João de Almeida Santos
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades? Só quando a mudança é percebida pela razão. A mudança é estrutural. Em tudo. E na política. “M5S”, em Itália. Syriza na Grécia. “Podemos”, em Espanha. Movimentos Independentes, em Portugal. Os pilares financeiros ruem como castelos de papel. O poder judicial parece insinuar-se como poder invasivo, bigbrotherizando, com escutas e fugas, a sociedade: já todos ditamos para a acta quando falamos ao telefone. O poder financeiro internacional e as agências de rating dominam as economias nacionais e as dívidas públicas. O poder mediático continua forte e intenso. Avançamos para uma problemática sociedade transparente. As diferenças civilizacionais convertem-se em choque. A política está capturada. Mas não pela vontade geral. A política já não se faz com modelos orgânicos, próprios dos velhos sistemas de partidos…
Perante isto, o que é que o PS, que se quer inovador, propõe? António Costa federou bem as sensibilidades. Mas talvez seja necessário promover uma ideia inovadora que mobilize e responda a este quadro tão complexo. O programa de governo e a agenda para a década são fundamentais. Mas há que propor também uma nova visão de fundo sobre a “sociedade transparente”, a atracção fatal pela democracia directa, a crise dos paradigmas organizacionais e da representação, o emergente “poder diluído”, as transmutações do capital financeiro, a crise do velho Estado social perante uma nova responsabilidade individual, a aliança perversa entre justiça e media, o choque civilizacional, a democracia supranacional a braços com o regresso do velho nacionalismo, a relação entre representação e “poder diluído”, a atrofia burocrática da sociedade. Ou o desafio do PS perante a mudança. Que implicará superar o velho modelo social-democrata. Ou seja, avançar para uma nova fase. Do maximalismo, “Godesberg” e Terceira Via para uma “democracia digital e em rede” em consonância com a nova sociedade que emerge. Mas esta será uma fase mais complexa: põe em causa o clássico modelo orgânico da política. E implica um confronto com a lógica dos novos poderes, com a emergente transparência comunitária e com a nova centralidade de um cidadão individualmente responsável. Como se compreenderá, a política precisa de uma filosofia que a inspire para não se desvitalizar e se transformar numa prática casuística prisioneira da ditadura do presente e da mera ideia de interesse. O ser humano move-se por ideais.