ESTRANHA ENCRUZILHADA
Poema de João de Almeida Santos. Ilustração: “A Rua” (2022; 104x118). Pintura que integra a minha Exposição “Luz na Montanha”, aberta ao público até 25.09, no Centro Cultural de Cascais. Agosto de 2022.

“A Rua”. JAS. 2022. 104×118
POEMA – “ESTRANHA ENCRUZILHADA”
CRUZEI-ME CONTIGO Numa esquina Da vida, Nesta rua Onde inventei Uma estranha Despedida. NÃO TE VI Como te via Da janela Sobranceira Quando passavas Na rua Abraçada À beleza, Teu perfeito Avatar, Quadro vivo De ti Que o tempo Quis desenhar. SE TE REVI (Mas não sei), Foi numa janela Vidrada Que me devolveu A imagem Reflectida Como num espelho De fada. E, ASSIM, ESTREMECI. Pressenti-te Fugidia, Nesse acaso Do destino, A meu oblíquo Olhar Em nova Encruzilhada Deste incerto Caminhar. DEPOIS SEGUI Com a alma Em alvoroço Essa tua silhueta Embaciada, No meio Da multidão... ........... Não via bem O perfil Por falta De nitidez Do meu campo De visão. ANÓNIMO Me assumi Como essa gente Comum Que se cruza No caminho Sem jogar O seu destino Num encontro Casual. QUE ESTRANHA Sensação, Caminhar Lado a lado Com uma vaga Silhueta, Fixado Num horizonte Que se esfuma E desfaz Como espuma Em areia A marcar uma Fronteira Traçada Pelas marés. ATÉ QUE CHEGUEI Às palavras Escritas na água Da praia Remexida Pelo vento, Derramando Na areia Um murmúrio, Um lamento, Um poema Simulado Para dar voz Ao poeta Que sofre Do seu pecado. MAS GOSTEI Do olhar Oblíquo Com que te vi Na janela De vidros baços, Fumados, Apenas imaginando Que aquela silhueta Era tua, Regressada Dos confins Dessa remota Memória Dos felizes Desencontros Que tinha Na outra rua. E GOSTEI Que me visses Sem olhar, Pressentindo-me Apenas, Anónimo A seguir o teu Caminho Para logo Se perder Nas veredas Do destino. TUDO TÃO ONDULANTE E tão normal, Estranhamente Banal, Que até o poema Espanta Por cantar O que nunca Aconteceu A não ser Na fantasia De quem com ele Renasceu. CRUZEI-ME CONTIGO Ao lusco-fusco De um estranho Entardecer, Numa encruzilhada Da rua Que um dia Inventei Pra desenhar O caminho Onde te ia Perder. É A VIDA De um poeta Que se alimenta Da dor. Se não a sente, Procura, Nem que seja No amor.

“A Rua”. Detalhe