A PALAVRA PROIBIDA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “Beija-Flor em Magnólia”. Original de minha autoria. Fevereiro de 2020.

“Beija-Flor em Magnólia”. Jas. 02-2020.
POEMA – “A PALAVRA PROIBIDA”
OS GUARDIÕES Do sagrado templo Da palavra E da cor Emitiram edital: “O amor em poesia Fica assim proibido Porque pode ser Fatal. Os versos E as estrofes Banhados A luz e cor Ficam pra sempre Banidos Da arte E do amor.” DIZ O GRANDE HONORÉ, Balzac, de apelido, Certeiro, Como poeta, Na palavra destemido, Que o Amor É poesia, É a arte Dos sentidos, É perfume Que inebria E nos faz sentir Perdidos Se não houver Guardião Que decrete, Impenitente: “Também eles São proibidos!” PROIBIDOS? Ah, esses, Não, Poesia É emoção, É enlevo Dos sentidos Que resiste Ao edital Mesmo que seja Cantado Pelo mais belo Jogral. O POEMA LEVA Aos píncaros Da mais alta Fantasia, Sobem ao monte Os sentidos Com as asas E a leveza Da arte Em poesia. MAS É DIFÍCIL Ouvir E sentir Em verso Com alegria Pois há sempre Alguém Que me rouba A brisa Dessa tua Maresia, A que respiras Bem cedo, Logo ao Amanhecer Quando ouves O meu canto Para nunca Te perder. OLHAS O MAR, Ouves As ondas Dentro de ti A cantar Com versos Que o vento Sopra Pra te poder Ciciar O que por ti Eu já sinto Nesta canção Que compus Numa noite De luar. POESIA Dos sentidos... ...................... O amor é mesmo isso, Porque, queiras Ou não queiras, Tem a força De feitiço. ENCONTRO-A Sempre em ti E mesmo que Proibidos Escrevo sempre Poemas Desde o dia Em que te vi. EXALTARAM-SE Os sentidos (Não sentiste?) E para o poema Parti Com as asas E as cores De um belo colibri... DECRETARAM Edital. Ah, que o façam, Pois, cumprir. Mas poesia É como vento Que te leva Cada dia, Sopra Tão forte Na alma Que o silêncio É alento De poeta Que com palavras Se salva. À PALAVRA PROIBIDA Sempre o poeta Resiste, É livre no seu dizer Das razões Da sua vida Quando a dor Atormenta E o sofrimento persiste...

“Beija-Flor em Magnólia”. Detalhe.
Mais um texto de João de Almeida Santos (JAS) que, na orgânica estruturante da composição poética, prima pela criatividade e originalidade. O recurso ao dispositivo original e impressivo do edital, em registo discursivo declarativo e judicial, surpreende o leitor: “OS GUARDIÕES/Do sagrado templo/Da palavra/E da cor/Emitiram edital:/ O amor em poesia/Fica assim proibido/Porque pode ser/Fatal./Os versos/ E as estrofes/Banhados/A luz e cor/Ficam pra sempre/Banidos/Da arte/E do amor.” Estes versos são um exemplo paradigmático da arte versificadora de JAS seja pela riqueza estilística seja pela fatalidade inerente ao amor seja pela presentificação verbal (“fica; pode, ficam”). Esta presentificação é semantizada pelo advérbio temporal (“sempre”) incutindo ao poema uma aura duradoura e eterna… Dir-se-ia que à efemeridade e à transitoriedade da vida, o sujeito poético, persistente, contrapõe a intemporalidade da Poesia e do Amor: “À PALAVRA PROIBIDA/Sempre o poeta/Resiste,/É livre no seu dizer/Das razões/Da sua vida/Quando a dor/Atormenta/E o sofrimento persiste…”.
A par desta tematização do Amor, em JAS isotopicamente aliado à dor, ao sofrimento, à ausência e ao silêncio, a poesia, em análise, é magistralmente sinestésica (“EXALTARAM-SE/Os sentidos”) e vibrante de luminosidade (“Parti/Com as asas/E as cores/De um belo colibri…”).
A convocação, certeira, do escritor francês, Honoré de Balzac, em cujas narrativas o Amor é, recorrentemente, matéria ficcional, é também significativa e surpreendente. O mesmo para a expressividade intertextual do “belo jogral”, que remonta ao singelo lirismo medieval do “amor cortês” trovadoresco cantado pelos jograis. Em suma: a poética de JAS é a narrativa de uma história de amor (real ou efabulada), imbuída da intelectualidade do Poeta e da substância semântica da sua verve…