PALHAÇO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Máscara”
Original de minha autoria
para este Poema. Fevereiro de 2019

“Máscara”. Jas. 02-2019
POEMA – “PALHAÇO”
COMPREI UMA MÁSCARA,
Pu-la no rosto do
Meu amado poeta
E ele não a enjeitou.
Ainda por cima
Me disse
“- Sou eu, sou...
........................
Como nas palavras
Que digo
Também meu rosto
Mudou".
"NÃO ESPERAVAS
Ver-me assim!
Vá, confessa
O teu espanto!
Luzinhas na minha
Cabeça,
Rosto tão
Desfigurado,
Cor, tanta cor,
A que apeteça
Pra sufocar
Esta dor
Sempre que ela
Apareça
A pedir o meu
Cuidado".
"ADOPTEI ESTA FIGURA,
Apresento-me assim,
As outras
Nada te dizem,
Com esta
Olhas pra mim!"
"PALHAÇO
É O QUE SOU,
Falo a
Surdos e mudos
Que não ouvem
O que digo
Nem me dizem
O que quero
Como se fosse
Mendigo
Do que, afinal,
Nem espero".
"VALHA-ME POIS
ESTA MÁSCARA!
Assim rio
Desta vida,
Rio de ti
E de mim,
Da chegada
E da partida,
Dos abraços,
Das palavras...
..................
E também da
Despedida!"
"SOU PALHAÇO,
É o que sou!
Entretenho-me
A cantar...
E se ouvires
Este canto
Arlequim
É seu autor...
......................
Não t’importes
Nem o chores,
Pois o que diz
No poema
É para espantar
Sua dor!”
A MÁSCARA
É o seu rosto,
Colou-se-lhe
Logo à pele
Com a cola
Do desgosto
E por isso
Já nem sabe
Se este rosto
É o dele.
COMPREI UMA
MÁSCARA
Luminosa
No mercado
Da minha vida,
Ponho-lha sempre
Que posso,
À chegada
E à partida!
NÃO LHA TIRES
Que rasgas a sua
Alma
Pois se o canto
O liberta
É a máscara
Que o salva!

“Máscara”. Detalhe.
“OLÁ!”
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Raízes”.
Original de minha autoria
para este poema. Fevereiro de 2019

“Raízes”. Jas. 02-2019
POESIA – “OLÁ!”
PEDI-TE UM DIA
Que me desses
Um “Olá!”,
Com súplica
Em magnólia
Pra romper
O teu silêncio
E sarar
Esta ferida
Que me causa
Tanta dor...
E “OLÁ!” TU ME
Disseste,
Tão rápido
Como o vento
Que me sopra
Sobre a alma
Quando cruzo
O teu olhar!
BALBUCIEI
O teu nome
Já distante
Do “Olá!”
Sem saber
O que fazer,
Se chamar-te
Para mim
Ou para longe
Partir...
...........
Não sabia
Que dizer!
MAS QUANDO VIREI
O rosto
Vi-te de novo
Austera,
Muito fria
E distante...
...............
Ignoravas
O passado
Que passara
Nesse instante!
JÁ MUITO LONGE
De ti
Voltei a pedir
Um “Olá!”,
Mas já não
Me respondeste...
.....................
Caíra um raio
Do céu
Que rasgou
Esse teu véu
Donde ainda
Me olharas...
E DEPOIS...
Tantos “Olás!”
Te pedi,
Tantas vezes
Te chamei,
Os poemas
Qu’escrevi
Palavras
Que derramei...
....................
Sabendo nada
De ti!
TALVEZ O VENTO
Te chame,
Talvez a flor
Te seduza,
As raízes te
Comovam
Ou o poema
Te diga
Que nunca
É tarde
Demais
Pra que no eco
Te encontre...
.................
Meu amor!

“Raízes”. Detalhe.
O POEMA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Ela”. Original de minha autoria para este Poema. Fevereiro de 2019.

“ELA”. Jas. 02-2019
POEMA – “O POEMA”
PRA QUE SERVE O meu Poema Se ela, Do outro lado Da rua, Não o vê e Não o ouve, Não lhe sente O perfume Que a alma Inebria? AH, MAS EU SINTO-A A ela Do lado de cá Do Poema E pinto-a Em aguarela P’ra que veja A minha dor... ................. Olho-a, então, Com palavras E falo-lhe Como pintor. PRA QUE SERVE O MEU POEMA? Pr’aquecer A minha alma Dizendo tudo O que sinto Mesmo quando Nos meus versos Até parece Que minto... MAS NÃO ESCREVO Pra ela Que não a vejo À janela A ver passar O poema Na rua do Desencontro... O POEMA É de quem O queira ver E ouvir-lhe A melodia, Ler ou mesmo Cantar Como uma sinfonia, É a festa Dos sentidos, É prazer, É emoção, Não o ouve Nem o vê Quem não pode Ou quem não queira... .................. Não é coisa da Razão! O POEMA É SEMPRE CANTO, Vale pela melodia, Pelos sentidos que Desperta Cada hora, Cada dia... É VIDA QUE ME LIBERTA Das amarras Da paixão Porque voo com Palavras Ao sabor da emoção. E SE TE CHAMO Ao poema É pra ter de volta O meu eco, Ouvir o som Desta dor, Decompô-la Em palavras, Anulando a paixão Num canto libertador Das amarras Da prisão. PARA ISTO EU SOU POETA, Canto pra quem Me ouve, Não espero Reacção, Porque sei que Já partiste, Me deixaste Em solidão. EM CANTO-ME Nestes poemas Pra redimir Minha dor E se a poesia Não chega, As palavras Não me bastam, Pois que seja... ................... Sou pintor.

“Jardim”. Jas. 02-2019
LUZ
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “O Arbusto”. Original de minha
autoria para este poema, à procura
da sinestesia perfeita.
Janeiro de 2019.

O Arbusto. Jas. 01-2019
POEMA – “LUZ”
LUZ DO CÉU,
Muita luz
Descia por uma
Fresta
No coração
Do arbusto
Sobre meu
Olhar
Fascinado...
TÃO INTENSA
E brilhante
Ela era...
Como raio
(Ou quimera?)
Me cegou...
...............
E fiquei
Aprisionado!
LUZ, MAIS LUZ,
Queria eu,
Era luz que me
Faltava...
E ela
Esmoreceu
No meu olhar
Esmagado!
MAS FICOU DENTRO
De mim,
Num poema
Ou desenho
Esboçado,
Cores, traços,
palavras,
Memória que
Não tem fim...
.....................
Até que essa luz
Se apague
No arbusto
Do jardim...
LUZ, MAIS LUZ,
Insistia o poeta
Ao entardecer
Desse dia,
Quando a luz
Esmoreceu
E nela ele
Se perdia...
ERA VIDA
Que findava
Ou tempo
De despedida
Que cedo demais
Me chegava!
MAS A LUZ
Reavivou
Dentro de mim -
O meu sol-,
Renasceu
Nessas cores
E nas palavras
Que me saem
Cá do peito
E do fundo
Da memória...
.............
São poemas
Que te grito
E não ouves,
São cores
E riscos
Com que me rasgo
A alma,
São os sons
Destas palavras
Com que
Ouço o teu
Silêncio,
É pauta da melodia
Que já não sei
Soletrar...
...................
Por falta de ti,
Meu amor,
Que te negas
Ao olhar...
..............
P’ra que eu
Sempre te dance
Ao ritmo dessa
Saudade
Que me dói
Cada vez mais
Para melhor
Te guardar...
FOI ASSIM QUE
A LUZ
Voltou
P’ra iluminar
O arbusto
Que me tempera
A alma
Com suas folhas
Amargas,
Infusão de sentimento
Que me assalta
O corpo
Quando chega
A solidão...
REGRESSO, ASSIM,
Ao começo,
Tropeço na tua luz,
Ilumino-me a
Alma
E ponho fim
Ao desgosto
Dessa perda
Irreal
Que descobriu
No poema
Remédio
Para o meu mal.

Detalhe.
GEOMETRIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Triângulos”.
Original de minha autoria para este
poema. Janeiro de 2019.

Triângulos. Jas. 01-2019
POEMA – “GEOMETRIA”
MEUS POEMAS
São triângulos
Perfeitos,
Geometria
De afecto
Irreal
Com três lados,
O poeta
Refractário,
A musa
Que o inspira
E a fonte
Seminal...
“ - PORQUÊ
GEOMETRIA”,
Dirias tu,
“Se o amor não
É exacto,
Perfeito e
Linear,
Linha pura
De um rosto
Que só tu podes
Olhar?”
PORQUE A GEOMETRIA
Eleva ao excelso
Paraíso,
Exactidão,
Leveza,
Rapidez,
Linhas
Rectas,
Refracção
(Como vês)
De um rosto
Divinal
Que projecto
Com a alma
No meu jardim
De cristal...
ELEVA-ME
À perfeição,
Que não é
Pecaminosa,
Distante
Da curva linha
Rugosa
Que descreve
O amor
Em gestação
Como onda
Sinuosa,
Turbilhão
Nesse vasto
Oceano
Que não ouso
Enfrentar...
E, POR ISSO,
Quando desenho
O amor
Como círculo
Perfeito,
Ângulo
Agudo do sete,
Eu perco-te,
Mesmo que o
Desenlace e
O projecte
Como linha
Que descreve
Um voo
Ao infinito
Que já transborda
De azul...
POR MAIS FIGURAS
Que desenhe
Ou fugas
Que eu encete,
Linhas no fio
Do céu,
Não encontro
O amor,
Mas projecção
Geométrica
De uma nudez
Interior
Que eu espelho
No meu canto,
Expiação
Desta dor!
NÃO HÁ AMOR
Num triângulo
Perfeito,
Bem sei,
Na aritmética
Do espaço,
Linha em fuga
De uma deserta
Rua
Para lá do
Horizonte
Dessa alma
Sempre nua...
AH, MAS NA COR...
Na cor que sinto
Bem fundo
Dentro de mim,
Como fonte
De calor
Com que me
Visto a alma
Para me agasalhar
Desta tão fria
Dor...
Sim, eu vislumbro
O amor...
.............
Nas faces
De um cristal
De onde te vejo
Em triângulos
De cor e luz,
Espelhos
Desse teu rosto
Em refracção
Luminosa
Que ao poeta
Inspira e seduz
Quando te canta
A beleza
P’ra te dizer
Do destino
A que o poema
Conduz...
MEUS POEMAS
Serão, pois,
Triângulos
De luz e cor
Que m'iluminam a
Alma
Onde te guardo
Escondida,
Para sempre,
Meu amor!

Detalhe.
PERFUME
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Perfume”. Original de minha autoria para este poema. As duas referências que gostaria de assinalar, neste poema, são as “Memórias de Adriano", da Marguerite Yourcenar (Alfragide, Leya, 2018: 72-73), e "Os Sonetos de Shakespeare" (Lisboa, Quetzal, 2016 - Soneto 54). Janeiro de 2019.

Perfume. Jas. 01-2019
POEMA – “PERFUME”
E SE UM DIA
Me perguntasse
O que é, para ti,
O amor?
Pintar
Esse teu rosto,
A retórica
Do corpo,
Celebrando-te
A cor?
OU DIZER-TE
NUM POEMA,
Retórica
Da minha alma
Que te sofre
Em dilema
Entre o silêncio
E o canto
De tão longa
Ser
Esta nossa
Despedida?
DESENHAR-TE
Como se fosses
Flor
À medida do
Desejo,
A retórica
Da cor
Que sempre,
Ao ver-te,
Festejo?
O QUE É?
O perfume de uma
Rosa,
Branca
Ou vermelha
De cor,
Que sempre
Me enche
De ti
E me perde,
Meu amor?
DESENHAR UMA
PAISAGEM
Contigo
No horizonte,
Uma brisa
Que sopra
Suavemente
Lá em cima
No meu Monte?
O QUE É PARA TI
O AMOR?
Ouvir-te
Como minha
Sinfonia
Ou sentir o teu
Silêncio,
A secreta
Melodia?
ENLAÇAR TEU CORPO
Ao meu,
Um calor
Que inebria,
Celebrar-te
Sem parar
Uma noite
E um dia
Ou projectar
No espelho
O teu corpo
Virtual,
Celebrando
Teu perfil
Como minha
Alquimia
Num estranho
Ritual?
SABES O QUE É,
MEU AMOR?
Talvez não...
..................
De tanto te
Celebrar,
Pintar,
De tanto cantar
O teu rosto,
A beleza seminal,
Numa tela,
Num ecrã
Ou no meu triste
Mural...
................
Este amor
Pode até ser
Negação...
SAI DE TI
E deixa-te ir,
Vagueia
A vida
Com alma,
Não celebres
Com tristeza
Cada tua despedida
Como se o tempo
Parasse
Para não seres
Esquecida...
SAI DE TI, SIM!
Procura
O que o mundo
Te dará
Pois essa será
A tua certa
Medida...
AMOR TALVEZ SEJA
O perfume
De uma rosa
Em gestação,
“Brando odor que
Nela habita”,
Cor intensa,
Forma bela,
Palavra que
O poema
Sempre hesita,
Mas interpela
Em versos que
Te destilam
Verdade
Quando a vida
Se resolve
Na escrita...
...................
De uma tão funda
Saudade!
PINTO-TE COM PALAVRAS!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Chakra”. Original de minha autoria para este poema. Janeiro de 2019.

Chakra. Jas. 01-2019
POEMA – “PINTO-TE COM PALAVRAS!”
TU PINTAS-ME... Eu bem sei, Gastas a alma Na cor E nos riscos Que te fazes Para assim Me compor, Elevar em Catarsia, Parar a dor Que te canto, Choro triste, Poesia. “- E TU CANTAS Meus pobres Traços, Euforia De paisagens, Rostos perdidos No tempo, Cores que Tapam A tristeza De te perder Para sempre Como minha Melodia”. SIM, EU CANTO Todas as cores Com que te pintas A vida, O que te nasce Das mãos Sempre já em Despedida... E CANTO As minhas dores Com essas palavras Gastas Que são como Os sabores Com que tempero O destino De ti sempre Tão ausente Como laico Do divino! SIM, EU CANTO A vida Sem a tinta Que é, afinal, Um desejo... Flui-te das mãos, Expõe-te a alma (Um lampejo!) Ao poeta Que te pinta Em versos Como cometa Que nasce E morre Consigo Como frágil Borboleta Que perdeu O seu abrigo... PORQUE DESENHAS A alma Com silêncio Que tu logo Cobres De tinta P’ra que eu já Não te veja Em meus versos Enganados E, assim, Já não te minta... MAS EU VEJO-TE Sempre Num poema Para além da Tua cor, Por isso vivo Em dilema: Sou poeta ou Pintor? SE TE PINTO, Cubro O silêncio De cor, Se te canto Sou eu mesmo... .............. Um poeta, Fingidor!
ESTA NOITE EU SONHEI-TE…
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Regresso a Pasárgada”. Original
de minha autoria para este poema. Dezembro de 2018

“Regresso a Pasárgada”. Jas. 12-2018
POEMA – “ESTA NOITE EU SONHEI-TE…”
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE...
....................
Já passara
Tanto tempo
Que parti
Do meu nordeste,
Do jardim do
Paraíso!
COMO SE NA
VASTIDÃO
Do espaço
Entre o sonho
E tua vida
Não houvesse
Essa tristeza
De tão longa
Despedida...
QUE ESTRANHO
ESTE SONHO,
Pois julgava-te
Perdida
Lá no fundo
Da memória,
Onde a imagem
De teu rosto
Não me fosse
Devolvida!
AH, QUE BOM
SONHAR-TE,
Recriar
O que perdi,
Virar tudo
Do avesso,
Reviver
O teu sorriso
E ficar-me
Por aqui!
ESTA NOITE
EU SONHEI-TE
E gosto
De o dizer,
É como ter-te
A meu lado
Para não mais
Te perder
Porque nasci
P’ra te amar...
...................
Esse dom
Que faz sofrer!
AH, QUE SONHO!
Ficou-me colado
Ao corpo
Mesmo quando
Acordei,
Foi um prazer
Infinito,
Pois tinha
O doce sabor
De alguém
Que eu amei.
SONHEI-TE,
Senti-te
Dentro de mim...
.................
Mas eu não sei
Por onde andas,
Se te ganhas
Ou te perdes...
..............
E esta dor
Não tem fim...
PERDI-TE
De modo diferente,
Bem sei,
Porque nunca
Te encontrei
Na ponte
Desse teu rio
Que eu nunca
Atravessei.
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE...
...........
Voltaste
De longa ausência,
Voltas sempre,
Sim, eu sei,
Porque de mim
Não saíste,
Do dia em que
Te encontrei.
MAS PARECE
Que te esfumas
No poço fundo
Do tempo,
A tua imagem
S'esbate
Nesta retina
Já gasta,
Tua voz é
O silêncio
Deste som
Que me consome,
Teu olhar
Fica cerrado
Para nunca mais
Me ver,
Braços caídos
No corpo
Para não me
Abraçares
Nem que seja
Na memória
Do que nos sobra
Da vida!
É ASSIM QUE
EU TE SONHO,
Vendo-te um pouco
Perdida,
Comigo sozinho
No cais
Com a alma
Adormecida,
Porque daqui,
Deste meu
Sonho,
Tu já não sais,
No resto da
Minha vida!
ESTA NOITE EU
SONHEI-TE
Porque estás
Longe de mim,
Não foi por
Vontade minha,
Foi a vida,
Foi assim...
ENCONTRO
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Dame mit Ohrring”. Original
de minha autoria para este poema.
Dezembro, 2018.
Exactamente há um ano, publiquei o poema “Teus Olhos”, agora
recriado sob a mesma inspiração, mas ilustrado, não com “Dame
mit Muff”, de Gustav Klimt, que aqui evoco e invoco, mas por este
quadro de minha autoria. O percurso de um ano, aqui plasmado,
quarenta e cinco desenhos depois, de um atrevido aprendiz de pintor
que, em grave estado de necessidade poética, se lançou na ousada
aventura de ilustrador da sua própria poesia!

“Dame mit Ohrring”. Jas. 12-2018
POEMA – “ENCONTRO”
CHEGASTE SÓ,
Rápida,
Deusa
No jardim,
Asas nos olhos,
Um horizonte
Sem fim...
A LUZ MORNA
Do entardecer
Deu brilho
Ao macio
Do teu rosto
Para o embelecer
Na penumbra
Que descia
Nesse cair
De sol-posto.
TUDO É BELO
Em ti,
Quando te deixas
Ir,
E vais, livre,
Por aí,
Serena
E distante
Da fria rotina,
Seduzida pela cor
Que sempre
Te cativou
E há muito
Te destina...
“ – ESTÁS MODERNO,
Meu amigo!”
Disseste, com
Malicioso sorriso,
Suave porto
De abrigo
De que tanto
Eu preciso...
VI-TE LEVE
Como traço
De pintor
Em aguarela,
Livre como
Pagã divindade,
Suave e doce
Como mulher
Sedutora
Em terna
E já madura
Idade...
VIMOS MIL
Quadros
Luminosos
E vi teu rosto
Em contraluz,
Esse perfil
Que há muito
Me seduz,
Traços finos em
Deslumbrante
Harmonia...
................
Era assim
Que nesse
Entardecer
Eu já te via!
SENTI-ME SUBIR
Ao céu,
Privilégio
Inesperado
Esse dom
Imerecido...
............
Ver-te ali
A meu lado
E sentir-me
Tão docemente
Perdido...
VEJO-TE, SIM,
Às vezes,
De semblante
Carregado,
Sulcos marcados
No rosto,
Recolhida
Num silêncio
Ecoado,
Dias cinzentos
Quando a luz
Te põe órfã
Por momentos,
Em sofrida
Melancolia!
CHEGASTE SÓ,
Nesse dia,
Mas cintilante,
A transbordar
De luz
E alegria.
LI-TE NA ALMA
Com o olhar,
Respirei contigo
O mesmo ar,
Dei vida
Ao que eu já
Pressentia...
................
Nesse morno
Entardecer!
QUANDO TE VEJO,
Assim,
Em sonho,
Nestes dias
De leveza,
Posso dizer
Que te amo,
Que te toco,
Ao olhar,
Que te beijo
Na alma
P’ra melhor
Te abraçar,
Que te digo
O que não ouso,
Ao sabor
Do vento
Em cada
Amanhecer
E que acordo
Sempre
Ao relento
Sob o céu
A descoberto
Para logo,
Bem cedo,
Ao lusco-fusco,
Eu te ter...
NO REGRESSO,
Parei a teu lado,
Por uns momentos,
Olhei-te
Sete vezes,
Um movimento
Sem fim,
Repeti
O teu nome,
Olhaste p’ra mim,
Perdi-me
Do mundo,
Levei-te ao jardim,
Colhi duas rosas,
Respirei
Bem fundo,
Um acre aroma
Me inebriou,
Beijei-te no rosto,
Meu peito parou...
MAS LOGO PARTISTE
Sozinha a voar
Ainda mais bela,
Comigo a sonhar,
Teus olhos
De mel
Em rosto sereno
E sempre feliz,
De alma bem cheia,
Um perfil de deusa
Como eu te quis...
....................
Até que o teu nome
Comigo partisse
P’ra este poema
Onde te recebi
Com estas palavras
Que nunca te disse
Mas que te ofereço
No que agora
Eu (já) escrevi!
FUGA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Corpos”.
Original de minha autoria
sobre bailado de
Angelin Preljocaj para este poema.
Dezembro de 2018.

“Corpos”. Jas. 12-2018
POEMA – “FUGA”
SINTO A TUA FALTA
E como a sinto
Eu danço e danço
Até cair exausto
No palco
De um poema.
SINTO O TEU SILÊNCIO
Murmurado
E como sinto
O meu canto
É triste,
Amargurado!
MAS NÃO SINTO
A tua pele
E como não a
Sinto
Eu pinto-a
De cores intensas
Numa folha
De papel.
NÃO OUÇO
A tua melodia
E como não a
Ouço,
Nem que seja
Por um dia,
Eu caio logo
Em silêncio
Para melhor
Te sentir,
Cá dentro,
Na minha fantasia.
FAZ-ME FALTA
A tua voz,
O teu sorriso...
..................
E como
Nunca me dizes
O nome
Digo-to eu
Num poema
Tão sofrido
Que busco
Um paraíso
Onde me sinta
Perdido!
DA TUA FALTA
Nasce em mim
A orquestra
Para uma
Sinfonia,
Corpos que
Dançam
Abraçados
Ao sabor da fantasia,
Andamentos
Sem fim,
Em catarsia,
Contrapontos de
Silêncio,
Luzes e cores,
Aromas e
Flores...
..........
Neste palco
Do poema!
TU FALTAS-ME
E eu revivo-te
No canto e
Na cor,
No silêncio e
Na dor,
Na dança
E no amor,
Na poesia...
...............
Em palavras
Que lanço
Ao vento
Construindo
As paredes
Desta minha
Utopia.
TUDO RECRIO
P’ra te reencontrar
À distância
De um poema,
Cantar-te,
Dançando
Com palavras,
Dizer-te
Em silêncio
Para melhor
Ouvir
O que nunca
Me dirás.
VISITO-TE, ASSIM,
Das mil maneiras
Com que te
Procuro
E te digo,
Encerrado
Numa torre de marfim,
Nesta teia
Enredado
P’ra melhor
Te reviver,
Com a leveza
Da arte,
Cá bem mais
Dentro de mim.
I N O C Ê N C I A
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Loubotinhas”. Original
de minha autoria para este Poema.
Dezembro de 2018.

“Loubotinhas”. Jas. 12-2018
POEMA – “INOCÊNCIA”
ENTRE LIVROS
E POEMAS
Encontrei-as,
As botinhas,
Marcas puras
De infância
Que traçaram
Um caminho
Logo aos primeiros
Passos...
...............
Com o selo
Do carinho!
DEI-LHES COR,
A que pude
Encontrar
Nesta vida
De aventura,
E com ela
Eu pintei
As chegadas
E partidas,
Encontros
E despedidas
Na sua forma
Mais pura.
ENCONTREI-AS
E lembrei-me
Do dia
Em que eu
Te conheci,
Do sorriso
Que esbocei,
Da timidez
Que travei
P’ra te dizer
Do afecto
Que logo te
Prometi.
AGORA, REGRESSO
A elas,
Aos passos
Que ensaiei,
Às palavras
Que tentei...
................
Ao beijo
Que não te dei,
À tristeza em que
Caí...
É DE PUREZA
Que falo,
Meu amor,
Antes de a vida
Me pôr
Laços presos
Ao meu corpo
Que já não sei
Deslaçar
A não ser
Em poesia
Onde posso viajar
P’ra muito
Perto de ti.
COM ESTAS BOTINHAS
Eu voo
E regresso
Ao paraíso,
Posso dizer
Que te amo
E mais dizer...
...............
Não preciso!
EU GOSTO DE
GATINHAR COM
A ALMA,
Descobrir
O que não sei,
Encontrar-te
Outra vez,
Dar um passo,
Dois ou três,
Caminhar
Sempre inseguro,
Tropeçar
Quando me vês,
Cair prò lado
Escuro
Quando partes...
...................
Ou não me crês!
EU GOSTO DELAS
E por isso as pintei
Para tas oferecer,
Um sorriso
De criança
Antes de adormecer,
Um sinal
De esperança...
...................
E de tanto
Eu te querer!
REGRESSO
À inocência
E vejo-te
A partir dela
E assim já não
Te esqueço
Porque com
Estas botinhas
Posso voar
Lá de cima,
Da que foi
Nossa janela!
NA BRUMA DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Luar”. Original de minha
autoria para este poema. Dezembro de 2018.

“Luar”. Jas. 12-2018
POEMA – “NA BRUMA DA MEMÓRIA”
FUI LEVAR-TE Uma rosa Aos confins Do meu afecto. Desci fundo Na memória Onde ainda te Guardava Como se fosse Teu tecto. PROCUREI-TE Na bruma Espessa Que caía Sobre mim E quase não te Encontrei, De tão longa Despedida... ............... Uma saudade Sem fim! PERDI-TE O rasto E o perfil, Até teu nome Perdeu cor, Teus olhos Luziam, Incertos, Nesta neblina Da dor... PERDI-TE A VOZ E a tua Melodia, Quase tudo... ................ Mas, no fim, Não te perdia! PORQUE ERAS Uma ideia Que me sobrou Do afecto Que por ti Sempre senti, Construção De arquitecto Para nunca Te perder Desde o dia Em que te vi. NO MEIO DA NEBLINA Esfumava-se O teu rosto De tanto eu Te perder, Incerto O cintilar De teus olhos Que eram negros Nessa ideia De te ver. ERA BRUMA Indefinida Este meu Esquecimento, Mas sobraste Como ideia Nesse preciso Momento. E VOLTEI! Eu volto sempre! É desejo De te ver, Dar-te corpo Nas palavras Com que te quero Dizer Em cada dia, Depois de, no fim, Te perder (Eu bem sabia). AGORA, DESENHO-TE Com palavras e Com cores, Com paisagens Que tenho dentro De mim, Com rostos E com flores, Aromas, Um passeio Com pavões, Utopias, Gritos d’alma, Emoções... .................. P’ra te recriar Com magia E contigo Caminhar Lá mais no alto, Na fantasia, Onde vive Essa ideia Que procuro Quando te quero Encontrar! VOO COM UMA Rosa, Disfarçado de Insecto, P'ra te ver Ali de perto, Olhos negros, Cintilantes, Fugidios Ao fascínio Do jogo da sedução Numa noite De luar... ............ E talvez De perdição! MAS TEUS Olhos Apagam-se Na fria penumbra Da memória E, então, Pinto-os Com as cores Do arco-íris P’ra melhor Te inventar Banhada Pelo sol Nas mil gotículas Que brilham Dentro de mim, Ponte luminosa Donde sempre Te alcanço P’ra me resgatar Com flores Do teu quimérico Jardim. TOMA ESTA ROSA, P'ra que sintas O aroma Do meu estro E como, ausente, Eu te guardo Tão perto de mim!
O PAVÃO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Azul no Parque”. Original de minha
autoria para este poema. 25 de Novembro de 2018.

“Azul no Parque” – Jas. 25.11.18
POEMA – “O PAVÃO”
FUI AO PARQUE
Do Mar’chal,
Logo ao amanhecer,
Num triste dia
D’outono,
À procura do pavão...
...........................
Eram muitas as saudades
Pois passara mais
De um verão!
ENCONTREI-O
Por ali,
Sozinho,
Também triste
Como eu
(Ou talvez não),
E vi nele,
Ao caminhar,
As cores fortes
Desta minha
Solidão...
PORQUE É
Tão belo
O meu pavão?
Porque se exibe
E me seduz,
Me enche
A alma e o olhar
De tanta cor,
De tanta luz?
Talvez não,
Pois esse seu
Porte austero
Estranha
A minha alma
E gela-me
A emoção!
MAS SEGUI-O,
Nesse dia,
Parque fora
No silêncio
Luminoso
Da manhã...
.......................
Folhas caídas
No chão
Acolhiam
O nostálgico
Passeio
De um poeta
E um pavão...
NESSE JARDIM
Do encontro
A beleza
Despontava
Em seu ritmo
Natural...
..................
Passos lentos
E cuidados,
Pose austera,
Altivez,
Um singelo
Ritual!
CAMINHEI COM ELE
Horas a fio,
Lado a lado,
Sem destino,
Revendo
As cores que
Um dia
Te emprestou
Num jogo
De sedução
Que à arte
Te levou
Como torrente
Sensível
Ou lava
De um vulcão!
JÁ NO ALTO
De um muro,
Oráculo,
Arte pura,
Aparição,
Perguntei-lhe
Qual a cor
Da tua alma
E ele mostrou-me
(E com razão)
Esse azul
Tão luminoso
Onde sempre
Se esfumam
Os traços
Da tua mão...
...................
E logo,
E por encanto,
Eu vi
Espelhado
O teu rosto
Nas cores vivas
Do pavão!
LUA
Poema de João de Almeida Santos, inspirado no quadro de Paula Rego “O Baile” (1988). Ilustração: “Mouvement”. Original de minha autoria para este Poema (Composição sobre bailado de Jerome Robbins/Philip Glass - Ópera Nacional de Paris - 2018). Novembro de 2018.

Mouvement. Jas. 11.2018
POEMA – “LUA”
DESCI À PRAIA Da meia-lua A ver se te via Num anoitecer Que, com tanta luz, Há muito Não acontecia! ERA DA LUA-CHEIA A luz que havia, Gente que dançava Em dia de festa, De som e de cor, E se divertia! NO CLARO DE LUA Vi um rosto De mulher Que não era Estranho, Um perfil qualquer... ERAM NEGROS Os seus olhos, Boca Rúbida e quente, Pele macia Em corpo ardente, Cabelos ao vento... ..................... Vi que era ela A deusa do baile, Luz branca da lua, Espelho de mar... ...................... E logo minh'alma Procurou a sua Nesse cintilante Brilho do luar... COM ELA DANCEI, Saltei e cantei Em alegria, Respirei a fundo Essa melodia Que me inspirava Numa bela praia Em forma de lua Que me seduzia. VI O SEU SORRISO Em perfil na lua Que eu desenhei, Uma luz intensa Me alumiou Quando eu dançava Essa melodia Que p’ra mim soou. CORPO DE MULHER... Eu já nem sabia Se era ela Ou outra qualquer Com quem eu podia Erguer-me à lua Com alma despida Neste frágil corpo Pouco mais que nu. E TAMBÉM A ALMA À sua procura Era de nudez Um pouco ousada, Mas, sim, era pura Por ser nesta lua Que eu adivinhava A minha ventura... ........................ Pouco mais que nada! ONDE ESTÁ A LUA? Nessa bela praia Ou noutro lugar Onde a possa ver Espreitar a rua P'ra me enfeitiçar? ESTÁ EM TODO O LADO Onde o poema Estiver, Desenhando Com palavras Um suave rosto Que é mais de deusa Do que de mulher...
ESPELHO DO TEMPO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Esfera do Tempo”.
Original de minha autoria para este Poema.
Novembro de 2018.

Esfera do Tempo. JAS. 11-2018
POEMA – “ESPELHO DO TEMPO”
QUEM ÉS, Tu que ressoas Na minha imaginação Sempre que parto Para um poema? TEMPO Que flui E se gasta Dentro de mim Como memória que se esfuma? ESFERA DO TEMPO... É como te vejo Do lado de cá Do espelho Plano Onde te reflectes Cada vez mais Como espectro Intangível. TEMPO, O nosso tempo, Que desliza Silencioso, Implacável, Como esfera De fogo, Meteorito Incandescente Sobre o jardim Das magnólias Encantadas Que me hão-de Renascer Em cíclico Retorno... E EU VOO Atrás dele, Do tempo, Levito, Queimando-me As entranhas, Vestido de Azuis Que se mancham De nuvens carregadas Para apagar O fogo Que faísca, Intermitente, Sobre mim. ÉS TEMPO, SIM... E és passado Quando te revejo Através de um Espelho Baço e enrugado, Superfície amarela Iluminada por um Clarão ao rubro Que parece Sombrear Este presente Sofrido! MAS O MEU TEMPO, Esse, É intervalo Entre o que foste E o que serás A meus olhos Já húmidos De tanto fixar Os teus espelhos De água (Azul marinho) Em busca De uma poética Da salvação Quando me afundo Na memória Com que ainda Te tenho E te canto! DENTRO DE MIM Há, como sabes, Um fogo intenso Que me consome, Mas que só arde Por fora Porque espelhos Líquidos Me devolvem a chama De través Para não petrificar Como lava De um vulcão Aceso Que me fascine E atraia Como se fosse Borboleta... ÉS TEMPO E já não te alcanço Neste balancear Incerto Onde me gasto Em poemas Para não ficar Prisioneiro Do passado Nem de um futuro Que se anuncie Rápido a Devorar-me O presente. QUEM ÉS TU, AFINAL?
VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA
Poema de João de Almeida Santos.
Diálogo com o poeta brasileiro
e nordestino Manuel Bandeira - 1886/1968
(Poemas: “Vou-me embora p’ra Pasárgada”
e “Brisa”), pelo cinquentenário da sua partida.
Ilustração: “Pasárgada”. Original
de minha autoria para este Poema.
Novembro de 2018.

“Pasárgada”. Jas. 11-2018
POEMA – “VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA”
VOU CONTIGO P’ra Pasárgada, É outro mundo, Irmão, Eu não fico Por aqui, Falha-me A inspiração Porque a brisa Do nordeste Ficou lá No Maranhão! NÃO TENHAS, Manel, Saudades, Nostalgia do futuro... Temos passado Que baste E foi, sim, Foi muito duro! VOU CONTIGO P’ra Pasárgada Não quero Ficar aqui, Há tempestade No ar E a brisa do nordeste Não passou Do Piauí. P’RA PASÁRGADA Quero ir, Lá todos Falam verdade, Por aqui Ah, eu nem sei, Já me falta Liberdade... GOSTO DE TI, Ó poeta Do reino Da utopia, Sem passado Nem futuro, Onde se faz Poesia, Se pinta, Canta E dança Porque o ar É do mais puro E cheira A maresia! VOU CONTIGO P’ra Pasárgada, Por aqui Não fico bem, É escuro O horizonte E eu até Já me sinto Como se fosse... .................. Ninguém! NÃO GOSTO D’estar aqui, Há ruído Que é demais, Esta terra Não me serve, Eu espero-te No cais... .............. Vou contigo No teu barco, À procura De mar calmo, Céu sereno E tudo o mais, Navegando No azul, Peixes voando No mar, No horizonte Uma ilha, Mulheres lindas A acenar... EM PASÁRGADA Sou feliz Canto e Danço Na madrugada Até que o corpo Se canse Com alma Apaixonada E adormeça No regaço Da mulher Que for amada. POR AQUI OUÇO Ruído, Há armas A crepitar, Matam poemas Com gritos, Já não podemos Cantar... VOU CONTIGO P’ra Pasárgada Meu mestre De poesia, Cantarei os teus Poemas Seja de noite Ou de dia... VOU CONTIGO P’RA PASÁRGADA...
DUAS HORAS…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Entardecer”. Original de minha autoria para este poema. Outubro de 2018. (Reproposição de um poema de 2017, com adaptações e nova ilustração).

“Entardecer”. Jas. 10-2018
POEMA – “DUAS HORAS…”
OLHEI-TE NOS OLHOS! Eram negros, Intensos E tão profundos! Toquei teus cabelos Com o olhar, Caminhei a teu lado Nesse jardim, Senti o teu corpo Tão perto de mim A respirar O acre perfume Da verde Ramagem Do vasto jasmim… INEBRIOU-ME Esse intenso Aroma E eu enredei-te Em tão doce Enleio Que não tinha fim… BRILHARAM Tão docemente Duas horas inteiras Esses teus olhos... ......................... E neles me perdi! ESTIVE NO CÉU Ao lado de deus E lá vi dois sóis Que não eram dele (Uma luz intensa) Porque eram teus! MAS O TEMPO Correu Depressa Demais... .................. E é sempre assim, Todos os dias Se tornam iguais Quando tu partes E, em nostalgia, Eu fico no cais… VOLTEI A OLHAR-TE Três horas seguidas... Parecia verdade Mas era ilusão Porque partiste Deixando-me só E o que sobrou... .................... Foi solidão! SUBIU A TRISTEZA, A saudade irrompeu Colou-se-me Ao rosto... ............... E como doeu! SE EU NÃO TE VEJO Sinto Falta de ti, Mas se te encontro Logo te perco Porque o tempo Voa E logo te leva P’ra longe dali! TER-TE DEMAIS Aumenta a saudade E quando te vais São negras As nuvens Da nossa cidade! AINDA QUE TRISTE Eu sou feliz E com estas mãos Te vou escrevendo O que quero dizer... ........................ Mas este meu tempo Volta a correr E cresce a vontade De logo te ver Mesmo que saiba Que é nesse instante Que te vou perder… TENHO SAUDADES, Saudades de ti, Desse virar Da nossa esquina, Na mesma rua Onde te vi, Dessa janela Donde espreitamos O que do mundo Sobra p’ra nós… EU JÁ NEM SEI Que hei-de fazer, Ter-te demais É puro prazer... ................... Mas quando te vais Fico a morrer! NEM SEI QUE Te diga, Ah!, meu amor, Quando me deixas Já nem sinto dor Tão grande a tristeza De já não te ter Pois tu partiste Mesmo sem querer! OLHEI-TE NOS OLHOS, Sim, meu amor, Nesse entardecer...
O TEU CORPO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Penché”. Original de minha autoria para este Poema sobre um bailado na Royal Opera House. Outubro de 2018. Nota: “Penché” é o nome que designa a posição que, em dança, continua o “Arabesque” e é a que se vê neste quadro.

“Penché”. Jas. 10-2018
POEMA – “O TEU CORPO”
HÁ POESIA No teu corpo... Alma geométrica Que se desenha No espaço Para te contar Sem palavras, Contraponto silencioso E expressivo Da tua melodia. HÁ MÚSICA No teu corpo... Pauta Da beleza Que levita, Instável, Entre cores, Desenhando Enigmas Que só o Poema Pode decifrar... TENS A ALMA Inscrita No corpo, Como eu a Tenho nas palavras Que roubo Ao poema inatingível Que procuro, Incansável, Como minha utopia... VEJO-TE Como letra De uma canção Que vou cantando Na minha subida Ao Monte, Porque o vale Já não me chega, Nem tu chegas, Pois partiste Em busca dos palcos da tua vida... MAS EU RESPIRO, Com o poema, A tua dança, Ao longe, Em forma de Letra No discurso da Beleza Em que nos vamos Enredando Como em teia Que prende E nos liberta... E PROCURO-TE Na pintura, Fixo-te Para te cantar Quando a noite Cai sobre mim E mergulho Na solidão Do silêncio Com que, de longe, Me falas. VEJO-TE Num bailado A solo, Dançando, Dançando, Para que te cante Num poema, Ao ritmo do Corpo E da alma Com que te Vais desenhando Nas telas Da tua vida. E, NO FIM, Rogo-te Que não pares O teu silencioso E longínquo Bailado Solitário Até que eu te Desenhe Em palavras Para que nelas Te revejas Como se fossem O espelho Encantado Da tua alma!
A TEIA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Pas de Deux”. Original de minha autoria para este poema (sobre um “Pas de Deux” na Royal Opera House - Londres). Outubro de 2018.

“Pas de Deux”. Jas. 10-2018
POEMA – “A TEIA”
JÁ GASTEI Todos os poemas Cantando O que não ousas Ouvir. Já me fogem As palavras E fico mais Pobre de ti! JÁ NEM SEI Se é silêncio Ou são notas Dissonantes Com que me cobres A suave Melodia. NEM PALAVRAS Nem cores Nem notas (Desenhadas) Na pauta Do silêncio Com que me falas... ................... Nada! AH! NEM EU Já saberei Nomear-te Na hora Da despedida, No encontro Que nunca Marcaremos Nessa baça Encruzilhada Onde sempre Te perdi! PARA QUE SERVE A poesia Se não a Sentes... Por dentro? Para que serve A pintura Se não desenhas Com a alma? Para que serve Gritar Se não ouves... Com o peito? Para que sirvo eu, Poeta, Se não te vejo... Por fora, Mesmo que te desenhe E cante... Por dentro? PARA NADA, A não ser Para celebrar O futuro De um passado Que esmoreceu Para nunca lá chegar, Perder-me Na rotina Dos ecos Silenciosos Da alma, Enganar-me Em desencontros Inventados, Ir por aí Sem saber Para onde vou, Desaparecendo Na montra Dos meus inúteis Passeios Pela arte Que desenterrei Das vísceras! AO MENOS DANÇO Em Pas de Deux Com meus Poemas Desenhados, Enredado Nos mil fios Da fértil Imaginação Do poeta pintor Que levita Sobre escombros De uma casa (Ou de um palco) Que nunca construiu... É A DANÇA Da solidão, Contigo Suspensa Nos fios Da teia Em que vou Enredando A minha vida, Até tombar exausto, Ao cair do pano... .................. Que tarda!
NEBLINA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Deusa”. Original de minha autoria
para este poema. Outubro de 2018.

“Deusa”. Jas. 10-2018
POEMA – “NEBLINA”
CRUZO-ME CONTIGO
Nas frias ruas do
Desencontro...
E não te vejo!
CAIU NEBLINA
Sobre nós...
............
Um fino véu
Translúcido
Desce
Sobre o meu
Rosto
Quando te
Pressinto!
ESVAI-SE
A nitidez
E regresso
À memória
Onde ficou
Gravada
A ideia
De ti,
O retrato
Imaterial
Que desenhei
Na fina tela do meu
Imaginário,
As cores intensas
Que te iluminam
E quase me
Cegam....
................
Por dentro.
CRESCES
Em mim,
Mas diluis-te
Por fora
Como espectro
Que se esgueira
Na fria bruma
De um entardecer,
Sem deixar rasto.
DA TUA IMAGEM
Física
Restam-me
Ténues riscos
De um rosto
Em aguarela
Inacabada
Que desmaia
No tempo
Que passa,
Veloz.
POR FORA,
O azul é cinzento,
O sol é sombra
E a luz já nem
Atrai
As borboletas
que lhe voam longe.
O som emudece e
O tempo pára.
A vida já só
É passado.
Arrefeceu.
Petrificou!
MAS HÁ UM
Contraponto
Luminoso!
Lava ao rubro,
Quente,
Jorra em mim
E inunda-me
A imaginação.
O sol
Acende a tua
Imagem irreal...
................
E então ganhas
Perfeita
Nitidez,
Cor exuberante,
A forma
De uma deusa
Luminosa.
Até o silêncio
Fala
E nele
Ouço, por dentro,
A tua
Encantatória
Melodia.
REACENDE-SE
Vida
Na minha
Imaginação
E eu recrio-te
Para voar,
Em fuga,
No teu azul
Até ao infinito...
.....................
E não mais
Voltar
Às frias ruas do
Desencontro.
Pas de Deux
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “O Coreógrafo”. Original, de
minha autoria, para este poema.
Setembro de 2018.

“O Coreógrafo”. Jas. 09-2018
POEMA – “Pas de Deux”
SOU COREÓGRAFO
Da minha alma,
Desenho-me
No espaço,
Embalado
Pela suave
Melodia do teu
Silêncio...
IMAGINO-ME,
Às vezes,
Num "pas de deux”
Contigo
Num palco
Em noite
De luar
Ali, na praia
Da meia-lua,
A dançar
O murmúrio
Desse mar
Com que te
Pintas
E ouves
Dentro de ti!
DANÇO
Com palavras,
Suspenso no ar
Pelos fios
Dos poemas
Com que
Teimosamente
Ilumino
Os caminhos
Por onde nunca
Ousas passar...
O SILÊNCIO É A TUA
Sinfonia,
O teu canto
De sereia,
A melodia
Que ressoa
Nesse mar
De linóleo
Onde me desenho
No suave
Bailado,
A solo,
De uma infinita
Despedida...
GOSTO DESTA
DANÇA
Espectral,
Contraponto
Dos sinais
Invisíveis
Com que pontuas
A tua assinalada
Ausência.
E CANTO-TE, SIM,
Mas, neste meu
Cantar,
Eu conto-me
Como espelho
Onde podes
Rever
O passado
Desse futuro
Que nunca
Existirá.
AGORA, SOZINHO,
No linóleo,
Ao pé da praia
Da meia-lua,
Acendo um sol
Com minhas mãos
E procuro
O que nunca
Encontrarei...
...............
A não ser
Sombras
De mim próprio
Gravadas
Na areia
Da baixa-mar.
POR ISSO, DANÇO,
Canto e
Pinto
Em contraponto,
Livremente,
Com a melodia
Interior
Que toma
Conta
De mim
Sempre que um véu
Protector
Desce sobre
O meu rosto
Para apenas
Pressentir a tua
Silhueta,
Quando
Atravessas,
Atarefada,
A rotina
Dos teus dias.
ESTE,
O que te celebra
Em arte,
Já não sou eu,
Mas o coreógrafo
Da (minha)
Melancolia!
É OUTRA, A JANELA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “A Outra Janela”. Original de JAS
para este Poema. Setembro de 2018.

“A Outra Janela”. Jas. 09-2018
POEMA – “É OUTRA, A JANELA…”
DESTA JANELA
Não te vejo!
Há um caminho,
Uma silhueta
Que se insinua,
Mas não sei
Onde me leva...
SÓ SEI QUE
Parto,
Com o olhar,
De um viçoso
Canteiro
Verdejante
Onde as camélias
Me apontam
Um incerto
E sedutor
Destino,
A levante...
SIM, HÁ SEMPRE
Uma outra janela
De onde ver
O mundo...
.................
Mas nesta
Não te vejo
Sequer como perfil,
A nascente.
VEJO, SIM,
Uma rua
Ou um rio,
Um traçado sensual,
Marcas
(Invisíveis)
De passos remotos
Escritos na água,
Um recanto liberto
Do presente,
Um caminho
Onde ninguém
Cruzou
Afectos
Para se despedir
Do que nunca
Ousou...
É OUTRA JANELA!
Não é a tua
Nem a dela,
Debruçadas sobre
A montanha
Ou sobre o mar!
É outra
De onde nunca
Verei
O teu rosto,
Porque dela,
A levante,
Lá onde nasce
O sol,
Chega uma luz
Que me cega
De tanto brilhar...
É A INTENSA
Luz do dia
Que nos convida
A viver, sim...
....................
Mas o poeta
Dobra-se
Em si,
Com metódica
Timidez,
Para alcançar
Uma luz interior
Que o ilumine...
Sem cegar!
ENTENDES?
O mundo,
Quando acorda,
A nascente,
Ou entardece,
A poente,
Muda de cor
E de luz,
Mas vê-se sempre
Duma janela...
.............
E eu, a ti,
Vejo-te sempre
A sul,
Uma parábola
Entre o nascer
E o entardecer...
Quase como
Um destino!
SIM, TUDO DEPENDE
DO OLHAR,
Bem sei...
Se te vejo
Ou não te vejo,
Se na janela
Me revejo
Ou te descubro
Olhando
O horizonte
Através das palavras
Com que há muito
Eu te digo...
MAS SABES PORQUE
NÃO É TUA,
Esta janela?
Porque nela
Te veria
De cima para baixo,
De um lugar
Que não é meu
Porque sempre
Foi teu,
Um lugar cimeiro.
E EU CANTAVA-TE
Cá de baixo,
Deste meu lado
Da rua
Com a alma
Cheia,
Mas nua,
Para me poder
Vestir de
Ti.
PERDI-TE,
Como sabes,
Porque nunca tive
Uma escada
Para te alcançar...
E, AGORA,
Há camélias,
Aqui.
Bem as vejo
Cá de cima,
Perto de mim.
Há um canteiro
Luminoso,
Talvez uma
Escada, sim...
............
Mas para ver
Mais longe!
Há um recanto,
Um caminho,
Há cor
E há palavras,
Uma silhueta
A apontar
O sentido...
.....................
Mas eu não te vejo
Ao pé de mim,
Nesta janela,
A olhar a esquina
Que nunca ousámos
Dobrar...
HÁ SEMPRE OUTRA...
Janela!
AZUL
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Paraíso”. Original de minha autoria
para este Poema. Setembro de 2018.

“Paraíso”. Jas. 09-2018
POEMA – “AZUL”
TANTO AZUL,
Meu deus!
O teu céu,
Esse imenso mar,
É espelho
Dos teus sonhos,
Medida do teu
Olhar.
O MEU É BRANCO
E cintilante
Para te alumiar
Na noite escura
Onde brilham
Gotículas salgadas
Nos teus olhos,
A navegar...
OUVE-SE
O suave murmúrio
Das ondas
Que abriga,
Como véu
Translúcido,
O estranho silêncio
Que há muito
Ouço,
Insistente,
Com a alma
Dorida do
Poeta que me
Habita.
QUANDO, NOS
SONHOS,
Ao longe
Te entrevejo
Vestida de azul
Turquesa,
Entro numa porta
Branca
Que me leva
Directamente ao
Paraíso...
...................
E nele voo, voo,
A perder de vista,
Deixando para trás
O jardim
Inacabado,
Porta escancarada,
Bailéus desenhados
A rigor,
A preto e branco,
De onde
Um dia
Te vi
E cantei
No meu primeiro
Poema,
Num estranho
Enlace
Que não tem
Fim...
NOS SONHOS,
(Em todos eles)
Caio das nuvens
Brancas
Como Ícaro
Ou meteorito
Incandescente
E quase me afogo
Nesse frio azul
Até te encontrar
No coral
Luminoso
Onde vives
Vestida de todas
As cores
Que povoam
A cidade
Dos poetas...
MAS É ESSE
Teu azul
Profundo e
Denso,
Que respiro,
O que me sobra
De ti,
Nos sonhos
Escritos
E pintados
Com que te
Vou soletrando
Lentamente...
Até cair exausto
E adormecer
No regaço
Da tua alma.
SEGREDO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Meteorito". Original de minha autoria para este Poema. Setembro de 2018

“Meteorito”. Jas. 09-2018
POEMA - "SEGREDO"
VOU CONTAR-TE
UM SEGREDO:
Amei-te
Em poesia!
As palavras eram
Graves,
Mas sempre cheias
De cor,
Com rimas
Muito suaves
E melodia
Com dor...
.........
Com tudo
O que de ti
Me sobrou...
...........
Meu amor!
CONTEI-TE HISTÓRIAS
De desencontros,
Dancei
Com palavras
Luminosas
Que inventei
Para por dentro
Te ver
Nesse quintal
De rosas
Que cultivas
No teu peito.
CANTEI
Para te aquecer
Na fria dança
Do silêncio
E contigo levitar,
Voando,
Invisíveis,
Sobre ruas
E praças,
Ao luar...
................
E, depois,
Pela manhã,
Um arco-íris
Erguer
Como ponte
Desse vale
Exuberante
Onde sempre
Te sonhei...
Neste meu
Entardecer.
SONHEI,SIM,
Alheio ao bulício
E ao cochichar
Indiscreto
Dos que não sabem
Voar...
AH!, QUE SONHO ESSE...
.................
Mas sei que não
Pousaram
No parapeito da
Tua janela
As palavras
E que alguém te
Contou
Que andavam
Borboletas
No ar,
Esvoaçando,
Perdidas,
À procura de pólen
Nos jardins
Verdejantes das
Nossas vidas...
E TU PERGUNTAS,
Agora,
Se ainda vivem,
As borboletas
De vida breve,
Se regressam
Ou já pousaram
Noutro jardim,
Se há pólen,
Se há vento
Ou pensamento
Que as traga
De volta
Desse incerto
Confim...
E EU RESPONDO
Que o seu destino
É o brilho deste céu
Que ainda vive
Dentro de mim.
MAGIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “Magia”.
Original de minha autoria, para este Poema.
Agosto de 2018.

“Magia”. Jas. 08-2018
POEMA - "MAGIA"
OLHO A MONTANHA
De uma porta
De granito
Amarelo
(O de sempre,
Muito belo,
Com cristais)
Sobre o ocre
De um telhado
Como se fosse janela
Do meu palácio
Encantado
(Que do sonho
É o cais).
CONTEMPLO A SERRA
De sempre,
Mas é diferente
A visão,
Antes, eu via futuro,
Agora, vejo passado,
Essa bela ilusão
De te ter sempre
A meu lado.
ENTRE PASSADO
E FUTURO
Sempre foi
Identidade,
Ficou quieta
À minha espera
Quando dela
Eu parti
Ao encontro
Da Cidade.
SUA FRONTEIRA
É o céu,
Abóbada sideral,
Sinto-a
Dentro de mim
Como fonte
Seminal,
Espelho da minha
Infância,
Um horizonte
sem fim,
Forte raiz
Comovida
Que eu tive
De deixar
No duro jogo
Da vida.
ELA É PORTO
De abrigo
E é lugar de
Partida.
É, pois, mais
Do que janela...
.................
É fronteira
Que passamos
Quando a vida
Se revela.
É UM ETERNO RETORNO,
Um regresso
Renovado
Onde posso
Renascer
Quando recrio
A memória
Do que não
Quero perder
Sem ter ficado
A teu lado.
ESTA PORTA
É MAGIA,
Viajo através dela,
Dou asas à fantasia
Como se fosse
Janela
De onde voo
Com o vento
Nos versos destes
Poemas
Que, sem ti,
Me dão alento.
DELA VOEI
Para o mundo
E o mundo veio
Até mim...
......................
Quando passei
Esta porta
Já era um mundo
Sem fim...
POR ISSO REGRESSO
A ela,
Esse pilar
Do meu ser...
..............
Quando chego,
Amanhece,
E, se parto,
Nem sinto
A despedida
Porque dela vejo
O mundo
Como a montanha
Da vida.
A OFERTA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: "Natureza Morta". Agosto de 2018. Original do autor para este Poema.

“Natureza Morta”. JAS. 08-2018
POEMA - "A OFERTA"
DO ENCONTRO IRREAL
Que aconteceu
Nesse tão cinzento
Dia
Quis libertar
O meu ser
Sem saber se
Conseguia.
Corri, então,
Junto ao mar
À hora da maresia...
SALTEI, DANCEI,
Respirei
Com a brisa
Que fazia
E libertei
O meu corpo
Da opressão
Que sofria...
FICOU O CORPO
Sozinho,
À deriva, nesse dia,
Mas no regresso
Da praia
Eu vi-te
No meu caminho...
....................
Milagres da fantasia!
LOGO TE FIZ
Um poema
Pois correr
Já não chegava,
Pus palavras
A sorrir
Quando a alma
Regressava!
FUI COM ELA
À Montanha
,
Quis trazer-ta
Num cabaz...
...............
Colhi frutos
Lá no alto
Guardei-os junto
Do peito
P’ra esse encontro
Fugaz
Que eu queria, sim,
Perfeito!
LEMBRAS-TE BEM
Dessa cesta,
Dos frutos que
Nela trazia?
Vinham todos
Da Montanha,
Traziam consigo
Alegria!
ESSES FRUTOS ERAM
Poemas
Que não podia
Cantar,
Derramavam seus
Aromas
Em palavras de
Embalar
E contavam
Mil histórias
Que te faziam sorrir...
......................
Era oferta singela
De quem só te
Queria sentir!
NA CESTA HAVIA
Estrelas
Às centenas,
vermelhinhas...
..................
Não viste nelas
Cintilas
Que voavam
Tão juntinhas?
ERAM MIL CORES
E aromas
Que desses frutos
Brotavam,
Colavam-se
À minha pele,
Mas era por ti
Que passavam!
PARTISTE COM ELES
Ao colo,
Rápida, sem me olhar,
Não esperava protocolo
(Tu bem sabes),
Mas foi grande
O meu espanto
Desse teu estranho ar!
SÓ À NOITE ME DISSESTE
“- Obrigada, meu Amigo,
Esses frutos
Que me deste,
Tão belos e tão gostosos,
Não serão
O teu abrigo”!
P'RA ME CURAR
Da estranheza
Fui correr
Em poesia,
Cantei em rima
Poemas,
Resisti bem
À tristeza
Sem a tua companhia
Pois sempre em
Meus versos
Ecoa
Uma tua melodia!
CUREI O CORPO,
Não a alma!
Essa ficou
Presa em ti,
Ninguém pode
Devolver-ma,
Mas, assim, não te
Perdi!
ESTRANHA ENCRUZILHADA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “A Rua”.
Original do autor. Agosto de 2018.
"A Rua". Jas. 08/2018
POEMA - "ESTRANHA ENCRUZILHADA..."
CRUZEI-ME CONTIGO
Numa esquina
Da vida
Nesta rua
Onde reinventei
Uma estranha
Despedida!
NÃO TE VI
Como te via
Da janela
Sobranceira
Quando passavas
Na rua
Abraçada
À beleza,
Teu perfeito
Avatar
Numa nova
Encruzilhada
Que o tempo
Quis desenhar...
SE TE VI,
Mas eu não sei,
Foi duma janela
Vidrada
Que me devolveu
A imagem
Como espelho
De uma fada
Onde te fui
Visitar!
MESMO ASSIM
ESTREMECI...
Pressenti-te
Sem te ver,
Fugidio
Ao olhar
Indiscreto
De um acaso
Tecido pelo
Destino...
AH! DEPOIS
SEGUI
Com a alma
Essa tua silhueta
Embaciada...
Pensei
Que não ia
Por ali
No meio
Da multidão,
Que não te via
Por falta
De nitidez
Do meu campo
De visão,
Que não te reconhecia
Nessa rua paralela
Onde todos
Nos cruzamos,
Indiferentes
Ao que já
Nem vemos nela!
ANÓNIMO
Me assumi
Como essa gente
Comum
Que se cruza
No caminho
Sem jogar
O seu destino...
SENTI TRISTEZA
Profunda,
A alma
Petrificada
Com lágrimas secas,
Das que
Não saem de nós,
Não banham
O nosso rosto,
Dor íntima,
Dor atroz
Cravada no peito
Lá bem fundo,
Perdida,
Já sem voz
Nem a melodia
Com que cantava
O rio
De que tu eras
A foz.
QUE ESTRANHA
Sensação!
Caminhando
Lado a lado,
Perdidos
Num horizonte
Que se esfuma
Até nos engolir
Como espuma
Que se desfaz
Na areia branca
Da praia...
ATÉ QUE CHEGUEI
A estas palavras
Escritas na água
Remexida pelo vento,
Também elas
Esmorecendo
Na praia
De um lamento
Porque sigo
Outras ondas
Noutras rimas
Em poemas errados
Ou simulados
Para dar voz
Ao poeta triste...
MAS GOSTEI
De olhar
Sem te ver,
Apenas imaginando
Que eras tu,
Regressada dos confins
Da minha memória...
E GOSTEI
Que me visses
Sem me olhar,
Pensando
Que nem sequer
Me pressentias,
A mim,
Esse anónimo
Que te seguia
Para logo
Te perder...
TUDO TÃO ONDULANTE,
Tão dolorosamente
Normal,
Estranhamente
Banal...
......................
Que até este poema
Espanta
Por cantar
O que nunca
Aconteceu!
QUE EXERCÍCIO
Foi este?
Crueldade
De um destino
Apenas imaginado?
Indiferença fatal
Que se torna
Irreversível
Como ferida
Que não cura
E dor
Que dissolve
Como espuma,
No poema,
As palavras
Com que ainda
Te digo?
AFINAL, QUE TE FIZ,
Meu amor,
Para te perder
Assim,
Ao entardecer,
Numa encruzilhada
Da rua
Que reinventei
Para te cantar
Como melodia
Para quem já
Não me ouve?
POR CAMINHOS PARALELOS…
João de Almeida Santos
Ilustração de minha autoria. Julho de 2018.
“Uma Casa no Jardim”. JAS. Julho, 2018.
POEMA
POR CAMINHOS
PARALELOS
Nos seguimos
Ao infinito,
Pintei o meu
De vermelho
Mas o teu
É mais bonito!
GASTEI
As minhas palavras,
Gasto as cores,
Eu já nem sei,
E porque o silêncio
É de ouro
Só às palavras
Cheguei.
Mas tirei-lhes
Logo o som
Por saber
Que te doía.
O silêncio
É, pois, o rei
Até que te veja,
Um dia...
A ESTES SENDEIROS
Cheguei
Quando eu te
Conheci,
Foram-se anos,
Bem sei,
Desde o dia
Em que te vi...
SÃO CAMINHOS
PARALELOS,
Nisto, naquilo,
Sei lá...
Mas estás
Do outro lado,
Eu não te vejo
Por cá,
Na rua do
Desencontro
Que ficou
Muito vazia
Desde que tu
Foste embora
Dessa forma
Inesperada
Como eu, sim,
Já previa...
O HORIZONTE
Que vejo
É o ponto
Destas linhas
Paralelas,
Convergimos
No olhar
Mas não caminhamos
Por elas
Porque a vida
Nos tirou
Da rua
Das aguarelas!
O SILÊNCIO DO POETA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: “Vermelho”. Quadro de
minha autoria. Julho de 2018.
Vermelho. JAS. Julho de 2018
O SILÊNCIO DO POETA – POEMA
O SILÊNCIO DO POETA
É dito em poesia
Como canto
Em surdina
Do que não
Pode calar,
Do que sente
Mas não diz
Se conjuga
O verbo amar.
SUA DOR VEM
Do silêncio
E chega à poesia.
Nela o poeta
Diz mais
Do que pode
E não devia
Porque sofrendo
Em excesso
Em sua dor
Não cabia.
E FALA COM O
Silêncio,
A fala da poesia.
Diz tudo
O que nela cabe
Em suave melodia,
O que só
A alma ouve
Dessa triste
Sinfonia...
SEU SILÊNCIO
É poesia...
...........
No cantar
É que ele sente
O que dizer
Não podia.
DIZ, POIS,
SEM O DIZER.
É outra coisa
Que diz.
Sofre em silêncio
O poeta
A dor
Que lhe vem
Lá da raiz
E que só o verso
Cura
Sem que o faça
Feliz.
OUTRO SILÊNCIO
É o dela
Que nem lhe manda
Sinais...
.................
“ - Não importa”,
Diz-lhe ele,
“Dentro de mim
Vives mais”.
O CANTO
DESTE POETA
Do silêncio
É o selo,
Sua vida é
Em verso,
Não é fria
Como gelo.
Seu canto
É em surdina,
Só o ouve
Quem o lê
Mas com luz
Que ilumine
Aquilo que
Não se vê.
ASSIM O VATE
Persiste
Nesse sol
Que irradia
E se o silêncio
É gelo
Derrete-o
Com fantasia,
Pois se a vida
É de dor
Conjuga-se
Em poesia...
A MAGNÓLIA ENCANTADA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração – “A Magnólia Encantada”. Original de minha autoria. Desenho e Poema sobre Magnólia. Julho de 2018
A Magnólia Encantada. JAS. Julho de 2018
"Una magnolia / pura, / redonda como un círculo / de nieve / subió hasta mi ventana / y me reconcilió con la hermosura... ...Como / cantarte sin / tocar / tu / piel puríssima, / amarte / sólo / al pie / de tu hermosura,/ e llevarte / dormida / en el árbol de mi alma, / resplandeciente, abierta, / deslumbrante, / sobre la selva oscura / de los sueños” Ode à Magnólia – Pablo Neruda
A MAGNÓLIA ENCANTADA – POEMA
ERA UMA VEZ Uma magnólia Encantada, Como num sonho, Uma fada Em busca Do que perdera No jardim Onde morava... FLOR EM FORMA DE PEIXE No profundo Oceano da vida À procura das raízes De uma estranha Despedida... TRAZIA CONSIGO Um inocente Espanto De ter ficado Tão só, De repente... ................ Por encanto! PARTIU, LEVOU COR E muita luz Que seu corpo Alumiava Nesse caminho Estreito Que a dor Incendiava... DEIXOU O JARDIM, Mar adentro, Água seminal, Em forma de peixe, À procura Do que perdera Em recife de coral... MAS ENCONTROU-TE À TONA, Vagueando Nesse mar Da tua vida, Cores e Riscos Como remos, Em busca da Praia perdida... REGRESSOU... Vinha triste De não te poder Resgatar Nesse dia, No alto mar! VOLTOU, Mas era tarde Demais. Já não te via Remar... ................. E então deu-se De novo Ao mar A ver Se te encontrava Nalguma praia Deserta P'ra te redimir Com essa arte Divina Em que já te via Incerta... FOI À PROCURA DE CORES, Eram muitas E vibrantes, Encontrou-as No jardim, Essas luzinhas Brilhantes... E LÁ FOI E anda ela, Umas vezes Como peixe Outras Como aguarela, Sempre À procura de ti, Levada Pela corrente, Por aí, Com ar tímido, D’espanto, Até que um dia Te encontre, Talvez triste, Na praia Do teu recanto! ENTÃO DEIXA-TE AS CORES E regressa À sua melancolia. É flor em mutação, Cada dia, No tempo Em que germina, Renovada, A raiz da nostalgia... MAGNÓLIA ENCANTADA Num poema E na pintura... ................ Assim te vou Construindo como Fada Que me cura!
O BEIJO
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração original do autor – “O Beijo”. Dia Internacional do Beijo: 6 de Julho, o dia que celebro, com um poema, cada ano. Inspirado no Thomas Mann de “Lotte in Weimar” (1939), a obra que continuou "Werther” (1774), de Goethe (1749-1832).
“O Beijo”. JAS. 6 de Julho de 2018.
1.
Thomas Mann:
“Ist die Liebe das Beste im Leben,
so in der Lieb das Beste der Kuss
– Poesie der Liebe...”. “Kuss ist Glueck,
Zeugung Wollust”.
“O amor é o melhor na vida,
assim, no amor, o melhor é o beijo
– Poesia do amor...”.
“Beijo é alegria, procriação é luxúria”.
2.
Inspirado também em Kafka, Shakespeare e Bernhardt:
“Geschriebene Küsse kommen nicht an ihren Ort,
sondern werden von den Gespenstern
auf dem Wege ausgetrunken”
- Os beijos escritos não chegam ao destino, mas são bebidos pelos fantasmas
ao longo do trajecto - Kafka
“If I were to kiss you then go to hell, I would.
So then I can brag with the devils that I saw
heaven without even entering it”
- Se para te beijar devesse, depois,
ir para o inferno, fá-lo-ia.Assim, poderia vangloriar-me, com os diabos,de ter visto o paraíso
sem nunca lá ter entrado - Shakespeare.
- O primeiro beijo não é dado com a boca,mas com os olhos – O. K. Bernhardt.
O BEIJO
FOI O QUE NUNCA TE DEI
A não ser com o olhar!
O primeiro, esse beijo,
Dei-to, pois, sem te tocar!E DEI-TE MAIS, COM PALAVRAS,
Quando olhar já não podia...
Foste embora, não estavas
E eu, triste, não te via!FORAM BEIJOS QUE SONHEI
Na rotina dos meus dias
E desejos que enfrentei
Quando tu mais me fugias...Mas dou-te beijos escritos
Que se perdem no caminho...............................
E se o poema me falta
Fico ainda mais sozinho!É ALEGRIA D'AMOR
É suave respirar,
É encontrar-te no céu,
É vontade de te amar,É desejo, é procura,
É sinal e é mensagem
É razão suficiente
P’ra te ter...................Como paisagem!O BEIJO É EMOÇÃO,
É razão descontrolada,
Se não for dado a tempo
Pouco mais será que nada!SEM BEIJO NÃO HÁ AMOR,
Sem Amor perde-se o Beijo.
Nada tem qualquer sentido
Se me faltar o desejoPor te ter, assim, perdido!AQUI O LANÇO AO VENTO
P’ra que atinja como brisa
E suave melodia
Esse rosto que precisa
De afecto em poesia!ESTE BEIJO QUE ME FALTA
De que nunca fui capaz
Voa p’ra ti em palavras
Põe-me sereno, em paz,E desejo que, no trajecto,
Voe, voe em grande altura...
.............................
Que fantasmas não o bebam
E minha dor tenha cura!Mas sei dos escolhos da via,
Dos perigos que ele corre................................
Capturado por fantasmas
É mensagem que me morre!
NO DIA DO BEIJO É HORA
De te cantar em voz alta
A poética do amor
P’ra redimir essa falta
E pôr fim à minha dor!E PORQUE O DIA É TEU
Ganha força, intensidade,
E mesmo que fantasmasO bebam
É um Beijo de verdade!ESSE BEIJO QUE NÃO DEI
Foi pecado original,
Hei-de sofrê-lo p’ra sempre
Como chaga corporal!Não há palavras que bastem
P’ra repor o que não dei
Elas voam, mas não chegam
E mesmo assim eu tentei!É CERTO QUE SEMPRE O QUIS,
Só que nunca to roubei,
A culpa foi desse tempo,
Dos dias em que te amei,
Um tempo em diferido
Sem presente nem futuro,
Talvez beijo sem sentido
Porque queria do mais puro,
Tangendo eternidade
Às portas do Paraíso,
Um beijo de divindade...
.........................
Mas simples... Como um sorriso!ESSE BEIJO IMPOSSÍVEL
Que não é do foro humano
Vou tentando construí-lo
Cada dia, cada ano,
Perdendo-me pelo caminho
Como sagrado em profano!
BIANCO&NERO
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – “Bianco&Nero”. Original
do Autor para este poema. Julho de 2018.
Bianco&Nero. JAS, 2018.
ENTRE O BRANCO
E O NEGRO
Quis desenhar
A tua alma
Na flor que,
Num acaso,
Encontrei, perdida,
No jardim
Da minha vida...
ATRÁS DE TI,
Ou em fuga,
Já nem sei,
Gastara
Todas as cores do
Arco-íris
Que tinha
Dentro de mim.
SOBRARA-ME
Uma marmórea
Nébula negra
De travertino
Onde me revia
Como espelho
Oracular,
Curvado sobre mim,
Escuro na alma,
Por falta
Das cores exuberantes
Que me protegiam
Do frio glacial
Do teu silêncio.
SOPREI FORTE
Com a alma
Desnuda
E a flor branca
Foi pousar suavemente
Nesse mármore
Liso e brilhante
Da catedral
Onde te celebrava.
E FICASTE ASSIM,
A branco e negro,
Em tinta-da-china
Esparsa,
Derramada
Sob a alvura
Do sol brilhante
Em que te via...
.................
Como uma flor!
ESCULPI-TE
Como filigrana
De ouro preto
Sobre branco-pérola,
Aurífice da tua
Alma sedutora
No coração
Alvoraçado
Dessa flor
Que guardei
Com o teu nome
Gravado
Em letras invisíveis...
CRIEI PARA TI
Alvas incrustações
Sobre filigrana
Negra
Como marcas
Indeléveis
Da arte
Que um dia
Me visitou
Na celebração
Da tua beleza.
E AGORA,
A olhar para
O branco e o negro
Deste cântico
Desenhado,
Ofereço-te
Este poema
Sobre pintura
Imaculada
Onde te celebro
Com beleza
Minimal,
Na cor
E na forma,
Sem fronteiras,
E onde
Te reinvento,
Em fuga,
Como esse subtil
Fio branco
Que esvoaça,
Livre,
No marmóreo céu
Do teu altar...
A ÂNCORA, ESSA,
A sul,
Desliza
Suavemente
Sobre ti
E dilui-se na
Negra vastidão...
EVOCO-TE, ASSIM,
A branco e negro
E canto-te
Como alma em
Filigrana
De ouro preto
Em repouso sobre
O branco-pérola
Dessa flor
Que, um dia,
Encontrei
No jardim
Da minha vida...
NOSTALGIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Nostalgia”. Original
do Autor. Junho de 2018.
“Nostalgia”. Jas. 2018
RÁPIDA COMO O VENTO
Passou por mim
Essa palavra saudade
Numa rua do meu bairro
Sob o céu desta cidade.
GRAVEI-A NA
Minha mente,
Evoquei-a
Ao crepúsculo,
Com incerta
Nostalgia…
…………………………
Não queima tanto,
A palavra,
Porque a sinto
Mais fria!
COM CESÁRIO,
Dei-lhe cor
E canto-a
Como pintura,
Dei-lhe vida
Num romance,
Tento tudo
O que não posso
Porque esta dor
Me perdura…
DA SUA COR
Vejo o mundo,
Com palavras
A recrio,
Procuro sempre
O teu rosto...
.................
E por mais longe
Qu’estejas
Eu não me sinto
Vazio.
A DOR DESTA
SAUDADE
Alimenta-me
A alma
E aquece a minha
Vida...
E assim eu vou
Vivendo
Em eterna
Despedida,
Neste cais
Que não tem fim,
Em partida
Que não há,
Um adeus que não
Me dizes,
Porque tu
Nunca saíste
Deste meu
Lado de cá.
MAS HÁ SEMPRE
Esta saudade
A que chamo
Nostalgia!
Vivo em tristeza
Feliz
Porque te sinto
Em cada dia.
NÃO TE TENHO,
Mas não te perco,
Estás longe,
Perto daqui,
Não te encontro
Nem te vejo,
Mas sei que não
Te perdi…
INSPIRA-ME, A
NOSTALGIA...
Recrio-te em cada
Instante!
Sou poeta,
Sou pintor
E também sou
Arlequim...
..............
Por isso vejo
O teu mundo
A partir de um
Camarim!
ESCULPO
TEU ROSTO
Com palavras
Do meu peito,
Pinto-me a alma
D’azul,
Voo contigo
Em sonho
E o destino
É sempre o sul...
LEVO COMIGO
PINCÉIS
E as asas
Do poeta.
Danço.
Sou arlequim.
Pinto-me nesta
Ribalta
Com as cores
Que vês
Em mim!
SEM TI
NESTA RUA
Da saudade
Sou palhaço
Em camarim
Que maquilha
O seu rosto
Para um palco
Sem fim...
REPRESENTA
PARA TI
Sem saber
Se lá estás...
...........
A verdade
Já não lh'importa,
É feliz com
O que faz!
ASSIM VIVE
O ARLEQUIM.
No palco,
É só arte
O seu fazer,
É dádiva que ele
Te entrega
Como modo
De viver!
J A S M I M
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração original do autor: “Rapsódia”.
Junho, 2018.
FLORESCEU O JASMIM!Dele jorra Poesia,Embriaga-me O aroma...Renovo-me Em fantasia!DAS PALAVRASVou à cor,O seu perfume Ilumina,Bate o sol Em suas pétalas,É luz intensa Que brilhaNo poema que Germina!JÁ NÃO É SÓO Loureiro!Agora canto O Jasmim!É tão intenso O aromaQue se renova Em mim!
INUNDO-MEDe palavras,Canto Esse mundoDa cor,Subo ao céu Com tuas asas,Vai comigoEsta dor...SOU ÍCAROLá no alto...
..............
E se o sol Me bate forteCaio em mim Do meu poemaE no chão Fico sem norte...PEÇO AJUDAÀ montanha...Volto a subir, Que alegria!Foi nela Que eu nasciE sou feliz
Lá no alto, Nem que seja
Por um dia!E LÁ TENHOO JasmimMesmo ao lado doLoureiro...
.................
Respiro fundo Até à almaE torno-meJardineiro!E ASSIM EU VOUVivendo No jardim daMinha vidaEm poemasE pintura...
............
E se a dorNão tem remédioQue seja esta
A cura!
A C H A V E
Poema, em dois andamentos, de João de Almeida Santos, criado a partir
de um poema/comentário de Ana de Sousa sobre “A Porta”.
Ilustração: “Uma Casa No Jardim”. Original (com várias citações de
Klimt) de minha autoria, para este Poema. Junho de 2018.
MOTE“Como uma fonte, / Como uma ave... / No horizonte, / Sempre uma
chave! / Sempre um segredo, / Não revelado, / Poema e quadro: /
Sonho velado / Escreve pintor. / Pinta poeta. / A vida é cor, / Dor
e amor / E tu, alerta!”
Ana de Sousa
A C H A V E
I.
PINTO E CANTO
O meu destino.
Sonhos velados,
A minha vida...
..................
Perdi a chave
Do meu futuro
E só me resta
A despedida!
POR ISSO CANTO
Com as aves,
Voo mais longe
E com mais cor
Porque no céu
Há mais azul
E nos meus sonhos
Há menos dor!
HÁ UM SEGREDO
Não revelado...
Se o dissesse
Não deveria
Porque dizê-lo
Era pecado
E certamente
Até mentia!
E NÃO O DISSE,
Mas eu pequei
Com murmúrio
Apaixonado
Em poemas
Inocentes
Por que fui
Tão castigado!
POR ISSO VOO
Sempre mais alto,
Trepo nas cores
P’ra lá chegar,
O céu azul
Dá-me alento
Para mais alto
Poder voar
E meus segredos
Dissipar...
LEVO PALAVRAS
Comigo,
Procuro inspiração.
Levo cor,
O meu abrigo,
Levo musas
E tudo o mais...
...................
E quando parto
Lá p’ra cima
É sempre festa
No cais.
LEVO-TE A TI.
E deste jeito!
Sim, meu amor,
Para que sinta
Lá bem no alto
Ar rarefeito
E menos peso
Na minha dor!
EU CANTO
E pinto
Por tudo isto,
P’ra resgatar
O pecado
De exaltar
Esse teu rosto,
Iluminar
Em aguarela
Esse enleio
Do meu olhar,
Por te ver
Na nossa rua
Debruçado
Na janela
Com vontade
De pintar.
II.
POR ISSO CANTO,
Por isso pinto,
Por isso voo
Lá para o alto...
...................
Já não os vejo,
Já não os ouço
E já não vivo
Em sobressalto.
MAS VEM COMIGO,
Eu dou-te asas,
O infinito
No céu azul,
Voamos juntos
Ao mesmo tempo
E o nosso rumo
Será o Sul.
VÁ, VEM COMIGO,
Voa mais alto,
Ah!, meu amor,
Se tu vieres
Eu já não sofro
E vai-se embora
A minha dor!
O SILÊNCIO E A MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Levitação”. Original de
minha autoria. Maio 2018.
"Para que tú me oigas / mis palabras / se adelgazan a veces /como las huellas de las gaviotas en las playas"
Pablo Neruda
POEMA
NO SILÊNCIOEu vejo-teCom palavrasSufocadas.A pretoE branco.A linguagemDo tempoQue passaInexorávelE erodeOs ângulosSuavesE coloridosCom que nosFomosDesenhando...........Nos diasDe festa!E, AGORA, VIVOOblíquo,Neste intervaloSofridoDe ondeTe vislumbroA silhuetaAo crepúsculoDo fugazEncontro,Lá no Monte,Que oraDeclina...“VOU-ME EMBORAP’ra Pasárgada”,Diria o saudoso
Poeta,“Porque aquiAnoiteceu”!MAS, NÃO!Eu não parto,Porque na memóriaTe vejo a cores.Aquelas com queNos fomosPintandoEm caminhadaCúmplice,À procuraDe formasPara oferecerEm trocaDe nada.NA MEMÓRIAAcaricio-teCom as mãosInvisíveisDa minha almaE o azulDo céuQue aindaNos sobraComo mantoTransparenteE frio.PRESSINTO-TE,Assim.Adivinho-teEm riscos queDeslizamDos teus dedos,DádivasDa belezaInscritaNo teu rostoQue me chegamCom a brisaDo amanhecerNesse pátioSecularDos nossosAntepassados.E ESTREMEÇOQuandoTe reencontroNestas veredasEstreitasMas profundasDa imaginaçãoCom queNos reinventamos.VISTO-ME, ENTÃO,De vermelho.Por dentro.A rigor.Solene.Pinto-meA almaAo sabor do vento.Cubro de rosasVermelhasO chão etéreoQue pisoSuavementeCom o olhar.Dou mais saborÀ liberdadeVoando comUma rosaP'ra te poderAlcançar.AH! SIM,Duplico-meNesta vidaÍntimaE oblíqua,Neste intervaloOnde te sonhoCom palavrasQue te chegamDesfiguradasPelo siroco,Vento do sulQue lhes sopraForte,No caminho,A áspera areiaDo deserto................Que habitamos.SIM, MAS SEO VENTOAinda sopraAo amanhecerQue me importam
A areia e o
O deserto?
A AGUARELA
Poema de João de Almeida Santos
inspirado no poema de Manuel Bandeira
“Tema e Variações” (Obras poéticas,
Lisboa, Minerva, 1956, p. 384).
Ilustração: “Vermelho”. Original de minha
autoria. Maio de 2018.
Milva: L'uomo dal mantello rosso
Milva (início da letra da canção, um sonho cantado): “La solitudine / È come la febbre: / diventa più forte di notte. / Un’aspirina e la febbre va via, / la solitudine no. / Io, che colpa ne ho io, / se questa notte ho sognato?” - “C’era un uomo dal mantello rosso...”
POEMA
SONHASTE, MANEL,
Que havias sonhado
Estar à janela
Sonhando a cores
Qu’estavas com ela.
TAMBÉM EU SONHEI
Que tinha sonhado
E que no sonho
A tinha encontrado,
Passando por ela,
Ali, lado a lado,
Mas quando acordei
Do primeiro sonho,
Sonhando, eu vi
O seu belo rosto
Numa aguarela
Pintada a cores
Que tinha guardado
Para uma tela...
SONHEI, OUTRA VEZ,
No segundo sonho,
Que era pintor
Mas que pintava
Sempre o seu rosto
A uma só cor...
DIZIA, SONHANDO,
Que não podia ser.
Seu rosto expressivo
Era arco-íris
Ao amanhecer
E era sorriso
Para o mundo ver!
MAS EU SÓ O VIA
Com a minha cor,
Esse rosto belo
De seda tecido
Que me seduzia
No sonho sonhado
Onde sempre a via
Ali, a meu lado.
NÃO QUERIA ACORDAR
Do sonho feliz
E nele fiquei
De olhos fechados.
Já não acordei
Do sonho sonhado
Porque nessa cor
Fiquei encerrado
Com todo o meu ser...
...............
Talvez por amor.
NO SONHO OLHEI
Para o meu espelho
E logo eu vi
Que essa minha cor
Era o vermelho.
QUANDO ACORDEI
Do primeiro sonho
Voltei a sonhar
Que tinha sonhado
Que o encontrei,
Esse rosto amado.
E logo lhe disse,
No segundo sonho,
Que a tinha sonhado.
DISSE-ME QUE NÃO
Que nunca me vira
Sequer acordado.
E logo acordei
Desse pesadelo.
Foi assim que vi
Que tinha sonhado
E que ela
Já lá não estava
Ali, a meu lado.
QUIS ADORMECER
Para a encontrar
Mas não consegui
Sonhar que a via,
Pôr os olhos nela,
Chorar d’alegria
Porque descobri
Na minha parede
Aquela aguarela
Que do sonho
Passado
Eu já conhecia...
................
Era o rosto dela!
A MONTANHA
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração (“O balão e a montanha”) de minha autoria.
Maio de 2018.
“I live not in myself, but I become
Portion of that around me; and to me,
High mountains are a feeling....”
Lord Byron
Childe Harold’s Pilgrimage (1812-18).
Canto III, 72 (1816).
POEMA
ESTOU A PERDER-TE,
Meu Amor!
O estro
Com que te canto
Esmorece,
Vai perdendo
Lentamente
O seu fulgor!
O poema
Empalidece
E eu,
Em poética anemia,
Sinto
Um doce, suave
E sonolento
Torpor...
SUBI A MONTANHA
Contigo!
E, feliz de lá chegar,
Com palavras
Que me deste
Eu aprendi a cantar!
CANTEI A TUA PARTIDA
Quando desceste
O vale.
E, triste,
Eu caminhei
Por veredas
Sem destino...
..........
Já nem sei!
PERDIDO
De ti,
Vagueei
À procura
De eco
Do meu canto
Derramado,
Som puro
E cristalino
E por ti
Iluminado.
MAS O ECO
Era silêncio
Profundo,
Sideral,
Inscrito
No azul,
Quase irreal,
Da abóbada
Celeste
Da montanha
Seminal.
NEM SEQUER
O CLARÃO
De um cometa
Fugaz
Me visitava,
Pinhal abaixo,
Rumo ao horizonte
Do meu inquieto
Olhar...
O AR RAREFEITO
Da montanha
Tomou conta
De mim
E desfaleceu
A emoção
De te rever,
Reinventar
E te cantar
Em surdina
Com esse
Silêncio
Cortante
Que me negava,
Impenitente,
O eco da
Minha canção!
DESCI, ENTÃO,
Também eu,
O vale
Da tua vida
E regressei
À triste monotonia,
Sem ti,
Em corpo
Sequer imaginado,
Nem semente
De poesia.
ESTOU A PERDER-TE
Meu amor!
É poética
Anemia.
Ar rarefeito
Que sufoca
A melodia.
O cântico
É murmúrio
Inaudível,
Sem comoção
De alma ferida
Que já nem
A dor pressente,
De tão esgotada
Na vida
Por excesso
De paixão!
O VALE ESPERA-ME.
Respiro ofegante,
Porque sei
Que não te vejo,
Que já não
Sobram sinais
Da rua do
Desencontro,
Não há fugas
Irreais
Para o teu
Infinito
Nem janelas
Donde te veja
Passar
Ou sequer imaginar
Na esquina
Esquecida
Do nosso
Contentamento!
ESTOU A PERDER-TE,
MEU AMOR.
Não há janela,
Nem há cor
Ou infinito,
Não há tempo
Nem lugar,
Não há poema
Nem mar
Que suspenda
O vazio
De não te poder
Encontrar!
JÁ TE PERDI,
Meu amor?
SONHO
POEMA TRISTE. João de Almeida Santos. Ilustração: “Sonho”. Original de João de Almeida Santos. Maio de 2018. Milva canta "IN SOGNO" (Album: "Tra Due Sogni")
Letra de "IN SOGNO": "Sì, / L’alba è la più forte./ Sì, / Vince i sogni, la realtà. / Eppure, / Solo in sogno / Viene a noi / La verità. / Così si chiude un fiore / Se il sole non c’è più, / Ma tutto il suo colore / Raccoglie in sé".

“Sonhei ter sonhado / Que havia sonhado./ Em sonho lembrei-me / De um sonho passado: (…) / Ter sonhado o quê? / Que havia sonhado / Estar com você. / Estar? Ter estado, / Que é tempo passado. / Um sonho presente / Um dia sonhei. / Chorei, de repente / Pois vi, despertado / Que tinha sonhado”. Manuel Bandeira
POEMA
SONHEI QUES AS PALAVRAS Se gastaram, Desfiaram, Desataram, Sobrando fios Para tecer O silêncio. SONHEI Que a tinta Perdeu a cor. Que já não havia Poemas E que não era Pintor. SONHEI Que não eras tu. Que foi tudo ilusão. Sonhei que te procurei No mundo da fantasia Onde as flores Caminhavam, Sabiam a maresia, Tinham rostos De mulher, Mas surdos Ao que eu dizia. SONHEI Que não sabia Onde estás, O que fazes E o que sonhas Nas noites Do teu luar, O que vês Nesses momentos Fugazes Em que olhas Para ti. SONHEI Que não me lês, Que já não ouves Poemas, Que estás tão longe Daqui! NO SONHO Fui à memória, Que também Perdeu a cor. Ficou tudo A preto e branco... ........ E sonhei, Sonhei, sim, Que te perdi, Meu amor... SONHANDO, Procurei cor Num outro Lugar qualquer. Só encontrei O cinzento E por falta De vermelho Meus versos Tão desbotados Nem os levava O vento... FOSTE P’RA ONDE Que eu não te vejo? Perguntei Quando do sonho Acordei. Saíste De onde estavas E agora resta O desejo De te cantar Sem palavras P’ra que ouças O silêncio Com que antes Me chamavas. JÁ NÃO ME CHEGAM SINAIS. O meu É poço escuro, É buraco Tão profundo Que nele Eu vou caindo Como triste Vagabundo... O SOL TAMBÉM JÁ SE FOI. As sombras Tomaram conta De mim. Meus dias São sempre Iguais. Sinto um vazio Sem fim... MAS PINTO, Agora pinto, Tenho cores E tenho aromas, Tenho luz E sou feliz... ........ Ah!, sim, Mas perdi A minha Musa, A fonte D’inspiração! Foi p’ra longe, Com o vento E em meu triste Pensamento Só ficou A ilusão! GASTARAM-SE As palavras, Meu amor! Gastou-se tudo, Afinal! Só ficou o teu Cinzento, A tinta com que Lavras O meu peito (Sem lamento) E me afundas Nesta dor, A que canto Em surdina Para ouvires O silêncio Com que te pinto Sem cor...
METAMORFOSE
Poema de João de Almeida Santos criado
em diálogo com este quadro original -
“Metamorfose” - de João de Almeida Santos.
Abril de 2018.
"Não colhas uma flor, senão chorarás ao vê-la murchar"
Provérbio chinês
Podem cortar todas as flores, mas nunca impedirão a primavera"
Pablo Neruda
"Talvez deva às flores ter-me tornado pintor"
Claude Monet
"Há flores por todo o lado para quem é capaz de as ver"
Henri Matisse "
Uma flor é um ser totalmente poético"
Novalis
"Quem não tem pão, mas compra flores, é um poeta"
Provérbio turco
POEMA
CAMINHAS
Tão docemente,
Tão irreal,
Sobre as cores
Que eu te dei...
ÉS PLANTA DE JARDIM,
Bem sei!
Na alma
Tu tens flores
Que eu sempre
Cultivei,
Alimento
Dos meus olhos,
Aroma
Desses poemas
Que para ti
Cantarei.
CAMÉLIA
É o teu nome.
Encontrei-te,
Desta vez,
Em profunda
Solidão.
A alvura luminosa
Era tão densa
Que eu quase
A tomei
Na palma da minha
Mão.
QUIS TRAZER-TE
Para dentro do poema.
Disseste
Logo que sim.
Ficarias mais serena,
Estando tão perto
De mim...
FALEI CONTIGO.
Dei-te palavras
E dei-te cor.
A solidão
É castigo,
Eu bem sei.
Ah, meu amor!
E tu,
Brancura divina,
Não mereces
Essa dor.
CAMINHÁMOS
Numa ponte
P’rá outra margem
Da vida.
Eram passos
De liberdade,
Não eram
De despedida.
VI EM TI
Uma mulher.
Recriei-te
Com afeição.
Pintei-te
Em movimento.
Quis-te livre
No meu chão
De onde te
Elevaste
Quando eu
Te dei a mão.
É ESTRANHO
O movimento
Que não te afasta
De mim...
Tu vives
Em quietude
Porque te ofereces
Assim!
ESSA PONTE
De papel
Que parece um
Arco-íris
Saído do meu
Pincel
Vai devolver-te
Ao jardim
Onde a cor
É alimento,
É como favo
De mel,
De meus olhos
O sustento.
PERDIDO, EU,
Nessa tua
Melancolia,
Convoquei
Todas as cores
(Que sabia)
Com palavras
De um poema.
E dei largas
À evasão
Da flor
Que foi
Mulher
Porque comigo
Cantou
Em palavras
Coloridas
Essa sua
Solidão.
VÊS, MEU AMOR,
Como a solidão
Em flor
Pode ser libertação
Se lhe dermos
Muita cor
Com a força da
Paixão?
A IMAGEM ORIGINAL, de 21.03.2016. Camélia
solitária em Cameleira. Na altura em que a publiquei, escrevi,
no Facebook, o seguinte: "Surpreendente, a natureza! Camélia branca
suspensa! A elegância sensual de uma fadada Cameleira. Encontrei-a
no Jardim. Estava à minha espera. E logo a capturei, sem lhe tocar.
Só para partilhar essa luminosa, fresca e solitária brancura! Estava
ali como brilhante proposta estética da natureza: 'diz o que pensas
desta estranha forma de surgir no teu Jardim. É provocação florida,
não é? Sou tão branca e tão perfeita que e(n)levo a Cameleira’.
Olho-a de baixo para cima e ponho-a numa sensual fronteira!".
Respondo-lhe agora, dois anos depois. Ficaram-me a imagem e as
palavras que escrevi. Cruzei-as com novas vivências e experiências
estéticas... e deu nisto! A beleza fica registada na nossa memória
para sempre... e alimenta-nos a alma quando um novo estímulo a
reevoca e, às vezes, invoca!
O PINTOR
POEMA de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Celebração da Cor” -
Original de João de Almeida Santos.
Abril de 2018.
"Le Poète se fait voyant par un long, immense et raisonné dérèglement
de tous les sens".
Rimbaud.
O PINTOR BRINCAVA
Com suas palavras.
Dizia-te sempre
Quando não estavas...
ERA UM POETA,
Era fingidor.
Não te desenhava.
Cantava-te
A cor.
SUAS CORES
Eram as palavras.
Fazia pincel
Da sua caneta.
O pintor riscava,
Mas a sua tinta
Já não era preta.
POR ISSO COMPROU
Um belo pincel.
Pintava, pintava...
Era a granel,
Como se a tela
Deixasse de ser
O velho papel.
DESCOBRIU A COR,
Que o fascinou!
Azul, vermelho
E tanto amarelo.
Tudo ele pintou,
Procurando sempre
O que era belo.
ATÉ QUE O ENCONTROU
Na cor dos
Teus olhos.
Era luz da pura
Que iluminava
O branco papel
Onde desenhou
O teu fino rosto
Com o seu pincel.
DEU CORPO À COR
Com que te dizia.
As suas palavras
Tornaram-se riscos...
Mais que poesia.
PINTAVA-TE ASSIM.
Os poemas
Já não lhe chegavam.
Pintor de palavras
De cor as compunha
E versos voavam
No azul do céu...
..................
“E o que tu fazias
Faço agora eu”
- Dissera-lhe um dia -
“Porque sou poeta
Mas também pintor.
Deixaste-me só,
Entregue à palavra...
E eu,
Tão pobre de ti,
Pintei-me de dor.
MAS EU FAÇO DELA
O meu arco-íris
P’ra subir ao céu
A ver se t’encontro
Atrás duma cor
Pintando o teu rosto
Para um poema
Que vou escrever
Com todas as cores
Que trago comigo
Enquanto viver”.
O PINTOR BRINCAVA
Mas era séria
Essa brincadeira.
Perdido em palavras
Encontrou a cor
Que dos seus poemas
Dela fez bandeira...
A COR DA MEMÓRIA
Poema de João de Almeida Santos
Ilustração: Composição de JAS
sobre foto/ilustração de “Sogno di Libertà”
de Milva/Theodorakis. Vídeo aqui republicado:
Milva-Theodorakis - Sogno di Libertà
“Si tu quieres soñar / y te hace falta un tónico / vuelve la copa del
cielo / ¡y bébete el azul!”.
Luís Vidales, 1900-1990 - “Paseo”, 1976.
NUM DIA DE CHUVA
Bateste levemente
À porta da minha
Memória.
ERA TRANSPARENTE
Essa porta.
Vi que eras tu.
Reconheci a tua boca,
O bâton púrpura
Dos teus lábios.
NÃO SEI SE
ME PRESSENTISTE,
Não sei,
Porque a porta
Era um espelho.
Através dela
Só se via
Do lado de cá.
ENTRASTE
Cheia de cor
Que a chuva
Humedecera,
Mas deixara
Intacta.
Apenas com mais
Brilho.
TAMBÉM TU
ERAS TRANSPARENTE.
Olhei-te
E vi, através de ti,
Um céu
Pintado
De azul plúmbeo.
NA TRANSPARÊNCIA,
DESPONTOU O SOL
Coado em amarelo.
Havia umas nuvens
Escuras
A nascente,
Lá no Monte...
ÀS VEZES, O AMARELO
Ganhava tons de
Âmbar
E vestia-te o corpo
Na minha intangível
Memória
Fotográfica.
RECORDAVA,
Sereno,
Esse teu belo
Sorriso...
..................
Mas quando te quis
Tocar,
Ao de leve,
Um vidro desceu,
Vertical,
Sobre nós.
Era frio
E húmido.
Separou-nos.
E eu chorei!
AS LÁGRIMAS
Escorreram
Pelo vidro.
Tentaste
Agarrá-las
Do lado de lá
E fixá-las com
Todas as cores
Que tinhas contigo.
Ficaram algumas
Gotas
No vidro,
Em amarelo,
Porque tu,
De repente,
Te tornaste sol
E eu já não era
Mais do que um
Reflexo dos teus
Raios filtrados
Por algumas
Nuvens...
.......
Escuras!
DESPERTEI
Ao som
De dedos que batiam
Suavemente
À porta
Do meu quarto.
CORRI A ABRI-LA...
.......
Ninguém!
REGRESSEI, RÁPIDO,
À minha memória,
Mas tu já não
Estavas,
Nem sequer
Como reflexo...
..............
Deixara aberta
A porta do tempo!
COR, MAIS COR…
POEMA de João de Almeida Santos. Ilustração - Inédito de JAS: Poseidôn. Abril, 2018. Volto a propor uma bela canção de Milva/Theodorakis: Milva-Theodorakis - Sogno di Libertà
"Donde termina el arco iris, en tu alma o en el horizonte?"
Pablo Neruda
COR, DÁ-ME COR!
Fico mais perto
De ti
Se vieres
Com o vento.
Cor, mais cor,
Que as palavras coloridas
Já me sabem
A cinzento...
OU TALVEZ NÃO!
Palavras
Já não me faltam
Nem vivo
Na escuridão.
Ainda consigo
Dizer-te,
Com palavras
Dar-te a mão.
TENHO-AS
QUE ME CHEGUEM
Para gritar
Em vermelho
O concreto
Do teu nome.
Ver-te, assim,
Tão colorida
No vidro do meu
Espelho
Sem que a tristeza
Assome!
AH! MAS A COR
SE FOR INTENSA
E crescer
Em explosão,
Se tiver
Em contraponto
Palavras
De evasão
Que dão ritmo
Ao azul
Dos teus sonhos
De papel...
..........
É tudo
O que eu preciso
P’ra t’esculpir
A cinzel.
DÁ-ME COR
Que eu sou
Sensível
À luz intensa
Do teu olhar!
Aprendo nas
Flores que
Colho,
Quando vestes
O vermelho,
Com azul
Como espelho,
Ou te cobres
Com as cores
Do arco-íris
Que és.
AH!, VÊS
COMO TE CONHEÇO?
Tu és cor,
Gota d’água
Suspensa
No fio
Do horizonte
Banhado por
Raios de sol
Que despontam
Lá no Monte.
DANÇAS COM ELA,
A cor,
E com ela adormeces.
Por amor.
É sopro
Da tua alma
Quando a vida
Já é sonho...
...........
E te acalma!
MAS EU GOSTO
DE TE PINTAR
Com palavras.
Em maiúscula.
Onde o azul é
Mais íntimo
E o verde
Te cobre
Como manto.
Onde o vermelho
É pranto
Sem lágrimas
De enxugar...
..........
Nem sequer
Em amarelo
P'ra melhor
Te recordar!
NA COR DAS MINHAS
PALAVRAS
Te revejo
As vezes
Que eu quiser
Pois és mais
Do que desejo
Nos cânticos
Que compuser!
MAS EU GOSTO
Cada vez mais
De cor...
............
Confundir-me
Com ela,
Dançá-la
Como vida
Em explosão,
Fogo de artifício
Que embriaga
Os sentidos
Como se fosse
Vulcão...
LEMBRO-ME
DO POETA QUE PEDIA
“Mais luz!”,
Já em seu leito
Fatal.
Tinha luz
Dentro de si
Mas não entrava
Cor
Pelo portal.
Era cinzenta
A cor que lhe restava
Até escurecer
Quando a janela
Lentamente
Se fechava...
LUZ É COR,
Desperta da
Letargia,
Ressuscita
Do torpor.
Celebra a vida.
É cântico.
Chilreio de
Passarinho
Lá no alto
Que anuncia
O meu voo
Aos azuis
Que tu pintas
Em cobalto.
MAS A PALAVRA
FASCINA-ME.
É com ela
Que eu te canto!
Com a cor danço
E voo!
Com ela, leio-te
A alma.
Na cor, a tua
Roupagem.
Com a palavra
Suspendo
Os sentidos
Para melhor
Te sonhar
De todos os dias
Perdidos...
........
À deriva
No teu mar!
AH!, SIM,
Eu gosto
É das palavras!
E sabes porquê?
Porque tu cabes
Em quatro letras
Mesmo que o teu
Nome
Tenha cinco
E me saiba a verde
De Primavera...
ROSTO DE PEDRA…
Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração – Jovem mulher com bâton.
“Estudo de uma jovem mulher” (1885), de
Gustav Klimt, (atrevidamente) retocado
por João de Almeida Santos
ENCONTREI-TE
POR ACASO
E caíste
Sobre mim
Naquelas escadas
Sem fim
Por onde descias,
Altiva,
Como senhora
Do silêncio
Austero
Que me devora.
É SEMPRE ASSIM
Quando te vejo.
Crispada,
Sobrolho
Franzido
E pesado,
Sofrido,
Em eterna
Revolta,
Anunciando
Penitência
Neste incerto
Destino
Já sem regresso.
DOEU?
Muito.
Mas que importa?
É sempre sal
Sobre ferida
Que não cura,
Mal que dura
E que perdura
Uma vida…
A TEIA
QUE NOS TECE
E cobre
Este espaço
Que entretece
E nos domina
É como o tempo
Que marca,
Implacável,
O acaso
Que tudo determina.
VI-TE, SIM,
Nesse dia,
Recolhida
Sobre ti,
Estranha na cidade
Invisível
Onde te conheci.
E ASSIM ME NEGAS.
E foges
Para lugar
Nenhum.
Corres, corres
Para onde
Nunca irás.
Escondes-te
Atrás do que
Desconheces
E de ti própria
Onde blasfemas
Contra o mundo
Onde não te
Reconheces!
A REVOLTA
Não sai
De ti
E petrifica
A tua alma.
É ÁSPERO, SIM,
ESSE TEU ROSTO.
Julgava-te
Já perdida
No silêncio
Da raiva
Surda
Contra mim,
Sem redenção,
Condenado
A grilhões
Que pesam
Como cativeiro.
CHAVES?
Ah!, sim,
Tantas são
As chaves que tens
E que não usas
Para me libertar!
TALVEZ NEM QUEIRAS
Porque também tu
Já és prisioneira
Da síndroma
Que te aprisiona
E te queima
Como fogueira.
CAÍSTE SOBRE MIM.
De repente,
Levantaste-te
Dessa sombra
Onde te encerras,
Te encobres
E vigias.
E atropelaste-me…
MAS NÃO ERA PRECISO,
Meu amor!
Todos os dias
O fazes.
Mesmo ausente…
EU VI UM ANJO…
No Dia Mundial da Poesia,
hoje, 21 de Março,
ofereço este Poema
de João de Almeida Santos.
Ilustração: Vénus, de
Botticelli, re-reimagined
por João de Almeida Santos
a partir de Yin Xin
(2008) e de Botticelli (1490).
EU VI UM ANJO
CAIR
Docemente
Sobre mim
Com seu rosto
Imaculado
Em momento
Inesperado
Que parecia
Não ter fim...
VINHA ELE
Lá de bem alto
Onde eu
O pressentia
Mas tive
Um sobressalto
Porque em mim
Esse anjo
Imaculado
Não cabia.
SUA LUZ
ERA INTENSA
Ofuscava-me
O olhar.
O seu brilho
Deslumbrava
E eu senti-me
Cegar...
MAS NÃO SEI
SE ERA ANJO.
Talvez fosse
Uma mulher.
E se não fosse
De arcanjo,
Ah!,
Não era um
Rosto qualquer...
POR ISSO
ME FASCINOU,
Porque ao vê-lo
Descer
Do trono
Onde reinava,
Quase, quase
Me cegou
Com a luz
Que o transportava.
E levou-me
Ao Olimpo
Onde a arte
Lhe sobrava.
FIXEI-O, ENTÃO,
Num quadro
De memória.
Traços leves,
Cores intensas
Que cativam
O olhar.
PINTEI-LHE DE
NEGRO
O cabelo
Para mais belo
Ficar
E seu rosto
Feminil
Deste modo
Desvelar
Como mulher
Sensual
Que me veio
Capturar.
DESENHEI-A
COMO BELO
Avatar
Que tomou
Conta de mim
Para sempre
Me lembrar
Que era
Uma mulher
E não era
Querubim.
MAS VI
UM ANJO,
Ah!, eu vi,
Entrar bem
Dentro de mim
Sob forma
De mulher,
Porque anjo
Imaculado
Não cabia,
Infinito,
No meu pequeno
Jardim.
FOI MISTÉRIO
Que subiu
Ao oráculo
Da vida
Onde eu a
Posso ler
Em texto
Que só termina
No dia
Da despedida,
Na hora em que
Morrer.
EU VI UM ANJO
DESCER
Neste vale
Da minha vida
E ele fez-me
Crescer,
Recomeçar
A partida...
E COM POEMAS
Parti
Em viagem
Ao Olimpo
Para com ele
Voar
Em cada palavra
Que digo,
Em cada verso
Que sinto!
CANTA, POETA, CANTA!
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: Auto-Retrato. Original de João de Almeida Santos. Março de 2018. Volto a repropor: Marzo - Milva. Arietta di Salvatore di Giacomo Para a letra e a tradução do napolitano, ver: Março.“Ora al nuovo sole si affidano i nuovi germogli” Virgílio.
CANTA, POETA, CANTA Até que Ela Te ouça, Nem que a palavra Te doa, Nem que a alma T’estremeça! CANTA, POETA, CANTA Que o teu poema Tem dor Que te baste, No amor, E tem cor Que alumia E tem sabor A cerejas, Que as dá A Primavera. SE NO CANTAR Tu quiseres Atingir o infinito, Salta p’ra cima Dum risco, Agarra asas De azul E voa Nesse teu céu Até que Ela Te veja, Te pinte Numa cereja E murmure O teu nome Em silêncio De igreja... CANTA, POETA, CANTA Que o teu cantar É um choro. E é água Cristalina Que corre Lesta Em teu rio Seminal, Dentro de ti, Turbilhão Arterial À procura de beleza No infinito Fatal De um adeus Beijado Pela tristeza! CANTA, POETA, CANTA Que contigo Cantarei A alvorada do dia. Chora, que eu Chorarei Se não houver Alegria. Ri, que Eu cantarei Animado por teu Riso. E para ti Dançarei Uma valsa De Strauss Às portas Do Paraíso! CANTA, POETA, CANTA Até que Ela Te ouça. Não pares De chorar alto, Lá em cima, Planalto Ou montanha, Poema Ou um desenho, Uma cor Em aguarela, Afagado Pela dor Mesmo que olhes P'ra ela Com um intenso Ardor Lá de cima Da janela... CANTA, POETA, CANTA, Para ti E para o mundo Que o teu cantar Enobrece Quem ouvir A tua prece, Quem sentir O teu lamento, Que de ser Já tão profundo Não o leva Nem o vento Pois em ti Ele entardece. E SE O VENTO O LEVAR Vai procurá-la A Ela, Dobra lento A esquina P’ra que o veja Da janela. MAS O DIA É DE FESTA! Há cortinas No poema E o lamento Lá regressa Ao poeta Que o cantou. O dia já Não é dele Mas de quem O castigou. CANTA, POETA, CANTA, Que um dia vai-te Ouvir. Deixa, pois, que o Tempo passe E a razão se esclareça. E confia no porvir. CHORA, POETA, CHORA Neste teu Entardecer Aqui tão perto Da arte Com saudades De morrer... CHORA, POETA, CHORA...
POEMA PARA TI
De: Olga Santos. Ilustração inspirada em Botticelli, "Nascimento de Vénus". Pormenor. “Re-reimagined” . Intervenção de JAS sobre Botticelli Reimagined – Venus in the gutter. By Yin Xin, 2008. Venus after Botticelli.
CRUZÁMO-NOS POR ACASO Na estrada da Poesia. Palavras embriagadas De cor, de luz, De misteriosa e intensa paixão, Caíam em suave cascata No colo da estrofe Que as aguardava Im-Paciente. SENTIDOS GENESÍACOS Eram paridos Pela neófita Que se fizera à estrada, Numa incontida explosão De prazer... JANELAS ERAM RASGADAS No traçado do poema Subitamente... Cruza-se a voz Do Poeta Com cantos de aedos outros. IRROMPEM CÍTARAS E TROMBETAS Volteiam bacantes palavras Perturbadora-mente Desassossegad-Horas. Tudo é cor, brilho, ritmo, cadência, Melodia... Farandole de Bizet Sarabande de Haendel. MAS FEVEREIRO ERA FRIO E a estrada penosa Para quem março nevou. SAÍ NA CURVA DA ESTRADA Disse adeus à melodia... PROMETIDO ESTÁ O REGRESSO, POETA! Quando o sol cegar a sombra E abrasar as pedras da montanha, E da bonina o tempo for.
PRIMAVERA, QUASE
João de Almeida Santos
POEMA. Ilustração: Primavera, Quase. Original de João de Almeida Santos. Março de 2018. Ilustração sonora de Milva, em napolitano, sobre uma Arietta de Salvatore di Giacomo: Marzo. Reproposição. Para a tradução, veja, aqui, Março. Para ouvir Milva: Marzo - Milva. Arietta di Salvatore di Giacomo
Primavera, Quase
"Até nos nossos sonhos neva, mas uma única vez na vida". Orhan Pamuk, escritor turco. Prémio Nobel da Literatura.
PRIMAVERA, QUASE
SE ME PERGUNTASSES PELA NEVE, O que sempre te diria? “- Tenho-a na minha Alma, Sinto-a, pura, Em cada dia.” DELA CONSERVO O FRIO E a brancura Do seu manto, Mas sinto-a quente Por dentro, Mesmo que sofra, Em pranto. ENTRA NEVE NA PRIMAVERA E dá húmus Ao jardim, Rega fundo A tua alma E ao sofrimento Põe fim. E QUANDO O INVERNO Termina Saem cores Da tua mão, Voam riscos, Nascem amores, Tudo brota Do teu chão... EU PERMANEÇO NA NEVE, Corpo frio, Alma quente. Se te banhar Como rio Germinas Como semente, Explodem os teus riscos Em girândolas De cor. É festa Na tua terra, Já não é tempo De dor! MAS SÓ DESÇO DA MONTANHA Como neve Que t'inspira Pois da arte É alimento, Frio branco Que conserva E à alma Dá alento. SÓ ASSIM EU TE VISITO, Perdoa A minha falta. No alto voam Foguetes, Mas dentro de mim É ribalta, A que quero Para ti Pois eu não quero Mais nada. Que Atena Te inspire Com sua varinha De Fada! É FESTA NA TUA TERRA, Crepitam foguetes No ar, Fosse eu O teu mordomo Não iriam As girândolas Na tua festa Parar! BRANCA NEVE, FRIA E HÚMIDA, Não vê Foguetes no ar, Mas banha A tua alma, Lentamente, Sem parar. E SE PERGUNTAS P'LA NEVE Eu ouço-te Cá em cima, Inspiro-me na Montanha E respondo-te Em rima, Devolvo-te Inspiração Que da arte É a vida, Num poema Em oração Que não é De despedida, Mas canto, Em comoção, Da palavra Proibida.
MARÇO
POEMA de João de Almeida Santos.
Ilustração: PÁN - Original
de João de Almeida Santos.
Em exposição na minha Galeria Poética,
de Março de 2018 até... Sempre!
"Marzo: nu poco chiove / e n’ato ppoco stracqua: / torna a chiovere,
schiove, / ride ’o sole cu ll’acqua./ Mo nu cielo celeste, / mo
n’aria cupa e nera: / mo d’ ’o vierno ’e tempeste, / mo n’aria ’e
primmavera. / N’auciello freddigliuso / aspetta ch’esce ’o sole: /
ncopp’ ’o tturreno nfuso / suspireno ’e vviole... / Catarì!… Che buo’
cchiù? / Ntienneme, core mio! / Marzo, tu ’o ssaie, si’ tu, /e
st’auciello songo io".
"Março: um pouco chove / e logo deixa de chover: / volta a chover,
pára, / ri o sol com a água. / Ora um céu celeste, / ora um ar
escuro e negro: / ora tempestades d’inverno, / ora um ar de
primavera. / Um pássaro com frio / Espera que espreite o sol: /
na terra ensopada suspiram as violetas... / Catarina! Que queres
mais? / Entende-me, meu amor! / Março, sabes, és tu, / e aquele
pássaro sou eu".
NOTA - “Arietta” (1898) do poeta napolitano Salvatore di Giacomo,
1860-1934,em dialecto napolitano. Ouça MILVA em:
https://www.youtube.com/watch?v=lMKDSnJEadc).
GOSTO DE MARÇO,
Entre a neve
E a primavera,
O branco e
As flores.
Na fronteira,
Como te vejo?
Talvez quimera!
GOSTO DO BOTTICELLI,
Dos rostos
E dos corpos
Feminis.
Volúpia de
Transparências
Sensuais.
Da pele, a Cor.
Dos traços
Que desenham
Alvura nas
Três Graças...
.........
E no Amor!
GOSTO DO BRANCO,
Cá de perto ou
Lá longe
No alto da Montanha.
E das cores intensas
Que brotam
Insinuantes
Ao meu olhar
Deslumbrado,
Cá em baixo,
Por ti
Iluminado!
GOSTO DE MARÇO.
Entrei nele
Contigo.
Ombro a ombro.
No signo do
Desencontro.
Que se repete
Em silêncio
Fatal,
Marcado
Contraponto
Do tempo
Imprevisível
Deste “triste
Destino”...
Quase irreal.
QUE O DIGAM
Os astros
Desalinhados!
Para ti colhia
Flores luminosas
E a inspiração
Crescia
Nas estrofes
Arrebatadas
Com que fingia
Sentir
O que dizer
Não podia,
Fosse por
Uma hora
Ou por um dia.
NO SIGNO DO
Desencontro
Marcado como selo,
Lá vou eu
Por aí,
Nem sei porquê
(Ou por falta de ti),
De braço dado
Com Botticelli,
Lá em cima,
na Galleria,
Onde, um dia,
Eu quase morei.
Procuro-te
Em oração
À tua deusa,
Atena,
Que trazes
(Eu bem sei)
No coração.
SINTO-TE PERTO,
Depuro
A tua imagem,
Bissetriz de mil
Rostos,
Até se tornar
Ideia
De corpo ausente!
DEPOIS REINVENTO-A
A cada instante,
Abraço-a
Com alma
De amante,
Pinto-a com
Palavras
E silêncio
De catedral.
E sonho-te...
AO ACORDAR,
No amanhecer
De cada poema,
Verei que continuas
Em mim,
De olhos fechados,
Como se fosses
Memória do que
Nunca aconteceu.
ANDAREMOS
Por aí
(Os astros o dirão),
Vagando
No pólen
Da beleza sensível
Onde pousamos
O nosso inquieto
Olhar
À procura
De alimento
Para pintar
O poema...
...................
Talvez o impossível!
LÁ NO ALTO
Te encontrarei,
Fio do horizonte,
Simulacro do teu
Olhar
A construir infinito,
Onde, num adeus
Sem fronteiras
Nem cais de partida,
Hás-de desenhar,
Com a alma,
As mil silhuetas
Ainda inacabadas...
.............
Ou talvez não!
MEU DEUS,
Como gosto de ti...
........
Em Março!
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: Almada Negreiros - “Viento. Blanco y Negro. N.º 2.017. 21 de enero de 1931 ”. In Pessoa. Todo arte es una forma de literatura. Catálogo. Museo Reina Sofía. Madrid, 2018, p. 262. Exposição aberta até 07 de Maio de 2018.
DESPEDIDA
“Tu prima m’inviasti verso Parnaso a ber ne le sue grotte, e prima
appresso Dio m’alluminasti”.
Dante Alighieri. Purgatorio. Canto XXII.
PERDI-TE
Porque nunca
Te encontrei.
Numa rua,
Numa praça,
Num café.
Em lado nenhum.
Não sei!
ENCONTREI-TE
No Parnaso.
Lá em cima.
Intangível.
Sem poder
Tocar-te
A não ser com
Palavras.
Em forma de poema.
Sensível às cores
Da tua alma.
DE REPENTE,
Vestiste-me
Com elas,
As palavras.
E eu senti-me
Quente,
Afagado
No meu Canto,
Às vezes,
Amargurado,
Outras,
Em pranto,
Sufocado.
SIM, ENCONTREI-TE
No Parnaso.
Lá em cima.
No Monte.
Através de ti
Eu vi a costa,
Eu vi o mar
E o meu mundo
Interior
Com nitidez,
A sonhar-te,
De cada vez,
Em azul...
.........
A tua cor.
A NEBLINA
Cobria-te
Para te revestir
E refrescar
A alma
Como chuva
De palavras
Húmidas
Caídas do meu
Céu.
EU NÃO ERA MAIS
Do que espelho
Que te devolvia
Fantasia
Contra a
Petrificação
Que espreita sempre
Nos olhares
Indiscretos.
Mas tu não me vias.
Em mim,
Especulavas,
Dizias...
E DE TANTO TE
VERES
E dizeres
Decidiste declinar
O espelho que
Começava
A embaciar-te.
E NÃO ERA DA
NEBLINA
Que te envolvia,
Mas dos desenhos
Que tuas mãos
Esboçavam
Timidamente
Nesse espelho
Já húmido
De ti.
E DESPEDISTE-TE.
Do Monte.
Desceste para ti
Vertiginosamente,
Em desconforto,
Sob os olhares
Das mil górgonas
Que sempre ameaçam
Petrificar-te.
E sucumbiste.
Ou talvez não...
NO MONTE, O ESPELHO
Disse para si:
- De tanto te veres
Em mim,
Ficou-me, de ti,
O repetido reflexo.
E sabes o que
Brotava
Quando te olhavas
Com palavras
Na minha superfície?
Beleza!
Toda a que me sobrou
Quando, triste,
Desceste o Monte.
MAS ESTA NÃO
PETRIFICARÁ
Porque ficou
Guardada
No meu corpo
Vítreo
Onde todos
Se revêem
Sem saber
Que no reflexo
Levam, gravada
Em transparência,
A tua imagem...
.........
Embaciada.
E EU POR CÁ FIQUEI,
Espelho do mundo,
A olhar para
O escuro espaço
Sideral
À espera que um cometa
Me alumie o caminho
Para to devolver como
Teu reflexo
Original...
A CAMINHO DE PASÁRGADA…
Poema de João de Almeida Santos, à desgarrada com Manuel Bandeira (1886-1968), a caminho de Pasárgada, inspirado em três poemas seus: Desencanto, 1912; Versos escritos na água, s.d.; Renúncia, 1906. In Obras Poéticas – 1956. Lisboa: Minerva, pp. 33, 40, 101. Ilustração: pormenor de uma obra do Mestre Guilherme Camarinha (1912-1994).
“OS POUCOS VERSOS QUE AÍ VÃO, Em lugar de outros é que os ponho. Tu que me lês, deixo ao teu sonho Imaginar como serão.” OS MUITOS VERSOS Que te dei Deixam claro O que sou. Se tu me leres, Eu não pequei. É pouco do muito Que te dou. “NELES PORÁS TUA TRISTEZA Ou bem teu júbilo, e, talvez, Lhes acharás, tu que me lês, Alguma sombra de beleza...” TALVEZ BELEZA E algum sentido, Tristeza, dor, Como castigo... Eu canto O que perdi P’ra que o verso Vá ter contigo Lá onde estejas... .............. Queira o vento Ser meu amigo. “QUEM OS OUVIU NÃO OS AMOU Meus pobres versos comovidos! Por isso fiquem esquecidos Onde o mau vento os atirou.” NÃO OS AMOU Por ser verdade Este amor Que aqui nasceu E que cantei Em liberdade Em versos Que o vento Já me levou Aos muros Dessa cidade. OUTROS FARIA Se pudesse Para os pôr Na tua mão, Não pediria que Os sonhasses, Olhos cerrados, Mas que os lesses Com afeição! AH!, MANUEL, Que bem me sabe Pôr a dor Em poesia, Em versos A emoção, No cantar Triste alegria E muito intensa Uma paixão, Mesmo que seja Utopia! DIZES TU, Em poesia, Que só a dor Te enobrece. É bem verdade, Meu bom poeta, Alma dorida Logo aquece E com seus versos Entretece O que a paixão Já tanto afecta. “A VIDA É VÃ COMO A SOMBRA QUE PASSA... Sofre sereno e de alma sobranceira, Sem um grito sequer tua desgraça. ENCERRA EM TI TUA TRISTEZA INTEIRA. E pede humildemente a Deus que a faça Tua doce e constante companheira...” POIS TENHO MEDO, Ah!, meu irmão, Que a dor Me passe, Perca o poema Sua raiz, Essa, sim, A verdadeira, E eu fique só Já sem palavras E caiam secas Todas as rosas Que me povoam Esta roseira. SOBRAM ESPINHOS Ferem-me a alma E saem versos E cai o sangue “Gota a gota, Do coração”, “Volúpia ardente” Já sem remédio “Eu faço versos Como quem chora” E chamo a dor Naquela hora E ela vem Por compaixão! AH!, POETA, Ah!, meu irmão, Tu fazes versos “Como quem morre” E eu procuro Neste meu canto... ............ O seu perdão! TU, MANUEL, És a bandeira E ela o meu refrão, P’ra mim és verso No meu poema E ela é... ............ Minha paixão!
A PALAVRA PROIBIDA…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: Intervenção digital (cor) de JAS sobre “O Rio” (1950), do artista italiano Alberto Savinio (1891-1952).
“L’amour est la poésie des sens” Honoré de Balzac
OS GUARDIÕES Do sagrado templo Emitiram Edital: “O amor em poesia Fica assim proibido Porque pode ser Fatal. Os versos E as estrofes Pintados A luz e cor Ficam p’ra sempre Banidos Da Arte E do Amor!” DIZ O AMIGO Honoré, Certeiro Como poeta, Que o Amor É poesia, É a arte Dos sentidos, É perfume Qu’inebria E nos faz sentir Perdidos... ............. Se não houver Guardião Impenitente Que decrete: “Também eles São proibidos!” PROIBIDOS? Ah!, esses, Não! Poesia É emoção, É enlevo Dos sentidos... ........... Que resiste Ao edital Mesmo que seja Cantado Pelo mais Belo jogral! TENTA, POR ISSO, Levá-los Aos píncaros Da fantasia, Sobem lá alto Os sentidos Com asas De poesia! MAS É DIFÍCIL Senti-los, Ouvi-los Em verso, Com alegria, Pois há sempre Alguém Que me rouba A brisa Dessa tua Maresia... .............. A que respiras Bem cedo, Logo ao Amanhecer, Em cada dia Que sentes Como, feliz, Eu te canto Para nunca Te perder! OLHAS O MAR, Sentes As ondas Dentro de ti A cantar Como versos Que o vento Sopra De mansinho P’ra te poder Sussurrar O que por ti Eu já sinto Apesar de tão Sozinho! POESIA Dos sentidos? O amor também É isso Porque, queiras Ou não queiras, Tem a força De feitiço. Encontro-a Sempre em ti E mesmo que Proibidos Desenho sempre Poemas Desde o dia Em que te vi... ............ Exaltaram-se Os sentidos E para o poema Parti... DECRETARAM Edital? Ah!, que o façam, Pois, cumprir! Mas poesia É como vento, Sopra-me Tão forte Na alma Que o teu silêncio É alento Para sempre Te esculpir. Na palavra proibida Encontrará o poema O seu próprio Porvir...
***
PERDER-TE…
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: intervenção digital de JAS sobre “Portrait d’un Poète (Juliet)”, 1954, de Man Ray (Man Ray, Cent’anni di Libertà - 1890-1990. Venezia, Sodicart, 1990, p. 119). Homenagem a um Artista que admiro.
RENUNCIEI Para nunca Te perder, Mas neste Silêncio sofrido Vai declinando O que p’ra sempre Eu quis ter... VÊS, BERNARDO, Que destino? Que desassossego, O meu? Quis seguir O teu caminho E perdi-me... .......... Já não sou Eu! QUE DESENCONTRO Foi esse Desde o dia Em que te vi? Dei-te errados Sinais Cada dia Que vivi, Cavando Cada vez mais A solidão Que m’invade Desde quando Te perdi? VÁ, DIZ-ME Tudo o que Não sabes! Eu quero Mesmo saber P’ra te cantar Em poemas, Pois não te Quero perder! TU AMAS A poesia? Senti-la é Doce sofrer, Ela diz tudo Com nada, O seu canto É prazer, É melodia De fada Mesmo quando Faz doer! NO POEMA Eu até finjo, É poeta Quem o diz, Mesmo que sinta O que digo Nunca sou, Sem ti, Feliz! MAS POEMA É como a vida, Posso ouvir A tua alma Em desejos Com palavras. É o modo De te ter, É remédio Que me salva De na solidão Eu arder! ESTE CANTO É, pois, meu, Nem tu Mo podes Roubar, Se te dizem Que é p’ra ti É verdade... ........... De enganar! O VERSO É o meu beijo Nesse rosto Que perdi, É quente Como o desejo E resiste A quem te diz Que o poeta Não te ama, Porque desenha As palavras Com um pedaço De giz... O AMOR Em poesia Não é mesmo Deste mundo, Quem o ler Como utopia Vai mais longe Vai mais fundo E não cai Em afasia Nem vê O pobre poeta Como simples Vagabundo. EU NÃO GOSTO Da renúncia, Mas que posso Eu fazer? Se não cantar O que sinto Ainda te vou Perder!
***
ALMA!
Poema a dois. Ana de Sousa e João de Almeida Santos. Ilustração de João de Almeida Santos. "Deusa no Jardim". 28.01.2018.
“ - PROPÍCIA, DESPERTA A MANHÃ, Desperta o dia. A Montanha distante É tua. Exageradamente fria. Está escrito Numa Estrela Em matriz Gravada A cinzel!” SIM, FRIA, É A MONTANHA Onde nascemos Para o Destino No granito Das nossas vidas! O CALOR Habita Outras paisagens Mais a sul, Onde nasce A poesia Para aquecer, Com flocos De palavras, A minha alma Granítica E vadia... “- FATAL CAMINHO De linhas paralelas. Até os sonhos Da mulher to dizem: ‘ - A solidão eterna Não ouvida. Ferida antiga, Aberta e repetida’.”
SOLIDÃO ETERNA... É longo O caminho Dos que amam No deserto Como gelo Na noite, A fria lua Iluminando a alma Nua Em desespero, Tendo areia E vento Como tempero... “- PORÉM, O GELO É QUENTE. Mente. Com a mentira sobrevive O engano. Da louca mansidão Se afastam Os sentidos Do paladar Do tacto.” SIM, É QUENTE, Porque não mente E é cortante, Faz brotar Sangue Em veias Flutuante Que escorre Sobre pele, Mesmo distante, Tal a força Da paixão Na memória Escaldante... “ - DE FACTO, PERDURA A audição, o olhar. O cheiro raro De um perfume Caro. Negrume De eclipse! Qual elipse? E o símbolo Do infinito Ata-lhe O petrificado coração. Reflecte um brilho Inigualável o diamante Inscrito Na sua neve Branca. Flecte Os joelhos. Sabe ainda rezar... Fá-lo Em poesia Confessando-se Às palavras Que se diz, Em permanente Melancolia...” ELIPSE E INFINITO Sabem de longe A não ouvido Grito de beleza Sacrificial Ou gemido Sussurrado E esquecido Lá longe. Alma ferida Que o seu altar Colorido Não acolhe Nessa distância Desmedida De uma fuga Inesperada E depois Insistentemente Ressentida No eco do silêncio! Oh! como é duro Vê-la perdida No meio da floresta Desordenada De cores, Esbracejando No seu irresistível Ímpeto, Em girândolas Ou estilhaços de Poderosa fantasia Em perigo De autofagia Cromática, À procura do Do tempo perdido Em sendeiro De floresta... “ - MAS O SILÊNCIO De Deus É um consolo. Mudança de estações, Tempo Insondável! Milhares de vezes Levanta voo a águia. Seu destino É voar. O da fiandeira, Fiar.” VOA, VOA A águia Com seus riscos, Mas ele, Que não é Fiandeiro, Fica-se Pelas palavras Como ciscos No seu olhar Perturbado, Sem cor Abandonado, Procurando, Parado, Voar Com outras asas Que encontra Em si, Sem saber Para onde Viajar, Perdido o infinito Que lhe roubaram Dessas mãos Tão generosas De palavras E cores... “ - SUAS IRMÃS, AS PARCAS, Riem Do destino Dessa mortal voadora. Resta-lhe ficar Soror da Seda Presa em seu casulo Do mais alto céu, Olhando de Longe Tudo o que a vida Lhe não deu.” MORTAL VOADORA Que me liberta Da Moira Que ao fim, Inflexível, Me conduz, Sem sair Desse silêncio Que tanto Me seduz... ......... Alma pura Que me trouxe Tanta, mas tanta Luz, Em plena vida De poeta Que resiste Com a Sorte À neblina Que aflora E espreita A cada esquina... “QUE CINZENTO E AZULADO, Porém, é o céu E o poente quente Que cai Alaranjado e vermelho, Como a nuvem Passou o sonho, Seu espelho... ............ Ah, a doçura Das palavras Amargas!” SIM, AMARGAS Como o gelo Quente Que não mente E não derrete Ao sol, No poente, Quando o verso Declina No horizonte marinho Ali a seu lado... Porque à vida E ao poema Sempre Reconduzem, Sim, As palavras, Mesmo sem cor! PROPÍCIA, DESPERTA A manhã, Sem ti, Meu amor!
ELAS FOGEM, AS PALAVRAS…
POEMA de JOÃO DE ALMEIDA SANTOS. Ilustração de ANA de SOUSA. 01/2018
QUERIA FAZER-TE UM POEMA, Sentir-te nele À vontade E as palavras Endoidaram Quando Feliz Lhes falei Da minha Quente Saudade... ............. Fugiram Numa revolta Sentida Sem conhecer A verdade. EU ESTAVA A MENTIR Sem cuidar Da crueldade De as usar Como queria Só porque Tinha saudade... ESGUEIRARAM RUA FORA, Cada uma Por seu lado, Em fugas No horizonte Deste poema Tentado. SÓ JÁ AS VIA LÁ LONGE, Ao fundo Da tua rua Num ponto Do infinito Desta minha Alma nua. UMAS ESVOAÇAVAM No fio Do horizonte, Outras Aninhadas No passeio... ............. E eu a tentar O versejo Capturado Num enleio Desta prisão Do desejo! PALAVRAS EM CORRERIA, Letras Perdendo forma Como fios De um novelo Já desfeito De sentido Como a água Do gelo... SÃO FIOS EMARANHADOS, Letras Que se deslaçam E procuram Outras formas Para lá da minha Rima, São riscos Na tua tela A subir Por ela acima... QUERO FAZER-TE UM POEMA Com palavras Desenhadas Mas elas fogem P’ra longe Correm, correm Assustadas Não vá mesmo Ser verdade Que as quero Alinhadas Neste recanto Feliz Onde resisto À saudade. ELAS GOSTAM DE CANTAR Esta minha Triste dor E gostam De me dizer Esta intensa Emoção... ........... Mas se vêem Que és feliz Fogem de ti, Dizem “não!” O POEMA PASSARINHO Procura-te Para cantar Mas se já Não sentes nada É ele que foge A voar... E HOJE É MESMO ASSIM Fogem todas As palavras Sem procurar Um destino, Já não consigo Agarrá-las Num poema Genuíno. NÃO SABEM DA MINHA DOR E por isso Vão embora Estou sem palavras, Amor, Estou muito triste, Agora!