POEMA EM AGUARELA…
À desgarrada com Manuel Bandeira. (1886 -1968), a caminho de Pasárgada, inspirado em três poemas do Vate: “Desencanto”, 1912; “Versos escritos na água”, s.d.; “Renúncia”, 1906. In Obras Poéticas. 1956. Lisboa: Minerva, pp. 33, 40, 101. Ilustração: pormenor de uma obra do Mestre Guilherme Camarinha (1912-1994).
“OS POUCOS VERSOS QUE AÍ VÃO, Em lugar de outros é que os ponho. Tu que me lês, deixo ao teu sonho Imaginar como serão.” OS MUITOS VERSOS Que te dei Deixam claro O que sou Se tu me leres Eu não pequei É pouco do muito Que te dou. “NELES PORÁS TUA TRISTEZA Ou bem teu júbilo, e, talvez, Lhes acharás, tu que me lês, Alguma sombra de beleza...” TALVEZ BELEZA E algum sentido, Tristeza, dor, Como castigo... Eu canto O que perdi P’ra que o verso Vá ter contigo Lá onde estejas... .............. Queira o vento Ser meu amigo. “QUEM OS OUVIU NÃO OS AMOU Meus pobres versos comovidos! Por isso fiquem esquecidos Onde o mau vento os atirou.” NÃO OS AMOU Por ser verdade Este amor Que aqui nasceu E que cantei Em liberdade Em versos Que o vento Já me levou Às muralhas Dessa cidade. OUTROS FARIA Se pudesse Para os pôr Na tua mão, Não pediria que Os sonhasses, Olhos cerrados, Mas que os lesses Com afeição! AH!, MANUEL Que bem me sabe Pôr a dor Em poesia, Em versos A emoção, No cantar Triste alegria E muito intensa Uma paixão, Mesmo que seja Com’ utopia! DIZES TU, Em poesia, Que só a dor Te enobrece. É bem verdade, Meu bom poeta, Alma dorida Logo aquece E com seus versos Entretece O que a paixão Já tanto afecta. “A VIDA É VÃ COMO A SOMBRA QUE PASSA... Sofre sereno e de alma sobranceira, Sem um grito sequer tua desgraça. ENCERRA EM TI TUA TRISTEZA INTEIRA. E pede humildemente a Deus que a faça Tua doce e constante companheira...” POIS TENHO MEDO, Ah!, meu irmão, Que a dor Me passe, Perca o poema Sua raiz, Essa, sim, A verdadeira, E eu fique só Já sem palavras E caiam secas Todas as rosas Que me povoam Esta roseira. SOBRAM ESPINHOS Ferem-me a alma E saem versos E cai o sangue “Gota a gota, Do coração”, “Volúpia ardente” Já sem remédio “Eu faço versos Como quem chora” E chamo a dor Naquela hora E ela vem Por compaixão! AH!, POETA Ah!, meu irmão, Tu fazes versos “Como quem morre” E eu procuro Neste meu canto O seu perdão! TU, MANUEL És a bandeira E ela o meu refrão, P’ra mim és verso No meu poema E ela é Minha paixão!