho... DEPOIS VIERAM Flores... ................... Tantas vezes disse "Não!"... Sempre falhei Nos amores E, agora, esta Paixão! NEM SEI O QUE Aconteceu... Um enigma, Esse seu rosto! Vi nele o que Em mim faltava, Tropecei, Fiquei exposto, Como ferida Sempre aberta Ao rubro o seu Sangrar, Uma dor que Quando aperta Põe palavras A voar... PALAVRAS De vivas cores Mais fortes que Oração Fortalecem-me a alma Resisto mais À tensão... PROVAR FEL Em edição, Em poema Amargurado? Pois seja esse O destino E se foi o meu Pecado Será sempre Desatino Sofrer assim Este fado! TEM SABOR De um remédio? Talvez tenha, Não duvido, Só alivia, Não cura, É afecto proibido, Inclinação Da mais pura Em que me sinto Perdido... JÁ NÃO A VEJO Nem ouço, É luz que nasce De mim, Se passar Eu fujo dela, Procuro-a no meu Jardim Como arbusto florido Sempre ali À minha frente... ................ De ser planta Robusta Não tem defeitos De gente, É esguia, Não é gorda, Tem mil folhas De cetim, Espera-me sempre De pé Mesmo ao lado do Jasmim! É AMOR Em provação? Se tem de ser, Pois que seja, Lanço versos por Paixão Onde quer que Ela esteja, Sai de mim esta tensão Como em cântico D’igreja Ou incenso que respiro E quando m’inunda Por dentro É pro céu Que eu me viro. PROVAR FEL Em edição? É enlace Do mais puro, Resulta duma paixão, Intensa neste poema E bela como Canção, Mas abraço Sem futuro!

“Cascata”. Detalhe.
PARA LEONARD
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração, “Mil Beijos”. Original de minha autoria para este Poema, dedicado a Leonard Cohen (1934-2016). Novembro de 2019.

“Mil Beijos”. Jas. 11-2019
POEMA – “PARA LEONARD”
OUÇO-TE Como respiro Com a alma... E como a sinto! Vejo-a dançar Na tua voz rouca E grave E, então, aninho-me No regaço da tua Melodia A observar O seu silêncio... ................ Mas estremeço Como o rio quando Entra na foz, Mar adentro... É SUAVE O REENCONTRO Com ela, Em fluxo submerso, Como as dobras Das palavras Quando se ajeitam Nas estrofes Dos meus poemas Ou os sons Quentes Na tua melodia, Vindos lá do alto Como ecos Da montanha Sagrada. OUVIR-TE, ÀS VEZES, Arrepia-me Porque na tua voz Acolhedora Sinto-a Dentro de mim A segredar-me O seu impossível E sufocado Silêncio. E, ENTÃO, DANÇO, DANÇO Com a alma Até ao fim... ..................... Que nunca mais chega! E não paro até (Já exausto) Cair em mim... OS MIL BEIJOS Que não lhe dei São, na tua melodia, Mais profundos Que as profundezas Do mar, Mais intensos Que mil abraços À superfície Do seu corpo... E ATÉ OS TEUS SORRISOS Maliciosos E os gracejos Inocentes Me levam A inventar Palavras quentes Como balões coloridos Que lanço Ao vento Que sopra Na sua alma... NÃO SOU COMO TU, Leonard, Eu esboço sozinho Tristes canções Em surdina Até às lágrimas secas Que nunca enxugam Porque não tenho Voz que chegue Para a chamar Ao poema... ................... Nem ela me ensinou A cantar, Por falta de jeito E de tempo Para amar... MAS CANTAS TU Por mim e por ela E, então, ouço-te Extasiado Como se fosses Oráculo Onde o silêncio Partilhado Se disfarça De oração Nos teus sons E na tua voz Para me enternecer Até à emoção. NÃO ME DESPEÇO, De ti, Com um abraço, Leonard! Vou continuar A ouvir-te Enquanto o silêncio Me interpelar No oráculo Da tua melodia E por ela sofrer Dessa melancolia Que nunca nos abandona, Seja noite Ou seja dia...

“Mil Beijos”. Detalhe.
NÃO ME OUVES…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Voar”. Original de minha autoria para este poema. Novembro de 2019.

“Voar”. Jas. 11-2019
O POEMA – “NÃO ME OUVES…”
NÃO ME OUVES, Perdida Que andas Nas tuas rotinas, Na vertigem De cada teu Amanhecer Como se a arte Pudesse, assim, Acontecer... NÃO HÁ CRIAÇÃO SEM LIBERDADE, Aquela que Construímos Sobre as ruínas Do nosso próprio Viver... A PROCURA DE ETERNIDADE, A chegada à galeria Dos imortais Só acontece Quando das ruínas Se eleva Um silêncio Que te fala Em surdina... ............. E nada mais! MAS GOSTAS De te pôr Fora do mundo (Eu bem sei) Observá-lo, Tomá-lo Nas tuas mãos Como brinquedo Em construção, Estética virtuosa, Minúcia de De artesão... MAS É FRÁGIL A utopia, Que o mundo só Se deixa possuir Pela dor, Pela liberdade Em ferida aberta, Por intensa Melancolia Ou vida sofrida E incerta... CAIR NO MUNDO, Tropeçar nele, Molhar as asas Da alma, Caminhando Pelas ruas da Cidade Como silhueta Em dias de Densa Neblina ou De chuva Tropical, Sem saber Pra onde ir, Perdida Em intenso Vendaval... ............ Oh, então, Gela-te A alma E sentes-te Profundamente Mortal... INUNDA-TE De chuva Por dentro E elevar-te-ás, Um dia, Para além da tua Janela De persianas Coloridas, Possuirás o mundo Com essas mãos Que afagam As cores do Arco-íris No vale Em que habitas, Depois da tempestade... A ARTE É liberdade, É subir pelas Sete cores acima E voar Para a montanha À procura Do infinito Sideral, Do tempo À medida do Desejo... AH, COMO GOSTARIA De te emprestar As minhas asas Com cicatrizes Da vida Para voares Mais alto Que o azul Do céu Onde pudesses Levitar Sobre um poema Sem risco De te perderes... .................. Mas tu não me ouves, Meu amor!

“Voar”. Detalhe.
“SOU O QUE SOU”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Fantasia de Poeta”. Original de minha autoria para este poema. Novembro de 2019.

Fantasia de Poeta. Jas. 11-2019
O POEMA – “SOU O QUE SOU”
EU SOU O que sou, Poeta Pra te cantar Mesmo que tu Já não ouças O pranto da minha Voz De tantas vezes Chorar... EU SOU O que sou Porque tu és Em mim Sempre mais Do que pensas Poder ser, Uma deusa, Uma musa No jardim Que m’inspira Para de ti Renascer... BEM SEI Que hoje Me pintei De poeta Para duas vezes Te ver E duas Te encontrar Nos versos Que já clamam Por de novo Te cantar. SIM, TU ÉS Musa Dos versos Perdidos, Dos versos Cantados Neste deserto Interior Da eterna Despedida... NÃO IMPORTA O que pensem, Como te vejo Ou te canto Porque serei Sempre movido Pela força Do encanto. ENCONTREI-TE Sem procurar O destino Que te trouxe, O mesmo Que te levou... ................. Cruzámo-nos Nesse caminho E, agora, É por ele Que sempre vou. O VENTO SOPROU Forte Em nós E voámos, Voámos No céu azul Com as asas Do desejo Até cairmos Do céu Quando veio A tempestade E o vento Nos deixou... ACORDEI Numa árvore Frondosa, Olhei em redor... ...Não te vi! DESDE ENTÃO SOU O que sou, Aquele que caiu das nuvens E, sozinho, Acordou Na copa De uma árvore Onde pra sempre Ficou. POR LÁ FIQUEI, Sim, A olhar o azul Do céu Perscrutando O horizonte Para ver Se lá te via, Fosse tarde, Fosse manhã, Fosse noite Ou fosse dia. É A ÁRVORE Onde vivo, A minha casa Discreta De onde Só te vislumbro Como simples Silhueta... TORNOU-SE Meu cativeiro, Onde vivo E te procuro (Fantasia De poeta) Lá no fundo Da memória Pra me tornar Teu profeta.... CERTOS DIAS, Na memória Ganho asas E logo voo pra ti Sem sair De onde estou... ................ Perdi-te, Já não te alcanço, Já nem sei Por onde vou... TRAÇA-ME TU O caminho, Pra chegar Ao pé de ti, Tenho palavras Que cheguem, Foi com elas Que cresci E com elas Eu voei Na linha do Horizonte Quando um dia Te encontrei No sagrado Do meu Monte.

Fantasia de Poeta. Detalhe.
O TEU CORPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração - “S/Título”- de minha autoria sobre quadro anónimo (fotografia de mulher em contraluz) da minha colecção privada. Outubro de 2019

S/Título. Jas. 10-2019
POEMA – “O TEU CORPO”
HÁ POESIA No teu corpo, Geometria Sensual Que te desenha No espaço, Como te contas Sem palavras, Contraponto Luminoso Da minha melodia... HÁ MÚSICA Em ti, Pauta De beleza Que ondula, Instável, Entre riscos E cores, Desenhando Enigmas Que só o poema Pode decifrar... TENS A ALMA Inscrita Nas formas Do teu corpo, Como eu a tenho Nas palavras Que lanço Ao vento À procura Da tua utopia... E VEJO-TE Como letra Da canção Que vou cantando Na minha subida Ao monte, Quando o vale Já não me chega E nem tu chegas, Afinal, Pois partiste Em busca Dos palcos Da tua vida... MAS EU RESPIRO-TE Ao ritmo De uma dança Com o poema Que canto, Palco de beleza Onde te enredo A alma Em teia Que prende E te liberta... PROCURO-TE Na pintura, Fixo-te Para te cantar Quando a noite Cai sobre mim E mergulho Na solidão Do silêncio Com que, De longe, Me falas. E SONHO-TE Num bailado A solo, Dançando, Dançando, Ao luar, Na praia Da meia-lua Para que eu Te volte a cantar Em poemas Ao ritmo Com que te Vais desenhando Nas telas Coloridas Do teu acontecer. E, NO FIM, ROGO-TE Que não pares O teu silencioso E longínquo Bailado Solitário Até que eu te Desenhe Em palavras Luminosas Para que nelas Te revejas Como se fossem O espelho Encantado Da tua alma... QUE FAZES Da tua vida, Meu amor?

S/Título. Detalhe.
COMO TE QUERO...
POEMA de João de Almeida Santos.
Ilustração: “SEDUÇÃO”.
Composição de minha autoria a partir
de um estudo de Gustav Klimt.
- "Dois estudos de uma jovem mulher", 1885.

“Sedução”. Jas. 10-2019
POEMA – “COMO TE QUERO…”
PEDI EMPRESTADO Ao pintor Este rosto De onde vejo A cor Velada Da tua alma... ENIGMÁTICO OLHAR Que me perscruta E fascina, Beleza etérea, Divina! OS TRAÇOS DELICADOS Que o desenham E a leveza Das vestes Que velam E desvelam O corpo De pele macia Que me cativa O desejo... .............. Seduzem-me! E FICA-ME ESTE ROSTO Solitário Na galeria poética Onde te versejo Mil vezes À procura De um amanhecer Que nunca chega... PARA TI DIRIGI O meu olhar Através de um espelho, A obra de arte, Vi leveza, Beleza intangível E ouvi silêncio Profundo Envolto Por uma densa Neblina Que nunca se dissipa! E ENTÃO RECRIEI-TE, Com a ajuda Do pintor, Tal como Te desejo, Na fronteira, Sempre no limiar Do impossível, Na distância Que o destino Nos traçou E nos compassos Do silêncio A que a deusa Nos votou. SE TE ENCONTRAR De novo Só saberei ver-te A partir Deste fino rosto, Memória de ti, Numa tela Cantada por mim. E ENTÃO REGRESSO Às tuas cores Para com elas Te desenhar De novo Com o pincel mágico Do pintor Que eu amo Em ti.

“Sedução”. Detalhe.
JASMIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Rapsódia”. Original de minha autoria. Outubro de 2019.

“Rapsódia”. Jas. 06-2018
POEMA – “JASMIM”
FLORESCEU O JASMIM, Dele jorra Poesia, Embriaga, O aroma, Liberta-se A fantasia! DOU ÀS PALAVRAS A COR, O seu perfume Ilumina, Bate o sol Nas suas pétalas, É luz intensa Que brilha No poema que Germina... JÁ NÃO É SÓ O LOUREIRO, Agora canto O jasmim, É tão vivo O seu perfume Que se renova Em mim. INUNDO-ME DE PALAVRAS, Canto Este mundo Da cor, Subo ao céu E penso em ti, Levo comigo Essa dor... SOU ÍCARO Lá no alto E quando o sol Me bate forte Caio em mim Do meu poema E no chão Fico sem norte... PEÇO AJUDA À MONTANHA, Volto a subir Com alegria, Lá no alto Vou renascer, Regressar à À poesia... E ENCONTRO O MEU JASMIM Mesmo ao lado do Loureiro, Respiro fundo O aroma E torno-me Jardineiro! E ASSIM EU VOU VIVENDO No jardim da Minha vida Em poemas E pintura... ............. E se a dor Não tem remédio Que seja esta A cura!

“Rapsódia”. Detalhe.
ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Silhueta”. Original de minha autoria para este poema. Outubro, 2019.

“Silhueta”. Jas. 10-2019
POEMA – “ENCONTRO”
OS ASTROS ALINHARAM-SE Uma só vez, Passados anos De aridez Que roubou Tempo De fantasia, Luz À vida, Lentamente, Cada dia... ENCONTREI-TE Sem querer... .................. Astros ou destino, Quero lá saber... Que bela Esta forma Tão singela De te ver! ABANDONEI-ME Ao destino, Chegou o acaso, Vi-te estranha Ao olhar De tão tardio Encontro Com a fita Da memória A rolar Em moviola. ERA INCERTA A TUA IMAGEM, O olhar Embaciado, Um arco-íris Descera Com o sol Dessa manhã, Gotículas Brilhantes Como lágrimas De alegria... FICOU-ME A alma cheia, A transbordar (Ficou), Mas o vazio Também logo Regressou. Mais do mesmo, Como antes, Um desencontro Sem fim... ............... E o ânimo Quebrou. VISLUMBREI-TE Perto do meu Destino, Raptou-me O acaso A incerta silhueta Que não pude Desenhar No meu campo De visão Como se fosse Castigo Por insólita Paixão. AQUI ESTOU EU Devolvido À solidão, Novas saudades De ti, Um poema Em gestação... SÓ ASSIM EU SEI Falar, Fico incerto Se te vejo, Troco o passo A cada instante, Hesito nesse Momento, Finjo aquilo Que não sinto E, por fim, Fico tão-só Amante da poesia Que me dá o que Não tenho... ............... Uma réstia De alegria. OS ASTROS ALINHARAM-SE Pra te voltar A perder, Dois minutos, Um sorriso... ................ Chegou cedo Este novo Entardecer!

“Silhueta”. Detalhe.
ESSES OLHOS NEGROS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Olhar”. Original de minha autoria para este poema. Setembro 2019.

“Olhar”. Jas. 09-2019
POEMA – “ESSES OLHOS NEGROS…”
DESSES OLHOS NEGROS Eu tenho Saudades, Viajo com eles Na minha memória Pra te alcançar Neste oceano Onde eu navego Entre altas vagas Sem nunca parar... E TENHO SAUDADES Por nunca te ver... .......... Quiseste Partir E logo negar O tempo exacto Para te sorrir. EU TENHO SAUDADES Saudades de ti, Quando te invoco Com estas palavras, Te digo O que sinto... .................. Que esta saudade Já não vai parar Mesmo se minto E digo em arte Que te vou Inventar. EU TENHO SAUDADES De te encontrar Naquele jardim Onde o desencontro De ser tão intenso Até parecia Nunca ter um fim... E TENHO SAUDADES Quando te escrevo Estes meus poemas Sabendo por certo Que não terá eco O que neles te digo E sempre senti. . EU TENHO SAUDADES Mas já nem eu sei Porque é que vivo Tão perto de ti E quase te sinto Quando tu respiras O ar que te sopra Como densa bruma Nesse teu jardim. EU TENHO SAUDADES, Saudades de ti, E até sei porquê Este meu sufoco... ................ Talvez porque Foges, Nem sequer nomeias O que te ressoa Se o canto Te chega E sobre ti ecoa. SEI BEM A RAZÃO Porque não te encontro Nem te dou a mão Pra que não me fujas ... ........................ Porque é em vão! COM TANTA SAUDADE Até sou feliz Em certos momentos, Tão longe de ti, Com alma Em tormento, Porque eu te amo Ao sabor do vento E da poesia Que sopram Intensos Lá do teu jardim, Mas tenho saudades Desses teus olhos Que vejo daqui Porque eles me dizem Que longe que estejas Estás perto de mim.

“Mulher com Véu”. Detalhe.
PINTEI-TE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Mulher”. Original de minha autoria para este poema. Setembro de 2019.

“Mulher”. Mas. 09-2019
POEMA – “PINTEI-TE”
PINTEI-TE
Como te vejo
Por dentro.
Gosto do Modigliani
E gosto de ti,
Dei-te este rosto
Que por dentro
Me sorri.
PINTEI-TE
Única e
Deusa,
Meu encanto,
Aura e halo,
Entre a vida
E o meu canto
Infinito
Intervalo.
PINTEI, SIM,
Para te dar
A cor
Que não queres.
É como dar-te
A vida que
Não tens
Fora de mim.
E SABES?
Gosto de ti
Assim,
Com estas cores,
Geometria
Que desliza
Para uma aguarela,
Como água
Cristalina
A brotar
Desse teu rosto...
AGORA EXPONHO-TE,
És espelho
Do poema,
Cores quentes
A ferver
Como eu
Que t’escrevo
Cartas de amor
Disfarçado
De poeta
Neste meu
Entardecer,
Quando o azul
Se faz breu.
AH, SIM,
Metade sou eu,
Metade é o poeta
Que desenha
Com palavras
E te celebra
Com as cores
De que te veste
No tempo
Da fantasia.
PINTEI-TE
E eu não queria...
...............
Mas o desejo
De te ter
À minha frente
Foi mais forte
Do que eu,
Pulsão quente,
Desejo ardente,
Olhar de frente
O teu céu.
OH, AFINAL,
Pinto-te sempre
Na tela
Da minha alma
Com palavras
Que o vento
Leva
E cores
Que se dissolvem
Neste triste
Entardecer.
E PARA QUÊ?
Para nada?
Dizes:
“- Eu quero lá
Saber!
Pinta praí
Como danado
Até que a cor
Te doa
Do teu pecado,
Escreve
E canta
Até que as mãos
Afaguem
Essa garganta
Dorida,
Olha-me
Até que a vista
se canse
De nunca me
Alcançar
Por ser visão
Proibida”.
OH, PENSANDO
Melhor
(Finalmente,
Tu dirás),
“- Pinta, canta
E olha
Porque, afinal,
Até gosto
Do que o teu
Canto me traz.
SEM TE LER
Nem te ouvir
Ou ver-te
Com memória
Atormentada
Do que nunca
Aconteceu...
...........
Eu bem sei
Como a ausência
Te doeu!”
“ - MAS PINTA,
Meu amor, pinta,
Quem to pede
Não te quer,
Mas sabe
Quanto a cor
Adoça a vida
Se perdeste
Uma mulher.”

“Mulher”. Detalhe.
COLISÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Meteorito”.
Original de minha autoria
para este poema. Setembro de 2019.

Meteorito. Jas. 09-2019.
“Dentro de los meteoritos y sus metales
extraños se leen
las historias de otros mundos”
(El País, 07.09.19)
POEMA – “COLISÃO”
CAÍSTE EM MIM Como meteorito, Embate espectral No meu chão, Abriste Sulco profundo No meu corpo, Mas não doeu Essa abrupta Aparição... A VELOCIDADE Cegou-me (É sempre assim), Clarão, Ondas, Vibrações Abanaram-me A alma, Raízes Estremeceram Lá mais no fundo De mim. PROCUREI-TE Nessa cratera Cavada na minha Alma E passada A tempestade Vi fragmentos De ti, Minerais Pra lapidar Como dunas Desenhadas Pelo vento Aqui bem perto Do mar. NESSA FENDA Tão profunda Encontrei Um brilho Estranho Que me pôs A levitar, Sol frio Como metal, Gelo cortante A cair Na linha Do meu olhar... NUNCA MAIS DE LÁ SAÍ... ............ E com mãos De alma pura Peguei Subitamente Em ti... .......... Escaldavas De tanto brilho Exalar E caíste-me No chão, Trémulo De tão inquieta Incerteza, Calor Fervente No peito, Mistério De uma estranha Beleza Que renasce Na cratera De um vulcão... FIZ DE TI Minha bola De cristal, Li nela A história de um Encanto Que trespassou Como raio Uma fronteira Vital. E AQUI ESTÁS Em tão sofrida Distância, Estranhos Perante nós Como quis o Meu destino E os astros Do teu chão Na fronteira Do divino. MAS NÃO PERDESTE Magia, Meteorito Em quietude, Íman Silencioso Que me atrai Suavemente Como oráculo De um destino Sempre em lenta Gestação. LEIO-ME A ALMA Na superfície Dourada De teu corpo Incandescente Qu'ilumina A emoção, Me consome E me domina Nesta tensa Relação. ÉS RASTO CÓSMICO, Atracção fatal Que me suspende A vida Pra me fazer Levitar, Tornando Meus tristes Dias Uma paisagem Lunar. AH, SIM, Mas és razão De arte Nesta vida Que inventei, Encantamento, Fonte seminal Onde bebo E me embriago D'emoção Até te ter Um momento Nas palavras De um poema De quimérica Paixão.

Meteorito. Detalhe.
“COR, MAIS COR…”
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Caminhos”. Original de minha autoria para este poema. Setembro de 2019.

Caminhos. Jas. 09-2019
POEMA – “COR, MAIS COR…”
COR, DÁ-ME COR
Fico mais perto
De ti
Se vieres
Com o vento...
..............
Cor, mais cor,
Que as palavras
Coloridas
Já me sabem
A cinzento...
OU TALVEZ NÃO.
Palavras
Já não me faltam,
Não sinto
Escuridão,
Ainda consigo
Dizer-te
Em mil palavras
Pintadas,
Entregar-te
A minha alma
Na palma
Da tua mão.
TENHO-AS
Que me cheguem
Para gritar
A vermelho
O concreto
Do teu nome,
Ver, assim,
Esse teu rosto
No eco
Da minha voz
Sem que a tristeza
Assome.
AH, E A COR
Se for intensa
E crescer
Em explosão,
Se tiver
Em contraponto
Palavras
De liberdade
Soletradas
Em azul
Dos teus sonhos
De papel...
............
É tudo
O que eu desejo
Pra t’esculpir
A cinzel.
DÁ-ME COR,
Que eu sou
Sensível
Ao brilho
Do teu olhar,
Vibro na luz
Qu’irradia
Quando vestes
O vermelho
Ou te cobres
Com as cores
Do arco-íris
Que és.
VÊS COMO TE
Conheço?
Tu és cor,
Gota d’água
Suspensa
No fio
Do horizonte
Banhada por
Raios de sol
Que despontam
Lá no monte.
DANÇAS COM ELA,
A cor,
E com ela
Adormeces.
É sopro doce
Do peito,
Da vida
Exaltação,
Com luz
Coada por ti
Para um sonho
Perfeito
No reino da
Evasão.
EU GOSTO MUITO
De cor,
Confundir-me
Todo
Com ela,
Dançá-la
Como vida
Em eclosão,
Girândola
Que embriaga
Os sentidos
Como se fosse
Vulcão...
LEMBRO-ME
Bem do poeta
Que pedia
“Mais luz!”
Já em seu leito
Fatal.
Tinha luz
Dentro de si
Mas a cor
Já não entrava
Pelas frestas
Do portal.
ERA CINZENTA
A cor que lhe
Restava
Até escurecer
Quando a janela
Lentamente
Se fechava
No sol-posto
Desse seu
Entardecer.
MAS A PALAVRA
Fascina-me.
É com ela
Que te canto,
Com a cor
Danço e voo,
Na palavra
Calo
Os sentidos
Para melhor
Te sonhar
Dos dias
Em vão perdidos
Na deriva
Do teu mar!
AH, SIM,
Eu gosto
É de palavras
Porque cabes
Em quatro letras
Aninhadas
No teu nome
Que me sabe
A verde
Eterno
Nas tardes de
Primavera.

Caminhos. Detalhe.
PALAVRAS
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Geometria de um Poema”.
Original de minha autoria.
Setembro de 2019.

“Geometria de um Poema”. Jas. 09-2019
POEMA – “PALAVRAS”
PRA QUE SERVE
Este poema,
Meu amor?
“- Para nada!”,
Dizes tu,
“- São palavras
Que usas
Pra te sentires
Menos nu”.
PALAVRAS
São como vento,
Vão,
Voltam
E mudam
D’intensidade,
Sopram forte
Ou de mansinho,
São volúveis,
Ilusão,
Vão pra sul
Ou vão pra norte
Mas cruzam
O teu destino
Mesmo que digas
Que não.
SÃO INTANGÍVEIS,
São sinais,
Podem ferir
Como espada,
Às vezes
Como silêncio,
Outras,
Pior,
Como nada...
DIZEM SEMPRE
O que sinto,
Parecendo
Não o dizer,
Às vezes
É proibido
E outras
É por não
Querer.
E se escrevo
E te minto
É por ser forte
O desejo
De um dia
Eu te ter.
ESTE POEMA
Que te envio
Escrevi-o
Com o vento,
Mas nele
Eu também minto...
..............
E o vermelho
É cinzento!
MAS É CONFISSÃO
Inocente
Que chega
Ao seu destino
Como o Sol
Vai a poente
Num poema
Cristalino.
SÃO PALAVRAS,
Meu amor,
Murmúrios
De quem te quer,
São o sonho
Do poeta
Quando a vida
Adormece
No rosto
De uma mulher.

“Geometria de um Poema”. Detalhe.
CATEDRAL
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Tempo”. Original de minha autoria sobre foto de Giovanna Bellelli, em Roma. Poema inspirado no Romance “Via dei Portoghesi” (Parsifal, 2019). Agosto de 2019.

“Tempo” – Jas. 08-2019.
POEMA – “CATEDRAL”
VIAJÁMOS NO TEMPO Até à cidade. Encontrei-te Por ali. Nada mudara. Rosto sereno, Inocente, Como quem Sempre sorri. FOMOS AO TEMPLO Da rua Da minha vida, À cúpula Da catedral. Não te abracei Nessa noite, Era sagrado O lugar, Seria abraço Fatal. MAS FICOU-ME O prazer De te ter Ali ao lado, A sonhar Nesse meu leito O beijo Que não trocámos Numa noite De luar, Quando o amor É mais quente E o corpo Desnudado Por tanto a alma Brilhar. FOMOS À PRAÇA NAVONA, Escutámos As águas da fonte E os traços Do Bernini, Da beleza Horizonte, Íntimos, Em sintonia, Antevendo um futuro Que nunca mais Chegaria... ATÉ QUE ME PROCURASTE Nessa fita Da memória, A noite Perdida de afectos Na cúpula da catedral, Corpos tensos Sem palavras Na fronteira Do amor. TORNOU-SE MAIS VIVO O que não aconteceu Como se fosse Futuro Que afinal No teu passado Ainda não se Perdeu. E CÁ ESTAMOS DE NOVO À procura Dessa noite, Do beijo Que não te dei, Passado virou Futuro E do tempo Dessa Igreja Já nem sei O que farei. TALVEZ FAÇA UM POEMA Para te reencontrar, Cantar esse Sorriso De que sempre Eu gostei, Voar no tempo Em espaço sideral E em noite de luar Pousar de novo Contigo Na cúpula Da catedral....

“Tempo” – Detalhe.
“LUA”
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Ballerina”
Original de minha autoria
para este poema. Agosto de 2018

Ballerina. Jas. 08.2019
POEMA – “LUA”
DESCI À PRAIA
Da meia-lua
A ver se nela
Te via.
Era brilhante
O anoitecer,
Cheio de luz
E perfume a maresia.
ERA DA LUA-CHEIA
A luz branca
Que do céu caía,
Gente que dançava
Em dia de festa,
De som e de cor...
....................
E se divertia!
NO CLARO DE LUA
Vi um rosto
De mulher
Que não era
Estranho,
Um perfil qualquer...
ERAM NEGROS
Os seus olhos,
Boca
Rúbida e quente,
Pele macia
Em corpo ardente,
Cabelos ao vento...
VI QUE ERA ELA
A deusa do baile,
Luz branca da lua,
Espelho de mar...
....................
Logo o meu olhar
Procurou o seu
Nesse cintilante
Brilho do luar...
COM ELA DANCEI,
Saltei e cantei
Em alegria,
Vibrou o meu corpo
Com essa melodia
Que me inspirava
Numa bela praia
Em forma de lua
E me seduzia.
VI O SEU SORRISO
Em perfil na lua
Que eu desenhei,
Uma luz intensa
Me iluminou
Quando eu dançava
Essa melodia
Que pra mim soou.
CORPO DE MULHER...
.................
Eu já nem sabia
Se era ela
Ou outra qualquer
Com quem eu podia
Erguer-me à lua
Com alma despida
Neste frágil corpo
Pouco mais que nu...
E TAMBÉM A ALMA
À sua procura
Era de nudez
Um pouco ousada,
Mas, sim, era pura
Por ser nesta lua
Que adivinhava
A minha ventura...
.....................
Pouco mais que nada!
ONDE ESTÁ A LUA?
Nessa bela praia
Ou noutro lugar
Onde a possa ver
Espreitar a rua
Pra me enfeitiçar?
ESTÁ EM TODO O LADO
Onde o meu poema
For entardecer
Para desenhar
Com suas palavras
Um suave rosto
Que é mais de deusa
Do que de mulher...

Ballerina. Detalhe.
“AGUARELA”
Poema de João de Almeida Santos, inspirado no poema de Manuel Bandeira “Tema e Variações”. Ilustração: “O Retrato”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2019.

“O Retrato”. Jas. 08-2019
POEMA – “AGUARELA”
SONHASTE, MANEL, Que havias sonhado Estar à janela Sonhando, a cores, Qu’estavas com ela. TAMBÉM EU SONHEI Que tinha sonhado E que no sonho A tinha encontrado, Passando por ela, Ali, lado a lado, Mas quando acordei Do primeiro sonho, Sonhando eu vi O seu rosto belo Numa aguarela Pintada a cores Que tinha guardado Para uma tela... SONHEI, OUTRA VEZ, No segundo sonho, Que era pintor Mas que pintava Sempre o seu rosto A uma só cor. DIZIA, SONHANDO, Que não podia ser. Seu rosto expressivo Era arco-íris Ao amanhecer E era sorriso Para o mundo ver! MAS EU SÓ O VIA Com a minha cor, Esse rosto belo De seda tecido Que me seduzia No sonho sonhado Onde sempre a via Ali, a meu lado. NÃO QUERIA ACORDAR Do sonho feliz E nele fiquei De olhos fechados. JÁ NÃO ACORDEI Do sonho sonhado Porque nessa cor Fiquei encerrado Com todo o meu ser... .................. Talvez por amor. NO SONHO OLHEI Para o meu espelho E logo eu vi Que essa minha cor Era o vermelho. E QUANDO ACORDEI Do primeiro sonho Voltei a sonhar Que desvanecia Nesse rosto amado E logo lhe disse, No segundo sonho, Que a tinha sonhado. DISSE-ME QUE NÃO Que nunca me vira Sequer acordado E logo acordei Desse pesadelo. FOI ASSIM QUE VI Que tinha sonhado E que ela Já lá não estava Ali, a meu lado. QUIS ADORMECER Para a encontrar Mas não consegui Sonhar que a via, Pôr os olhos nela, Chorar d’alegria Porque descobri Na minha parede Aquela aguarela Que do sonho Passado Eu já conhecia... ..................... Era o rosto dela!

“O Retrato”. Detalhe
ELAS FOGEM, AS PALAVRAS…
Poema, em dois andamentos, de João de Almeida Santos. Ilustração: “Letras”. Original de minha autoria para este poema. Agosto de 2019.

“Letras”. Jas. 08-2019
POEMA – “ELAS FOGEM, AS PALAVRAS…”
I. QUERIA FAZER-TE UM POEMA, Sentir-te nele À vontade E as palavras Endoidaram Quando, Feliz, Lhes falei Da minha Quente Saudade. FUGIRAM Numa revolta Sentida Sem conhecer A verdade Deixando-me Só, Sem palavras, À deriva, Sem dó Nem piedade... EU ESTAVA A MENTIR Sem pensar Na crueldade De as usar Como queria Só porque Tinha saudade... ESGUEIRARAM RUA FORA, Cada uma Por seu lado, Em fugas No horizonte Deste poema Tentado... SÓ JÁ AS VIA AO LONGE, Ao fundo Da tua rua, Num ponto Do infinito Desta minha Alma nua. UMAS ESVOAÇAVAM No fio Do horizonte, Outras Aninhadas No passeio... ................... E eu a tentar O versejo Capturado No enleio Desta prisão Do desejo! PALAVRAS EM CORRERIA, Letras Perdendo forma Como fios De novelo Já desfeito De sentido Como a água Do gelo... SÂO FIOS EMARANHADOS, Letras Que se deslaçam E procuram Outras formas Para lá da minha Rima, São riscos Na tua tela A subir Por ela acima... II. QUERO FAZER-TE UM POEMA Com palavras Desenhadas, Mas elas fogem Pra longe, Correm, correm, Assustadas, Não vá mesmo Ser verdade Que as quero Alinhadas Neste recanto Feliz Onde resisto À saudade. ELAS GOSTAM DE CANTAR Esta minha Triste dor E gostam De me dizer Em intensa Emoção, Mas se me vêem Feliz Fogem de mim, Dizem “não!” O POEMA PASSARINHO Procura-te Para cantar Mas se já Não sentes nada É ele que foge A voar... E HOJE É mesmo assim Fogem todas As palavras Sem procurar Um destino, Já não consigo Agarrá-las Num poema Genuíno... NÃO SABEM Da minha dor E por isso Vão embora Estou sem palavras, Amor, Estou muito triste, Agora!

“Letras”. Detalhe.
NEBLINA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “S/Título”. Original de minha autoria para este poema. Julho de 2019.

“S/Título”. Jas. 07-2019
POEMA – “NEBLINA”
OUÇO O SILÊNCIO
Que me cerca
O corpo
E a alma...
ADENTRO-ME
Na multidão
Rumorosa
E ele cresce
Sobre mim,
Ensurdece-me
Por dentro!
MAS É DEMAIS,
Caustica-me
A pele
Macia das
Recordações,
Faz-me
Zumbidos
Na alma,
Assobia
Como silvo
Do vento
Nas janelas
Da emoção,
Escuro
Em dias
De tempestade.
OUÇO
A palavra
Silêncio
Tonitruante
Dentro de mim...
HÁ TROVÕES
Silenciosos
Que me assaltam
E fujo
Para o ermo,
Lá em cima,
Solidão de
Eremita
Procurando
O silêncio
Que cobre
O nome
(Tão simples)
Que nunca
Ousaste
Pronunciar...
E O SILÊNCIO
Torna-se
Melodia,
Ouço uma harpa
Dedilhada
Por ti,
Notas musicais
Esvoaçando
No teu azul
De catedral.
VEJO-TE SAIR
Da densa neblina
Que te veste
E cubro-me de
Palavras
À procura
De autor
Que as componha
Num poema
Que te cante
E que te conte...
NOMEIO-TE
Em silêncio
E sussurro
Uma pequena
Palavra
Que nunca ousei
Dizer-te
Mas que ouviste
Ressoar-te
Na alma
Mil vezes!
O SILÊNCIO
Tomou conta de nós
E eu não sairei
Deste poema
Até que me ouças
E soletres
Finalmente
O meu nome
Com as cores
Da tua fantasia.

“Sem/Título”. Detalhe.
CANTA, POETA, CANTA!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Auto-Retrato de um Poeta". Original de minha autoria. Julho de 2019.

“Auto-Retrato de um Poeta”. Jas. 07-2019
“Ora al nuovo sole si affidano i nuovi germogli” Virgílio
POEMA – “CANTA, POETA, CANTA!”
CANTA, POETA, CANTA Até que ela Te ouça, Nem que a palavra Te doa E a alma Estremeça. CANTA, POETA, CANTA Que o teu poema Tem dor Que te baste No amor E tem cor Que alumia E tem sabor A cerejas Que as dá A Primavera. SE NO CANTAR Tu quiseres Atingir o infinito Salta pra cima Dum risco, Agarra asas De azul E voa Nesse teu céu Até que ela Te veja, Te pinte Numa cereja E murmure Este teu nome Em silêncio De igreja... CANTA, POETA, CANTA Que o teu cantar É meu choro E é água Cristalina Que corre Lesta Em seu rio À procura de beleza Num infinito Adeus Beijado Pela tristeza. CANTA, POETA, CANTA Que contigo Cantarei A alvorada do dia, Chora, que eu Chorarei Se não houver Alegria, Ri, que Eu sorrirei Animado por teu Riso E para ti Dançarei Uma valsa De Strauss Às portas Do Paraíso. CANTA, POETA, CANTA Até que ela Te ouça, Não pares De chorar alto, Na montanha, No planalto, Num poema Ou num desenho, Numa cor Em aguarela, Afagado Pela dor De não a veres À janela. CANTA, POETA, CANTA, Para ti E para o mundo Que o teu cantar Enobrece Quem ouvir A tua prece, Quem sentir O teu lamento, Que de ser Já tão profundo Não o leva Nem o vento Pois em ti Ele entardece. E SE O VENTO O levar Vai procurá-la A ela, Dobra lento A esquina Pra que a vejas À janela Num dia que É de festa Sem cortinas No poema... MAS SE O VENTO Não soprar, O lamento Lá regressa Ao poeta Que o cantou Pois não era Dele o dia Mas de quem O castigou... CANTA, POETA, Canta Que um dia há-de Ouvir... ................... Deixa, pois, que o Tempo passe, Que a razão Se esclareça E confia no porvir... CHORA, POETA, Chora, Neste teu Entardecer Aqui tão perto Da arte E saudades De morrer... CHORA, POETA, Chora, Até que rompa A aurora Deste longo Anoitecer...

“Auto-Retrato de um Poeta”. Detalhe.
O BRINCO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Brinco de pérolas e cristais”.
Original de minha autoria para este poema.
Julho de 2019.

“Brinco de pérolas e cristais”. Jas. 07-2019
POEMA – “O BRINCO”
VI-TE TRISTE
Naquele dia,
Rosto quieto,
Melancolia,
Olhar
Perdido,
Levemente
Embaciado...
NÃO SEI...
Era versátil
O teu rosto,
Bebia cores
Que se aninhavam
Na pele macia
Que a luz
Interpelava
(Cada dia)
Como pincel
Sobre tela
De veludo
(E bem se via).
TEUS OLHOS
TRISTES
Respondiam
Em metamorfoses
De brilho,
Ecos
Da natureza,
Raios de luz...
E MEUS OLHOS,
Seu espelho,
Devolviam-lhes
Cor incerta,
Reflexo
De alma
A vaguear
Pelas mil
Dobras
Da vida,
À procura
De destinos
Em gestação...
..............
Aconchego
De alma
Itinerante!
GANHARA VIDA
Esse brinco!
Desprendera-se
De um rosto
Que o pintor
Esculpira
Com as cores
Do desejo
Cristalizado
Pelo silêncio
Frio
Da tela.
ESTAVAS TRISTE
Nesse dia,
Sulcos marcados,
Peso na alma,
Sinais selados…
POUSARA EM TI
Esse brinco
Como sinal
Cravejado
De cristais,
Vindo de um longo
Silêncio,
Quase Irreal,
Agora resgatado
Com diamantes
Em mulher
Madura,
Olhar fatal...
CRISTAIS
Sobre mim...
...............
Código exposto,
Encontro
Casual,
Silêncio
Resgatado
Com brinco
Sensual
Em rosto
Pela tristeza
Toldado...
ÉRAMOS DOIS
E o brinco
De cristais
Que em ti
Renasciam
Como sinais...
QUIS DESENHAR-TE
Num poema...
........
Olhei,
Marquei,
Tracei,
Era pintor
De metáforas
Com palavras
Roubadas
Ao silêncio...
ERA OUSADA,
Bem sei,
A poética
Que te compunha
Como breve,
Mas intensa
Sinfonia...
AH, MULHER,
Como te sonhei
Nesse dia!
UM
Dois,
Três,
Regressei
De vez
À rapariga
Do brinco
Original
Em mulher
Madura
E essas pérolas
Irreais
Eram pêndulo
Do tempo
Resgatado...
............
Tic, tac,
Tic, tac,
.............
A marcar
O ritmo
De uma valsa
Lenta
Para dentro
De ti,
Um sonho
Escrito
Com as palavras
Do desejo...
A CADA COMPASSO
Era mais belo
Esse brinco,
Brilhava
Como pérola
Em coral
De águas
Profundas,
Alegoria
Seminal
Que iluminava
Tua alma triste
E o perfil
De teu corpo
Humedecido e
Abandonado
Às mãos
Livres
Do poeta...
HAVIA PÉROLAS...
.................
E acariciavam,
Ondulantes,
A sensualidade
Aveludada
De teu rosto
Sobre mim...
PENDULAR,
Esse brinco
Ecoava
No tempo
E renascia
Em ti...
...........
Tic, tac,
Tic, tac,
............
Em ritmo
Vital
E ofegante
Como se fosse
Estrofe
Oscilante
(Tic, tac)
Do breve
Poema
De tua vida!

“Brinco de pérolas e cristais”. Detalhe.
O BEIJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração original do autor – “O BEIJO”. Dia Internacional do Beijo: 6 de Julho, o dia que celebro, com um poema, cada ano. Inspirado no Thomas Mann de “Lotte em Weimar” (1939), a obra que continuou "Werther” (1774), de Goethe (1749-1832), e no romance “Via dei Portoghesi”.

“O Beijo”. Jas. 06-07-2019
Thomas Mann: “O amor é o melhor na vida, assim, no amor, o melhor é o beijo – Poesia do amor...”. “Beijo é alegria, procriação é luxúria.” Inspirado também em: Kafka: “Os beijos escritos não chegam ao destino, mas são bebidos pelos fantasmas ao longo do trajecto.” Shakespeare: “Se para te beijar devesse, depois, ir para o inferno, fá-lo-ia. Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos, de ter visto o paraíso sem nunca lá ter entrado.” Bernhardt: “O primeiro beijo não é dado com a boca, mas com os olhos.”
POEMA – “O BEIJO”
FOI O QUE NUNCA TE DEI A não ser com o olhar! O primeiro, esse beijo, Dei-to, pois, sem te tocar! E DEI-TE MAIS, COM PALAVRAS, Quando olhar já não podia, Foste embora, não estavas E eu, triste, não te via! FORAM BEIJOS QUE SONHEI Na rotina dos meus dias E desejos que enfrentei Quando tu mais me fugias, Mas dou-te beijos escritos Que se perdem no caminho E se me falta o poema Fico ainda mais sozinho! O BEIJO É EMOÇÃO, É razão descontrolada, Se não for dado a tempo Pouco mais será que nada! SEM BEIJO NÃO HÁ AMOR, Sem amor perde-se o beijo, A vida perde sentido Se me faltar o desejo Por te ter, assim, perdido! AQUI O LANÇO AO VENTO Pra que atinja como brisa E suave melodia Esse rosto que precisa De afecto em poesia! ESSE BEIJO QUE ME FALTA De que nunca fui capaz Voa pra ti em palavras Põe-me sereno, em paz E desejo que, no trajecto, Voe, voe em grande altura, Que fantasmas não o bebam E minha dor tenha cura. MAS SEI DOS ESCOLHOS DA VIA, Dos perigos que ele corre, Capturado por fantasmas É mensagem que me morre! NO DIA DO BEIJO É HORA De te cantar em voz alta A poética do amor Pra redimir essa falta E pôr fim à minha dor. E PORQUE O DIA É TEU Ganha força, Intensidade... ........................ Mesmo que fantasmas O bebam É um beijo de verdade! ESSE BEIJO QUE NÃO DEI Foi pecado original, Hei-de sofrê-lo pra sempre Como chaga corporal. NÃO HÁ PALAVRAS QUE BASTEM Pra repor o que não dei Elas voam, mas não chegam E mesmo assim eu tentei... É CERTO QUE SEMPRE O QUIS, Só que nunca to roubei, A culpa foi desse tempo, Dos dias em que te amei, Um tempo em diferido Sem presente nem futuro, Talvez beijo sem sentido Porque queria do mais puro, Tangendo eternidade Às portas do Paraíso, Um beijo de divindade, Mas simples Como um sorriso! ESSE BEIJO IMPOSSÍVEL Que não é do foro humano Vou tentando construí-lo Cada dia, cada ano, Perdendo-me pelo caminho Como sagrado em profano!

ARLEQUIM
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Máscara”. Original de minha autoria. Reproposição com ajustamentos no poema e na pintura. Junho de 2019.

“Máscara”. Jas. 06-2019
POEMA – “ARLEQUIM”
COMPREI UMA MÁSCARA, Pu-la no rosto do Meu amado poeta E ele não a Enjeitou. Ainda por cima Me disse: “- Sou eu, sou, Como nas palavras Que digo Também meu rosto Mudou. NÃO ESPERAVAS Ver-me assim! Vá, confessa O teu espanto! Luzinhas na minha Cabeça, Rosto tão Desfigurado, Cor, tanta cor (A que apeteça) Pra sufocar Esta dor, Sempre que ela Apareça A pedir o meu Cuidado. ADOPTEI ESTA FIGURA, Apresento-me assim, As outras Nada te dizem, Com esta Olhas pra mim! PALHAÇO É O QUE SOU, Falo a Surdos e mudos Que não ouvem O que digo Nem me dizem O que quero Como se fosse Mendigo Do que, afinal, Nem espero. VALHA-ME POIS ESTA MÁSCARA! Assim rio Desta vida, Rio de ti E de mim, Da chegada E da partida, Dos abraços, Das palavras E também da Despedida! SOU PALHAÇO, É o que sou, Entretenho-me A cantar E se ouvires Este meu canto Arlequim É seu autor, Por isso tu Não t’importes O que diz É de certeza Pra espantar Sua dor!” A MÁSCARA É o seu rosto, Colou-se-lhe Logo à pele Com a cola Do desgosto E por isso Já nem sabe Se seu rosto É o dele. COMPREI UMA MÁSCARA Luminosa No mercado Da minha vida Ponho-lha sempre Que posso, À chegada E à partida. NUNCA LHA TIRO, Ao poeta, Que rasgo a sua Alma, Pois se o canto O liberta É a máscara Que o salva!

Máscara”. Detalhe.
NOSTALGIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Nostalgia”. Original
de minha autoria. Poema inspirado no Romance
"Via dei Portoghesi", que será lançado na próxima
Quinta-Feira, 27 de Junho, na Sala do Arquivo
da Câmara Municipal de Lisboa, Praça do Município,
às 18:30. Junho de 2019.
Convido hoje o leitor a ler também o meu Ensaio
"A Arte, o Artista e os Outros", aqui em link:
https://joaodealmeidasantos.com/2018/08/24/ensaio-5/?fbclid=IwAR1UqXBHq-FMQBEd5hPrZYvVTpNnMYDJQ078xuo_KVL4c7-iyE2HUuaM1HQ

“Nostalgia”. Jas. 06-2019
POEMA – “NOSTALGIA”
RÁPIDA COMO O VENTO
Passou por mim
Esta palavra saudade
Numa rua do meu bairro
Sob o céu desta cidade.
GRAVEI-A
Na minha mente,
Evoquei-a
Ao crepúsculo
Com incerta
Nostalgia...
...................
Não queima tanto,
Esta palavra,
Porque a sinto
Mais fria!
COM CESÁRIO
(De quem gosto)
Dei-lhe cor,
Cantei-a
Com a pintura,
Dei-lhe vida
Num romance,
Tento tudo,
O que não posso,
Porque esta dor
Me perdura...
DA SUA COR
Vejo o mundo,
Com palavras
A recrio,
Procuro sempre
O seu rosto...
...................
E por mais longe
Qu’esteja
Eu não me sinto
Vazio.
A DOR
Desta saudade
Alimenta-me
A alma
E aquece a minha
Vida
E assim eu vou
Vivendo
Em eterna
Despedida,
Neste cais
Que não tem fim,
Em partida
Que não há,
Um adeus que não
Existe,
Porque tu
Nunca saíste
Deste meu
Lado de cá.
MAS HÁ SEMPRE
Esta saudade
A que chamo
Nostalgia,
Uma tristeza
Feliz
Que eu sinto
No labor de
Cada dia.
NÃO TE TENHO,
Mas não te perco,
Estás longe,
Perto daqui,
Não te encontro
Nem te vejo,
Mas sei que não
Te perdi...
INSPIRA-ME,
A nostalgia...
......................
Recrio-te em cada
Instante,
Sou poeta,
Sou pintor
E também sou
Arlequim,
Por isso vejo
O teu mundo
A partir dum
Camarim!
ESCULPO
Teu rosto
Com palavras
Do meu peito,
Pinto a alma
Com a cor
Da tua voz,
Voo contigo
Em sonho,
Banho a alma
No dourado do
Teu rio
Pra chegar
À tua foz.
TENHO COMIGO
PINCÉIS
E as asas
Do poeta,
Danço,
Sou arlequim,
Pinto-me nesta
Ribalta
Com as cores
Que vês
Em mim!
SEM TI
NESTA RUA
Da saudade
Sou palhaço
Em camarim
Que maquilha
O seu rosto
Num palco
Que não tem fim,
Representa
Para ti
Sem saber
Se lá estás,
A verdade
Não lh'importa,
É feliz com
O que faz!
ASSIM VIVE
O ARLEQUIM...
........................
No palco da sua vida
É só arte
O seu fazer,
As dádivas que ele
Te entrega
São um modo
De viver!

“Nostalgia”. Detalhe.
DISSERAM-ME, UM DIA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Inscrições na Pedra”.
Original de minha autoria para este poema.
Junho de 2019.

“Inscrições na Pedra”. Jas. 06-2019
POEMA – “DISSERAM-ME, UM DIA…”
DISSERAM-ME,
Um dia,
Que te viram
Sozinha
E melancólica,
Sentada
Numa pedra
De granito...
...Amarelo,
Luminosa de
Cristais,
À sombra
Duma figueira
E já nem sei,
Nem sei que mais...
DISSERAM-ME
Que foi
Lá em cima
No Monte
Sagrado,
Como se tivesses
Perdido
Uma parte de ti
E a chorasses
Em solidão,
Invocando a bela
Athena,
Essa deusa
Que t'inspira
E te leva
Pela mão...
DISSERAM, SIM,
E cantaram-te
A beleza triste,
A nostálgica
Melancolia
Espelhada
Em teu rosto,
Na turbação
Desse dia...
E EU, ENTRISTECIDO,
Voltei
A imaginar-te
Projectada
Em mil rostos
Desenhados
A carvão,
Em flores
De cor intensa,
Bem pintadas
A pastel,
Em planos de
Infinito
Desenhados
No papel...
E VI-TE
A vaguear
No tempo,
Nos confins
Da memória
Com olhos
De fantasia
À procura
Da beleza
Que tens inscrita
Na alma,
De tua arte
A magia.
MAS EU VI
O mundo
Desabar
Sobre ti,
Rasgar a folha
Branca e macia
Onde desenhavas
O futuro
Com mestria,
Estilhaçando
A ténue luz
Que te alumiava
De perto,
Como por encanto,
O destino...
...................
E até a tua
Serena alegria!
NÃO DESTE CONTA,
Bem sei,
Mas agora
Sentes-te um pouco
Às escuras,
O sol do Monte
Esgueirou-se
Para outras paisagens,
A poente,
E à noite
A lua-cheia
Da praia
Da meia-lua
Já só brilha
Intermitente...
NEM SEI COMO
Dizer-te,
Num poema
Ou num quadro,
Que a arte
Só vive
De liberdade,
Desnuda-nos
A alma toda
Como luz que nos
Invade!
AGARRA, ENTÃO,
O vento
Que te sopra
Dentro,
Desnuda-te
E voa nele
De novo
Em direcção ao
Infinito,
Reinventa-te
Em azul
E grita ao mundo,
Lá de cima,
A arte que levas
Dentro de ti,
Grávida
Dessa beleza
Onde, nos meus poemas,
Eu sempre, feliz,
Renasci.
AH, COMO GOSTARIA
De voar de novo
Contigo
Agarrado a palavras
Deslaçadas
Em mil fios
Coloridos,
Cansado que estou
De voar sempre
Sozinho
Para não te perder
De vez
Nesta inóspita
Esquina
Do meu caminho...
................
Mas talvez seja
Tarde demais
Para apagar
Esta melancolia
Que me corrompe
O entardecer
De cada poema
E a sua melodia...

“Inscrições na Pedra”. Detalhe.
EM CERTOS DIAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Beija-Flor em Magnólia Branca”. Original de minha autoria para este poema. Junho de 2019.

Beija-Flor em Magnólia Branca”. Jas. 06-2019
POEMA – “EM CERTOS DIAS…”
EM CERTOS DIAS, Teu macio rosto De veludo Alterna Entre suave doçura e Vincos marcados Como sulcos, Aspereza de Sensualidade Sustida À flor da pele Para que não Transbordes Em excesso De ti. COMO SE FOSSES DUAS MULHERES, As faces de Janus, Decidida E evasiva, Passado e futuro, Espartilho Que quase anula O teu fértil Húmus anímico Que remotamente Te inspira, Desde a raiz. MAS TU ÉS UMA SÓ, Aquela que Ficou Sentada Na soleira da tua Alma Quando, em solidão, Saíste, decidida, Para a rua Da tua vida À conquista Do mundo... ACORDA, MULHER, Vai à procura De ti Na fronteira Do teu destino, Olha o mundo Da janela, Mas sai Pela porta da tua Alma De braço dado Com o sol que Tantas vezes Te ilumina O olhar Com as cores Do arco-íris. HÁ TANTAS MAGNÓLIAS (Como tu) No meio do caminho Da tua vida Que basta olhá-las Pra que ela Te sorria. AH, NÃO SABES Quanta metafísica Há numa magnólia Branca! Fala-lhe com os teus Olhos, Acende-a com Teu sopro quente, Acaricia-a com Mãos macias E verás que ela Te apontará o caminho Do reencontro Contigo Na brancura De suas pétalas. E VERÁS TAMBÉM Que tu vives, (Como eu) Num intervalo entre ti E o mundo De onde te podes Reconhecer No regresso À tua soleira vital, Para repartires Aconchegada, Contigo no regaço. NA FRONTEIRA - Sabias? - Vemos melhor Para dentro e para fora De nós, Vemos Os demónios E os anjos... VÁ, CANTA A VIDA Com teus olhos, Demora-te um pouco Na janela sobranceira Do teu íntimo A ver passar Aquela que já Não queres ser Porque apaga O rasto do teu Acontecer... .................... E sai com o vento Pela porta do Teu destino. E VAI AO JARDIM Falar com as magnólias E come chocolates E canta E dança E grita se for preciso Até que o eco Te devolva Identidade E teus olhos Se cubram Daquele verde Que nasce nas Encostas, Nos verões Das nossas vidas, Quando o sol Já brilha no horizonte... MAS BRILHA? - Perguntarás. E eu digo-te Que sim Se o brilho Se acender também No teu inquieto Olhar!

“Beija-Flor em Magnólia Branca”. Detalhe.
AH, PASÁRGADA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Idílio em Pasárgada”. Original de minha autoria para este poema. Um diálogo em poesia com Manuel Bandeira (“Desencanto”; “Versos escritos na água”; “Renúncia" - Manuel Bandeira, Obras Poéticas. Lisboa, Minerva, 1956, pp. 33, 40, 101). Junho de 2019.

“Idílio em Pasárgada”. Jas. 06.2019.
“POEMA: “AH, PASÁRGADA…”
“OS POUCOS VERSOS QUE AÍ VÃO, Em lugar de outros é que os ponho. Tu que me lês, deixo ao teu sonho Imaginar como serão.” (M.B.) OS MUITOS VERSOS Que te dei Transparecem No que eu sou. Se me leres Saberás Que não pequei E que é tanto O que agora Eu te dou. “NELES PORÁS TUA TRISTEZA Ou bem teu júbilo, e, talvez, Lhes acharás, tu que me lês, Alguma sombra de beleza...” BELEZA Que desenhei Sempre contigo, Mas em tristeza E tanta dor Como castigo. EU CANTO O que perdi P’ra que o verso Vá ter contigo Lá onde estejas Queira o vento Ser meu amigo Mesmo que tu Nunca me vejas. “QUEM OS OUVIU NÃO OS AMOU Meus pobres versos comovidos! Por isso fiquem esquecidos Onde o mau vento os atirou.” NÃO OS AMOU Mas foi verdade Este amor Que aqui nasceu E que cantei Em liberdade Em versos Que o vento Já me levou Dos muros Desta cidade. OUTROS FARIA Se pudesse Para os pôr Na tua mão, Não pediria que Os sonhasses, Olhos cerrados, Mas que os lesses Por afeição. AH, MANEL, Que bem me sabe Pôr a dor Em poesia, Em versos A emoção, No cantar Triste alegria De tão intensa Ser a paixão Mesmo que seja Apenas Doce utopia Ou singela Ilusão. DIZES TU, Em poesia, Que só a dor Te enobrece. É bem verdade, Meu bom poeta, Alma dorida Logo me aquece E com seus versos Entretece O que a paixão Já tanto afecta. “A VIDA É VÃ COMO A SOMBRA QUE PASSA... Sofre sereno e de alma sobranceira, Sem um grito sequer tua desgraça. ENCERRA EM TI TUA TRISTEZA INTEIRA. E pede humildemente a Deus que a faça Tua doce e constante companheira...” POIS TENHO MEDO, Ah, meu irmão, Que a dor Me passe, Perca o poema Sua raiz, Essa, sim, A verdadeira, E eu fique só Já sem palavras E caiam secas Todas as rosas Que me povoam Esta roseira. SOBRAM ESPINHOS, Ferem-me a alma E saem versos E cai o sangue “Gota a gota, Do coração”, “Volúpia ardente” Já sem remédio “Eu faço versos Como quem chora” E chamo a dor Naquela hora E ela vem Por compaixão! AH, POETA, Ah, meu irmão, Tu fazes versos “Como quem morre” E eu procuro Neste meu canto O seu perdão. TU, MANEL, És o poeta E a bandeira E ela é O meu refrão, P’ra mim és verso No meu poema E ela é, Na minha alma, Esta paixão!

“Idílio em Pasárgada”. Detalhe.
ENCONTREI-TE NESTA RUA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: Capa do Romance “VIA DEI PORTOGHESI”,
sobre desenho original de João de Almeida Santos, autor.
Poema inspirado neste Romance,
que estará nas livrarias e nas grandes superfícies
no próximo dia 18 de Junho.
Editora Parsifal. Lisboa. 2019.

Capa do Romance “Via dei Portoghesi”. Pintura original de JAS. 05-2019
POEMA – “ENCONTREI-TE NESTA RUA…”
ENCONTREI-TE NESTA RUA
Levemente curvada
Sob o peso da tua
Persistente
(E sedutora)
Melancolia...
UM OLHAR
Invisível
Seguia
O teu rasto,
Por incontida
Paixão,
Na rua
Do desencontro,
Dos olhares cruzados,
Incertos ou
Dissimulados,
Inundados de
Lágrimas secas
Expulsas
Pela dor
Nostálgica
E profunda
De almas
Em ferida.
MAS É A NOSSA RUA,
Não é?
Lugar vital
De tristes desacertos,
Vereda estreita,
Inacabada,
Destino
Traçado
Pelos deuses
Como castigo
Sei lá do quê,
Curva apertada
Da vida
Sobre abismo
Vertical
Que ameaça
Engolir-nos
No nada.
AH, EU SINTO
VERTIGENS
Ao passar na nossa
Rua!
Estou sempre
À beira de cair
No precipício
Quando que me
Cruzo contigo
Que seja
Apenas na
Memória deste lugar
Que me atrai
Como laço
Nunca deslaçado
Porque nunca
Cumprido.
ESTA É A RUA DO
Meu abismo,
Atracção fatal
Das margens
Dos meus dias
Para um passado
Que me devora
Inexoravelmente
O futuro,
Sem compaixão...
EU GOSTO
DESTA RUA,
Estou sempre
A celebrá-la
Com poemas,
Em exorcismos
Salvíficos
E consoladores,
Atraído
Por ela
Como se fosse
A nascente do meu
Incompleto
E melancólico
Viver...
MESMO QUANDO NÃO ESTÁS
(Nunca estás,
Eu bem sei)
Nela, tropeço
Em ti,
Seguro-me
Para não cair
Em mim
E sigo em frente
Até à esquina
Onde, contigo,
Me cruzava,
De uma certa forma,
Com o implacável
Mundo
Que nos era
Friamente hostil.
É A RUA DO DESENCONTRO
Porque foi nela
Que te encontrei,
Trocando
As voltas ao destino
E seguindo em frente,
A teu lado,
Por algum tempo,
Até que te perdi
O rasto
Numa curva
Perigosa
Desse desfiladeiro
Da tua vida
Que ameaça sugar-te
Para um vazio
Profundo...
MAS AGORA VISITO-TE
Em lugares
Imateriais
Onde te procuro
E recrio
Na esperança de
Um dia,
Inesperadamente,
Te ouvir dizer
De novo: “Olá!”...
................
E não seja
Tarde demais!

Plano da Capa do Romance.
A JANELA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Onde te vejo”. Publico hoje, em reposição, mas juntando um poema (de Dezembro de 2017) e um quadro, ambos de minha autoria, que foram executados para momentos e referentes diferentes: “A Janela” (ligeiramente retocado) e “Onde te vejo”. Este é o único poema que, até hoje, publiquei onde o sujeito poético é uma mulher. Dadas as suas características, fortemente rimáticas, não fiz versão áudio.

“Onde Te Vejo”. Jas. 03-2019
POEMA - "A JANELA"
NOS VIDROS Desta janela Se espelha Todo o meu ser, É neles que Eu te revejo Quando deixo De te ver. DA JANELA Vejo o mundo E o mundo Vê a janela, Debruçada No parapeito Olho o céu E olho a rua Para ver Se passas nela... NOS VIDROS Desta janela Há reflexos Da vida Olho p’ra eles Pensativa E não me sinto Perdida Se puder Falar contigo Quando te vir De partida... NOS VIDROS Da minha janela Se espelha Todo o teu ser Quando passas Nesta rua E me sinto Estremecer Da falta que tu Me fazes Por ainda Não te ter. SE TE AFASTAS Da janela E vislumbro Silhueta Lá ao fundo, Longe dela, Eu sofro Por te perder... .......... É uma dor Tão profunda Que logo Se me revela. VOA P’RA LONGE Essa tua Silhueta Que s’esgueira Na esquina Como se fosse Cometa A passar Na minha rua... .............. Mas também eu Me diluo E me sinto Um pouco nua Na imagem Transparente Dos vidros Desta janela Como se fosse Já tua. FOSTE EMBORA Do meu mundo Onde eu Te queria ter Ao alcance De um olhar Para nunca Te perder... MAS NÃO DEIXEI A janela, Esperei sempre Por ti, Hora-a-hora, Dia-a-dia, Até que, por fim, Eu te vi. VI-TE Da minha janela, Desenhei-te Com alma E olhar De devoção, Pintei-te todo A vermelho Na cor da minha Paixão... ................ Mas mesmo assim Tu partiste Sem me dar A tua mão. DA JANELA Sempre te vejo, Mesmo ausente Da nossa rua, Nos vidros Fica imagem, Perfeita Como a tua, Mas é sempre Transparente E não lhe posso Tocar, Guardo-a, então, Com ternura No meu inocente Olhar. E GOSTO Da primavera, Confundir-te Com aromas Que me chegam À janela, Anunciando A chegada Do melhor Que sinto nela. A JANELA Não tem cortinas P’ra te ver Na nossa rua, Ver-te chegar E partir, Ficando um pouco Mais nua, Querer que Me vejas Assim Tão brilhante Como a Lua... AH, QUANTAS VEZES Eu desci Da janela Para a rua... ............... Olhava de baixo P’ra cima, Mas eu nela Não me via, E, assim, Não era tua. O MEU MUNDO É a janela, O da rua É o teu, É dela que Eu te vejo, Na rua Já não sou eu. DA JANELA Do meu mundo Olho p’ra ti Com calor, Sem ela Eu não te sinto, Fica um muro, Meu amor!

“Onde te vejo”. Detalhe.
O BENFEITOR
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Um homem das arábias”.
Original de minha autoria para este poema.
Maio de 2019.
Para ouvir a versão áudio, pelo autor,
com música de Albinoni (Adagio), por von Karajan:

“Um homem das arábias”. Jas. 05-2019
POEMA – “O BENFEITOR”
COMO TE VEJO,
Ó benfeitor,
Filho dilecto
Da tua Ilha,
Nosso Jardim!
Há mil quadros,
Rara beleza,
Espelhos do teu
Amor,
Todos pra mim,
Aqui tão perto,
À minha beira...
..................
Sinto-me rico
De tanta cor
No ouro das molduras
De madeira!
COMO TE SINTO,
Meu benfeitor,
Sempre de negro,
Artista grande
Que nem Dali,
Noites d’inverno
Onde o escuro
É a beleza
E o dinheiro
(Que foi pra ti)
O meu inferno!
VERMELHO E NEGRO,
Como Stendhal
Ou Julião
(Tens o Sarmento...),
De coração
A palpitar
(Sem um lamento).
A TUA VIDA
É um natal,
Com tantas prendas
Dos teus banqueiros...
Mas a minha
É tempestade
Com aguaceiros,
Sempre a pagar...
.................
É natural!
DA ARTE TU ÉS
O Mago,
A colecção
Vai aumentar,
Banqueiro dá,
Finge qu'empresta,
É aos milhões,
Mas logo chega
O meu castigo...
.................
É sempre assim,
Sempre a cobrar
(Põe-me mendigo)
O que pra ele
São só tostões...
EU GOSTO D’ARTE
Da que eu faço,
Sem a vender,
Nem a comprar,
Mas vou ao banco
(Vou muitas vezes),
Acerto o passo,
Eu tenho contas
Para pagar.
O MEU PAÍS
É muito culto,
Jeff Koons
Lucio Fontana,
Henri Michaux,
Mas no balcão
(Não sei porquê)
O meu banqueiro
É um sacana...
...................
Foi sempre assim,
Vem do avô!
ANSELM KIEFER,
Gerhard Richter.
Frank Stella...
É muito bom!
Pois tem de ser
Se o banqueiro
Olha pra ela,
(Prà colecção)
Fica pasmado
Com tanta arte
E dá-lhe tudo
Por gratidão!
E DUBUFFET,
Não gostas dele?
Morris Louis
Piero Manzoni
Georges Segal
Ou Chamberlain
É a beleza
Da colecção,
Perante ti...
Não percebeste?
Chegas e vês
Gostas e pagas,
És devedor...
...................
Não rogues, pois,
Crente da arte,
As tuas pragas
Ao benfeitor!
GOSTO DE TI,
Da tua arte,
Ficou humana
A nossa banca...
Mas sem milhões!
Que nos importa?
Temos beleza,
Temos amor...
E as nossas contas
Aos trambolhões...
Temos-te a ti,
Tão generoso...
..................
São os banqueiros
Os aldabrões.
MAS QUE M’IMPORTA,
Ó benfeitor,
Fizeste bem
Mais uma vez,
Pois ajudaste
Os teus banqueiros,
Tinham excesso
De liquidez.
GERALD LAING,
Alain Jacquet
Pauline Boty...
.................
Logo acertaste,
Ó benfeitor,
A liquidez
Ficou pra ti...

“Um homem das arábias…”. Detalhe.
ENCONTRAR-TE NUM POEMA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “La Diseuse”. Original de minha autoria para este poema. Maio de 2019. Para ouvir o poema pela voz do autor:

“La Diseuse”. Jas. 05-2019
POEMA – “ENCONTRAR-TE NUM POEMA…”
ÀS VEZES Perco-me Em ti Quando te sonho Num poema. Ondulas Entre tristeza E doçura Nos teus dias Mais incertos, Em momentos De ventura! SE ÉS TERNA, Eu estremeço Porque enleia, O teu olhar! Olhos escuros Despontam Da luz No suave Amanhecer Quando em surdina Me dizes E partilhas Esse teu Acontecer. CONTEMPLO A tua imagem, Essa beleza Tão pura, Por instantes Muito breves... Mas logo recolho Às palavras Sedutoras De tão inocente Encanto E de tão meiga Ternura... O TEMPO Corre sempre Contra nós E eu corro Contra ele Pra que a saudade Não chegue Antes do tempo Chegar, Pois sei Que ela m’inunda, Desagua No meu rio Para logo Transbordar... VIVO SEMPRE Num intervalo De onde nos vejo Sorrir De saber - Tu imagina - Que nunca nos Cansaremos Por falta de tempo Neste efémero Viver Sob esse poder Que domina E me impede De te ter. MAS PERCO-ME No brilho intenso Dos teus olhos À procura dessa cor Que desponta Quando o sol Te ilumina. SINTO CALOR No meu peito E procuro o teu Regaço Pra que me olhes Por dentro Nos poemas Que te canto E que dizes com Fervor Como se fosse Um abraço. EU GOSTO Da doçura que te Invade Quando recusas O mundo Que te atropela Nas curvas Da tua vida... ................ Pra cantar O meu poema Porque me vês De partida... AH, COMO GOSTO De te sonhar A dizer-me Em poesia, É encanto, É prazer E é mistério... .................. É a vida Em sinfonia!

“La Diseuse”. Detalhe.
SONHAR
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Sonho”. Original de minha autoria para este poema. Versão áudio pelo autor, tendo como fundo o “Concerto de Aranjuez”, de Joaquín Rodrigo. Para ouvir o poema dito pelo autor:

“Sonho”. Jas. 05-2019
POEMA – “SONHAR”
SONHEI QUE AS PALAVRAS Se gastaram, Desfiaram, Desataram, Sobrando fios Para tecer O silêncio. SONHEI Que a tinta Perdeu a cor, Que não havia Poemas E que não era Pintor. SONHEI Que não eras tu, Que foi tudo Uma ilusão. SONHEI QUE TE PROCUREI No mundo da fantasia, Onde as flores Caminhavam, Sabiam a maresia, Tinham rostos De mulher, Mas surdos Ao que dizia. SONHEI Que não sabia Onde estás, O que fazes E o que sonhas Nas noites Do teu luar, O que vês Nesses momentos Fugazes Em que olhas Para ti. SONHEI Que já não me lês E que não ouves Poemas, Que estás tão longe Daqui... NO SONHO Fui à memória, Que também Perdeu a cor, Ficou tudo A preto e branco E sonhei, Sonhei, sim, Que te perdi... ................. Meu amor! SONHANDO, Procurei cor Num outro Lugar qualquer. Só encontrei O cinzento E por falta De vermelho Meus versos Tão desbotados Já nem iam Com o vento... “FOSTE P’RA ONDE Que eu não te vejo?” Perguntei Quando do sonho Acordei. SAÍSTE De onde estavas E agora resta O desejo De te cantar Sem palavras P’ra que ouças O silêncio Com que antes Me chamavas. JÁ NÃO ME CHEGAM SINAIS, O meu É um poço escuro, É buraco Tão profundo Que nele Eu vou caindo Como triste Vagabundo... O SOL TAMBÉM JÁ SE FOI, As sombras Tomaram conta De mim, Meus dias São sempre Iguais, Sinto um vazio Sem fim... MAS PINTO, Agora pinto, Tenho cores E tenho aromas, Tenho luz E sou feliz... AH, SIM, Mas perdi A minha Musa, A fonte D’inspiração Foi p’ra longe Com o vento E em meu triste Pensamento Só ficou A ilusão! GASTARAM-SE As palavras, Meu amor. Gastou-se tudo, Afinal. Só ficou o teu Cinzento, A tinta com que Lavras O meu peito (Sem lamento) E me afundas Nesta dor, A que canto Em surdina Para ouvires O silêncio Com que te pinto Sem cor...

“Sonho”. Detalhe.
LIBERDADE
Poema inédito de João de Almeida Santos, escrito para a comemoração do 25 de Abril de 2019, em Portimão, na Sociedade Vencedora Portimonense, pelo "Grupo Canto Renascido", dirigido pelo Maestro António Vinagre. Ilustração: "Liberdade". Original de minha autoria para este poema. Dito, na Sessão, por Dulce Guerreiro, com acompanhamento ao piano. Para ouvir o poema pela voz do autor e um nocturno de Chopin:

“Liberdade”. Jas. Abril de 2019
POEMA – “LIBERDADE”
PERGUNTEI-TE, Num dia De sol: “Voas comigo Pra linha Do horizonte?” Deste-me a mão E sorriste: “Voo, sim, Pois preciso De ar puro Lá bem no alto Do Monte!” E PARTIMOS. Tu levaste O arco-íris Que tinhas Dentro de ti E eu as letras Que tinha Comigo, Alinhadas Nesta alma Solitária Recolhida Em seu abrigo... ENREDÁMOS Todas as cores Com linhas De palavras Deslaçadas, Construímos Asas em forma De verso E voámos No céu De um poema Pintado todo De azul... ANDEI CONTIGO Por lá Anos a fio, Vagueando Ao sabor da Inspiração, Levados Pela brisa Que sopra fria No Monte, Mas afaga O coração. E COMO GOSTEI De voar contigo, Livres como Pássaros Sobre o vale Onde um dia Te encontrei Construindo Castelos Na areia Com força De fantasia! É ASSIM QUE EU Te vejo, Tecer a vida Com sopro Na alma E as cores Do arco-íris Pintadas Por tua mão Como pautas Coloridas De uma bela Melodia Que canto Com devoção! FOI ASSIM QUE NOS Dissemos Nesse tempo, Livres de amarras Que não nos deixam Voar, Cantando com Arte Um destino Marcado Pela vontade Pra fazer Da nossa vida Caminho De liberdade.

Liberdade”. Detalhe”
UM SONHO NA ALDEIA
(Outra Versão Áudio)
Poema de João de Almeida Santos Outra versão áudio, com fundo musical, deste poema (de 21.04.2019), que uma Amiga me fez chegar e que tenho o gosto de partilhar... e de agradecer.

“Rua na Minha Aldeia”. Detalhe. Jas. 04-2019
UM SONHO NA ALDEIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Rua na minha aldeia”.
No final, detalhe de um quadro inédito,
"Sonho". Originais de minha autoria.
Abril de 2019.
Para ouvir o poema dito pelo autor:

“Rua na minha aldeia”. Jas. 04-2019
POEMA – “UM SONHO NA ALDEIA”
SONHEI-TE ESTA NOITE
Nas ruas
Da minha aldeia.
Não sei porquê
(Os sonhos são
Sempre assim),
Caminhámos
Paralelos
Sem dizer
Uma palavra,
Sem um olhar
De través....
........................
Apenas pressentimento!
DUAS VEZES
Lá estive,
A sentir
O que sentia
Na rua
Da minha aldeia,
Nesse tempo
Diferido
Dos encontros
Intangíveis.
MAS VI-TE
Com nitidez
(Um pouco baça,
É certo)
No silêncio do meu
Sonho,
Em misteriosa
Alvura
A recordar
Tempo antigo
Quando a neve
Regressava.
FOI NA RUA DA CARREIRA
(A rua chama-se
Assim)
Em frente
Da minha casa,
Onde me vejo
Passar...
..................
Sendeiro da minha
Vida!
CRUZÁMO-NOS
Por pouco tempo
(Como na vida real),
Nem um olhar
Nos trocámos,
Apenas nos pressentimos,
Tão fugaz foi
O meu sonho.
MAS SE A VIDA
É um sonho
Também os sonhos
São vida,
Pois senti que,
Na verdade,
Sonâmbula
Me adivinhaste
Nesta breve
Despedida.
E AQUI ESTOU EU
A sonhar-te
Outra vez
Em palavras
Que derramo,
Porque te vi
Nesse sonho
Na rua da
Minha aldeia,
Lugar nativo
Que amo.
É SEMPRE ASSIM,
Meu amor,
Quanto mais tu
Te esfumas
Mais me cresce
Esta dor.
É por isso
Que te sonho,
Pra desenhar
O teu rosto
Com palavras
De poeta.
E DE TANTO TE DIZER
Acabei por
Te encontrar
Na terra
Onde nasci,
Na rua
Onde brinquei,
Onde a neve
Derretia
Quando o sol
Já despontava
E a tristeza
Me cobria.
AGORA A NEVE
És tu,
Fugaz que foi
A passagem
Na rua
Da minha vida,
Como a brancura
De outrora
Que em tempos
De meninice
De saudades
Me doía.
E QUANDO TE
Encontrar
Talvez não
Te reconheça...
.............
Terei então
A certeza
Que recriei
Essa ausência
Para nunca
Eu perder
O que de ti
Me sobrou,
Como a neve
Da minha rua
Que não há sol
Que a derreta
Na penumbra
Da memória...
...............
Que, em parte,
É a tua.

“Rua na Minha Aldeia”. Detalhe.
VESTIDA DE CORES
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Exaltação da Luz”
Original de minha autoria
para este poema. Abril de 2019.
Para ouvir o poema pela voz do autor:

“Exaltação da Luz”. Jas. 04-2019
POEMA – “VESTIDA DE CORES”
VESTES CORES Garridas Em elegantes Danças De luz No palco Do mundo Como quem grita A beleza que leva Dentro de si. COBRES-TE DE TI, Agasalhas-te A alma, Repetes Em mil poses O teu rosto, Em perfil... DIZES-TE Em arte, Com aura, Única, Corpo luminoso Sempre a voar Para lugares onde Te confundes com O que te é Estranho Num subtil Jogo de Espelhos e Aparições Fugazes Onde te mostras Feliz. MAS QUANDO Regressas Às origens É como o fim De um sonho Que te levou Ao paraíso... ................ A queda De um anjo Na rotina do viver! E PARTES DE NOVO, À procura de ti Noutros lugares, Em catedrais Onde o eco do Silêncio Bate mais forte E o brilho do teu Olhar Se reflecte Nos vitrais Translúcidos Da divina luz Que julgas Interpelar... DOCE ILUSÃO A dos vitrais que Constróis Sobre ti Atravessados Por raios de luz Que te fascinam E seduzem Como hipnose Da arte sublime Que te transportará Em levitação Ao oráculo Da divina Atena... ................... Para a apoteose Final! MAS EU SIGO-TE, Vou E voo Atrás de ti Com os meus poemas Sempre feridos De cores vivas, Ao rubro, Com versos Em voz Rouca De tanto te dizer Ao longe, Na melodia triste Feita de Murmúrios Por não te alcançar... ..................... Sequer com palavras! NÃO IMPORTA Que a fuga Para a boca de cena À procura de autor Que te conte Ao mundo Seja fuga De ti própria Para a luz Da ribalta, Holofotes Que iluminem A penumbra Onde, persistente, Vestes A tua imaginação Para a exibir Nas festas coloridas E luminosas Da arte, Em rituais De celebração... GOSTO De te ver assim, Luminosa, Oficiante Desse rito pagão Que celebra A arte E a liberdade Que traz consigo Como pregão A convocar para Um hino à vida, Sem amarras! MAS EU CONTINUO Por aqui, Na solidão Sideral da Montanha A olhar O horizonte Sem fim E o céu plúmbeo, Pagando Com um poema E uma exuberante Rapsódia de cores O meu tributo Ao ritual Onde te celebras! AH, COMO GOSTARIA De te rever Na praia Da meia-lua, No baile Da meia-noite, Em diálogo Silencioso Com um luar Brilhante De lua cheia Que te iluminasse A alma!

“Exaltação da Luz”. Detalhe.
MUSA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Praia”. Original de minha autoria para este poema. Abril de 2019. Para ouvir o poema pela voz do autor:

A Praia. Jas. 04-2019
POEMA – “MUSA”
EU TENHO UMA MUSA
Guardada
No fundo
Da minha memória.
Perdi-lhe o rasto
Ao corpo,
Ficou-me dela
O mistério
Que me alimenta
O estro
Quando a saudade
Me assalta.
SOBROU-ME
Recordação,
Marcas cá
Dentro de mim,
Desço ao fundo
Da alma
Mas não lhe vejo
O fim.
E ASSIM NÃO A
VISLUMBRO,
Há uma certa
Escuridão,
O olhar já
Não me chega,
Restam-me
As cicatrizes
E uma funda
Solidão.
ÀS VEZES DESENHO
Seu rosto,
Ponho-lhe cores
Muito vivas,
Pinto a alma
Com palavras,
Dou-lhe nome
Que não é seu,
Levo-a nos meus
Poemas...
...............
Devolvo tudo
O que ela
Não me deu.
VALE-ME A POESIA
Pra onde fujo
Com ela,
É como a maresia
Da praia
Que vejo
Da minha janela.
TENHO UMA MUSA
Na praia,
Nesse mar
Que não tem fim,
Revolvo-me
Nas suas ondas,
Regresso feliz
Ao poema
Onde sorri
Para mim.
NÃO IMPORTA
Onde está,
Musa é fonte
De inspiração
Desde que haja
Na praia
Uma intensa
Paixão...

“Praia”. Detalhe.
ORIGEM
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Onde Te Vejo”.
Original de minha autoria
para este Poema. Março de 2019.
Versão áudio pelo autor:

“Onde Te Vejo”. Jas. 03-2019
POEMA – “ORIGEM”
A SUA ARTE
Nasceu contigo,
Do mistério e do
Silêncio
Que te enchia a alma,
A transbordar...
NASCEU
De um inesperado
Encanto,
Da tristeza
Submissa,
Quase matricial,
Que o cativou.
O começo
De uma revelação
Que não tem fim...
Intemporal.
E ELE, CRIANÇA,
Fascinado
Pelo teu olhar
Profundo,
O teu ímpeto
Imparável,
Fúrias
Quentes,
Cabelos negros
Desgrenhados
À solta
Sobre um corpo
Incerto,
Seios generosos
Que anunciavam
O nascimento de um
Poeta...
NASCEU CONTIGO,
Sim,
No teu regaço,
O poeta,
Aninhado
Na incerteza,
Na bruma
densa
Do encantamento.
DEPOIS CRESCEU
E quis a perfeição,
Seduzir-te
De longe,
Através do vento
Que te soprava
Na alma
Atormentada,
Com palavras cálidas,
Mas tristes,
Ritmadas
À medida que te
Ia perdendo
No implacável
Tempo da renúncia.
ACOLHESTE
A tormenta
No dia-a-dia
(Eu sei),
Obsessão
Martelante,
Sofrida em palavras
Repetidas
E gastas
À exaustão
Até à fuga
Para o nada...
...................
Cheio de tudo
O que não pudeste
Ou não quiseste
Ter.
MAS LEVASTE
O poeta contigo
(E muito mais),
Grávida de palavras
Não ditas,
Olhares falhados,
Imperceptíveis
Sinais,
Silêncios gritados,
Quieta turbação,
Lava oprimida
No centro de um
Vulcão
Que te alimenta
E consome
Nessa tua inefável
Solidão!
E O POETA
Capturou-te
Dentro de si
Para te libertar
Com metódica
Persistência
Em poemas,
Nuvens
Cintilantes
Que espalha
No teu céu,
Sobre ti,
Para te refrescar
A alma
Incandescente.
E EU, SEU CONFIDENTE,
Vejo-te só,
A olhar
O céu da minha
Janela,
As nuvens brilhantes
Do poeta,
À espera
Da chuva
E dos trovões
Que anunciem
Raios de luz
Sobre o teu olhar...
E TU, ALI,
Pensativa,
Silenciosa,
Taciturna,
A rever nelas
Um passado
Que nunca existiu,
Porque tudo tiveste
E tudo se perdeu.
MAS O PASSADO,
Ah, o passado
Anuncia-se
Agora,
Na primavera,
Em metamorfose,
Como ressurgimento,
Cântico
À eternidade,
Onde um dia,
Na solidão do teu
Destino,
Te reconhecerás...
.................
Talvez com um
Sorriso
Um pouco triste!
Mas não será tarde
Demais
Porque é o tempo
Do reencontro.

“Onde te vejo”. Detalhe.
COMO TE VEJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Trono”. Original de minha autoria para este Poema. Março de 2019. Para ouvir o poema pela voz do autor:

Trono. Jas. 03-2019
POEMA – “COMO TE VEJO”
COMO TE VEJO Na minha imaginação? Sentada num trono, Hierática, Sorriso formal, Parca em palavras, Muito bela, Quase irreal... ................. Como te sinto! BELEZA FRIA, Marmórea, Pele desenhada A rigor e A cinzel Por escultor Que te perscrutou A alma Desnuda Nos confins Enigmáticos Do teu ser. FICOU-TE A beleza No perfil, À superfície, Onde ainda te Vislumbro Na cíclica Neblina Do meu olhar! E CRIAS ROUPAGENS De mil cores Que descem Do trono E te gritam Ao mundo, Escondendo A solidão Da tua alma, A queda De um anjo No poço fundo De uma velada Melancolia. NÃO HÁ FUGA Possível Para o reino Das formas puras Quando falta O sopro Que anima Os voos Da fantasia Para o infinito De um espaço Sideral. MAS EU VEJO-TE Sempre Num trono Dourado Sentada na ilusão De conquista Do mundo À medida que te Vais gastando Na voragem do Tempo Que te atira Para fora A vaguear Na cidade Em busca Das formas Perdidas... ...................... Para o teu mirífico Reino. SERÃO SÓ SINAIS De fumo Que se elevam No horizonte A anunciar-te, Levados pelo vento Que te sopra Na alma, E que clamam Por atenção? AH, COMO GOSTARIA De os ler, Os sinais, Na exegese De um oráculo Promissor! MAS O TRONO Tem paredes subtis, Leves e frágeis, Tem rituais, Tem ouro E muito mais, Tem cânticos E tem vestais, Orações, Sacerdotes, Musas E catedrais... E FICA LÁ EM CIMA No Monte Onde o ar é Rarefeito E os horizontes Não têm fim Porque tocam A linha do infinito... ..................... E turbam a alma! ALGO ME DIZ Que ao trono Onde te vi Não voltarás Porque desceste Ao vale Chamada pelos arautos Das formas vazias, Apóstatas, Timoratos Da montanha Sagrada, Das vertigens E das tonturas Pela proximidade Da sideral E mágica Abóbada celeste Que nos arrebata A alma. A MONTANHA Não se deixa subir Duas vezes Na procura de inspiração, Sabias? O trono muda De cor E de oficiantes, Como se a vida Lá em cima Tivesse um único Ciclo de tempo Que não podemos Abandonar. SERÁ ESSE O TEU DESTINO? Não sei. Mas na montanha Há um trono Onde nos sentamos Uma única vez...

TARDO A ENCONTRAR-TE
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração. “Noite”. Original de minha autoria para este Poema. Março de 2019. Para ouvir o Poema, pela voz do Autor:

“Noite”. Jas. 03-2019
POEMA – “TARDO A ENCONTRAR-TE”
TARDO A ENCONTRAR-TE
Porque não sei
Como procurar-te
Levado
Por um poema...
NÃO É A VONTADE,
Mas o destino a marcar
Os passos que
Eu darei
Ou que nunca
Ousarei
Nesta estreita
Vereda
Da minha vida.
E TU SABES
Que não sei
Mas sabes por onde
Andei
E me perdi,
À procura do que
Não podia ter
Pra preservar
O que não quis
Apenas
Dentro de mim.
ATÉ QUE TE REENCONTREI
No fim de um caminho
Que já nem sei se
Trilhei
Ou se abandonei
Antes de um qualquer
Início.
ÀS VEZES ENCONTRAVA-TE.
Encontros fugazes,
Onde o teu brilho
Cegava
Por fora
E iluminava
Por dentro...
....................
E cantava-te!
MAS NÃO SEI
Se te quero
Para nunca
Te ter,
Sentir saudades
Logo ao amanhecer
Do perfume da aurora
Quando te reencontre
Na memória fresca
Dos afectos
Indefinidos...
....................
Os mais perfeitos!
SIM, DEIXO-ME IR
Nas mãos do destino,
Bem sabes,
Mas há sempre
Um súbito
Sobressalto
Quando o real
Nos atropela
Por dentro
E tudo se torna
Inóspito...
.................
Então eu tenho
Saudades de ti!
SE NÃO ME DEIXO IR
Viajo para outros
Lugares,
Tenho sempre
De viajar
À procura de mim,
Dum espelho onde
Me veja por dentro
A olhar-te
Por fora,
À espera do próximo
Sobressalto...
...................
Que nunca demora!
AH, COMO ME ESCASSEIA
Esse véu que te cobre
O rosto
Quando te quero
Pintar com palavras
E te vejo
Nua,
Com a alma a tiritar,
À mercê dos sobressaltos
Que te marcam
Como sulcos,
Cicatrizes ásperas
Da vida.
MAS EU PROCURO-TE
Com disfarçado
E tímido
Olhar,
Perscrutando-te
A alma
Que se aninha
Em ti
Para te proteger
Do risco da beleza
Exposta
Como fractura,
Aquela que os poetas
Cantam
Quando sentem a
Liberdade
Por perto.
TALVEZ A NOITE
Te sirva de véu
E te cubra as cicatrizes
Da vida,
Luz coada pela
Penumbra
Que te amacia
A pele
Encrespada,
Te devolva como
Sonho
Acetinado
Onde te reinventarei
Como mulher
Desejada...
....................
Para além do bem
E do mal.
MAS EU NÃO SEI,
Tenho medo
Dos sobressaltos,
De ser atropelado
Na esquina de um
Inocente
Jogo sedutor
Que te cative a
Alma
Já em fuga
Para o infinito
Que se cruza
Nos nossos olhares...
....................
Intermitentes.
TARDO A ENCONTRAR-TE
No bulício dos nossos
Dias...
...................
Até que no amanhecer
De um poema
Te encontre
E te diga
Com olhar
Submisso:
Meu amor!
Mas talvez já seja
Tarde demais...

SOLIDÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: "Evasão". Original de minha
autoria para este Poema. Março de 2019.
Para ouvir o Poema, dito pelo autor:

Evasão. Jas. 03-2019
“Os poetas são impudentes em relação às suas vivências: exploram-nas” (Die Dichter sind gegen ihre Erlebnisse schamlos: sie beuten sie aus) "O que se faz por amor acontece sempre para além do bem e do mal" (Was aus Liebe gethan wird, geschieht immer jenseits von Gut und Böse). F. Nietzsche, Jenseits von Gut und Böse (Para além do bem e do mal), 1886. IV. Sprüche und Zwischenspiele: 161. 153.
POEMA – “SOLIDÃO”
PERGUNTEI AO POETA
Sobre a minha
Solidão...
...............
E sabes
O que me disse?
Que ela tem
Os sete véus
Pra que ninguém
Atravesse
O sagrado
Do seu halo...
.....................
Um oásis no deserto,
Confessou!
PERGUNTEI-LHE
Pela dor
Que me resta,
E eu afago,
Deste amor
Que me veio
Ao encontro
Como dádiva do céu...
........................
E sabes
O que me disse?
Deixa lá,
Se já não tens
Alegria
Pra encantar
Quem tu amas
Resta-te a dor
Em plena solidão,
Quente
Como lava
De vulcão
Em humana
Eternidade,
Fora do mundo,
Da cidade,
Em suave e doce
Evasão!
MAS DISSE
Mais.
Não a procures,
Não lhe fales
Nem a vejas
A não ser como
Poeta,
Nesse intervalo
Da vida
Que te torna
Intangível
Como pura
Silhueta!
FINGE
Que não a sentes
E confessa-lhe amor,
Sobe às nuvens
Pelas linhas
Do seu rosto e
Põe asas
No seu nome,
Mas finge
Que não o dizes
Pra que não
Te reconheça...
E SE UM DIA
Teus olhos
Pousarem nela
Finge outra vez,
Finge que
Não a vês,
Que estás ali
Por acaso,
Como se fosse
À janela,
Que o destino
Te levou
Para fora
Do teu mundo
À procura
De desejo
Que resgate
A solidão.
PERGUNTEI, DE NOVO,
Ao poeta
Sobre esta solidão
Que cresce dentro
De mim...
..................
E sabes
O que me disse?
Que também ele
Ia nu,
Viajando nas estrelas,
Com asas
De sete véus,
Transparentes
Como ar,
Mergulhando no azul
Para ver se
A cantava
Sentado no horizonte,
A tocar o infinito...
QUERO SER
Como falou
Zarathustra,
Sussurrou...
.....................
Que da paixão
Saia virtude,
Dos demónios
Nasçam anjos,
Da solidão
Liberdade,
Que na dor
Cresça alegria
Cada ano,
Cada dia,
Enquanto o poeta
Viver,
Enquanto a possa
Cantar...
ENCONTREI UM DIA
O poeta
A caminho
Das estrelas.
Perguntei-lhe
Sobre a minha solidão.
Bateu as asas
E disse:
Voa pra junto de mim
Com asas de sete véus
Que o azul deste
Meu céu
É a tua evasão!

Evasão. Detalhe.
NÃO SEI!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Incerteza”. Original de minha autoria para este Poema. Março de 2019.

“Incerteza”. Jas. 03-2019
POEMA – “NÃO SEI!”
SE ME PERGUNTARES Por que razão Eu te amo Respondo-te, Com espanto, “Não sei!” SE ME PERGUNTARES Pelo que dói Neste tão cego Amor, Respondo-te Que não sei, Que sinto Pungente dor Esparsa Sobre o meu corpo Como sentido Penhor De um rapto Imprevisto Que nunca há-de Ter fim... SE ME PERGUNTARES, Depois, Se eu sinto A tua falta Respondo-te Logo que sim, Que tenho sempre Saudades Mesmo quando Eu te tenho Aqui bem junto De mim. “- PORQUE SOU EU A mulher Que te merece Atenção?” AH, ISSO EU SEI, Meu amor... .................... Foi o destino E a minha salvação, Esta dor Que não me vem Da vontade, Da procura Da verdade, De um saber Que não terei... ..................... E tudo o mais Eu não sei... ................... Quando te beijo Na alma! “- O QUE SABES TU DE MIM, Neste teu Desejo ardente?” POUCO OU NADA Sei de ti E sabendo O que não sei Não te amaria Às cegas, Assim tão Intensamente! AMAR-TE É como beber Tempestades, É dor que Não se sabe Onde está, É mistério Revelado, É encanto Permanente, O reverso Do saber, Luz intensa Que me cega E também Fascinação, Anúncio Que nunca acaba, Lado oculto Da razão... “- PRA QUE ME QUERES, Então, meu amor?” EU QUERO-TE Para te querer, Simples vontade De ti Como fim Do meu viver, Sentir saudades Do que estou Sempre a perder, Olhar-te nos olhos E ver neles O teu mundo... E o mundo Dentro deles, O brilho Embaciado De um olhar Onde me perco... E SE UM DIA Eu souber Por que razão Te amei Chorarei Eternamente Porque então Descobrirei Que por isso Te perdi...

“Incerteza”. Detalhe.
ANOITECEU…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Uma Janela no Jardim”. Original de minha autoria para este poema. Fevereiro de 2019.

“Uma Janela no Jardim”. Jas. 02-2019
POEMA – “ANOITECEU…”
É DAQUI QUE EU Te vejo, Ao luar, Sempre que me Anoitece Na vida. UMA JANELA, Solidão, Luz coada na Vidraça Onde pressinto Que te dás, Velada, Ao meu olhar Interior, Tão discreto Como a noite Que me cai Fundo Na alma! TENHO A MEU LADO Uma flor, Uma rosa Iluminada... A que o destino Me deu Por companhia, Irrompendo, Noite escura, Como vela Que perece Pra m’iluminar O caminho... SIM, ANOITECE Nas nossas vidas, Em todas, Bem sei, E também eu já Não te vejo Nem te ouço Ao entardecer, Porque passou Tempo demais... SE AINDA TE PRESSINTO Em tão ténues Sinais Que me chegam Aos sentidos É porque tu Já não me sais Da memória Onde sempre Te visito... MAS AGORA, JÁ SOBE, Sim, sobe, Suave e Subtil, Um perfume No Jardim, Aroma doce, Anúncio de Florescência A despontar Nua, Como eu, Para o que Um dia Haverá de Germinar... A JANELA ACENDE-SE Com esplendor! Luzes, Brilho intenso, Cores Em catadupa, Talvez uma nova Vida Possa ainda Renascer No meu jardim... ............... Simples, Como uma flor. A ROSA E A MAGNÓLIA Ganham luz, As pétalas quase Gritam Aos sentidos E anunciam-te, Imprevista Alegria, Cor da minha alma, Aroma intenso, Brilho profundo... .................... E tu renasces, Bela como sempre, Quando o véu Te cobre o rosto Macio, Sem marcas De vida sofrida, Beleza de perdição Que devolve, Como sopro, Encanto À minha vida E reparo à Solidão. OLHO A JANELA De longe E um perfume De rosa Desprende-se, Denso, A meu lado, Inebriante... .................... E incendeia-me A alma No mágico Anoitecer... ANOITECEU, SIM, MEU AMOR... ............... Mas à noite Segue-se, Sempre, Implacável E silenciosa, A madrugada E eu desperto Do torpor De um desperdiçado Amor Para renascer De novo Deste lado Como flor Que desponta, Ao relento, No jardim Da minha vida!

PALHAÇO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Máscara”
Original de minha autoria
para este Poema. Fevereiro de 2019

“Máscara”. Jas. 02-2019
POEMA – “PALHAÇO”
COMPREI UMA MÁSCARA,
Pu-la no rosto do
Meu amado poeta
E ele não a enjeitou.
Ainda por cima
Me disse
“- Sou eu, sou...
........................
Como nas palavras
Que digo
Também meu rosto
Mudou".
"NÃO ESPERAVAS
Ver-me assim!
Vá, confessa
O teu espanto!
Luzinhas na minha
Cabeça,
Rosto tão
Desfigurado,
Cor, tanta cor,
A que apeteça
Pra sufocar
Esta dor
Sempre que ela
Apareça
A pedir o meu
Cuidado".
"ADOPTEI ESTA FIGURA,
Apresento-me assim,
As outras
Nada te dizem,
Com esta
Olhas pra mim!"
"PALHAÇO
É O QUE SOU,
Falo a
Surdos e mudos
Que não ouvem
O que digo
Nem me dizem
O que quero
Como se fosse
Mendigo
Do que, afinal,
Nem espero".
"VALHA-ME POIS
ESTA MÁSCARA!
Assim rio
Desta vida,
Rio de ti
E de mim,
Da chegada
E da partida,
Dos abraços,
Das palavras...
..................
E também da
Despedida!"
"SOU PALHAÇO,
É o que sou!
Entretenho-me
A cantar...
E se ouvires
Este canto
Arlequim
É seu autor...
......................
Não t’importes
Nem o chores,
Pois o que diz
No poema
É para espantar
Sua dor!”
A MÁSCARA
É o seu rosto,
Colou-se-lhe
Logo à pele
Com a cola
Do desgosto
E por isso
Já nem sabe
Se este rosto
É o dele.
COMPREI UMA
MÁSCARA
Luminosa
No mercado
Da minha vida,
Ponho-lha sempre
Que posso,
À chegada
E à partida!
NÃO LHA TIRES
Que rasgas a sua
Alma
Pois se o canto
O liberta
É a máscara
Que o salva!

“Máscara”. Detalhe.
“OLÁ!”
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Raízes”.
Original de minha autoria
para este poema. Fevereiro de 2019

“Raízes”. Jas. 02-2019
POESIA – “OLÁ!”
PEDI-TE UM DIA
Que me desses
Um “Olá!”,
Com súplica
Em magnólia
Pra romper
O teu silêncio
E sarar
Esta ferida
Que me causa
Tanta dor...
E “OLÁ!” TU ME
Disseste,
Tão rápido
Como o vento
Que me sopra
Sobre a alma
Quando cruzo
O teu olhar!
BALBUCIEI
O teu nome
Já distante
Do “Olá!”
Sem saber
O que fazer,
Se chamar-te
Para mim
Ou para longe
Partir...
...........
Não sabia
Que dizer!
MAS QUANDO VIREI
O rosto
Vi-te de novo
Austera,
Muito fria
E distante...
...............
Ignoravas
O passado
Que passara
Nesse instante!
JÁ MUITO LONGE
De ti
Voltei a pedir
Um “Olá!”,
Mas já não
Me respondeste...
.....................
Caíra um raio
Do céu
Que rasgou
Esse teu véu
Donde ainda
Me olharas...
E DEPOIS...
Tantos “Olás!”
Te pedi,
Tantas vezes
Te chamei,
Os poemas
Qu’escrevi
Palavras
Que derramei...
....................
Sabendo nada
De ti!
TALVEZ O VENTO
Te chame,
Talvez a flor
Te seduza,
As raízes te
Comovam
Ou o poema
Te diga
Que nunca
É tarde
Demais
Pra que no eco
Te encontre...
.................
Meu amor!

“Raízes”. Detalhe.
O POEMA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Ela”. Original de minha autoria para este Poema. Fevereiro de 2019.

“ELA”. Jas. 02-2019
POEMA – “O POEMA”
PRA QUE SERVE O meu Poema Se ela, Do outro lado Da rua, Não o vê e Não o ouve, Não lhe sente O perfume Que a alma Inebria? AH, MAS EU SINTO-A A ela Do lado de cá Do Poema E pinto-a Em aguarela P’ra que veja A minha dor... ................. Olho-a, então, Com palavras E falo-lhe Como pintor. PRA QUE SERVE O MEU POEMA? Pr’aquecer A minha alma Dizendo tudo O que sinto Mesmo quando Nos meus versos Até parece Que minto... MAS NÃO ESCREVO Pra ela Que não a vejo À janela A ver passar O poema Na rua do Desencontro... O POEMA É de quem O queira ver E ouvir-lhe A melodia, Ler ou mesmo Cantar Como uma sinfonia, É a festa Dos sentidos, É prazer, É emoção, Não o ouve Nem o vê Quem não pode Ou quem não queira... .................. Não é coisa da Razão! O POEMA É SEMPRE CANTO, Vale pela melodia, Pelos sentidos que Desperta Cada hora, Cada dia... É VIDA QUE ME LIBERTA Das amarras Da paixão Porque voo com Palavras Ao sabor da emoção. E SE TE CHAMO Ao poema É pra ter de volta O meu eco, Ouvir o som Desta dor, Decompô-la Em palavras, Anulando a paixão Num canto libertador Das amarras Da prisão. PARA ISTO EU SOU POETA, Canto pra quem Me ouve, Não espero Reacção, Porque sei que Já partiste, Me deixaste Em solidão. EM CANTO-ME Nestes poemas Pra redimir Minha dor E se a poesia Não chega, As palavras Não me bastam, Pois que seja... ................... Sou pintor.

“Jardim”. Jas. 02-2019
LUZ
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “O Arbusto”. Original de minha
autoria para este poema, à procura
da sinestesia perfeita.
Janeiro de 2019.

O Arbusto. Jas. 01-2019
POEMA – “LUZ”
LUZ DO CÉU,
Muita luz
Descia por uma
Fresta
No coração
Do arbusto
Sobre meu
Olhar
Fascinado...
TÃO INTENSA
E brilhante
Ela era...
Como raio
(Ou quimera?)
Me cegou...
...............
E fiquei
Aprisionado!
LUZ, MAIS LUZ,
Queria eu,
Era luz que me
Faltava...
E ela
Esmoreceu
No meu olhar
Esmagado!
MAS FICOU DENTRO
De mim,
Num poema
Ou desenho
Esboçado,
Cores, traços,
palavras,
Memória que
Não tem fim...
.....................
Até que essa luz
Se apague
No arbusto
Do jardim...
LUZ, MAIS LUZ,
Insistia o poeta
Ao entardecer
Desse dia,
Quando a luz
Esmoreceu
E nela ele
Se perdia...
ERA VIDA
Que findava
Ou tempo
De despedida
Que cedo demais
Me chegava!
MAS A LUZ
Reavivou
Dentro de mim -
O meu sol-,
Renasceu
Nessas cores
E nas palavras
Que me saem
Cá do peito
E do fundo
Da memória...
.............
São poemas
Que te grito
E não ouves,
São cores
E riscos
Com que me rasgo
A alma,
São os sons
Destas palavras
Com que
Ouço o teu
Silêncio,
É pauta da melodia
Que já não sei
Soletrar...
...................
Por falta de ti,
Meu amor,
Que te negas
Ao olhar...
..............
P’ra que eu
Sempre te dance
Ao ritmo dessa
Saudade
Que me dói
Cada vez mais
Para melhor
Te guardar...
FOI ASSIM QUE
A LUZ
Voltou
P’ra iluminar
O arbusto
Que me tempera
A alma
Com suas folhas
Amargas,
Infusão de sentimento
Que me assalta
O corpo
Quando chega
A solidão...
REGRESSO, ASSIM,
Ao começo,
Tropeço na tua luz,
Ilumino-me a
Alma
E ponho fim
Ao desgosto
Dessa perda
Irreal
Que descobriu
No poema
Remédio
Para o meu mal.

Detalhe.
GEOMETRIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Triângulos”.
Original de minha autoria para este
poema. Janeiro de 2019.

Triângulos. Jas. 01-2019
POEMA – “GEOMETRIA”
MEUS POEMAS
São triângulos
Perfeitos,
Geometria
De afecto
Irreal
Com três lados,
O poeta
Refractário,
A musa
Que o inspira
E a fonte
Seminal...
“ - PORQUÊ
GEOMETRIA”,
Dirias tu,
“Se o amor não
É exacto,
Perfeito e
Linear,
Linha pura
De um rosto
Que só tu podes
Olhar?”
PORQUE A GEOMETRIA
Eleva ao excelso
Paraíso,
Exactidão,
Leveza,
Rapidez,
Linhas
Rectas,
Refracção
(Como vês)
De um rosto
Divinal
Que projecto
Com a alma
No meu jardim
De cristal...
ELEVA-ME
À perfeição,
Que não é
Pecaminosa,
Distante
Da curva linha
Rugosa
Que descreve
O amor
Em gestação
Como onda
Sinuosa,
Turbilhão
Nesse vasto
Oceano
Que não ouso
Enfrentar...
E, POR ISSO,
Quando desenho
O amor
Como círculo
Perfeito,
Ângulo
Agudo do sete,
Eu perco-te,
Mesmo que o
Desenlace e
O projecte
Como linha
Que descreve
Um voo
Ao infinito
Que já transborda
De azul...
POR MAIS FIGURAS
Que desenhe
Ou fugas
Que eu encete,
Linhas no fio
Do céu,
Não encontro
O amor,
Mas projecção
Geométrica
De uma nudez
Interior
Que eu espelho
No meu canto,
Expiação
Desta dor!
NÃO HÁ AMOR
Num triângulo
Perfeito,
Bem sei,
Na aritmética
Do espaço,
Linha em fuga
De uma deserta
Rua
Para lá do
Horizonte
Dessa alma
Sempre nua...
AH, MAS NA COR...
Na cor que sinto
Bem fundo
Dentro de mim,
Como fonte
De calor
Com que me
Visto a alma
Para me agasalhar
Desta tão fria
Dor...
Sim, eu vislumbro
O amor...
.............
Nas faces
De um cristal
De onde te vejo
Em triângulos
De cor e luz,
Espelhos
Desse teu rosto
Em refracção
Luminosa
Que ao poeta
Inspira e seduz
Quando te canta
A beleza
P’ra te dizer
Do destino
A que o poema
Conduz...
MEUS POEMAS
Serão, pois,
Triângulos
De luz e cor
Que m'iluminam a
Alma
Onde te guardo
Escondida,
Para sempre,
Meu amor!

Detalhe.
PERFUME
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Perfume”. Original de minha autoria para este poema. As duas referências que gostaria de assinalar, neste poema, são as “Memórias de Adriano", da Marguerite Yourcenar (Alfragide, Leya, 2018: 72-73), e "Os Sonetos de Shakespeare" (Lisboa, Quetzal, 2016 - Soneto 54). Janeiro de 2019.

Perfume. Jas. 01-2019
POEMA – “PERFUME”
E SE UM DIA
Me perguntasse
O que é, para ti,
O amor?
Pintar
Esse teu rosto,
A retórica
Do corpo,
Celebrando-te
A cor?
OU DIZER-TE
NUM POEMA,
Retórica
Da minha alma
Que te sofre
Em dilema
Entre o silêncio
E o canto
De tão longa
Ser
Esta nossa
Despedida?
DESENHAR-TE
Como se fosses
Flor
À medida do
Desejo,
A retórica
Da cor
Que sempre,
Ao ver-te,
Festejo?
O QUE É?
O perfume de uma
Rosa,
Branca
Ou vermelha
De cor,
Que sempre
Me enche
De ti
E me perde,
Meu amor?
DESENHAR UMA
PAISAGEM
Contigo
No horizonte,
Uma brisa
Que sopra
Suavemente
Lá em cima
No meu Monte?
O QUE É PARA TI
O AMOR?
Ouvir-te
Como minha
Sinfonia
Ou sentir o teu
Silêncio,
A secreta
Melodia?
ENLAÇAR TEU CORPO
Ao meu,
Um calor
Que inebria,
Celebrar-te
Sem parar
Uma noite
E um dia
Ou projectar
No espelho
O teu corpo
Virtual,
Celebrando
Teu perfil
Como minha
Alquimia
Num estranho
Ritual?
SABES O QUE É,
MEU AMOR?
Talvez não...
..................
De tanto te
Celebrar,
Pintar,
De tanto cantar
O teu rosto,
A beleza seminal,
Numa tela,
Num ecrã
Ou no meu triste
Mural...
................
Este amor
Pode até ser
Negação...
SAI DE TI
E deixa-te ir,
Vagueia
A vida
Com alma,
Não celebres
Com tristeza
Cada tua despedida
Como se o tempo
Parasse
Para não seres
Esquecida...
SAI DE TI, SIM!
Procura
O que o mundo
Te dará
Pois essa será
A tua certa
Medida...
AMOR TALVEZ SEJA
O perfume
De uma rosa
Em gestação,
“Brando odor que
Nela habita”,
Cor intensa,
Forma bela,
Palavra que
O poema
Sempre hesita,
Mas interpela
Em versos que
Te destilam
Verdade
Quando a vida
Se resolve
Na escrita...
...................
De uma tão funda
Saudade!

PINTO-TE COM PALAVRAS!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Chakra”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2019.

Chakra. Jas. 01-2019
POEMA – “PINTO-TE COM PALAVRAS!”
TU PINTAS-ME... Eu bem sei, Gastas a alma Na cor E nos riscos Que te fazes Para assim Me compor, Elevar em Catarsia, Parar a dor Que te canto, Choro triste, Poesia. “- E TU CANTAS Meus pobres Traços, Euforia De paisagens, Rostos perdidos No tempo, Cores que Tapam A tristeza De te perder Para sempre Como minha Melodia”. SIM, EU CANTO Todas as cores Com que te pintas A vida, O que te nasce Das mãos Sempre já em Despedida... E CANTO As minhas dores Com essas palavras Gastas Que são como Os sabores Com que tempero O destino De ti sempre Tão ausente Como laico Do divino! SIM, EU CANTO A vida Sem a tinta Que é, afinal, Um desejo... Flui-te das mãos, Expõe-te a alma (Um lampejo!) Ao poeta Que te pinta Em versos Como cometa Que nasce E morre Consigo Como frágil Borboleta Que perdeu O seu abrigo... PORQUE DESENHAS A alma Com silêncio Que tu logo Cobres De tinta P’ra que eu já Não te veja Em meus versos Enganados E, assim, Já não te minta... MAS EU VEJO-TE Sempre Num poema Para além da Tua cor, Por isso vivo Em dilema: Sou poeta ou Pintor? SE TE PINTO, Cubro O silêncio De cor, Se te canto Sou eu mesmo... .............. Um poeta, Fingidor!
ESTA NOITE EU SONHEI-TE…
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Regresso a Pasárgada”. Original
de minha autoria para este poema. Dezembro de 2018

“Regresso a Pasárgada”. Jas. 12-2018
POEMA – “ESTA NOITE EU SONHEI-TE…”
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE...
....................
Já passara
Tanto tempo
Que parti
Do meu nordeste,
Do jardim do
Paraíso!
COMO SE NA
VASTIDÃO
Do espaço
Entre o sonho
E tua vida
Não houvesse
Essa tristeza
De tão longa
Despedida...
QUE ESTRANHO
ESTE SONHO,
Pois julgava-te
Perdida
Lá no fundo
Da memória,
Onde a imagem
De teu rosto
Não me fosse
Devolvida!
AH, QUE BOM
SONHAR-TE,
Recriar
O que perdi,
Virar tudo
Do avesso,
Reviver
O teu sorriso
E ficar-me
Por aqui!
ESTA NOITE
EU SONHEI-TE
E gosto
De o dizer,
É como ter-te
A meu lado
Para não mais
Te perder
Porque nasci
P’ra te amar...
...................
Esse dom
Que faz sofrer!
AH, QUE SONHO!
Ficou-me colado
Ao corpo
Mesmo quando
Acordei,
Foi um prazer
Infinito,
Pois tinha
O doce sabor
De alguém
Que eu amei.
SONHEI-TE,
Senti-te
Dentro de mim...
.................
Mas eu não sei
Por onde andas,
Se te ganhas
Ou te perdes...
..............
E esta dor
Não tem fim...
PERDI-TE
De modo diferente,
Bem sei,
Porque nunca
Te encontrei
Na ponte
Desse teu rio
Que eu nunca
Atravessei.
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE...
...........
Voltaste
De longa ausência,
Voltas sempre,
Sim, eu sei,
Porque de mim
Não saíste,
Do dia em que
Te encontrei.
MAS PARECE
Que te esfumas
No poço fundo
Do tempo,
A tua imagem
S'esbate
Nesta retina
Já gasta,
Tua voz é
O silêncio
Deste som
Que me consome,
Teu olhar
Fica cerrado
Para nunca mais
Me ver,
Braços caídos
No corpo
Para não me
Abraçares
Nem que seja
Na memória
Do que nos sobra
Da vida!
É ASSIM QUE
EU TE SONHO,
Vendo-te um pouco
Perdida,
Comigo sozinho
No cais
Com a alma
Adormecida,
Porque daqui,
Deste meu
Sonho,
Tu já não sais,
No resto da
Minha vida!
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE
Porque estás
Longe de mim,
Não foi por
Vontade minha,
Foi a vida,
Foi assim...

ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Dame mit Ohrring”. Original
de minha autoria para este poema.
Dezembro, 2018.
Exactamente há um ano, publiquei o poema “Teus Olhos”, agora
recriado sob a mesma inspiração, mas ilustrado, não com “Dame
mit Muff”, de Gustav Klimt, que aqui evoco e invoco, mas por este
quadro de minha autoria. O percurso de um ano, aqui plasmado,
quarenta e cinco desenhos depois, de um atrevido aprendiz de pintor
que, em grave estado de necessidade poética, se lançou na ousada
aventura de ilustrador da sua própria poesia!

“Dame mit Ohrring”. Jas. 12-2018
POEMA – “ENCONTRO”
CHEGASTE SÓ,
Rápida,
Deusa
No jardim,
Asas nos olhos,
Um horizonte
Sem fim...
A LUZ MORNA
Do entardecer
Deu brilho
Ao macio
Do teu rosto
Para o embelecer
Na penumbra
Que descia
Nesse cair
De sol-posto.
TUDO É BELO
Em ti,
Quando te deixas
Ir,
E vais, livre,
Por aí,
Serena
E distante
Da fria rotina,
Seduzida pela cor
Que sempre
Te cativou
E há muito
Te destina...
“ – ESTÁS MODERNO,
Meu amigo!”
Disseste, com
Malicioso sorriso,
Suave porto
De abrigo
De que tanto
Eu preciso...
VI-TE LEVE
Como traço
De pintor
Em aguarela,
Livre como
Pagã divindade,
Suave e doce
Como mulher
Sedutora
Em terna
E já madura
Idade...
VIMOS MIL
Quadros
Luminosos
E vi teu rosto
Em contraluz,
Esse perfil
Que há muito
Me seduz,
Traços finos em
Deslumbrante
Harmonia...
................
Era assim
Que nesse
Entardecer
Eu já te via!
SENTI-ME SUBIR
Ao céu,
Privilégio
Inesperado
Esse dom
Imerecido...
............
Ver-te ali
A meu lado
E sentir-me
Tão docemente
Perdido...
VEJO-TE, SIM,
Às vezes,
De semblante
Carregado,
Sulcos marcados
No rosto,
Recolhida
Num silêncio
Ecoado,
Dias cinzentos
Quando a luz
Te põe órfã
Por momentos,
Em sofrida
Melancolia!
CHEGASTE SÓ,
Nesse dia,
Mas cintilante,
A transbordar
De luz
E alegria.
LI-TE NA ALMA
Com o olhar,
Respirei contigo
O mesmo ar,
Dei vida
Ao que eu já
Pressentia...
................
Nesse morno
Entardecer!
QUANDO TE VEJO,
Assim,
Em sonho,
Nestes dias
De leveza,
Posso dizer
Que te amo,
Que te toco,
Ao olhar,
Que te beijo
Na alma
P’ra melhor
Te abraçar,
Que te digo
O que não ouso,
Ao sabor
Do vento
Em cada
Amanhecer
E que acordo
Sempre
Ao relento
Sob o céu
A descoberto
Para logo,
Bem cedo,
Ao lusco-fusco,
Eu te ter...
NO REGRESSO,
Parei a teu lado,
Por uns momentos,
Olhei-te
Sete vezes,
Um movimento
Sem fim,
Repeti
O teu nome,
Olhaste p’ra mim,
Perdi-me
Do mundo,
Levei-te ao jardim,
Colhi duas rosas,
Respirei
Bem fundo,
Um acre aroma
Me inebriou,
Beijei-te no rosto,
Meu peito parou...
MAS LOGO PARTISTE
Sozinha a voar
Ainda mais bela,
Comigo a sonhar,
Teus olhos
De mel
Em rosto sereno
E sempre feliz,
De alma bem cheia,
Um perfil de deusa
Como eu te quis...
....................
Até que o teu nome
Comigo partisse
P’ra este poema
Onde te recebi
Com estas palavras
Que nunca te disse
Mas que te ofereço
No que agora
Eu (já) escrevi!

FUGA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Corpos”.
Original de minha autoria
sobre bailado de
Angelin Preljocaj para este poema.
Dezembro de 2018.

“Corpos”. Jas. 12-2018
POEMA – “FUGA”
SINTO A TUA FALTA
E como a sinto
Eu danço e danço
Até cair exausto
No palco
De um poema.
SINTO O TEU SILÊNCIO
Murmurado
E como sinto
O meu canto
É triste,
Amargurado!
MAS NÃO SINTO
A tua pele
E como não a
Sinto
Eu pinto-a
De cores intensas
Numa folha
De papel.
NÃO OUÇO
A tua melodia
E como não a
Ouço,
Nem que seja
Por um dia,
Eu caio logo
Em silêncio
Para melhor
Te sentir,
Cá dentro,
Na minha fantasia.
FAZ-ME FALTA
A tua voz,
O teu sorriso...
..................
E como
Nunca me dizes
O nome
Digo-to eu
Num poema
Tão sofrido
Que busco
Um paraíso
Onde me sinta
Perdido!
DA TUA FALTA
Nasce em mim
A orquestra
Para uma
Sinfonia,
Corpos que
Dançam
Abraçados
Ao sabor da fantasia,
Andamentos
Sem fim,
Em catarsia,
Contrapontos de
Silêncio,
Luzes e cores,
Aromas e
Flores...
..........
Neste palco
Do poema!
TU FALTAS-ME
E eu revivo-te
No canto e
Na cor,
No silêncio e
Na dor,
Na dança
E no amor,
Na poesia...
...............
Em palavras
Que lanço
Ao vento
Construindo
As paredes
Desta minha
Utopia.
TUDO RECRIO
P’ra te reencontrar
À distância
De um poema,
Cantar-te,
Dançando
Com palavras,
Dizer-te
Em silêncio
Para melhor
Ouvir
O que nunca
Me dirás.
VISITO-TE, ASSIM,
Das mil maneiras
Com que te
Procuro
E te digo,
Encerrado
Numa torre de marfim,
Nesta teia
Enredado
P’ra melhor
Te reviver,
Com a leveza
Da arte,
Cá bem mais
Dentro de mim.

I N O C Ê N C I A
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Loubotinhas”. Original
de minha autoria para este Poema.
Dezembro de 2018.

“Loubotinhas”. Jas. 12-2018
POEMA – “INOCÊNCIA”
ENTRE LIVROS
E POEMAS
Encontrei-as,
As botinhas,
Marcas puras
De infância
Que traçaram
Um caminho
Logo aos primeiros
Passos...
...............
Com o selo
Do carinho!
DEI-LHES COR,
A que pude
Encontrar
Nesta vida
De aventura,
E com ela
Eu pintei
As chegadas
E partidas,
Encontros
E despedidas
Na sua forma
Mais pura.
ENCONTREI-AS
E lembrei-me
Do dia
Em que eu
Te conheci,
Do sorriso
Que esbocei,
Da timidez
Que travei
P’ra te dizer
Do afecto
Que logo te
Prometi.
AGORA, REGRESSO
A elas,
Aos passos
Que ensaiei,
Às palavras
Que tentei...
................
Ao beijo
Que não te dei,
À tristeza em que
Caí...
É DE PUREZA
Que falo,
Meu amor,
Antes de a vida
Me pôr
Laços presos
Ao meu corpo
Que já não sei
Deslaçar
A não ser
Em poesia
Onde posso viajar
P’ra muito
Perto de ti.
COM ESTAS BOTINHAS
Eu voo
E regresso
Ao paraíso,
Posso dizer
Que te amo
E mais dizer...
...............
Não preciso!
EU GOSTO DE
GATINHAR COM
A ALMA,
Descobrir
O que não sei,
Encontrar-te
Outra vez,
Dar um passo,
Dois ou três,
Caminhar
Sempre inseguro,
Tropeçar
Quando me vês,
Cair prò lado
Escuro
Quando partes...
...................
Ou não me crês!
EU GOSTO DELAS
E por isso as pintei
Para tas oferecer,
Um sorriso
De criança
Antes de adormecer,
Um sinal
De esperança...
...................
E de tanto
Eu te querer!
REGRESSO
À inocência
E vejo-te
A partir dela
E assim já não
Te esqueço
Porque com
Estas botinhas
Posso voar
Lá de cima,
Da que foi
Nossa janela!

NA BRUMA DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Luar”. Original de minha
autoria para este poema. Dezembro de 2018.

“Luar”. Jas. 12-2018
POEMA – “NA BRUMA DA MEMÓRIA”
FUI LEVAR-TE Uma rosa Aos confins Do meu afecto. Desci fundo Na memória Onde ainda te Guardava Como se fosse Teu tecto. PROCUREI-TE Na bruma Espessa Que caía Sobre mim E quase não te Encontrei, De tão longa Despedida... ............... Uma saudade Sem fim! PERDI-TE O rasto E o perfil, Até teu nome Perdeu cor, Teus olhos Luziam, Incertos, Nesta neblina Da dor... PERDI-TE A VOZ E a tua Melodia, Quase tudo... ................ Mas, no fim, Não te perdia! PORQUE ERAS Uma ideia Que me sobrou Do afecto Que por ti Sempre senti, Construção De arquitecto Para nunca Te perder Desde o dia Em que te vi. NO MEIO DA NEBLINA Esfumava-se O teu rosto De tanto eu Te perder, Incerto O cintilar De teus olhos Que eram negros Nessa ideia De te ver. ERA BRUMA Indefinida Este meu Esquecimento, Mas sobraste Como ideia Nesse preciso Momento. E VOLTEI! Eu volto sempre! É desejo De te ver, Dar-te corpo Nas palavras Com que te quero Dizer Em cada dia, Depois de, no fim, Te perder (Eu bem sabia). AGORA, DESENHO-TE Com palavras e Com cores, Com paisagens Que tenho dentro De mim, Com rostos E com flores, Aromas, Um passeio Com pavões, Utopias, Gritos d’alma, Emoções... .................. P’ra te recriar Com magia E contigo Caminhar Lá mais no alto, Na fantasia, Onde vive Essa ideia Que procuro Quando te quero Encontrar! VOO COM UMA Rosa, Disfarçado de Insecto, P'ra te ver Ali de perto, Olhos negros, Cintilantes, Fugidios Ao fascínio Do jogo da sedução Numa noite De luar... ............ E talvez De perdição! MAS TEUS Olhos Apagam-se Na fria penumbra Da memória E, então, Pinto-os Com as cores Do arco-íris P’ra melhor Te inventar Banhada Pelo sol Nas mil gotículas Que brilham Dentro de mim, Ponte luminosa Donde sempre Te alcanço P’ra me resgatar Com flores Do teu quimérico Jardim. TOMA ESTA ROSA, P'ra que sintas O aroma Do meu estro E como, ausente, Eu te guardo Tão perto de mim!
O PAVÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Azul no Parque”. Original de minha
autoria para este poema. 25 de Novembro de 2018.

“Azul no Parque” – Jas. 25.11.18
POEMA – “O PAVÃO”
FUI AO PARQUE
Do Mar’chal,
Logo ao amanhecer,
Num triste dia
D’outono,
À procura do pavão...
...........................
Eram muitas as saudades
Pois passara mais
De um verão!
ENCONTREI-O
Por ali,
Sozinho,
Também triste
Como eu
(Ou talvez não),
E vi nele,
Ao caminhar,
As cores fortes
Desta minha
Solidão...
PORQUE É
Tão belo
O meu pavão?
Porque se exibe
E me seduz,
Me enche
A alma e o olhar
De tanta cor,
De tanta luz?
Talvez não,
Pois esse seu
Porte austero
Estranha
A minha alma
E gela-me
A emoção!
MAS SEGUI-O,
Nesse dia,
Parque fora
No silêncio
Luminoso
Da manhã...
.......................
Folhas caídas
No chão
Acolhiam
O nostálgico
Passeio
De um poeta
E um pavão...
NESSE JARDIM
Do encontro
A beleza
Despontava
Em seu ritmo
Natural...
..................
Passos lentos
E cuidados,
Pose austera,
Altivez,
Um singelo
Ritual!
CAMINHEI COM ELE
Horas a fio,
Lado a lado,
Sem destino,
Revendo
As cores que
Um dia
Te emprestou
Num jogo
De sedução
Que à arte
Te levou
Como torrente
Sensível
Ou lava
De um vulcão!
JÁ NO ALTO
De um muro,
Oráculo,
Arte pura,
Aparição,
Perguntei-lhe
Qual a cor
Da tua alma
E ele mostrou-me
(E com razão)
Esse azul
Tão luminoso
Onde sempre
Se esfumam
Os traços
Da tua mão...
...................
E logo,
E por encanto,
Eu vi
Espelhado
O teu rosto
Nas cores vivas
Do pavão!

LUA
Poema de João de Almeida Santos, inspirado no quadro de Paula Rego “O Baile” (1988). Ilustração: “Mouvement”. Original de minha autoria para este Poema (Composição sobre bailado de Jerome Robbins/Philip Glass - Ópera Nacional de Paris - 2018). Novembro de 2018.

Mouvement. Jas. 11.2018
POEMA – “LUA”
DESCI À PRAIA Da meia-lua A ver se te via Num anoitecer Que, com tanta luz, Há muito Não acontecia! ERA DA LUA-CHEIA A luz que havia, Gente que dançava Em dia de festa, De som e de cor, E se divertia! NO CLARO DE LUA Vi um rosto De mulher Que não era Estranho, Um perfil qualquer... ERAM NEGROS Os seus olhos, Boca Rúbida e quente, Pele macia Em corpo ardente, Cabelos ao vento... ..................... Vi que era ela A deusa do baile, Luz branca da lua, Espelho de mar... ...................... E logo minh'alma Procurou a sua Nesse cintilante Brilho do luar... COM ELA DANCEI, Saltei e cantei Em alegria, Respirei a fundo Essa melodia Que me inspirava Numa bela praia Em forma de lua Que me seduzia. VI O SEU SORRISO Em perfil na lua Que eu desenhei, Uma luz intensa Me alumiou Quando eu dançava Essa melodia Que p’ra mim soou. CORPO DE MULHER... Eu já nem sabia Se era ela Ou outra qualquer Com quem eu podia Erguer-me à lua Com alma despida Neste frágil corpo Pouco mais que nu. E TAMBÉM A ALMA À sua procura Era de nudez Um pouco ousada, Mas, sim, era pura Por ser nesta lua Que eu adivinhava A minha ventura... ........................ Pouco mais que nada! ONDE ESTÁ A LUA? Nessa bela praia Ou noutro lugar Onde a possa ver Espreitar a rua P'ra me enfeitiçar? ESTÁ EM TODO O LADO Onde o poema Estiver, Desenhando Com palavras Um suave rosto Que é mais de deusa Do que de mulher...

ESPELHO DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Esfera do Tempo”.
Original de minha autoria para este Poema.
Novembro de 2018.

Esfera do Tempo. JAS. 11-2018
POEMA – “ESPELHO DO TEMPO”
QUEM ÉS, Tu que ressoas Na minha imaginação Sempre que parto Para um poema? TEMPO Que flui E se gasta Dentro de mim Como memória que se esfuma? ESFERA DO TEMPO... É como te vejo Do lado de cá Do espelho Plano Onde te reflectes Cada vez mais Como espectro Intangível. TEMPO, O nosso tempo, Que desliza Silencioso, Implacável, Como esfera De fogo, Meteorito Incandescente Sobre o jardim Das magnólias Encantadas Que me hão-de Renascer Em cíclico Retorno... E EU VOO Atrás dele, Do tempo, Levito, Queimando-me As entranhas, Vestido de Azuis Que se mancham De nuvens carregadas Para apagar O fogo Que faísca, Intermitente, Sobre mim. ÉS TEMPO, SIM... E és passado Quando te revejo Através de um Espelho Baço e enrugado, Superfície amarela Iluminada por um Clarão ao rubro Que parece Sombrear Este presente Sofrido! MAS O MEU TEMPO, Esse, É intervalo Entre o que foste E o que serás A meus olhos Já húmidos De tanto fixar Os teus espelhos De água (Azul marinho) Em busca De uma poética Da salvação Quando me afundo Na memória Com que ainda Te tenho E te canto! DENTRO DE MIM Há, como sabes, Um fogo intenso Que me consome, Mas que só arde Por fora Porque espelhos Líquidos Me devolvem a chama De través Para não petrificar Como lava De um vulcão Aceso Que me fascine E atraia Como se fosse Borboleta... ÉS TEMPO E já não te alcanço Neste balancear Incerto Onde me gasto Em poemas Para não ficar Prisioneiro Do passado Nem de um futuro Que se anuncie Rápido a Devorar-me O presente. QUEM ÉS TU, AFINAL?

VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA
Poema de João de Almeida Santos.
Diálogo com o poeta brasileiro
e nordestino Manuel Bandeira - 1886/1968
(Poemas: “Vou-me embora p’ra Pasárgada”
e “Brisa”), pelo cinquentenário da sua partida.
Ilustração: “Pasárgada”. Original
de minha autoria para este Poema.
Novembro de 2018.

“Pasárgada”. Jas. 11-2018
POEMA – “VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA”
VOU CONTIGO P’ra Pasárgada, É outro mundo, Irmão, Eu não fico Por aqui, Falha-me A inspiração Porque a brisa Do nordeste Ficou lá No Maranhão! NÃO TENHAS, Manel, Saudades, Nostalgia do futuro... Temos passado Que baste E foi, sim, Foi muito duro! VOU CONTIGO P’ra Pasárgada Não quero Ficar aqui, Há tempestade No ar E a brisa do nordeste Não passou Do Piauí. P’RA PASÁRGADA Quero ir, Lá todos Falam verdade, Por aqui Ah, eu nem sei, Já me falta Liberdade... GOSTO DE TI, Ó poeta Do reino Da utopia, Sem passado Nem futuro, Onde se faz Poesia, Se pinta, Canta E dança Porque o ar É do mais puro E cheira A maresia! VOU CONTIGO P’ra Pasárgada, Por aqui Não fico bem, É escuro O horizonte E eu até Já me sinto Como se fosse... .................. Ninguém! NÃO GOSTO D’estar aqui, Há ruído Que é demais, Esta terra Não me serve, Eu espero-te No cais... .............. Vou contigo No teu barco, À procura De mar calmo, Céu sereno E tudo o mais, Navegando No azul, Peixes voando No mar, No horizonte Uma ilha, Mulheres lindas A acenar... EM PASÁRGADA Sou feliz Canto e Danço Na madrugada Até que o corpo Se canse Com alma Apaixonada E adormeça No regaço Da mulher Que for amada. POR AQUI OUÇO Ruído, Há armas A crepitar, Matam poemas Com gritos, Já não podemos Cantar... VOU CONTIGO P’ra Pasárgada Meu mestre De poesia, Cantarei os teus Poemas Seja de noite Ou de dia... VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA...

DUAS HORAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Entardecer”. Original de minha autoria para este poema. Outubro de 2018. (Reproposição de um poema de 2017, com adaptações e nova ilustração).

“Entardecer”. Jas. 10-2018
POEMA – “DUAS HORAS…”
OLHEI-TE NOS OLHOS! Eram negros, Intensos E tão profundos! Toquei teus cabelos Com o olhar, Caminhei a teu lado Nesse jardim, Senti o teu corpo Tão perto de mim A respirar O acre perfume Da verde Ramagem Do vasto jasmim… INEBRIOU-ME Esse intenso Aroma E eu enredei-te Em tão doce Enleio Que não tinha fim… BRILHARAM Tão docemente Duas horas inteiras Esses teus olhos... ......................... E neles me perdi! ESTIVE NO CÉU Ao lado de deus E lá vi dois sóis Que não eram dele (Uma luz intensa) Porque eram teus! MAS O TEMPO Correu Depressa Demais... .................. E é sempre assim, Todos os dias Se tornam iguais Quando tu partes E, em nostalgia, Eu fico no cais… VOLTEI A OLHAR-TE Três horas seguidas... Parecia verdade Mas era ilusão Porque partiste Deixando-me só E o que sobrou... .................... Foi solidão! SUBIU A TRISTEZA, A saudade irrompeu Colou-se-me Ao rosto... ............... E como doeu! SE EU NÃO TE VEJO Sinto Falta de ti, Mas se te encontro Logo te perco Porque o tempo Voa E logo te leva P’ra longe dali! TER-TE DEMAIS Aumenta a saudade E quando te vais São negras As nuvens Da nossa cidade! AINDA QUE TRISTE Eu sou feliz E com estas mãos Te vou escrevendo O que quero dizer... ........................ Mas este meu tempo Volta a correr E cresce a vontade De logo te ver Mesmo que saiba Que é nesse instante Que te vou perder… TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Desse virar Da nossa esquina, Na mesma rua Onde te vi, Dessa janela Donde espreitamos O que do mundo Sobra p’ra nós… EU JÁ NEM SEI Que hei-de fazer, Ter-te demais É puro prazer... ................... Mas quando te vais Fico a morrer! NEM SEI QUE Te diga, Ah!, meu amor, Quando me deixas Já nem sinto dor Tão grande a tristeza De já não te ter Pois tu partiste Mesmo sem querer! OLHEI-TE NOS OLHOS, Sim, meu amor, Nesse entardecer...
O TEU CORPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Penché”. Original de minha autoria para este Poema sobre um bailado na Royal Opera House. Outubro de 2018. Nota: “Penché” é o nome que designa a posição que, em dança, continua o “Arabesque” e é a que se vê neste quadro.

“Penché”. Jas. 10-2018
POEMA – “O TEU CORPO”
HÁ POESIA No teu corpo... Alma geométrica Que se desenha No espaço Para te contar Sem palavras, Contraponto silencioso E expressivo Da tua melodia. HÁ MÚSICA No teu corpo... Pauta Da beleza Que levita, Instável, Entre cores, Desenhando Enigmas Que só o Poema Pode decifrar... TENS A ALMA Inscrita No corpo, Como eu a Tenho nas palavras Que roubo Ao poema inatingível Que procuro, Incansável, Como minha utopia... VEJO-TE Como letra De uma canção Que vou cantando Na minha subida Ao Monte, Porque o vale Já não me chega, Nem tu chegas, Pois partiste Em busca dos palcos da tua vida... MAS EU RESPIRO, Com o poema, A tua dança, Ao longe, Em forma de Letra No discurso da Beleza Em que nos vamos Enredando Como em teia Que prende E nos liberta... E PROCURO-TE Na pintura, Fixo-te Para te cantar Quando a noite Cai sobre mim E mergulho Na solidão Do silêncio Com que, de longe, Me falas. VEJO-TE Num bailado A solo, Dançando, Dançando, Para que te cante Num poema, Ao ritmo do Corpo E da alma Com que te Vais desenhando Nas telas Da tua vida. E, NO FIM, Rogo-te Que não pares O teu silencioso E longínquo Bailado Solitário Até que eu te Desenhe Em palavras Para que nelas Te revejas Como se fossem O espelho Encantado Da tua alma!
A TEIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Pas de Deux”. Original de minha autoria para este poema (sobre um “Pas de Deux” na Royal Opera House - Londres). Outubro de 2018.

“Pas de Deux”. Jas. 10-2018
POEMA – “A TEIA”
JÁ GASTEI Todos os poemas Cantando O que não ousas Ouvir. Já me fogem As palavras E fico mais Pobre de ti! JÁ NEM SEI Se é silêncio Ou são notas Dissonantes Com que me cobres A suave Melodia. NEM PALAVRAS Nem cores Nem notas (Desenhadas) Na pauta Do silêncio Com que me falas... ................... Nada! AH! NEM EU Já saberei Nomear-te Na hora Da despedida, No encontro Que nunca Marcaremos Nessa baça Encruzilhada Onde sempre Te perdi! PARA QUE SERVE A poesia Se não a Sentes... Por dentro? Para que serve A pintura Se não desenhas Com a alma? Para que serve Gritar Se não ouves... Com o peito? Para que sirvo eu, Poeta, Se não te vejo... Por fora, Mesmo que te desenhe E cante... Por dentro? PARA NADA, A não ser Para celebrar O futuro De um passado Que esmoreceu Para nunca lá chegar, Perder-me Na rotina Dos ecos Silenciosos Da alma, Enganar-me Em desencontros Inventados, Ir por aí Sem saber Para onde vou, Desaparecendo Na montra Dos meus inúteis Passeios Pela arte Que desenterrei Das vísceras! AO MENOS DANÇO Em Pas de Deux Com meus Poemas Desenhados, Enredado Nos mil fios Da fértil Imaginação Do poeta pintor Que levita Sobre escombros De uma casa (Ou de um palco) Que nunca construiu... É A DANÇA Da solidão, Contigo Suspensa Nos fios Da teia Em que vou Enredando A minha vida, Até tombar exausto, Ao cair do pano... .................. Que tarda!
NEBLINA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Deusa”. Original de minha autoria
para este poema. Outubro de 2018.

“Deusa”. Jas. 10-2018
POEMA – “NEBLINA”
CRUZO-ME CONTIGO
Nas frias ruas do
Desencontro...
E não te vejo!
CAIU NEBLINA
Sobre nós...
............
Um fino véu
Translúcido
Desce
Sobre o meu
Rosto
Quando te
Pressinto!
ESVAI-SE
A nitidez
E regresso
À memória
Onde ficou
Gravada
A ideia
De ti,
O retrato
Imaterial
Que desenhei
Na fina tela do meu
Imaginário,
As cores intensas
Que te iluminam
E quase me
Cegam....
................
Por dentro.
CRESCES
Em mim,
Mas diluis-te
Por fora
Como espectro
Que se esgueira
Na fria bruma
De um entardecer,
Sem deixar rasto.
DA TUA IMAGEM
Física
Restam-me
Ténues riscos
De um rosto
Em aguarela
Inacabada
Que desmaia
No tempo
Que passa,
Veloz.
POR FORA,
O azul é cinzento,
O sol é sombra
E a luz já nem
Atrai
As borboletas
que lhe voam longe.
O som emudece e
O tempo pára.
A vida já só
É passado.
Arrefeceu.
Petrificou!
MAS HÁ UM
Contraponto
Luminoso!
Lava ao rubro,
Quente,
Jorra em mim
E inunda-me
A imaginação.
O sol
Acende a tua
Imagem irreal...
................
E então ganhas
Perfeita
Nitidez,
Cor exuberante,
A forma
De uma deusa
Luminosa.
Até o silêncio
Fala
E nele
Ouço, por dentro,
A tua
Encantatória
Melodia.
REACENDE-SE
Vida
Na minha
Imaginação
E eu recrio-te
Para voar,
Em fuga,
No teu azul
Até ao infinito...
.....................
E não mais
Voltar
Às frias ruas do
Desencontro.

Pas de Deux
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Coreógrafo”. Original, de
minha autoria, para este poema.
Setembro de 2018.

“O Coreógrafo”. Jas. 09-2018
POEMA – “Pas de Deux”
SOU COREÓGRAFO
Da minha alma,
Desenho-me
No espaço,
Embalado
Pela suave
Melodia do teu
Silêncio...
IMAGINO-ME,
Às vezes,
Num "pas de deux”
Contigo
Num palco
Em noite
De luar
Ali, na praia
Da meia-lua,
A dançar
O murmúrio
Desse mar
Com que te
Pintas
E ouves
Dentro de ti!
DANÇO
Com palavras,
Suspenso no ar
Pelos fios
Dos poemas
Com que
Teimosamente
Ilumino
Os caminhos
Por onde nunca
Ousas passar...
O SILÊNCIO É A TUA
Sinfonia,
O teu canto
De sereia,
A melodia
Que ressoa
Nesse mar
De linóleo
Onde me desenho
No suave
Bailado,
A solo,
De uma infinita
Despedida...
GOSTO DESTA
DANÇA
Espectral,
Contraponto
Dos sinais
Invisíveis
Com que pontuas
A tua assinalada
Ausência.
E CANTO-TE, SIM,
Mas, neste meu
Cantar,
Eu conto-me
Como espelho
Onde podes
Rever
O passado
Desse futuro
Que nunca
Existirá.
AGORA, SOZINHO,
No linóleo,
Ao pé da praia
Da meia-lua,
Acendo um sol
Com minhas mãos
E procuro
O que nunca
Encontrarei...
...............
A não ser
Sombras
De mim próprio
Gravadas
Na areia
Da baixa-mar.
POR ISSO, DANÇO,
Canto e
Pinto
Em contraponto,
Livremente,
Com a melodia
Interior
Que toma
Conta
De mim
Sempre que um véu
Protector
Desce sobre
O meu rosto
Para apenas
Pressentir a tua
Silhueta,
Quando
Atravessas,
Atarefada,
A rotina
Dos teus dias.
ESTE,
O que te celebra
Em arte,
Já não sou eu,
Mas o coreógrafo
Da (minha)
Melancolia!

É OUTRA, A JANELA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Outra Janela”. Original de JAS
para este Poema. Setembro de 2018.

“A Outra Janela”. Jas. 09-2018
POEMA – “É OUTRA, A JANELA…”
DESTA JANELA
Não te vejo!
Há um caminho,
Uma silhueta
Que se insinua,
Mas não sei
Onde me leva...
SÓ SEI QUE
Parto,
Com o olhar,
De um viçoso
Canteiro
Verdejante
Onde as camélias
Me apontam
Um incerto
E sedutor
Destino,
A levante...
SIM, HÁ SEMPRE
Uma outra janela
De onde ver
O mundo...
.................
Mas nesta
Não te vejo
Sequer como perfil,
A nascente.
VEJO, SIM,
Uma rua
Ou um rio,
Um traçado sensual,
Marcas
(Invisíveis)
De passos remotos
Escritos na água,
Um recanto liberto
Do presente,
Um caminho
Onde ninguém
Cruzou
Afectos
Para se despedir
Do que nunca
Ousou...
É OUTRA JANELA!
Não é a tua
Nem a dela,
Debruçadas sobre
A montanha
Ou sobre o mar!
É outra
De onde nunca
Verei
O teu rosto,
Porque dela,
A levante,
Lá onde nasce
O sol,
Chega uma luz
Que me cega
De tanto brilhar...
É A INTENSA
Luz do dia
Que nos convida
A viver, sim...
....................
Mas o poeta
Dobra-se
Em si,
Com metódica
Timidez,
Para alcançar
Uma luz interior
Que o ilumine...
Sem cegar!
ENTENDES?
O mundo,
Quando acorda,
A nascente,
Ou entardece,
A poente,
Muda de cor
E de luz,
Mas vê-se sempre
Duma janela...
.............
E eu, a ti,
Vejo-te sempre
A sul,
Uma parábola
Entre o nascer
E o entardecer...
Quase como
Um destino!
SIM, TUDO DEPENDE
DO OLHAR,
Bem sei...
Se te vejo
Ou não te vejo,
Se na janela
Me revejo
Ou te descubro
Olhando
O horizonte
Através das palavras
Com que há muito
Eu te digo...
MAS SABES PORQUE
NÃO É TUA,
Esta janela?
Porque nela
Te veria
De cima para baixo,
De um lugar
Que não é meu
Porque sempre
Foi teu,
Um lugar cimeiro.
E EU CANTAVA-TE
Cá de baixo,
Deste meu lado
Da rua
Com a alma
Cheia,
Mas nua,
Para me poder
Vestir de
Ti.
PERDI-TE,
Como sabes,
Porque nunca tive
Uma escada
Para te alcançar...
E, AGORA,
Há camélias,
Aqui.
Bem as vejo
Cá de cima,
Perto de mim.
Há um canteiro
Luminoso,
Talvez uma
Escada, sim...
............
Mas para ver
Mais longe!
Há um recanto,
Um caminho,
Há cor
E há palavras,
Uma silhueta
A apontar
O sentido...
.....................
Mas eu não te vejo
Ao pé de mim,
Nesta janela,
A olhar a esquina
Que nunca ousámos
Dobrar...
HÁ SEMPRE OUTRA...
Janela!

AZUL
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Paraíso”. Original de minha autoria
para este Poema. Setembro de 2018.

“Paraíso”. Jas. 09-2018
POEMA – “AZUL”
TANTO AZUL,
Meu deus!
O teu céu,
Esse imenso mar,
É espelho
Dos teus sonhos,
Medida do teu
Olhar.
O MEU É BRANCO
E cintilante
Para te alumiar
Na noite escura
Onde brilham
Gotículas salgadas
Nos teus olhos,
A navegar...
OUVE-SE
O suave murmúrio
Das ondas
Que abriga,
Como véu
Translúcido,
O estranho silêncio
Que há muito
Ouço,
Insistente,
Com a alma
Dorida do
Poeta que me
Habita.
QUANDO, NOS
SONHOS,
Ao longe
Te entrevejo
Vestida de azul
Turquesa,
Entro numa porta
Branca
Que me leva
Directamente ao
Paraíso...
...................
E nele voo, voo,
A perder de vista,
Deixando para trás
O jardim
Inacabado,
Porta escancarada,
Bailéus desenhados
A rigor,
A preto e branco,
De onde
Um dia
Te vi
E cantei
No meu primeiro
Poema,
Num estranho
Enlace
Que não tem
Fim...
NOS SONHOS,
(Em todos eles)
Caio das nuvens
Brancas
Como Ícaro
Ou meteorito
Incandescente
E quase me afogo
Nesse frio azul
Até te encontrar
No coral
Luminoso
Onde vives
Vestida de todas
As cores
Que povoam
A cidade
Dos poetas...
MAS É ESSE
Teu azul
Profundo e
Denso,
Que respiro,
O que me sobra
De ti,
Nos sonhos
Escritos
E pintados
Com que te
Vou soletrando
Lentamente...
Até cair exausto
E adormecer
No regaço
Da tua alma.

SEGREDO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Meteorito". Original de minha autoria para este Poema. Setembro de 2018

“Meteorito”. Jas. 09-2018
POEMA - "SEGREDO"
VOU CONTAR-TE
UM SEGREDO:
Amei-te
Em poesia!
As palavras eram
Graves,
Mas sempre cheias
De cor,
Com rimas
Muito suaves
E melodia
Com dor...
.........
Com tudo
O que de ti
Me sobrou...
...........
Meu amor!
CONTEI-TE HISTÓRIAS
De desencontros,
Dancei
Com palavras
Luminosas
Que inventei
Para por dentro
Te ver
Nesse quintal
De rosas
Que cultivas
No teu peito.
CANTEI
Para te aquecer
Na fria dança
Do silêncio
E contigo levitar,
Voando,
Invisíveis,
Sobre ruas
E praças,
Ao luar...
................
E, depois,
Pela manhã,
Um arco-íris
Erguer
Como ponte
Desse vale
Exuberante
Onde sempre
Te sonhei...
Neste meu
Entardecer.
SONHEI,SIM,
Alheio ao bulício
E ao cochichar
Indiscreto
Dos que não sabem
Voar...
AH!, QUE SONHO ESSE...
.................
Mas sei que não
Pousaram
No parapeito da
Tua janela
As palavras
E que alguém te
Contou
Que andavam
Borboletas
No ar,
Esvoaçando,
Perdidas,
À procura de pólen
Nos jardins
Verdejantes das
Nossas vidas...
E TU PERGUNTAS,
Agora,
Se ainda vivem,
As borboletas
De vida breve,
Se regressam
Ou já pousaram
Noutro jardim,
Se há pólen,
Se há vento
Ou pensamento
Que as traga
De volta
Desse incerto
Confim...
E EU RESPONDO
Que o seu destino
É o brilho deste céu
Que ainda vive
Dentro de mim.

MAGIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “Magia”.
Original de minha autoria, para este Poema.
Agosto de 2018.

“Magia”. Jas. 08-2018
POEMA - "MAGIA"
OLHO A MONTANHA
De uma porta
De granito
Amarelo
(O de sempre,
Muito belo,
Com cristais)
Sobre o ocre
De um telhado
Como se fosse janela
Do meu palácio
Encantado
(Que do sonho
É o cais).
CONTEMPLO A SERRA
De sempre,
Mas é diferente
A visão,
Antes, eu via futuro,
Agora, vejo passado,
Essa bela ilusão
De te ter sempre
A meu lado.
ENTRE PASSADO
E FUTURO
Sempre foi
Identidade,
Ficou quieta
À minha espera
Quando dela
Eu parti
Ao encontro
Da Cidade.
SUA FRONTEIRA
É o céu,
Abóbada sideral,
Sinto-a
Dentro de mim
Como fonte
Seminal,
Espelho da minha
Infância,
Um horizonte
sem fim,
Forte raiz
Comovida
Que eu tive
De deixar
No duro jogo
Da vida.
ELA É PORTO
De abrigo
E é lugar de
Partida.
É, pois, mais
Do que janela...
.................
É fronteira
Que passamos
Quando a vida
Se revela.
É UM ETERNO RETORNO,
Um regresso
Renovado
Onde posso
Renascer
Quando recrio
A memória
Do que não
Quero perder
Sem ter ficado
A teu lado.
ESTA PORTA
É MAGIA,
Viajo através dela,
Dou asas à fantasia
Como se fosse
Janela
De onde voo
Com o vento
Nos versos destes
Poemas
Que, sem ti,
Me dão alento.
DELA VOEI
Para o mundo
E o mundo veio
Até mim...
......................
Quando passei
Esta porta
Já era um mundo
Sem fim...
POR ISSO REGRESSO
A ela,
Esse pilar
Do meu ser...
..............
Quando chego,
Amanhece,
E, se parto,
Nem sinto
A despedida
Porque dela vejo
O mundo
Como a montanha
Da vida.

A OFERTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Natureza Morta". Agosto de 2018. Original do autor para este Poema.

“Natureza Morta”. JAS. 08-2018
POEMA - "A OFERTA"
DO ENCONTRO IRREAL
Que aconteceu
Nesse tão cinzento
Dia
Quis libertar
O meu ser
Sem saber se
Conseguia.
Corri, então,
Junto ao mar
À hora da maresia...
SALTEI, DANCEI,
Respirei
Com a brisa
Que fazia
E libertei
O meu corpo
Da opressão
Que sofria...
FICOU O CORPO
Sozinho,
À deriva, nesse dia,
Mas no regresso
Da praia
Eu vi-te
No meu caminho...
....................
Milagres da fantasia!
LOGO TE FIZ
Um poema
Pois correr
Já não chegava,
Pus palavras
A sorrir
Quando a alma
Regressava!
FUI COM ELA
À Montanha
,
Quis trazer-ta
Num cabaz...
...............
Colhi frutos
Lá no alto
Guardei-os junto
Do peito
P’ra esse encontro
Fugaz
Que eu queria, sim,
Perfeito!
LEMBRAS-TE BEM
Dessa cesta,
Dos frutos que
Nela trazia?
Vinham todos
Da Montanha,
Traziam consigo
Alegria!
ESSES FRUTOS ERAM
Poemas
Que não podia
Cantar,
Derramavam seus
Aromas
Em palavras de
Embalar
E contavam
Mil histórias
Que te faziam sorrir...
......................
Era oferta singela
De quem só te
Queria sentir!
NA CESTA HAVIA
Estrelas
Às centenas,
vermelhinhas...
..................
Não viste nelas
Cintilas
Que voavam
Tão juntinhas?
ERAM MIL CORES
E aromas
Que desses frutos
Brotavam,
Colavam-se
À minha pele,
Mas era por ti
Que passavam!
PARTISTE COM ELES
Ao colo,
Rápida, sem me olhar,
Não esperava protocolo
(Tu bem sabes),
Mas foi grande
O meu espanto
Desse teu estranho ar!
SÓ À NOITE ME DISSESTE
“- Obrigada, meu Amigo,
Esses frutos
Que me deste,
Tão belos e tão gostosos,
Não serão
O teu abrigo”!
P'RA ME CURAR
Da estranheza
Fui correr
Em poesia,
Cantei em rima
Poemas,
Resisti bem
À tristeza
Sem a tua companhia
Pois sempre em
Meus versos
Ecoa
Uma tua melodia!
CUREI O CORPO,
Não a alma!
Essa ficou
Presa em ti,
Ninguém pode
Devolver-ma,
Mas, assim, não te
Perdi!

ESTRANHA ENCRUZILHADA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “A Rua”.
Original do autor. Agosto de 2018.
"A Rua". Jas. 08/2018
POEMA - "ESTRANHA ENCRUZILHADA..."
CRUZEI-ME CONTIGO
Numa esquina
Da vida
Nesta rua
Onde reinventei
Uma estranha
Despedida!
NÃO TE VI
Como te via
Da janela
Sobranceira
Quando passavas
Na rua
Abraçada
À beleza,
Teu perfeito
Avatar
Numa nova
Encruzilhada
Que o tempo
Quis desenhar...
SE TE VI,
Mas eu não sei,
Foi duma janela
Vidrada
Que me devolveu
A imagem
Como espelho
De uma fada
Onde te fui
Visitar!
MESMO ASSIM
ESTREMECI...
Pressenti-te
Sem te ver,
Fugidio
Ao olhar
Indiscreto
De um acaso
Tecido pelo
Destino...
AH! DEPOIS
SEGUI
Com a alma
Essa tua silhueta
Embaciada...
Pensei
Que não ia
Por ali
No meio
Da multidão,
Que não te via
Por falta
De nitidez
Do meu campo
De visão,
Que não te reconhecia
Nessa rua paralela
Onde todos
Nos cruzamos,
Indiferentes
Ao que já
Nem vemos nela!
ANÓNIMO
Me assumi
Como essa gente
Comum
Que se cruza
No caminho
Sem jogar
O seu destino...
SENTI TRISTEZA
Profunda,
A alma
Petrificada
Com lágrimas secas,
Das que
Não saem de nós,
Não banham
O nosso rosto,
Dor íntima,
Dor atroz
Cravada no peito
Lá bem fundo,
Perdida,
Já sem voz
Nem a melodia
Com que cantava
O rio
De que tu eras
A foz.
QUE ESTRANHA
Sensação!
Caminhando
Lado a lado,
Perdidos
Num horizonte
Que se esfuma
Até nos engolir
Como espuma
Que se desfaz
Na areia branca
Da praia...
ATÉ QUE CHEGUEI
A estas palavras
Escritas na água
Remexida pelo vento,
Também elas
Esmorecendo
Na praia
De um lamento
Porque sigo
Outras ondas
Noutras rimas
Em poemas errados
Ou simulados
Para dar voz
Ao poeta triste...
MAS GOSTEI
De olhar
Sem te ver,
Apenas imaginando
Que eras tu,
Regressada dos confins
Da minha memória...
E GOSTEI
Que me visses
Sem me olhar,
Pensando
Que nem sequer
Me pressentias,
A mim,
Esse anónimo
Que te seguia
Para logo
Te perder...
TUDO TÃO ONDULANTE,
Tão dolorosamente
Normal,
Estranhamente
Banal...
......................
Que até este poema
Espanta
Por cantar
O que nunca
Aconteceu!
QUE EXERCÍCIO
Foi este?
Crueldade
De um destino
Apenas imaginado?
Indiferença fatal
Que se torna
Irreversível
Como ferida
Que não cura
E dor
Que dissolve
Como espuma,
No poema,
As palavras
Com que ainda
Te digo?
AFINAL, QUE TE FIZ,
Meu amor,
Para te perder
Assim,
Ao entardecer,
Numa encruzilhada
Da rua
Que reinventei
Para te cantar
Como melodia
Para quem já
Não me ouve?

POR CAMINHOS PARALELOS…
João de Almeida Santos
Ilustração de minha autoria. Julho de 2018.
“Uma Casa no Jardim”. JAS. Julho, 2018.
POEMA
POR CAMINHOS
PARALELOS
Nos seguimos
Ao infinito,
Pintei o meu
De vermelho
Mas o teu
É mais bonito!
GASTEI
As minhas palavras,
Gasto as cores,
Eu já nem sei,
E porque o silêncio
É de ouro
Só às palavras
Cheguei.
Mas tirei-lhes
Logo o som
Por saber
Que te doía.
O silêncio
É, pois, o rei
Até que te veja,
Um dia...
A ESTES SENDEIROS
Cheguei
Quando eu te
Conheci,
Foram-se anos,
Bem sei,
Desde o dia
Em que te vi...
SÃO CAMINHOS
PARALELOS,
Nisto, naquilo,
Sei lá...
Mas estás
Do outro lado,
Eu não te vejo
Por cá,
Na rua do
Desencontro
Que ficou
Muito vazia
Desde que tu
Foste embora
Dessa forma
Inesperada
Como eu, sim,
Já previa...
O HORIZONTE
Que vejo
É o ponto
Destas linhas
Paralelas,
Convergimos
No olhar
Mas não caminhamos
Por elas
Porque a vida
Nos tirou
Da rua
Das aguarelas!

O SILÊNCIO DO POETA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Vermelho”. Quadro de
minha autoria. Julho de 2018.
Vermelho. JAS. Julho de 2018
O SILÊNCIO DO POETA – POEMA
O SILÊNCIO DO POETA
É dito em poesia
Como canto
Em surdina
Do que não
Pode calar,
Do que sente
Mas não diz
Se conjuga
O verbo amar.
SUA DOR VEM
Do silêncio
E chega à poesia.
Nela o poeta
Diz mais
Do que pode
E não devia
Porque sofrendo
Em excesso
Em sua dor
Não cabia.
E FALA COM O
Silêncio,
A fala da poesia.
Diz tudo
O que nela cabe
Em suave melodia,
O que só
A alma ouve
Dessa triste
Sinfonia...
SEU SILÊNCIO
É poesia...
...........
No cantar
É que ele sente
O que dizer
Não podia.
DIZ, POIS,
SEM O DIZER.
É outra coisa
Que diz.
Sofre em silêncio
O poeta
A dor
Que lhe vem
Lá da raiz
E que só o verso
Cura
Sem que o faça
Feliz.
OUTRO SILÊNCIO
É o dela
Que nem lhe manda
Sinais...
.................
“ - Não importa”,
Diz-lhe ele,
“Dentro de mim
Vives mais”.
O CANTO
DESTE POETA
Do silêncio
É o selo,
Sua vida é
Em verso,
Não é fria
Como gelo.
Seu canto
É em surdina,
Só o ouve
Quem o lê
Mas com luz
Que ilumine
Aquilo que
Não se vê.
ASSIM O VATE
Persiste
Nesse sol
Que irradia
E se o silêncio
É gelo
Derrete-o
Com fantasia,
Pois se a vida
É de dor
Conjuga-se
Em poesia...

A MAGNÓLIA ENCANTADA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração – “A Magnólia Encantada”. Original de minha autoria. Desenho e Poema sobre Magnólia. Julho de 2018
A Magnólia Encantada. JAS. Julho de 2018
"Una magnolia / pura, / redonda como un círculo / de nieve / subió hasta mi ventana / y me reconcilió con la hermosura... ...Como / cantarte sin / tocar / tu / piel puríssima, / amarte / sólo / al pie / de tu hermosura,/ e llevarte / dormida / en el árbol de mi alma, / resplandeciente, abierta, / deslumbrante, / sobre la selva oscura / de los sueños” Ode à Magnólia – Pablo Neruda

A MAGNÓLIA ENCANTADA – POEMA
ERA UMA VEZ Uma magnólia Encantada, Como num sonho, Uma fada Em busca Do que perdera No jardim Onde morava... FLOR EM FORMA DE PEIXE No profundo Oceano da vida À procura das raízes De uma estranha Despedida... TRAZIA CONSIGO Um inocente Espanto De ter ficado Tão só, De repente... ................ Por encanto! PARTIU, LEVOU COR E muita luz Que seu corpo Alumiava Nesse caminho Estreito Que a dor Incendiava... DEIXOU O JARDIM, Mar adentro, Água seminal, Em forma de peixe, À procura Do que perdera Em recife de coral... MAS ENCONTROU-TE À TONA, Vagueando Nesse mar Da tua vida, Cores e Riscos Como remos, Em busca da Praia perdida... REGRESSOU... Vinha triste De não te poder Resgatar Nesse dia, No alto mar! VOLTOU, Mas era tarde Demais. Já não te via Remar... ................. E então deu-se De novo Ao mar A ver Se te encontrava Nalguma praia Deserta P'ra te redimir Com essa arte Divina Em que já te via Incerta... FOI À PROCURA DE CORES, Eram muitas E vibrantes, Encontrou-as No jardim, Essas luzinhas Brilhantes... E LÁ FOI E anda ela, Umas vezes Como peixe Outras Como aguarela, Sempre À procura de ti, Levada Pela corrente, Por aí, Com ar tímido, D’espanto, Até que um dia Te encontre, Talvez triste, Na praia Do teu recanto! ENTÃO DEIXA-TE AS CORES E regressa À sua melancolia. É flor em mutação, Cada dia, No tempo Em que germina, Renovada, A raiz da nostalgia... MAGNÓLIA ENCANTADA Num poema E na pintura... ................ Assim te vou Construindo como Fada Que me cura!

O BEIJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração original do autor – “O Beijo”. Dia Internacional do Beijo: 6 de Julho, o dia que celebro, com um poema, cada ano. Inspirado no Thomas Mann de “Lotte in Weimar” (1939), a obra que continuou "Werther” (1774), de Goethe (1749-1832).

“O Beijo”. JAS. 6 de Julho de 2018.
1.
Thomas Mann:
“Ist die Liebe das Beste im Leben,
so in der Lieb das Beste der Kuss
– Poesie der Liebe...”. “Kuss ist Glueck,
Zeugung Wollust”.
“O amor é o melhor na vida,
assim, no amor, o melhor é o beijo
– Poesia do amor...”.
“Beijo é alegria, procriação é luxúria”.
2.
Inspirado também em Kafka, Shakespeare e Bernhardt:
“Geschriebene Küsse kommen nicht an ihren Ort,
sondern werden von den Gespenstern
auf dem Wege ausgetrunken”
- Os beijos escritos não chegam ao destino, mas são bebidos pelos fantasmas
ao longo do trajecto - Kafka
“If I were to kiss you then go to hell, I would.
So then I can brag with the devils that I saw
heaven without even entering it”
- Se para te beijar devesse, depois,
ir para o inferno, fá-lo-ia.Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos,de ter visto o paraíso
sem nunca lá ter entrado - Shakespeare.
- O primeiro beijo não é dado com a boca,mas com os olhos – O. K. Bernhardt.

O BEIJO
FOI O QUE NUNCA TE DEI
A não ser com o olhar!
O primeiro, esse beijo,
Dei-to, pois, sem te tocar!E DEI-TE MAIS, COM PALAVRAS,
Quando olhar já não podia...
Foste embora, não estavas
E eu, triste, não te via!FORAM BEIJOS QUE SONHEI
Na rotina dos meus dias
E desejos que enfrentei
Quando tu mais me fugias...Mas dou-te beijos escritos
Que se perdem no caminho...............................
E se o poema me falta
Fico ainda mais sozinho!É ALEGRIA D'AMOR
É suave respirar,
É encontrar-te no céu,
É vontade de te amar,É desejo, é procura,
É sinal e é mensagem
É razão suficiente
P’ra te ter...................Como paisagem!O BEIJO É EMOÇÃO,
É razão descontrolada,
Se não for dado a tempo
Pouco mais será que nada!SEM BEIJO NÃO HÁ AMOR,
Sem Amor perde-se o Beijo.
Nada tem qualquer sentido
Se me faltar o desejoPor te ter, assim, perdido!AQUI O LANÇO AO VENTO
P’ra que atinja como brisa
E suave melodia
Esse rosto que precisa
De afecto em poesia!ESTE BEIJO QUE ME FALTA
De que nunca fui capaz
Voa p’ra ti em palavras
Põe-me sereno, em paz,E desejo que, no trajecto,
Voe, voe em grande altura...
.............................
Que fantasmas não o bebam
E minha dor tenha cura!Mas sei dos escolhos da via,
Dos perigos que ele corre................................
Capturado por fantasmas
É mensagem que me morre!
NO DIA DO BEIJO É HORA
De te cantar em voz alta
A poética do amor
P’ra redimir essa falta
E pôr fim à minha dor!E PORQUE O DIA É TEU
Ganha força, intensidade,
E mesmo que fantasmasO bebam
É um Beijo de verdade!ESSE BEIJO QUE NÃO DEI
Foi pecado original,
Hei-de sofrê-lo p’ra sempre
Como chaga corporal!Não há palavras que bastem
P’ra repor o que não dei
Elas voam, mas não chegam
E mesmo assim eu tentei!É CERTO QUE SEMPRE O QUIS,
Só que nunca to roubei,
A culpa foi desse tempo,
Dos dias em que te amei,
Um tempo em diferido
Sem presente nem futuro,
Talvez beijo sem sentido
Porque queria do mais puro,
Tangendo eternidade
Às portas do Paraíso,
Um beijo de divindade...
.........................
Mas simples... Como um sorriso!ESSE BEIJO IMPOSSÍVEL
Que não é do foro humano
Vou tentando construí-lo
Cada dia, cada ano,
Perdendo-me pelo caminho
Como sagrado em profano!

BIANCO&NERO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “Bianco&Nero”. Original
do Autor para este poema. Julho de 2018.

Bianco&Nero. JAS, 2018.
ENTRE O BRANCO
E O NEGRO
Quis desenhar
A tua alma
Na flor que,
Num acaso,
Encontrei, perdida,
No jardim
Da minha vida...
ATRÁS DE TI,
Ou em fuga,
Já nem sei,
Gastara
Todas as cores do
Arco-íris
Que tinha
Dentro de mim.
SOBRARA-ME
Uma marmórea
Nébula negra
De travertino
Onde me revia
Como espelho
Oracular,
Curvado sobre mim,
Escuro na alma,
Por falta
Das cores exuberantes
Que me protegiam
Do frio glacial
Do teu silêncio.
SOPREI FORTE
Com a alma
Desnuda
E a flor branca
Foi pousar suavemente
Nesse mármore
Liso e brilhante
Da catedral
Onde te celebrava.
E FICASTE ASSIM,
A branco e negro,
Em tinta-da-china
Esparsa,
Derramada
Sob a alvura
Do sol brilhante
Em que te via...
.................
Como uma flor!
ESCULPI-TE
Como filigrana
De ouro preto
Sobre branco-pérola,
Aurífice da tua
Alma sedutora
No coração
Alvoraçado
Dessa flor
Que guardei
Com o teu nome
Gravado
Em letras invisíveis...
CRIEI PARA TI
Alvas incrustações
Sobre filigrana
Negra
Como marcas
Indeléveis
Da arte
Que um dia
Me visitou
Na celebração
Da tua beleza.
E AGORA,
A olhar para
O branco e o negro
Deste cântico
Desenhado,
Ofereço-te
Este poema
Sobre pintura
Imaculada
Onde te celebro
Com beleza
Minimal,
Na cor
E na forma,
Sem fronteiras,
E onde
Te reinvento,
Em fuga,
Como esse subtil
Fio branco
Que esvoaça,
Livre,
No marmóreo céu
Do teu altar...
A ÂNCORA, ESSA,
A sul,
Desliza
Suavemente
Sobre ti
E dilui-se na
Negra vastidão...
EVOCO-TE, ASSIM,
A branco e negro
E canto-te
Como alma em
Filigrana
De ouro preto
Em repouso sobre
O branco-pérola
Dessa flor
Que, um dia,
Encontrei
No jardim
Da minha vida...

NOSTALGIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Nostalgia”. Original
do Autor. Junho de 2018.
“Nostalgia”. Jas. 2018
RÁPIDA COMO O VENTO
Passou por mim
Essa palavra saudade
Numa rua do meu bairro
Sob o céu desta cidade.
GRAVEI-A NA
Minha mente,
Evoquei-a
Ao crepúsculo,
Com incerta
Nostalgia…
…………………………
Não queima tanto,
A palavra,
Porque a sinto
Mais fria!
COM CESÁRIO,
Dei-lhe cor
E canto-a
Como pintura,
Dei-lhe vida
Num romance,
Tento tudo
O que não posso
Porque esta dor
Me perdura…
DA SUA COR
Vejo o mundo,
Com palavras
A recrio,
Procuro sempre
O teu rosto...
.................
E por mais longe
Qu’estejas
Eu não me sinto
Vazio.
A DOR DESTA
SAUDADE
Alimenta-me
A alma
E aquece a minha
Vida...
E assim eu vou
Vivendo
Em eterna
Despedida,
Neste cais
Que não tem fim,
Em partida
Que não há,
Um adeus que não
Me dizes,
Porque tu
Nunca saíste
Deste meu
Lado de cá.
MAS HÁ SEMPRE
Esta saudade
A que chamo
Nostalgia!
Vivo em tristeza
Feliz
Porque te sinto
Em cada dia.
NÃO TE TENHO,
Mas não te perco,
Estás longe,
Perto daqui,
Não te encontro
Nem te vejo,
Mas sei que não
Te perdi…
INSPIRA-ME, A
NOSTALGIA...
Recrio-te em cada
Instante!
Sou poeta,
Sou pintor
E também sou
Arlequim...
..............
Por isso vejo
O teu mundo
A partir de um
Camarim!
ESCULPO
TEU ROSTO
Com palavras
Do meu peito,
Pinto-me a alma
D’azul,
Voo contigo
Em sonho
E o destino
É sempre o sul...
LEVO COMIGO
PINCÉIS
E as asas
Do poeta.
Danço.
Sou arlequim.
Pinto-me nesta
Ribalta
Com as cores
Que vês
Em mim!
SEM TI
NESTA RUA
Da saudade
Sou palhaço
Em camarim
Que maquilha
O seu rosto
Para um palco
Sem fim...
REPRESENTA
PARA TI
Sem saber
Se lá estás...
...........
A verdade
Já não lh'importa,
É feliz com
O que faz!
ASSIM VIVE
O ARLEQUIM.
No palco,
É só arte
O seu fazer,
É dádiva que ele
Te entrega
Como modo
De viver!

J A S M I M
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração original do autor: “Rapsódia”.
Junho, 2018.

FLORESCEU O JASMIM!Dele jorra Poesia,Embriaga-me O aroma...Renovo-me Em fantasia!DAS PALAVRASVou à cor,O seu perfume Ilumina,Bate o sol Em suas pétalas,É luz intensa Que brilhaNo poema que Germina!JÁ NÃO É SÓO Loureiro!Agora canto O Jasmim!É tão intenso O aromaQue se renova Em mim!
INUNDO-MEDe palavras,Canto Esse mundoDa cor,Subo ao céu Com tuas asas,Vai comigoEsta dor...SOU ÍCAROLá no alto...
..............
E se o sol Me bate forteCaio em mim Do meu poemaE no chão Fico sem norte...PEÇO AJUDAÀ montanha...Volto a subir, Que alegria!Foi nela Que eu nasciE sou feliz
Lá no alto, Nem que seja
Por um dia!E LÁ TENHOO JasmimMesmo ao lado doLoureiro...
.................
Respiro fundo Até à almaE torno-meJardineiro!E ASSIM EU VOUVivendo No jardim daMinha vidaEm poemasE pintura...
............
E se a dorNão tem remédioQue seja esta
A cura!

A C H A V E
Poema, em dois andamentos, de João de Almeida Santos, criado a partir
de um poema/comentário de Ana de Sousa sobre “A Porta”.
Ilustração: “Uma Casa No Jardim”. Original (com várias citações de
Klimt) de minha autoria, para este Poema. Junho de 2018.

MOTE“Como uma fonte, / Como uma ave... / No horizonte, / Sempre uma
chave! / Sempre um segredo, / Não revelado, / Poema e quadro: /
Sonho velado / Escreve pintor. / Pinta poeta. / A vida é cor, / Dor
e amor / E tu, alerta!”
Ana de Sousa

A C H A V E
I.
PINTO E CANTO
O meu destino.
Sonhos velados,
A minha vida...
..................
Perdi a chave
Do meu futuro
E só me resta
A despedida!
POR ISSO CANTO
Com as aves,
Voo mais longe
E com mais cor
Porque no céu
Há mais azul
E nos meus sonhos
Há menos dor!
HÁ UM SEGREDO
Não revelado...
Se o dissesse
Não deveria
Porque dizê-lo
Era pecado
E certamente
Até mentia!
E NÃO O DISSE,
Mas eu pequei
Com murmúrio
Apaixonado
Em poemas
Inocentes
Por que fui
Tão castigado!
POR ISSO VOO
Sempre mais alto,
Trepo nas cores
P’ra lá chegar,
O céu azul
Dá-me alento
Para mais alto
Poder voar
E meus segredos
Dissipar...
LEVO PALAVRAS
Comigo,
Procuro inspiração.
Levo cor,
O meu abrigo,
Levo musas
E tudo o mais...
...................
E quando parto
Lá p’ra cima
É sempre festa
No cais.
LEVO-TE A TI.
E deste jeito!
Sim, meu amor,
Para que sinta
Lá bem no alto
Ar rarefeito
E menos peso
Na minha dor!
EU CANTO
E pinto
Por tudo isto,
P’ra resgatar
O pecado
De exaltar
Esse teu rosto,
Iluminar
Em aguarela
Esse enleio
Do meu olhar,
Por te ver
Na nossa rua
Debruçado
Na janela
Com vontade
De pintar.
II.
POR ISSO CANTO,
Por isso pinto,
Por isso voo
Lá para o alto...
...................
Já não os vejo,
Já não os ouço
E já não vivo
Em sobressalto.
MAS VEM COMIGO,
Eu dou-te asas,
O infinito
No céu azul,
Voamos juntos
Ao mesmo tempo
E o nosso rumo
Será o Sul.
VÁ, VEM COMIGO,
Voa mais alto,
Ah!, meu amor,
Se tu vieres
Eu já não sofro
E vai-se embora
A minha dor!

O SILÊNCIO E A MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Levitação”. Original de
minha autoria. Maio 2018.

"Para que tú me oigas / mis palabras / se adelgazan a veces /como las huellas de las gaviotas en las playas"
Pablo Neruda
POEMA
NO SILÊNCIO
Eu vejo-te
Com palavras
Sufocadas.
A preto
E branco.
A linguagem
Do tempo
Que passa
Inexorável
E erode
Os ângulos
Suaves
E coloridos
Com que nos
Fomos
Desenhando...
........
Nos dias
De festa!
E, AGORA, VIVO
Oblíquo,
Neste intervalo
Sofrido
De onde
Te vislumbro
A silhueta
Ao crepúsculo
Do fugaz
Encontro,
Lá no Monte,
Que ora
Declina...
“VOU-ME EMBORA
P’ra Pasárgada”,
Diria o saudoso
Poeta,
“Porque aqui
Anoiteceu”!
MAS, NÃO!
Eu não parto,
Porque na memória
Te vejo a cores.
Aquelas com que
Nos fomos
Pintando
Em caminhada
Cúmplice,
À procura
De formas
Para oferecer
Em troca
De nada.
NA MEMÓRIA
Acaricio-te
Com as mãos
Invisíveis
Da minha alma
E o azul
Do céu
Que ainda
Nos sobra
Como manto
Transparente
E frio.
PRESSINTO-TE,
Assim.
Adivinho-te
Em riscos que
Deslizam
Dos teus dedos,
Dádivas
Da beleza
Inscrita
No teu rosto
Que me chegam
Com a brisa
Do amanhecer
Nesse pátio
Secular
Dos nossos
Antepassados.
E ESTREMEÇO
Quando
Te reencontro
Nestas veredas
Estreitas
Mas profundas
Da imaginação
Com que
Nos reinventamos.
VISTO-ME, ENTÃO,
De vermelho.
Por dentro.
A rigor.
Solene.
Pinto-me
A alma
Ao sabor do vento.
Cubro de rosas
Vermelhas
O chão etéreo
Que piso
Suavemente
Com o olhar.
Dou mais sabor
À liberdade
Voando com
Uma rosa
P'ra te poder
Alcançar.
AH! SIM,
Duplico-me
Nesta vida
Íntima
E oblíqua,
Neste intervalo
Onde te sonho
Com palavras
Que te chegam
Desfiguradas
Pelo siroco,
Vento do sul
Que lhes sopra
Forte,
No caminho,
A áspera areia
Do deserto...
.............
Que habitamos.
SIM, MAS SEO VENTO
Ainda sopra
Ao amanhecer
Que me importam
A areia e o
O deserto?
A AGUARELA
Poema de João de Almeida Santos
inspirado no poema de Manuel Bandeira
“Tema e Variações” (Obras poéticas,
Lisboa, Minerva, 1956, p. 384).
Ilustração: “Vermelho”. Original de minha
autoria. Maio de 2018.
Milva: L'uomo dal mantello rosso

Milva (início da letra da canção, um sonho cantado): “La solitudine / È come la febbre: / diventa più forte di notte. / Un’aspirina e la febbre va via, / la solitudine no. / Io, che colpa ne ho io, / se questa notte ho sognato?” - “C’era un uomo dal mantello rosso...”
POEMA
SONHASTE, MANEL,
Que havias sonhado
Estar à janela
Sonhando a cores
Qu’estavas com ela.
TAMBÉM EU SONHEI
Que tinha sonhado
E que no sonho
A tinha encontrado,
Passando por ela,
Ali, lado a lado,
Mas quando acordei
Do primeiro sonho,
Sonhando, eu vi
O seu belo rosto
Numa aguarela
Pintada a cores
Que tinha guardado
Para uma tela...
SONHEI, OUTRA VEZ,
No segundo sonho,
Que era pintor
Mas que pintava
Sempre o seu rosto
A uma só cor...
DIZIA, SONHANDO,
Que não podia ser.
Seu rosto expressivo
Era arco-íris
Ao amanhecer
E era sorriso
Para o mundo ver!
MAS EU SÓ O VIA
Com a minha cor,
Esse rosto belo
De seda tecido
Que me seduzia
No sonho sonhado
Onde sempre a via
Ali, a meu lado.
NÃO QUERIA ACORDAR
Do sonho feliz
E nele fiquei
De olhos fechados.
Já não acordei
Do sonho sonhado
Porque nessa cor
Fiquei encerrado
Com todo o meu ser...
...............
Talvez por amor.
NO SONHO OLHEI
Para o meu espelho
E logo eu vi
Que essa minha cor
Era o vermelho.
QUANDO ACORDEI
Do primeiro sonho
Voltei a sonhar
Que tinha sonhado
Que o encontrei,
Esse rosto amado.
E logo lhe disse,
No segundo sonho,
Que a tinha sonhado.
DISSE-ME QUE NÃO
Que nunca me vira
Sequer acordado.
E logo acordei
Desse pesadelo.
Foi assim que vi
Que tinha sonhado
E que ela
Já lá não estava
Ali, a meu lado.
QUIS ADORMECER
Para a encontrar
Mas não consegui
Sonhar que a via,
Pôr os olhos nela,
Chorar d’alegria
Porque descobri
Na minha parede
Aquela aguarela
Que do sonho
Passado
Eu já conhecia...
................
Era o rosto dela!
A MONTANHA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração (“O balão e a montanha”) de minha autoria.
Maio de 2018.

“I live not in myself, but I become
Portion of that around me; and to me,
High mountains are a feeling....”
Lord Byron
Childe Harold’s Pilgrimage (1812-18).
Canto III, 72 (1816).
POEMA
ESTOU A PERDER-TE,
Meu Amor!
O estro
Com que te canto
Esmorece,
Vai perdendo
Lentamente
O seu fulgor!
O poema
Empalidece
E eu,
Em poética anemia,
Sinto
Um doce, suave
E sonolento
Torpor...
SUBI A MONTANHA
Contigo!
E, feliz de lá chegar,
Com palavras
Que me deste
Eu aprendi a cantar!
CANTEI A TUA PARTIDA
Quando desceste
O vale.
E, triste,
Eu caminhei
Por veredas
Sem destino...
..........
Já nem sei!
PERDIDO
De ti,
Vagueei
À procura
De eco
Do meu canto
Derramado,
Som puro
E cristalino
E por ti
Iluminado.
MAS O ECO
Era silêncio
Profundo,
Sideral,
Inscrito
No azul,
Quase irreal,
Da abóbada
Celeste
Da montanha
Seminal.
NEM SEQUER
O CLARÃO
De um cometa
Fugaz
Me visitava,
Pinhal abaixo,
Rumo ao horizonte
Do meu inquieto
Olhar...
O AR RAREFEITO
Da montanha
Tomou conta
De mim
E desfaleceu
A emoção
De te rever,
Reinventar
E te cantar
Em surdina
Com esse
Silêncio
Cortante
Que me negava,
Impenitente,
O eco da
Minha canção!
DESCI, ENTÃO,
Também eu,
O vale
Da tua vida
E regressei
À triste monotonia,
Sem ti,
Em corpo
Sequer imaginado,
Nem semente
De poesia.
ESTOU A PERDER-TE
Meu amor!
É poética
Anemia.
Ar rarefeito
Que sufoca
A melodia.
O cântico
É murmúrio
Inaudível,
Sem comoção
De alma ferida
Que já nem
A dor pressente,
De tão esgotada
Na vida
Por excesso
De paixão!
O VALE ESPERA-ME.
Respiro ofegante,
Porque sei
Que não te vejo,
Que já não
Sobram sinais
Da rua do
Desencontro,
Não há fugas
Irreais
Para o teu
Infinito
Nem janelas
Donde te veja
Passar
Ou sequer imaginar
Na esquina
Esquecida
Do nosso
Contentamento!
ESTOU A PERDER-TE,
MEU AMOR.
Não há janela,
Nem há cor
Ou infinito,
Não há tempo
Nem lugar,
Não há poema
Nem mar
Que suspenda
O vazio
De não te poder
Encontrar!
JÁ TE PERDI,
Meu amor?

SONHO
POEMA TRISTE. João de Almeida Santos. Ilustração: “Sonho”. Original de João de Almeida Santos. Maio de 2018. Milva canta "IN SOGNO" (Album: "Tra Due Sogni")
Letra de "IN SOGNO": "Sì, / L’alba è la più forte./ Sì, / Vince i sogni, la realtà. / Eppure, / Solo in sogno / Viene a noi / La verità. / Così si chiude un fiore / Se il sole non c’è più, / Ma tutto il suo colore / Raccoglie in sé".

“Sonhei ter sonhado / Que havia sonhado./ Em sonho lembrei-me / De um sonho passado: (…) / Ter sonhado o quê? / Que havia sonhado / Estar com você. / Estar? Ter estado, / Que é tempo passado. / Um sonho presente / Um dia sonhei. / Chorei, de repente / Pois vi, despertado / Que tinha sonhado”. Manuel Bandeira
POEMA

SONHEI QUES AS PALAVRAS Se gastaram, Desfiaram, Desataram, Sobrando fios Para tecer O silêncio. SONHEI Que a tinta Perdeu a cor. Que já não havia Poemas E que não era Pintor. SONHEI Que não eras tu. Que foi tudo ilusão. Sonhei que te procurei No mundo da fantasia Onde as flores Caminhavam, Sabiam a maresia, Tinham rostos De mulher, Mas surdos Ao que eu dizia. SONHEI Que não sabia Onde estás, O que fazes E o que sonhas Nas noites Do teu luar, O que vês Nesses momentos Fugazes Em que olhas Para ti. SONHEI Que não me lês, Que já não ouves Poemas, Que estás tão longe Daqui! NO SONHO Fui à memória, Que também Perdeu a cor. Ficou tudo A preto e branco... ........ E sonhei, Sonhei, sim, Que te perdi, Meu amor... SONHANDO, Procurei cor Num outro Lugar qualquer. Só encontrei O cinzento E por falta De vermelho Meus versos Tão desbotados Nem os levava O vento... FOSTE P’RA ONDE Que eu não te vejo? Perguntei Quando do sonho Acordei. Saíste De onde estavas E agora resta O desejo De te cantar Sem palavras P’ra que ouças O silêncio Com que antes Me chamavas. JÁ NÃO ME CHEGAM SINAIS. O meu É poço escuro, É buraco Tão profundo Que nele Eu vou caindo Como triste Vagabundo... O SOL TAMBÉM JÁ SE FOI. As sombras Tomaram conta De mim. Meus dias São sempre Iguais. Sinto um vazio Sem fim... MAS PINTO, Agora pinto, Tenho cores E tenho aromas, Tenho luz E sou feliz... ........ Ah!, sim, Mas perdi A minha Musa, A fonte D’inspiração! Foi p’ra longe, Com o vento E em meu triste Pensamento Só ficou A ilusão! GASTARAM-SE As palavras, Meu amor! Gastou-se tudo, Afinal! Só ficou o teu Cinzento, A tinta com que Lavras O meu peito (Sem lamento) E me afundas Nesta dor, A que canto Em surdina Para ouvires O silêncio Com que te pinto Sem cor...

METAMORFOSE
Poema de João de Almeida Santos criado
em diálogo com este quadro original -
“Metamorfose” - de João de Almeida Santos.
Abril de 2018.

"Não colhas uma flor, senão chorarás ao vê-la murchar"
Provérbio chinês
Podem cortar todas as flores, mas nunca impedirão a primavera"
Pablo Neruda
"Talvez deva às flores ter-me tornado pintor"
Claude Monet
"Há flores por todo o lado para quem é capaz de as ver"
Henri Matisse "
Uma flor é um ser totalmente poético"
Novalis
"Quem não tem pão, mas compra flores, é um poeta"
Provérbio turco

POEMA
CAMINHAS
Tão docemente,
Tão irreal,
Sobre as cores
Que eu te dei...
ÉS PLANTA DE JARDIM,
Bem sei!
Na alma
Tu tens flores
Que eu sempre
Cultivei,
Alimento
Dos meus olhos,
Aroma
Desses poemas
Que para ti
Cantarei.
CAMÉLIA
É o teu nome.
Encontrei-te,
Desta vez,
Em profunda
Solidão.
A alvura luminosa
Era tão densa
Que eu quase
A tomei
Na palma da minha
Mão.
QUIS TRAZER-TE
Para dentro do poema.
Disseste
Logo que sim.
Ficarias mais serena,
Estando tão perto
De mim...
FALEI CONTIGO.
Dei-te palavras
E dei-te cor.
A solidão
É castigo,
Eu bem sei.
Ah, meu amor!
E tu,
Brancura divina,
Não mereces
Essa dor.
CAMINHÁMOS
Numa ponte
P’rá outra margem
Da vida.
Eram passos
De liberdade,
Não eram
De despedida.
VI EM TI
Uma mulher.
Recriei-te
Com afeição.
Pintei-te
Em movimento.
Quis-te livre
No meu chão
De onde te
Elevaste
Quando eu
Te dei a mão.
É ESTRANHO
O movimento
Que não te afasta
De mim...
Tu vives
Em quietude
Porque te ofereces
Assim!
ESSA PONTE
De papel
Que parece um
Arco-íris
Saído do meu
Pincel
Vai devolver-te
Ao jardim
Onde a cor
É alimento,
É como favo
De mel,
De meus olhos
O sustento.
PERDIDO, EU,
Nessa tua
Melancolia,
Convoquei
Todas as cores
(Que sabia)
Com palavras
De um poema.
E dei largas
À evasão
Da flor
Que foi
Mulher
Porque comigo
Cantou
Em palavras
Coloridas
Essa sua
Solidão.
VÊS, MEU AMOR,
Como a solidão
Em flor
Pode ser libertação
Se lhe dermos
Muita cor
Com a força da
Paixão?
A IMAGEM ORIGINAL, de 21.03.2016. Camélia
solitária em Cameleira. Na altura em que a publiquei, escrevi,
no Facebook, o seguinte: "Surpreendente, a natureza! Camélia branca
suspensa! A elegância sensual de uma fadada Cameleira. Encontrei-a
no Jardim. Estava à minha espera. E logo a capturei, sem lhe tocar.
Só para partilhar essa luminosa, fresca e solitária brancura! Estava
ali como brilhante proposta estética da natureza: 'diz o que pensas
desta estranha forma de surgir no teu Jardim. É provocação florida,
não é? Sou tão branca e tão perfeita que e(n)levo a Cameleira’.
Olho-a de baixo para cima e ponho-a numa sensual fronteira!".
Respondo-lhe agora, dois anos depois. Ficaram-me a imagem e as
palavras que escrevi. Cruzei-as com novas vivências e experiências
estéticas... e deu nisto! A beleza fica registada na nossa memória
para sempre... e alimenta-nos a alma quando um novo estímulo a
reevoca e, às vezes, invoca!
O PINTOR
POEMA de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Celebração da Cor” -
Original de João de Almeida Santos.
Abril de 2018.

"Le Poète se fait voyant par un long, immense et raisonné dérèglement
de tous les sens".
Rimbaud.
O PINTOR BRINCAVA
Com suas palavras.
Dizia-te sempre
Quando não estavas...
ERA UM POETA,
Era fingidor.
Não te desenhava.
Cantava-te
A cor.
SUAS CORES
Eram as palavras.
Fazia pincel
Da sua caneta.
O pintor riscava,
Mas a sua tinta
Já não era preta.
POR ISSO COMPROU
Um belo pincel.
Pintava, pintava...
Era a granel,
Como se a tela
Deixasse de ser
O velho papel.
DESCOBRIU A COR,
Que o fascinou!
Azul, vermelho
E tanto amarelo.
Tudo ele pintou,
Procurando sempre
O que era belo.
ATÉ QUE O ENCONTROU
Na cor dos
Teus olhos.
Era luz da pura
Que iluminava
O branco papel
Onde desenhou
O teu fino rosto
Com o seu pincel.
DEU CORPO À COR
Com que te dizia.
As suas palavras
Tornaram-se riscos...
Mais que poesia.
PINTAVA-TE ASSIM.
Os poemas
Já não lhe chegavam.
Pintor de palavras
De cor as compunha
E versos voavam
No azul do céu...
..................
“E o que tu fazias
Faço agora eu”
- Dissera-lhe um dia -
“Porque sou poeta
Mas também pintor.
Deixaste-me só,
Entregue à palavra...
E eu,
Tão pobre de ti,
Pintei-me de dor.
MAS EU FAÇO DELA
O meu arco-íris
P’ra subir ao céu
A ver se t’encontro
Atrás duma cor
Pintando o teu rosto
Para um poema
Que vou escrever
Com todas as cores
Que trago comigo
Enquanto viver”.
O PINTOR BRINCAVA
Mas era séria
Essa brincadeira.
Perdido em palavras
Encontrou a cor
Que dos seus poemas
Dela fez bandeira...
A COR DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: Composição de JAS
sobre foto/ilustração de “Sogno di Libertà”
de Milva/Theodorakis. Vídeo aqui republicado:
Milva-Theodorakis - Sogno di Libertà

“Si tu quieres soñar / y te hace falta un tónico / vuelve la copa del
cielo / ¡y bébete el azul!”.
Luís Vidales, 1900-1990 - “Paseo”, 1976.
NUM DIA DE CHUVA
Bateste levemente
À porta da minha
Memória.
ERA TRANSPARENTE
Essa porta.
Vi que eras tu.
Reconheci a tua boca,
O bâton púrpura
Dos teus lábios.
NÃO SEI SE
ME PRESSENTISTE,
Não sei,
Porque a porta
Era um espelho.
Através dela
Só se via
Do lado de cá.
ENTRASTE
Cheia de cor
Que a chuva
Humedecera,
Mas deixara
Intacta.
Apenas com mais
Brilho.
TAMBÉM TU
ERAS TRANSPARENTE.
Olhei-te
E vi, através de ti,
Um céu
Pintado
De azul plúmbeo.
NA TRANSPARÊNCIA,
DESPONTOU O SOL
Coado em amarelo.
Havia umas nuvens
Escuras
A nascente,
Lá no Monte...
ÀS VEZES, O AMARELO
Ganhava tons de
Âmbar
E vestia-te o corpo
Na minha intangível
Memória
Fotográfica.
RECORDAVA,
Sereno,
Esse teu belo
Sorriso...
..................
Mas quando te quis
Tocar,
Ao de leve,
Um vidro desceu,
Vertical,
Sobre nós.
Era frio
E húmido.
Separou-nos.
E eu chorei!
AS LÁGRIMAS
Escorreram
Pelo vidro.
Tentaste
Agarrá-las
Do lado de lá
E fixá-las com
Todas as cores
Que tinhas contigo.
Ficaram algumas
Gotas
No vidro,
Em amarelo,
Porque tu,
De repente,
Te tornaste sol
E eu já não era
Mais do que um
Reflexo dos teus
Raios filtrados
Por algumas
Nuvens...
.......
Escuras!
DESPERTEI
Ao som
De dedos que batiam
Suavemente
À porta
Do meu quarto.
CORRI A ABRI-LA...
.......
Ninguém!
REGRESSEI, RÁPIDO,
À minha memória,
Mas tu já não
Estavas,
Nem sequer
Como reflexo...
..............
Deixara aberta
A porta do tempo!
COR, MAIS COR…
POEMA de João de Almeida Santos. Ilustração - Inédito de JAS: Poseidôn. Abril, 2018. Volto a propor uma bela canção de Milva/Theodorakis: Milva-Theodorakis - Sogno di Libertà

"Donde termina el arco iris, en tu alma o en el horizonte?"
Pablo Neruda
COR, DÁ-ME COR!
Fico mais perto
De ti
Se vieres
Com o vento.
Cor, mais cor,
Que as palavras coloridas
Já me sabem
A cinzento...
OU TALVEZ NÃO!
Palavras
Já não me faltam
Nem vivo
Na escuridão.
Ainda consigo
Dizer-te,
Com palavras
Dar-te a mão.
TENHO-AS
QUE ME CHEGUEM
Para gritar
Em vermelho
O concreto
Do teu nome.
Ver-te, assim,
Tão colorida
No vidro do meu
Espelho
Sem que a tristeza
Assome!
AH! MAS A COR
SE FOR INTENSA
E crescer
Em explosão,
Se tiver
Em contraponto
Palavras
De evasão
Que dão ritmo
Ao azul
Dos teus sonhos
De papel...
..........
É tudo
O que eu preciso
P’ra t’esculpir
A cinzel.
DÁ-ME COR
Que eu sou
Sensível
À luz intensa
Do teu olhar!
Aprendo nas
Flores que
Colho,
Quando vestes
O vermelho,
Com azul
Como espelho,
Ou te cobres
Com as cores
Do arco-íris
Que és.
AH!, VÊS
COMO TE CONHEÇO?
Tu és cor,
Gota d’água
Suspensa
No fio
Do horizonte
Banhado por
Raios de sol
Que despontam
Lá no Monte.
DANÇAS COM ELA,
A cor,
E com ela adormeces.
Por amor.
É sopro
Da tua alma
Quando a vida
Já é sonho...
...........
E te acalma!
MAS EU GOSTO
DE TE PINTAR
Com palavras.
Em maiúscula.
Onde o azul é
Mais íntimo
E o verde
Te cobre
Como manto.
Onde o vermelho
É pranto
Sem lágrimas
De enxugar...
..........
Nem sequer
Em amarelo
P'ra melhor
Te recordar!
NA COR DAS MINHAS
PALAVRAS
Te revejo
As vezes
Que eu quiser
Pois és mais
Do que desejo
Nos cânticos
Que compuser!
MAS EU GOSTO
Cada vez mais
De cor...
............
Confundir-me
Com ela,
Dançá-la
Como vida
Em explosão,
Fogo de artifício
Que embriaga
Os sentidos
Como se fosse
Vulcão...
LEMBRO-ME
DO POETA QUE PEDIA
“Mais luz!”,
Já em seu leito
Fatal.
Tinha luz
Dentro de si
Mas não entrava
Cor
Pelo portal.
Era cinzenta
A cor que lhe restava
Até escurecer
Quando a janela
Lentamente
Se fechava...
LUZ É COR,
Desperta da
Letargia,
Ressuscita
Do torpor.
Celebra a vida.
É cântico.
Chilreio de
Passarinho
Lá no alto
Que anuncia
O meu voo
Aos azuis
Que tu pintas
Em cobalto.
MAS A PALAVRA
FASCINA-ME.
É com ela
Que eu te canto!
Com a cor danço
E voo!
Com ela, leio-te
A alma.
Na cor, a tua
Roupagem.
Com a palavra
Suspendo
Os sentidos
Para melhor
Te sonhar
De todos os dias
Perdidos...
........
À deriva
No teu mar!
AH!, SIM,
Eu gosto
É das palavras!
E sabes porquê?
Porque tu cabes
Em quatro letras
Mesmo que o teu
Nome
Tenha cinco
E me saiba a verde
De Primavera...
ROSTO DE PEDRA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – Jovem mulher com bâton.
“Estudo de uma jovem mulher” (1885), de
Gustav Klimt, (atrevidamente) retocado
por João de Almeida Santos

ENCONTREI-TE
POR ACASO
E caíste
Sobre mim
Naquelas escadas
Sem fim
Por onde descias,
Altiva,
Como senhora
Do silêncio
Austero
Que me devora.
É SEMPRE ASSIM
Quando te vejo.
Crispada,
Sobrolho
Franzido
E pesado,
Sofrido,
Em eterna
Revolta,
Anunciando
Penitência
Neste incerto
Destino
Já sem regresso.
DOEU?
Muito.
Mas que importa?
É sempre sal
Sobre ferida
Que não cura,
Mal que dura
E que perdura
Uma vida…
A TEIA
QUE NOS TECE
E cobre
Este espaço
Que entretece
E nos domina
É como o tempo
Que marca,
Implacável,
O acaso
Que tudo determina.
VI-TE, SIM,
Nesse dia,
Recolhida
Sobre ti,
Estranha na cidade
Invisível
Onde te conheci.
E ASSIM ME NEGAS.
E foges
Para lugar
Nenhum.
Corres, corres
Para onde
Nunca irás.
Escondes-te
Atrás do que
Desconheces
E de ti própria
Onde blasfemas
Contra o mundo
Onde não te
Reconheces!
A REVOLTA
Não sai
De ti
E petrifica
A tua alma.
É ÁSPERO, SIM,
ESSE TEU ROSTO.
Julgava-te
Já perdida
No silêncio
Da raiva
Surda
Contra mim,
Sem redenção,
Condenado
A grilhões
Que pesam
Como cativeiro.
CHAVES?
Ah!, sim,
Tantas são
As chaves que tens
E que não usas
Para me libertar!
TALVEZ NEM QUEIRAS
Porque também tu
Já és prisioneira
Da síndroma
Que te aprisiona
E te queima
Como fogueira.
CAÍSTE SOBRE MIM.
De repente,
Levantaste-te
Dessa sombra
Onde te encerras,
Te encobres
E vigias.
E atropelaste-me…
MAS NÃO ERA PRECISO,
Meu amor!
Todos os dias
O fazes.
Mesmo ausente…
EU VI UM ANJO…
No Dia Mundial da Poesia,
hoje, 21 de Março,
ofereço este Poema
de João de Almeida Santos.
Ilustração: Vénus, de
Botticelli, re-reimagined
por João de Almeida Santos
a partir de Yin Xin
(2008) e de Botticelli (1490).

EU VI UM ANJO
CAIR
Docemente
Sobre mim
Com seu rosto
Imaculado
Em momento
Inesperado
Que parecia
Não ter fim...
VINHA ELE
Lá de bem alto
Onde eu
O pressentia
Mas tive
Um sobressalto
Porque em mim
Esse anjo
Imaculado
Não cabia.
SUA LUZ
ERA INTENSA
Ofuscava-me
O olhar.
O seu brilho
Deslumbrava
E eu senti-me
Cegar...
MAS NÃO SEI
SE ERA ANJO.
Talvez fosse
Uma mulher.
E se não fosse
De arcanjo,
Ah!,
Não era um
Rosto qualquer...
POR ISSO
ME FASCINOU,
Porque ao vê-lo
Descer
Do trono
Onde reinava,
Quase, quase
Me cegou
Com a luz
Que o transportava.
E levou-me
Ao Olimpo
Onde a arte
Lhe sobrava.
FIXEI-O, ENTÃO,
Num quadro
De memória.
Traços leves,
Cores intensas
Que cativam
O olhar.
PINTEI-LHE DE
NEGRO
O cabelo
Para mais belo
Ficar
E seu rosto
Feminil
Deste modo
Desvelar
Como mulher
Sensual
Que me veio
Capturar.
DESENHEI-A
COMO BELO
Avatar
Que tomou
Conta de mim
Para sempre
Me lembrar
Que era
Uma mulher
E não era
Querubim.
MAS VI
UM ANJO,
Ah!, eu vi,
Entrar bem
Dentro de mim
Sob forma
De mulher,
Porque anjo
Imaculado
Não cabia,
Infinito,
No meu pequeno
Jardim.
FOI MISTÉRIO
Que subiu
Ao oráculo
Da vida
Onde eu a
Posso ler
Em texto
Que só termina
No dia
Da despedida,
Na hora em que
Morrer.
EU VI UM ANJO
DESCER
Neste vale
Da minha vida
E ele fez-me
Crescer,
Recomeçar
A partida...
E COM POEMAS
Parti
Em viagem
Ao Olimpo
Para com ele
Voar
Em cada palavra
Que digo,
Em cada verso
Que sinto!
CANTA, POETA, CANTA!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: Auto-Retrato. Original de João de Almeida Santos. Março de 2018. Volto a repropor: Marzo - Milva. Arietta di Salvatore di Giacomo Para a letra e a tradução do napolitano, ver: Março.“Ora al nuovo sole si affidano i nuovi germogli” Virgílio.
CANTA, POETA, CANTA Até que Ela Te ouça, Nem que a palavra Te doa, Nem que a alma T’estremeça! CANTA, POETA, CANTA Que o teu poema Tem dor Que te baste, No amor, E tem cor Que alumia E tem sabor A cerejas, Que as dá A Primavera. SE NO CANTAR Tu quiseres Atingir o infinito, Salta p’ra cima Dum risco, Agarra asas De azul E voa Nesse teu céu Até que Ela Te veja, Te pinte Numa cereja E murmure O teu nome Em silêncio De igreja... CANTA, POETA, CANTA Que o teu cantar É um choro. E é água Cristalina Que corre Lesta Em teu rio Seminal, Dentro de ti, Turbilhão Arterial À procura de beleza No infinito Fatal De um adeus Beijado Pela tristeza! CANTA, POETA, CANTA Que contigo Cantarei A alvorada do dia. Chora, que eu Chorarei Se não houver Alegria. Ri, que Eu cantarei Animado por teu Riso. E para ti Dançarei Uma valsa De Strauss Às portas Do Paraíso! CANTA, POETA, CANTA Até que Ela Te ouça. Não pares De chorar alto, Lá em cima, Planalto Ou montanha, Poema Ou um desenho, Uma cor Em aguarela, Afagado Pela dor Mesmo que olhes P'ra ela Com um intenso Ardor Lá de cima Da janela... CANTA, POETA, CANTA, Para ti E para o mundo Que o teu cantar Enobrece Quem ouvir A tua prece, Quem sentir O teu lamento, Que de ser Já tão profundo Não o leva Nem o vento Pois em ti Ele entardece. E SE O VENTO O LEVAR Vai procurá-la A Ela, Dobra lento A esquina P’ra que o veja Da janela. MAS O DIA É DE FESTA! Há cortinas No poema E o lamento Lá regressa Ao poeta Que o cantou. O dia já Não é dele Mas de quem O castigou. CANTA, POETA, CANTA, Que um dia vai-te Ouvir. Deixa, pois, que o Tempo passe E a razão se esclareça. E confia no porvir. CHORA, POETA, CHORA Neste teu Entardecer Aqui tão perto Da arte Com saudades De morrer... CHORA, POETA, CHORA...
POEMA PARA TI
De: Olga Santos. Ilustração inspirada em Botticelli, "Nascimento de Vénus". Pormenor. “Re-reimagined” . Intervenção de JAS sobre Botticelli Reimagined – Venus in the gutter. By Yin Xin, 2008. Venus after Botticelli.
CRUZÁMO-NOS POR ACASO Na estrada da Poesia. Palavras embriagadas De cor, de luz, De misteriosa e intensa paixão, Caíam em suave cascata No colo da estrofe Que as aguardava Im-Paciente. SENTIDOS GENESÍACOS Eram paridos Pela neófita Que se fizera à estrada, Numa incontida explosão De prazer... JANELAS ERAM RASGADAS No traçado do poema Subitamente... Cruza-se a voz Do Poeta Com cantos de aedos outros. IRROMPEM CÍTARAS E TROMBETAS Volteiam bacantes palavras Perturbadora-mente Desassossegad-Horas. Tudo é cor, brilho, ritmo, cadência, Melodia... Farandole de Bizet Sarabande de Haendel. MAS FEVEREIRO ERA FRIO E a estrada penosa Para quem março nevou. SAÍ NA CURVA DA ESTRADA Disse adeus à melodia... PROMETIDO ESTÁ O REGRESSO, POETA! Quando o sol cegar a sombra E abrasar as pedras da montanha, E da bonina o tempo for.
PRIMAVERA, QUASE
João de Almeida Santos
POEMA. Ilustração: Primavera, Quase. Original de João de Almeida Santos. Março de 2018. Ilustração sonora de Milva, em napolitano, sobre uma Arietta de Salvatore di Giacomo: Marzo. Reproposição. Para a tradução, veja, aqui, Março. Para ouvir Milva: Marzo - Milva. Arietta di Salvatore di Giacomo
Primavera, Quase
"Até nos nossos sonhos neva, mas uma única vez na vida". Orhan Pamuk, escritor turco. Prémio Nobel da Literatura.
PRIMAVERA, QUASE
SE ME PERGUNTASSES PELA NEVE, O que sempre te diria? “- Tenho-a na minha Alma, Sinto-a, pura, Em cada dia.” DELA CONSERVO O FRIO E a brancura Do seu manto, Mas sinto-a quente Por dentro, Mesmo que sofra, Em pranto. ENTRA NEVE NA PRIMAVERA E dá húmus Ao jardim, Rega fundo A tua alma E ao sofrimento Põe fim. E QUANDO O INVERNO Termina Saem cores Da tua mão, Voam riscos, Nascem amores, Tudo brota Do teu chão... EU PERMANEÇO NA NEVE, Corpo frio, Alma quente. Se te banhar Como rio Germinas Como semente, Explodem os teus riscos Em girândolas De cor. É festa Na tua terra, Já não é tempo De dor! MAS SÓ DESÇO DA MONTANHA Como neve Que t'inspira Pois da arte É alimento, Frio branco Que conserva E à alma Dá alento. SÓ ASSIM EU TE VISITO, Perdoa A minha falta. No alto voam Foguetes, Mas dentro de mim É ribalta, A que quero Para ti Pois eu não quero Mais nada. Que Atena Te inspire Com sua varinha De Fada! É FESTA NA TUA TERRA, Crepitam foguetes No ar, Fosse eu O teu mordomo Não iriam As girândolas Na tua festa Parar! BRANCA NEVE, FRIA E HÚMIDA, Não vê Foguetes no ar, Mas banha A tua alma, Lentamente, Sem parar. E SE PERGUNTAS P'LA NEVE Eu ouço-te Cá em cima, Inspiro-me na Montanha E respondo-te Em rima, Devolvo-te Inspiração Que da arte É a vida, Num poema Em oração Que não é De despedida, Mas canto, Em comoção, Da palavra Proibida.
MARÇO
POEMA de João de Almeida Santos.
Ilustração: PÁN - Original
de João de Almeida Santos.
Em exposição na minha Galeria Poética,
de Março de 2018 até... Sempre!

"Marzo: nu poco chiove / e n’ato ppoco stracqua: / torna a chiovere,
schiove, / ride ’o sole cu ll’acqua./ Mo nu cielo celeste, / mo
n’aria cupa e nera: / mo d’ ’o vierno ’e tempeste, / mo n’aria ’e
primmavera. / N’auciello freddigliuso / aspetta ch’esce ’o sole: /
ncopp’ ’o tturreno nfuso / suspireno ’e vviole... / Catarì!… Che buo’
cchiù? / Ntienneme, core mio! / Marzo, tu ’o ssaie, si’ tu, /e
st’auciello songo io".
"Março: um pouco chove / e logo deixa de chover: / volta a chover,
pára, / ri o sol com a água. / Ora um céu celeste, / ora um ar
escuro e negro: / ora tempestades d’inverno, / ora um ar de
primavera. / Um pássaro com frio / Espera que espreite o sol: /
na terra ensopada suspiram as violetas... / Catarina! Que queres
mais? / Entende-me, meu amor! / Março, sabes, és tu, / e aquele
pássaro sou eu".
NOTA - “Arietta” (1898) do poeta napolitano Salvatore di Giacomo,
1860-1934,em dialecto napolitano. Ouça MILVA em:
https://www.youtube.com/watch?v=lMKDSnJEadc).
GOSTO DE MARÇO,
Entre a neve
E a primavera,
O branco e
As flores.
Na fronteira,
Como te vejo?
Talvez quimera!
GOSTO DO BOTTICELLI,
Dos rostos
E dos corpos
Feminis.
Volúpia de
Transparências
Sensuais.
Da pele, a Cor.
Dos traços
Que desenham
Alvura nas
Três Graças...
.........
E no Amor!
GOSTO DO BRANCO,
Cá de perto ou
Lá longe
No alto da Montanha.
E das cores intensas
Que brotam
Insinuantes
Ao meu olhar
Deslumbrado,
Cá em baixo,
Por ti
Iluminado!
GOSTO DE MARÇO.
Entrei nele
Contigo.
Ombro a ombro.
No signo do
Desencontro.
Que se repete
Em silêncio
Fatal,
Marcado
Contraponto
Do tempo
Imprevisível
Deste “triste
Destino”...
Quase irreal.
QUE O DIGAM
Os astros
Desalinhados!
Para ti colhia
Flores luminosas
E a inspiração
Crescia
Nas estrofes
Arrebatadas
Com que fingia
Sentir
O que dizer
Não podia,
Fosse por
Uma hora
Ou por um dia.
NO SIGNO DO
Desencontro
Marcado como selo,
Lá vou eu
Por aí,
Nem sei porquê
(Ou por falta de ti),
De braço dado
Com Botticelli,
Lá em cima,
na Galleria,
Onde, um dia,
Eu quase morei.
Procuro-te
Em oração
À tua deusa,
Atena,
Que trazes
(Eu bem sei)
No coração.
SINTO-TE PERTO,
Depuro
A tua imagem,
Bissetriz de mil
Rostos,
Até se tornar
Ideia
De corpo ausente!
DEPOIS REINVENTO-A
A cada instante,
Abraço-a
Com alma
De amante,
Pinto-a com
Palavras
E silêncio
De catedral.
E sonho-te...
AO ACORDAR,
No amanhecer
De cada poema,
Verei que continuas
Em mim,
De olhos fechados,
Como se fosses
Memória do que
Nunca aconteceu.
ANDAREMOS
Por aí
(Os astros o dirão),
Vagando
No pólen
Da beleza sensível
Onde pousamos
O nosso inquieto
Olhar
À procura
De alimento
Para pintar
O poema...
...................
Talvez o impossível!
LÁ NO ALTO
Te encontrarei,
Fio do horizonte,
Simulacro do teu
Olhar
A construir infinito,
Onde, num adeus
Sem fronteiras
Nem cais de partida,
Hás-de desenhar,
Com a alma,
As mil silhuetas
Ainda inacabadas...
.............
Ou talvez não!
MEU DEUS,
Como gosto de ti...
........
Em Março!
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: Almada Negreiros - “Viento. Blanco y Negro. N.º 2.017. 21 de enero de 1931 ”. In Pessoa. Todo arte es una forma de literatura. Catálogo. Museo Reina Sofía. Madrid, 2018, p. 262. Exposição aberta até 07 de Maio de 2018.
DESPEDIDA

“Tu prima m’inviasti verso Parnaso a ber ne le sue grotte, e prima
appresso Dio m’alluminasti”.
Dante Alighieri. Purgatorio. Canto XXII.
PERDI-TE
Porque nunca
Te encontrei.
Numa rua,
Numa praça,
Num café.
Em lado nenhum.
Não sei!
ENCONTREI-TE
No Parnaso.
Lá em cima.
Intangível.
Sem poder
Tocar-te
A não ser com
Palavras.
Em forma de poema.
Sensível às cores
Da tua alma.
DE REPENTE,
Vestiste-me
Com elas,
As palavras.
E eu senti-me
Quente,
Afagado
No meu Canto,
Às vezes,
Amargurado,
Outras,
Em pranto,
Sufocado.
SIM, ENCONTREI-TE
No Parnaso.
Lá em cima.
No Monte.
Através de ti
Eu vi a costa,
Eu vi o mar
E o meu mundo
Interior
Com nitidez,
A sonhar-te,
De cada vez,
Em azul...
.........
A tua cor.
A NEBLINA
Cobria-te
Para te revestir
E refrescar
A alma
Como chuva
De palavras
Húmidas
Caídas do meu
Céu.
EU NÃO ERA MAIS
Do que espelho
Que te devolvia
Fantasia
Contra a
Petrificação
Que espreita sempre
Nos olhares
Indiscretos.
Mas tu não me vias.
Em mim,
Especulavas,
Dizias...
E DE TANTO TE
VERES
E dizeres
Decidiste declinar
O espelho que
Começava
A embaciar-te.
E NÃO ERA DA
NEBLINA
Que te envolvia,
Mas dos desenhos
Que tuas mãos
Esboçavam
Timidamente
Nesse espelho
Já húmido
De ti.
E DESPEDISTE-TE.
Do Monte.
Desceste para ti
Vertiginosamente,
Em desconforto,
Sob os olhares
Das mil górgonas
Que sempre ameaçam
Petrificar-te.
E sucumbiste.
Ou talvez não...
NO MONTE, O ESPELHO
Disse para si:
- De tanto te veres
Em mim,
Ficou-me, de ti,
O repetido reflexo.
E sabes o que
Brotava
Quando te olhavas
Com palavras
Na minha superfície?
Beleza!
Toda a que me sobrou
Quando, triste,
Desceste o Monte.
MAS ESTA NÃO
PETRIFICARÁ
Porque ficou
Guardada
No meu corpo
Vítreo
Onde todos
Se revêem
Sem saber
Que no reflexo
Levam, gravada
Em transparência,
A tua imagem...
.........
Embaciada.
E EU POR CÁ FIQUEI,
Espelho do mundo,
A olhar para
O escuro espaço
Sideral
À espera que um cometa
Me alumie o caminho
Para to devolver como
Teu reflexo
Original...
A CAMINHO DE PASÁRGADA…
Poema de João de Almeida Santos, à desgarrada com Manuel Bandeira (1886-1968), a caminho de Pasárgada, inspirado em três poemas seus: Desencanto, 1912; Versos escritos na água, s.d.; Renúncia, 1906. In Obras Poéticas – 1956. Lisboa: Minerva, pp. 33, 40, 101. Ilustração: pormenor de uma obra do Mestre Guilherme Camarinha (1912-1994).
“OS POUCOS VERSOS QUE AÍ VÃO, Em lugar de outros é que os ponho. Tu que me lês, deixo ao teu sonho Imaginar como serão.” OS MUITOS VERSOS Que te dei Deixam claro O que sou. Se tu me leres, Eu não pequei. É pouco do muito Que te dou. “NELES PORÁS TUA TRISTEZA Ou bem teu júbilo, e, talvez, Lhes acharás, tu que me lês, Alguma sombra de beleza...” TALVEZ BELEZA E algum sentido, Tristeza, dor, Como castigo... Eu canto O que perdi P’ra que o verso Vá ter contigo Lá onde estejas... .............. Queira o vento Ser meu amigo. “QUEM OS OUVIU NÃO OS AMOU Meus pobres versos comovidos! Por isso fiquem esquecidos Onde o mau vento os atirou.” NÃO OS AMOU Por ser verdade Este amor Que aqui nasceu E que cantei Em liberdade Em versos Que o vento Já me levou Aos muros Dessa cidade. OUTROS FARIA Se pudesse Para os pôr Na tua mão, Não pediria que Os sonhasses, Olhos cerrados, Mas que os lesses Com afeição! AH!, MANUEL, Que bem me sabe Pôr a dor Em poesia, Em versos A emoção, No cantar Triste alegria E muito intensa Uma paixão, Mesmo que seja Utopia! DIZES TU, Em poesia, Que só a dor Te enobrece. É bem verdade, Meu bom poeta, Alma dorida Logo aquece E com seus versos Entretece O que a paixão Já tanto afecta. “A VIDA É VÃ COMO A SOMBRA QUE PASSA... Sofre sereno e de alma sobranceira, Sem um grito sequer tua desgraça. ENCERRA EM TI TUA TRISTEZA INTEIRA. E pede humildemente a Deus que a faça Tua doce e constante companheira...” POIS TENHO MEDO, Ah!, meu irmão, Que a dor Me passe, Perca o poema Sua raiz, Essa, sim, A verdadeira, E eu fique só Já sem palavras E caiam secas Todas as rosas Que me povoam Esta roseira. SOBRAM ESPINHOS Ferem-me a alma E saem versos E cai o sangue “Gota a gota, Do coração”, “Volúpia ardente” Já sem remédio “Eu faço versos Como quem chora” E chamo a dor Naquela hora E ela vem Por compaixão! AH!, POETA, Ah!, meu irmão, Tu fazes versos “Como quem morre” E eu procuro Neste meu canto... ............ O seu perdão! TU, MANUEL, És a bandeira E ela o meu refrão, P’ra mim és verso No meu poema E ela é... ............ Minha paixão!
A PALAVRA PROIBIDA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: Intervenção digital (cor) de JAS sobre “O Rio” (1950), do artista italiano Alberto Savinio (1891-1952).
“L’amour est la poésie des sens” Honoré de Balzac
OS GUARDIÕES Do sagrado templo Emitiram Edital: “O amor em poesia Fica assim proibido Porque pode ser Fatal. Os versos E as estrofes Pintados A luz e cor Ficam p’ra sempre Banidos Da Arte E do Amor!” DIZ O AMIGO Honoré, Certeiro Como poeta, Que o Amor É poesia, É a arte Dos sentidos, É perfume Qu’inebria E nos faz sentir Perdidos... ............. Se não houver Guardião Impenitente Que decrete: “Também eles São proibidos!” PROIBIDOS? Ah!, esses, Não! Poesia É emoção, É enlevo Dos sentidos... ........... Que resiste Ao edital Mesmo que seja Cantado Pelo mais Belo jogral! TENTA, POR ISSO, Levá-los Aos píncaros Da fantasia, Sobem lá alto Os sentidos Com asas De poesia! MAS É DIFÍCIL Senti-los, Ouvi-los Em verso, Com alegria, Pois há sempre Alguém Que me rouba A brisa Dessa tua Maresia... .............. A que respiras Bem cedo, Logo ao Amanhecer, Em cada dia Que sentes Como, feliz, Eu te canto Para nunca Te perder! OLHAS O MAR, Sentes As ondas Dentro de ti A cantar Como versos Que o vento Sopra De mansinho P’ra te poder Sussurrar O que por ti Eu já sinto Apesar de tão Sozinho! POESIA Dos sentidos? O amor também É isso Porque, queiras Ou não queiras, Tem a força De feitiço. Encontro-a Sempre em ti E mesmo que Proibidos Desenho sempre Poemas Desde o dia Em que te vi... ............ Exaltaram-se Os sentidos E para o poema Parti... DECRETARAM Edital? Ah!, que o façam, Pois, cumprir! Mas poesia É como vento, Sopra-me Tão forte Na alma Que o teu silêncio É alento Para sempre Te esculpir. Na palavra proibida Encontrará o poema O seu próprio Porvir...
***
PERDER-TE…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: intervenção digital de JAS sobre “Portrait d’un Poète (Juliet)”, 1954, de Man Ray (Man Ray, Cent’anni di Libertà - 1890-1990. Venezia, Sodicart, 1990, p. 119). Homenagem a um Artista que admiro.

RENUNCIEI Para nunca Te perder, Mas neste Silêncio sofrido Vai declinando O que p’ra sempre Eu quis ter... VÊS, BERNARDO, Que destino? Que desassossego, O meu? Quis seguir O teu caminho E perdi-me... .......... Já não sou Eu! QUE DESENCONTRO Foi esse Desde o dia Em que te vi? Dei-te errados Sinais Cada dia Que vivi, Cavando Cada vez mais A solidão Que m’invade Desde quando Te perdi? VÁ, DIZ-ME Tudo o que Não sabes! Eu quero Mesmo saber P’ra te cantar Em poemas, Pois não te Quero perder! TU AMAS A poesia? Senti-la é Doce sofrer, Ela diz tudo Com nada, O seu canto É prazer, É melodia De fada Mesmo quando Faz doer! NO POEMA Eu até finjo, É poeta Quem o diz, Mesmo que sinta O que digo Nunca sou, Sem ti, Feliz! MAS POEMA É como a vida, Posso ouvir A tua alma Em desejos Com palavras. É o modo De te ter, É remédio Que me salva De na solidão Eu arder! ESTE CANTO É, pois, meu, Nem tu Mo podes Roubar, Se te dizem Que é p’ra ti É verdade... ........... De enganar! O VERSO É o meu beijo Nesse rosto Que perdi, É quente Como o desejo E resiste A quem te diz Que o poeta Não te ama, Porque desenha As palavras Com um pedaço De giz... O AMOR Em poesia Não é mesmo Deste mundo, Quem o ler Como utopia Vai mais longe Vai mais fundo E não cai Em afasia Nem vê O pobre poeta Como simples Vagabundo. EU NÃO GOSTO Da renúncia, Mas que posso Eu fazer? Se não cantar O que sinto Ainda te vou Perder!
***
ALMA!
Poema a dois. Ana de Sousa e João de Almeida Santos. Ilustração de João de Almeida Santos. "Deusa no Jardim". 28.01.2018.

“ - PROPÍCIA, DESPERTA A MANHÃ, Desperta o dia. A Montanha distante É tua. Exageradamente fria. Está escrito Numa Estrela Em matriz Gravada A cinzel!” SIM, FRIA, É A MONTANHA Onde nascemos Para o Destino No granito Das nossas vidas! O CALOR Habita Outras paisagens Mais a sul, Onde nasce A poesia Para aquecer, Com flocos De palavras, A minha alma Granítica E vadia... “- FATAL CAMINHO De linhas paralelas. Até os sonhos Da mulher to dizem: ‘ - A solidão eterna Não ouvida. Ferida antiga, Aberta e repetida’.”
SOLIDÃO ETERNA... É longo O caminho Dos que amam No deserto Como gelo Na noite, A fria lua Iluminando a alma Nua Em desespero, Tendo areia E vento Como tempero... “- PORÉM, O GELO É QUENTE. Mente. Com a mentira sobrevive O engano. Da louca mansidão Se afastam Os sentidos Do paladar Do tacto.” SIM, É QUENTE, Porque não mente E é cortante, Faz brotar Sangue Em veias Flutuante Que escorre Sobre pele, Mesmo distante, Tal a força Da paixão Na memória Escaldante... “ - DE FACTO, PERDURA A audição, o olhar. O cheiro raro De um perfume Caro. Negrume De eclipse! Qual elipse? E o símbolo Do infinito Ata-lhe O petrificado coração. Reflecte um brilho Inigualável o diamante Inscrito Na sua neve Branca. Flecte Os joelhos. Sabe ainda rezar... Fá-lo Em poesia Confessando-se Às palavras Que se diz, Em permanente Melancolia...” ELIPSE E INFINITO Sabem de longe A não ouvido Grito de beleza Sacrificial Ou gemido Sussurrado E esquecido Lá longe. Alma ferida Que o seu altar Colorido Não acolhe Nessa distância Desmedida De uma fuga Inesperada E depois Insistentemente Ressentida No eco do silêncio! Oh! como é duro Vê-la perdida No meio da floresta Desordenada De cores, Esbracejando No seu irresistível Ímpeto, Em girândolas Ou estilhaços de Poderosa fantasia Em perigo De autofagia Cromática, À procura do Do tempo perdido Em sendeiro De floresta... “ - MAS O SILÊNCIO De Deus É um consolo. Mudança de estações, Tempo Insondável! Milhares de vezes Levanta voo a águia. Seu destino É voar. O da fiandeira, Fiar.” VOA, VOA A águia Com seus riscos, Mas ele, Que não é Fiandeiro, Fica-se Pelas palavras Como ciscos No seu olhar Perturbado, Sem cor Abandonado, Procurando, Parado, Voar Com outras asas Que encontra Em si, Sem saber Para onde Viajar, Perdido o infinito Que lhe roubaram Dessas mãos Tão generosas De palavras E cores... “ - SUAS IRMÃS, AS PARCAS, Riem Do destino Dessa mortal voadora. Resta-lhe ficar Soror da Seda Presa em seu casulo Do mais alto céu, Olhando de Longe Tudo o que a vida Lhe não deu.” MORTAL VOADORA Que me liberta Da Moira Que ao fim, Inflexível, Me conduz, Sem sair Desse silêncio Que tanto Me seduz... ......... Alma pura Que me trouxe Tanta, mas tanta Luz, Em plena vida De poeta Que resiste Com a Sorte À neblina Que aflora E espreita A cada esquina... “QUE CINZENTO E AZULADO, Porém, é o céu E o poente quente Que cai Alaranjado e vermelho, Como a nuvem Passou o sonho, Seu espelho... ............ Ah, a doçura Das palavras Amargas!” SIM, AMARGAS Como o gelo Quente Que não mente E não derrete Ao sol, No poente, Quando o verso Declina No horizonte marinho Ali a seu lado... Porque à vida E ao poema Sempre Reconduzem, Sim, As palavras, Mesmo sem cor! PROPÍCIA, DESPERTA A manhã, Sem ti, Meu amor!
ELAS FOGEM, AS PALAVRAS…

POEMA de JOÃO DE ALMEIDA SANTOS. Ilustração de ANA de SOUSA. 01/2018
QUERIA FAZER-TE UM POEMA, Sentir-te nele À vontade E as palavras Endoidaram Quando Feliz Lhes falei Da minha Quente Saudade... ............. Fugiram Numa revolta Sentida Sem conhecer A verdade. EU ESTAVA A MENTIR Sem cuidar Da crueldade De as usar Como queria Só porque Tinha saudade... ESGUEIRARAM RUA FORA, Cada uma Por seu lado, Em fugas No horizonte Deste poema Tentado. SÓ JÁ AS VIA LÁ LONGE, Ao fundo Da tua rua Num ponto Do infinito Desta minha Alma nua. UMAS ESVOAÇAVAM No fio Do horizonte, Outras Aninhadas No passeio... ............. E eu a tentar O versejo Capturado Num enleio Desta prisão Do desejo! PALAVRAS EM CORRERIA, Letras Perdendo forma Como fios De um novelo Já desfeito De sentido Como a água Do gelo... SÃO FIOS EMARANHADOS, Letras Que se deslaçam E procuram Outras formas Para lá da minha Rima, São riscos Na tua tela A subir Por ela acima... QUERO FAZER-TE UM POEMA Com palavras Desenhadas Mas elas fogem P’ra longe Correm, correm Assustadas Não vá mesmo Ser verdade Que as quero Alinhadas Neste recanto Feliz Onde resisto À saudade. ELAS GOSTAM DE CANTAR Esta minha Triste dor E gostam De me dizer Esta intensa Emoção... ........... Mas se vêem Que és feliz Fogem de ti, Dizem “não!” O POEMA PASSARINHO Procura-te Para cantar Mas se já Não sentes nada É ele que foge A voar... E HOJE É MESMO ASSIM Fogem todas As palavras Sem procurar Um destino, Já não consigo Agarrá-las Num poema Genuíno. NÃO SABEM DA MINHA DOR E por isso Vão embora Estou sem palavras, Amor, Estou muito triste, Agora!
































































































