O POEMA
Poema de João de Almeida Santos Ilustração: “Ela”. Original de minha autoria para este Poema. Fevereiro de 2019.

“ELA”. Jas. 02-2019
POEMA – “O POEMA”
PRA QUE SERVE O meu Poema Se ela, Do outro lado Da rua, Não o vê e Não o ouve, Não lhe sente O perfume Que a alma Inebria? AH, MAS EU SINTO-A A ela Do lado de cá Do Poema E pinto-a Em aguarela P’ra que veja A minha dor... ................. Olho-a, então, Com palavras E falo-lhe Como pintor. PRA QUE SERVE O MEU POEMA? Pr’aquecer A minha alma Dizendo tudo O que sinto Mesmo quando Nos meus versos Até parece Que minto... MAS NÃO ESCREVO Pra ela Que não a vejo À janela A ver passar O poema Na rua do Desencontro... O POEMA É de quem O queira ver E ouvir-lhe A melodia, Ler ou mesmo Cantar Como uma sinfonia, É a festa Dos sentidos, É prazer, É emoção, Não o ouve Nem o vê Quem não pode Ou quem não queira... .................. Não é coisa da Razão! O POEMA É SEMPRE CANTO, Vale pela melodia, Pelos sentidos que Desperta Cada hora, Cada dia... É VIDA QUE ME LIBERTA Das amarras Da paixão Porque voo com Palavras Ao sabor da emoção. E SE TE CHAMO Ao poema É pra ter de volta O meu eco, Ouvir o som Desta dor, Decompô-la Em palavras, Anulando a paixão Num canto libertador Das amarras Da prisão. PARA ISTO EU SOU POETA, Canto pra quem Me ouve, Não espero Reacção, Porque sei que Já partiste, Me deixaste Em solidão. EM CANTO-ME Nestes poemas Pra redimir Minha dor E se a poesia Não chega, As palavras Não me bastam, Pois que seja... ................... Sou pintor.

“Jardim”. Jas. 02-2019
Estou cada vez mais convencido que é preciso ser poeta ( e pintor ou outro artista qualquer) para não se perder em reações fúteis à realidade que nos magoa! É o que Camões conseguiu perante o declínio da era heróica portuguesa, e até certo ponto o Pessoa. Diogo do Couto, contemporâneo de Camões foi bom cronista e historiador, mas ficou preso na sua irritação e derrotado pelos seus sentimentos de mágoa, que transmite n’O Soldado Prático’ e nas suas Décadas da Ásia.
Parabéns caro professor João por seguir o caminho de auto-libertação/ nirvana através de poesia pintada.
Concordo, Professor Teotonio. Gosto da frase “ficou preso na sua irritação”. Corresponde à verdade. Tantas vezes ficamos prisioneiros das nossas irritações… e perdemos o sentido do que verdadeiramente importa, chegando mesmo a perder (desperdiçar) o que poderia ser decisivo para concretizarmos a nossa estratégia de vida. Tantas vezes somente para salvar aparências enganosas aos olhos de quem não sabe ver ou valorizar o essencial. Não, eu não quero ficar prisioneiro de uma irritação, que até pode ser meramente conjuntural, e com isso prejudicar a minha estratégia de vida. Por isso, deixei-me deslizar para o interior da poesia e da pintura, navegando nelas como se navega na vida. E porque elas são a expressão mais genuína da liberdade, então, sinto-me em processo de libertação das amarras da “realidade que magoa”. “Poesia pintada”, sim, dando mais cor às palavras, como se voassem no interior de um arco-íris. A cor dá mais força impressiva às palavras. Nirvana? Isso é difícil, não tenho dimensão ascética suficiente para lá chegar… Obrigado por este seu sábio comentário. Tocou-me profundamente.