Artigo

DECLARAÇÃO DE VOTO

Nas Eleições Presidenciais

João de Almeida Santos

"S/Título". JAS 2025
1.

APESAR DE CONSIDERAR que o Presidente da República deveria ser eleito por um colégio eleitoral alargado, como já aqui tive oportunidade de referir e de fundamentar, naturalmente que votarei nas próximas eleições de Janeiro. E o meu voto irá para António José Seguro (AJS). Em primeiro lugar, porque a sua candidatura se inscreve na minha área política, que é a da social-democracia. Depois, porque reconheço que ele dispõe, pelas funções políticas e institucionais que desempenhou, de experiência política suficiente para o desempenho de uma função em que se destaca o poder de dissolução do Parlamento, quase sem limitações (a não ser nos últimos seis meses do mandato e no início de uma nova Assembleia, também seis meses). Mas também porque julgo ser um candidato democrata, moderado e dotado de bom senso, que é uma característica fundamental para a função. Depois da extravagância expositiva e do activismo dissolutivo que tivemos durante os últimos anos é aconselhável alguma prudência e algum recato e bom senso. E creio que AJS tem as características necessárias para esta mudança.

2.

Mas há uma razão estritamente política que merece ser considerada. AJS ao propor-se como candidato independente (de partidos), obedecendo exclusivamente às suas próprias razões pessoais e ao resistir estoicamente a ataques públicos um pouco indecorosos por parte de uma parte da chamada elite socialista, conseguiu manter-se firme, acabar por ficar como candidato único do centro-esquerda e por merecer o apoio público do PS. Só esta razão seria suficiente para lhe dar o meu voto. Certos personagens do PS, tendo desempenhado funções relevantes no partido e no Estado, deveriam sentir-se obrigados a uma certa contenção nas declarações públicas acerca de uma pessoa que desempenhou durante três anos as funções de líder do partido que, ao longo do tempo, lhes foi confiando importantes responsabilidades no Estado. As razões pessoais, que são legítimas, não se devem sobrepor, num caso desta natureza, às razões políticas. Mas, mesmo assim, tendo AJS levado a bom porto a sua candidatura como a única do centro-esquerda também acabou por impor uma derrota a estes intemperados personagens. O voto é livre e secreto, certamente, mas a responsabilidade política de certos protagonistas obedece a critérios morais que, neste caso, sendo também políticos, não me parece que tenham sido devidamente considerados.

3.

Sim, é verdade que AJS não conseguiu reunir os apoios da esquerda fragmentária que persiste em dar batalha ao centro-esquerda mesmo quando este se pode revelar fundamental para impedir más soluções políticas. Acham-no demasiado de direita para os seus gostos políticos e, por isso, talvez prefiram o original em vez da cópia. Coisa, de resto habitual, se exceptuarmos os quatro anos da “geringonça”, construída em dois pilares essenciais: não permitir que a direita que ganhou as eleições formasse governo e salvar a pele de António Costa, que, depois de um grave período de austeridade, não só não ganhou as eleições sequer por “poucochinho”, mas perdeu-as por muito.  Agora, em linha com a clássica orientação, PCP, Bloco e Livre provavelmente vão disputar a primeira volta e contribuir para que o candidato do centro-esquerda não chegue à segunda volta, abrindo fileiras para que seja a direita a disputar a segunda volta e a ganhar as presidenciais. Dir-se-á que, deste modo, ou seja, mantendo-se distante da esquerda radical, AJS possa vir a obter votos do centro-direita, colmatando as brechas eleitorais que venham a verificar-se no seu próprio espaço político. Mas, no essencial, tomando em consideração, por um lado, a dimensão eleitoral do PS e a dimensão conjunta de toda a esquerda radical e, por outro, a fragmentação da direita, o mais provável seria que AJS chegasse à segunda volta, podendo disputar efectivamente a presidência. Não sendo assim, e tomando em consideração as sondagens, será mais difícil que o candidato do centro-esquerda chegue à segunda volta.

4.

Mais uma vez, a esquerda radical só pensa em usar o período eleitoral da campanha presidencial para se promover e para testar o valor eleitoral de alguns dos seus personagens, pouco lhe importando o desfecho das presidenciais. Mais, conquistando o bloco da direita a presidência, o seu capital de queixa aumentará, podendo, deste modo, prosseguir melhor o rumo de uma progressiva e inelutável irrelevância política.

5.

O Presidente da República dispõe de poucos poderes, mas dispõe de um que é muito importante: o de poder dissolver o parlamento ainda que haja uma maioria absoluta parlamentar, como se viu, por exemplo, com esta presidência que agora, e felizmente, chega ao fim, com os resultados que conhecemos.

6.

A eleição do Presidente da República é, juntamente com as legislativas e as autárquicas, um dos pilares fundamentais do nosso sistema democrático. E, por isso, e porque dispõe de um poder único no sistema – o de dissolução do Parlamento, sem que haja um instrumento equivalente que também a ele se possa aplicar, como é, por exemplo, o do impeachment –, o seu uso pode produzir profundas alterações no equilíbrio de forças, como se viu com a dissolução decidida em 2023, que levaria o PSD ao poder, depois de uma breve maioria absoluta do PS.  Uma dissolução que tem muito que se lhe diga, designadamente pelo facto de o PS a ter aceite passivamente, sem que os seus órgãos electivos se tenham pronunciado e reivindicado energicamente o direito de o PS continuar a governar, embora com outro primeiro-ministro. É conhecida, em parte, a mecânica insólita deste processo e o resultado a que ele levou, e não parece ser difícil, para já, tirar dele algumas, e preocupantes, ilações. Até por isso, julgo ter fundadas razões para votar em António José Seguro. É apenas um voto, em urna, mas aqui publicamente argumentado e justificado. JAS@12-2025

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