ENSAIO

 

A ARTE, O ARTISTA E OS OUTROS

DIÁLOGO COM FERNANDO PESSOA 
E MARGUERITE YOURCENAR

João de Almeida Santos

BallerinaFP11_2019_01

“Ballerina III”. Jas. 12-2019

 

O TEXTO DE MARGUERITE YOURCENAR

Cruzei-me com um pequeno subcapítulo de «Le temps, ce grand sculpteur», de Marguerite Yourcenar, «II – Sixtine – Gherardo Perini» (Paris, Gallimard, 2015 – obra de 1983), e parti para uma nova reflexão acerca da minha experiência com a arte, na óptica do autor, e em profunda e sentida convergência com estas duas grandes figuras da literatura mundial, Pessoa e Yourcenar. 

Um excerto do texto de Yourcenar:

«L'amour d'un être est un présent si inattendu, et si peu mérité, 
que nous devons toujours nous étonner qu'on ne nous le reprenne pas 
plus tôt. Je ne suis pas inquiet de ceux que tu ne connais pas 
encore, mais vers lesquels tu vas et qui t'attendent peut-être: 
celui qu'ils connaitront sera différent de celui que je crus 
connaître, et que je m'imagine aimer. On ne possède personne (ceux 
qui pèchent même n'y parviennent pas) et l'art étant la seule 
possession véritable, il s'agit moins de s'emparer d'un être que 
de le recréer. 
Gherardo, ne te méprends pas sur mes larmes: il vaut mieux que ceux 
que nous aimons s'en aillent, lorsqu'il nous est encore loisible de 
les pleurer. Si tu restais, peut-être ta présence, en s'y 
superposant, eut affaibli l'image que je tiens à conserver d'elle. 
De même que tes vêtements ne sont que l'enveloppe de ton corps, 
tu n'es plus pour moi que l'enveloppe de l'autre, que j'ai dégagé 
de toi, et qui te survivra. Gherardo, tu es maintenant plus beau 
que toi-même. 
On ne possède eternellement que les amis qu’on a laissés»*.

 O TEXTO DE FERNANDO PESSOA

“Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência”. “Possuir é ser possuído, e portanto perder-se”. “A arte livra-nos ilusoriamente da sordidez de sermos”. “Mas na arte não há desilusão porque a ilusão foi admitida desde o princípio” (Pessoa, F., Livro do Desassossego, Porto, Assírio e Alvim, 2015, p. 238).

CRIAR A PARTIR DE UM INTERVALO…

O meu interesse súbito pelo texto «Sixtine – Gherardo Perini», evidente para quem tem seguido o meu percurso poético, deve-se também à posição ideal em que me coloco no processo de construção da narrativa poética, na dialéctica entre o texto e o real. Sim, narrativa, porque se trata, sempre, de uma narrativa, nem que seja de um instante vivido ou de uma impressão fugaz. O que me acontece com frequência. No meu processo criativo procuro, pois, contar sempre uma história, mais do que desenhar fragmentos impressivos do que sinto no momento em que escrevo, confundindo-os com palavras com poder performativo. Tenho sempre bem presente a frase da Isak Dinesen, que pratico: «all sorrows can be borne if you put them into a story or tell a story about them». Li esta frase pela primera vez num livro da Hannah Arendt, «The Human Condition». Precisamente. E adoptei-a, até pelo seu efeito terapêutico. E a poesia, pelo seu poder altamente performativo, age, de facto, sobre o autor ainda mais profundamente do que a narrativa romanesca, através dos seus personagens. Também já tive essa experiência, ao passar de uma para a outra, do romance para a poesia, quando o terminei e fiquei órfão das personagens, nostálgico e melancólico (Via dei Portoghesi, Lisboa, Parsifal, 2019). Ou seja, concretizando mais, o meu interesse por este texto da Yourcenar deve-se ao valor que atribuo a esse intervalo de onde me ponho a observar a minha própria relação com o mundo e com os outros, um autêntico espaço intermédio de onde se vê quer os bastidores quer o palco… da vida. (No texto, a relação é entre Michelangelo e Gherardo Perini, mas do que se trata é de um discurso sobre a arte, a beleza e o amor). Olho, pois, para esta relação, metodologicamente, como se estivesse já a olhar para uma obra de arte «in nuce», um quadro, uma fotografia, um passo de bailado, a partir da qual posso esculpir um texto ou um desenho, sempre indiscretos, pelo que me é dado observar, em especial se o observado for eu próprio. O «eu» como meio de arte para o poeta ou o pintor, desnudado como modelo às mãos do artista: «Je te vois nu. J’ai le don de voir, a travers le vêtement, le rayonnement du corps, et c’est de cette façon, je pense, que les saints voient les âmes». Isto diz a Yourcenar. Pintar-me com palavras, riscos ou cores, olhando o espelho onde se projecta a minha alma em acção, de algum modo comprometida  com o mundo, com os outros. Um pouco mais do que o que Pessoa queria, pois, a ele, na arte, a sua relação efectiva com o mundo não interessava mais do que o seu «quadro», a sua representação; de resto, ele até amava somente «com o olhar, e nem (sequer) com a fantasia» (Livro do Desassossego, edição citada, p. 424). Uma função que era desempenhada por uma espécie de espelho virtual onde ele se reconhecia e onde projectava a imagem do real que idealizava. Falo do Bernardo Soares, claro. Visão, pois, instrumental do sentimento ao serviço da arte. «Saber interpor-se constantemente entre si próprio e as coisas é o mais alto grau de sabedoria e prudência» – eis como Pessoa interpreta a posição de sageza e de prudência no relacionamento com o mundo, sobretudo quando a relação se localiza na arte.  Ninguém ama alguém – ama tão-só a ideia que se faz de alguém.  

AMAR POR PALAVRAS…

Medito, pois, a este propósito, nas divagações do Bernardo Soares no «Livro do Desassossego», onde sobressai a ideia que aqui vamos encontrar. Em palavras simples: a criação artística é suscitada pelo real, como não podia deixar de ser, como pulsão (meramente mecânica), estímulo e impressão sensorial (simples registo descomprometido), conhecendo, depois, um desenvolvimento autónomo, autopoiético, que segue as suas próprias leis, a sua dinâmica e a sua linguagem. Isto na óptica do radical Bernardo Soares, que não é exactamente a minha, mais comprometida com a dor e arredores, porque os arredores também são importantes, embora não tanto como diz Pessoa, falando do amor: “Não o amor, mas os arredores é que vale a pena…”.

Os filósofos dizem: uma coisa é a génese, outra é a validade. São esferas que pertencem a planos diferentes. Até o título de uma importante obra de Juergen Habermas, de 1992, alude a isto: «Faktizitaet und Geltung» – facticidade e validade, o concreto e a forma, o singular e o universal, o empírico e a lógica, a variável e o sistema. E quando o texto ganha forma, então, a impressão genética original torna-se remota, perde pregnância, passa a ser um simples elemento (residual) do sistema, por este «sobredeterminado», para usar o interessante conceito do Althusser do “Pour Marx”. Deste modo, o poeta ama, pois, mais com a palavra e na palavra do que com a pulsão e na pulsão. A performatividade da poesia é isto: toca e troca o real por palavras, por uma polissemia colorida e auto-suficiente, às vezes em tons escuros. E o pintor ama com o olhar, na cor e nos traços.

Há como que uma distância originária ou matricial entre o artista e o real, a que Pessoa chama renúncia e a que a Yourcenar responde com a ideia de que a verdadeira posse (a referência é sempre o real, claro) só é possível através da recriação artística. «Nunca amamos alguém », diz Pessoa. «Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém» (2015: 125) e «possuir é perder », mas «sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência», mantendo, pois, a distância necessária, ou seja, colocando-se num intervalo entre si e o ser amado ou esteticamente desejado.  Mas possuir é ser também possuído, logo, é perder a liberdade para recriar, porque se ficou cativo. Isto até faz lembrar o passarinho do Vinicius de Moraes, que teve de ir embora (“some-te daqui”) porque já não havia poeta, mas um homem feliz, talvez possuído pelo amor. Pois a Pessoa – para poder continuar a poetar – só interessava o real em forma de retrato ou representação para a recriação e, como bom dissidente da vida (2015: 120), não gostava de tocar na realidade sequer com a ponta dos dedos (2015: 246). 

Mas a Yourcenar também diz, aqui, na interlocução com Gherardo: «On ne possède personne (ceux qui pèchent même n’y parviennent pas) et l’art étant la seule possession véritable, il s’agit moins de s’emparer d’un être que de le recréer ». Só se possui com a arte, recriando, ao ponto de o ser amado, em arte, ser mais belo do que o modelo real: «Gherardo tu es maintenant plus beau que toi même». Aqui está: a transfiguração pela arte, a elevação, a imobilização da alma, como diria Yourcenar, ou a cristallisation, como gostava de dizer Stendhal, em particular no «De l’Amour» (1822), escrito, julgo, para se resgatar dessa intensa paixão pela Matilde Viscontini Dembowski, que não o quis. Ou, então, Pessoa: «os campos são mais verdes no dizer-se do que no seu verdor » (2015: 55). É a distância de que nos fala: saber interpor-se entre si e as coisas é a verdadeira sabedoria. Segredo da arte. Colocar-se num intervalo criativo, algo especular, sem se deixar sucumbir à força dessa “doença da alma” de que fala o Stendhal de “De l’Amour”. Diria eu, glosando o poeta: se não te tenho (possuo), ninguém pode roubar-te (2015: 209), porque tu já vives dentro de mim, confundida comigo próprio e com a ideia que tenho de ti. E provavelmente essa já nem és tu, mas sim o que me sobrou de ti quando partiste e te chorei, antes que te gastasses numa qualquer rotina.

A ARTE É A SOBRA DO QUE SE TEVE?

Yourcenar é dura no seu juízo acerca da imortalidade pela arte: se houver de imortalizar pela arte um amor não podemos deixar que esse ser se esgote na quotidianeidade, que se gaste, se consuma. É melhor que os que amamos partam enquanto for possível chorar a sua perda ou partida, pois a sua continuação acabaria por enfraquecer a imagem que temos deles, gastando-se e tornando-se imprópria para a arte – partida e a perda que provocam dor, esse alimento inesgotável da poesia! E essa, sim, é a autêntica  realidade que interessa ao artista-amante: o outro, o que está para além da aparência, da roupagem com que se cobre, do quotidiano sofrido, da presença que desgasta e que é preciso “imobilizar” a tempo, a partir da sua nudez, o ponto de partida necessário para a recriação, tal como «os santos vêem as almas», diria Yourcenar. Este sobreviverá ao outro que já partiu, o que deixou um rasto de si, como se tivesse partido sem ter esgotado a relação com o (re)criador. E por aqui entra a ideia de renúncia, ligada à ideia de ausência, de privação, quer em Yourcenar quer em Pessoa: «sou a ponte de passagem entre o que não tenho e o que não quero »; «a renúncia é a libertação”; “não querer é poder » (2015: 209, 140). E creio que se, para Yourcenar, a arte exprime realmente «o que sobrou do que (o artista) teve», porque não deixou que se esgotasse na sua presença, para Pessoa ela «exprime o que (o artista) não tem» (2015: 207), porque, no seu caso, não quer tocar a realidade sequer com a ponta dos dedos. Para Yourcenar a renúncia é a não-posse, a ausência e a partida, necessárias como condições para a (re)criação artística.

Gosto desta sugestão do Pessoa: fazer arte com o que sobrou do que se teve, sem, afinal, se ter tido. Fazer arte com o que resta do que, tão-somente, se pôde olhar. Processo que para Yourcenar exigiria um pouco mais: o que sobrou de alguém que se teve, mas que partiu. E o que sobrou foi o que o artista viu nesse alguém quando presente, bem diferente do que outros nele verão e que não será certamente o mesmo. «Tu m’as lié, et tu me délies», porque «tu ne m’aimes plus». Mas eu fiquei com o que de melhor vi em ti, diz. Era este que amava, não o outro que partiu, esse que já não será o mesmo que foi para si e que será outro para outros. Não o perdeu, apesar de não o possuir, porque, afinal, o recriou. É esse, o que sobrou dele, que será objecto de poemas, de narrativas, de pintura, de arte. É esse que será imortalizado pela arte: «Et c’est de la même façon que j’immobiliserai ton âme», que te sobreviverá. É esse, sim, que será «imobilizado» ou «cristalizado». E eu sinto que isso pode ser verdade, num plano onde a pragmática terá pouco a dizer e a fazer, sujeita que está ao declínio dos corpos. «Um dia, eu senti isso e nasci para a arte», diria o poeta, desabafando com alguém. 

O que julgou conhecer e crê amar – assim definia Yourcenar a relação amorosa e artística, um pouco menos radical do que Pessoa, que achava mesmo impossível conhecer o outro, sabendo que nem a si próprio conhecia. Por isso, o artista Pessoa é mais o que cria o que não teve, porque nele a renúncia é rainha, do que o que criou com o que lhe sobrou do que teve. E este é o artista da Marguerite Yourcenar. E eu, nisso, sinto-me duplamente mais perto dela do que de Pessoa.

A ARTE É SOLIDÃO

A solidão é outra das dimensões que os acomuna: «les choses purement belles sont solitaires come la douleur de l’homme», dizia Yourcenar. Lá onde parece que a comunhão de destinos funda o amor e a beleza, verifica-se que não é assim, que a arte é amiga da solidão, pois os que amamos e nos amam nos vão deixando «insensivelmente a cada instante que passa». O que fica, o que persiste é o que é extraído («dégagé») em presença e recriado em ausência. E só isso é eterno, o que sobrou: «on ne possède eternellement que les amis qu’on a laissés». Ou seja, a autêntica posse dá-se em ausência, logo, em solidão, ficando, pois, confinada numa recriação que outra coisa não é senão transfiguração pela arte. Este processo, na poesia, talvez seja mais real do que no romance porque a transfiguração nela é mais viva, intensa e indeterminada (sem limites), precisamente como na linguagem viva do sentimento, da emoção ou da pulsão. A performatividade da poesia talvez seja, de facto, muito superior à do romance.

EM SUMA,

É esta mesma dinâmica que eu julgo que move a minha poesia, talvez no registo de ambos, Pessoa e Marguerite, e das referências ausentes (que, para mim, são decisivas), pois parto da ideia de que tive sem ter e de que crio para preservar e elevar o que sobrou do que tive, sem ter tido. Na verdade, tive com o olhar e com a alma e porque me apoderei do que isso para mim representava e significava, da essência que extraí («que j’ai degagé de toi», para usar as palavras da Yourcenar) de quem estava à minha frente, do que não possuí a não ser como energia para me elevar pela arte, soprando-o para a eternidade, por mais efémera que realmente essa possa vir a ser. Eternidade efémera – um oxímoro de que gosto -, porque ela não existe se não houver um rosto, sempre efémero porque sujeito à lei do tempo, mesmo em arte. Lembro-me bem da famosa carta do Pessoa a um retrato de mulher casada. Até a reinventei no romance “Via dei Portoghesi”. Nela é possível juntar, em pensamento sobre a posse, Yourcenar e Pessoa, aos quais me associo por humilde afinidade de pensamento e de intuição e por confessada admiração, sem me esquecer das sábias palavras da Isak Dinesen, oportunamente relembradas por Hannah Arendt, que sabia bem do que se tratava. 

______________

* “O amor de alguém é um presente tão inesperado e tão pouco 
merecido que devemos espantar-nos que não no-lo retirem mais 
cedo. Não estou inquieto por aqueles que ainda não conheces, 
ao encontro de quem vais e que porventura te esperam: aquele que 
eles vão conhecer será diferente daquele que eu julguei conhecer
e creio amar. Não se possui ninguém (mesmo os que pecam não o 
conseguem) e, sendo a arte a única forma de posse verdadeira, o 
que importa é recriar um ser e não prendê-lo. Gherardo, não te 
enganes sobre as minha lágrimas: vale mais que os que amamos 
partam quando ainda conseguimos chorá-los. Se ficasses, talvez 
atua presença, ao sobrepor-se-lhe, enfraquecesse a imagem que me 
importa conservar dela. Tal como as tuas vestes não são mais que 
o invólucro do teu corpo, assim tu também não és mais para mim 
do que o invólucro de um outro que extraí de ti e que te vai 
sobreviver. Gherardo, tu és agora mais belo que tu mesmo. 
Só se possui eternamente os amigos de quem nos separamos”.

 

Poesia-Pintura

AS PALAVRAS SÃO OÁSIS…

Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Oásis”. Original
de minha autoria para este
poema. Dezembro de 2019.
OasisFinal30

“Oásis”. Jas. 12-2019

POEMA – “AS PALAVRAS SÃO OÁSIS…”

PORQUE NÃO TE DÁS
Um pouco,
Meu amor?
A minha
Sede de ti
É tão grande
Como a dor
Do dia
Em que, no fim,
Te perdi.

PENSA NO DESERTO
E no oásis
Que o suspende
De tão longo
E árido ser
O caminhar
Sobre areia
Escaldante
Na procura
Infindável
De te alcançar
Como amante...

OS MEUS LÁBIOS,
Áridos de ti,
Não se saciam
Com uma gota
De água
Ou o aflorar
Da seiva
Exausta
Do meu caule,
Gasto de tanto
Te esperar...
.................
Mas quando falam
(O pouco que te 
Falam)
Humedecem,
Porque as palavras
Pousam neles,
São oásis
Verdejantes
No imenso deserto
De um amor
Em longa
Despedida...

E QUANDO CHEGO
Ao fim,
À última estrofe
Do teu poema,
Já sei
Que tenho de retomar
O arenoso caminho
Do canto 
Em solidão...

OS OÁSIS
São parte do deserto
Que atravessamos
Na nossa vida,
São bátegas
Que banham
A alma ressequida
De tanto
Clamar por uma
Saída
Nesse mar de areia
Em que o viver
Se tornou.

MAS TU
Nem gotículas
Me dás
Quando clamo
Por ti
Na miragem
Do deserto...

O QUE TALVEZ
Não saibas
(Ou sabes
Em demasia?)
É que a vida
É mais
Deserto do que
Oásis,
Mais areia do que
Gotículas
Que brilham
Ao sol ardente...
.................
E que os lagos
E as fontes
Onde refrescamos
A alma
São pura
Alucinação
Que nos deixa
Mais entregues
Ao silêncio...
...................
E à fria solidão.

AH, QUE FALTA SINTO
Da tua fonte
A jorrar
Cores vivas
Sobre mim,
Das bebedeiras
De palavras
Sobre ti,
Da densa neblina
No deserto
A coar o sol que
Me bate no peito
Onde mais te sinto.

IMAGINO-TE, ENTÃO,
Como meu oásis,
Chuva no deserto
Sobre esta minha pele
Seca e encrespada...
.....................
Mas bem sei
Que não passa de
Alucinação!

PORQUE HÃO-DE SER ASSIM
As nossas vidas,
Sem gotículas
Que banhem
O nosso corpo
Por falta de alma
Que as acolha?

O QUE ME SALVA,
Meu amor,
É este oásis
Verdejante
Que construí
Como palco
Para te cantar
Ao entardecer
Da nossa melancolia...
OasisFinal30R

“Oásis”. Detalhe.

Poesia-Pintura

PAIXÃO

Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Cascata”. Original de minha
autoria para este poema. Reproposição 
(com alterações) de um poema
publicado há três anos, em resposta
a um soneto de Ana de Sousa (09.2016).
Novembro de 2019.
Jas_Cascata241119-Exp.

“Cascata”. Jas. 11-2019

MOTE – SONETO

“Vinde cá meu tão certo Secretário”,
Confirmai meu gosto de espelhar
À Musa que recusa Amor notório
Gritando ao Mundo o que não quero calar!
 
De rosas, de loureiro, de jasmim
De astral, de amargor, de doce fel
As bagas, a folhagem, no jardim
Onde abelhas obreiras fazem mel! 

Dizei o que tanto quero ouvir
Que o que pensais, não quero, não!
Escrevei que meu engenho repetir  

Só quero na rima, mil dores de coração.
Enlace, ponto final, sem remédio é ir
Do próprio veneno provar... em edição.”

POEMA – “PAIXÃO”

ESPELHO MEU,
Espelho meu,
Vês dor mais forte
Do que a minha?
Não sabes que
Sem palavras
Nem tu me salvas,
Rainha?

PROVAR FEL
Em edição?
Tomei-o,
Nestes meus dias.
Castigo
Por afeição,
Derramado
Em poesias,
Palavras ditas
Em vão,
Estreitas sendas
Vazias...

INCAPAZ 
De as trilhar
Fui procurar
Novas vias,
Mas gastas
As encontrei,
Incertas
Em seu destino...
....................
Senti-me um pouco
Estranho
E perdi-me
Do caminho...

DEPOIS VIERAM
Flores...
...................
Tantas vezes disse
"Não!"...
Sempre falhei
Nos amores
E, agora, esta
Paixão!

NEM SEI O QUE
Aconteceu...
Um enigma,
Esse seu rosto!
Vi nele o que
Em mim faltava,
Tropecei,
Fiquei exposto,
Como ferida
Sempre aberta
Ao rubro o seu
Sangrar,
Uma dor que
Quando aperta
Põe palavras
A voar...

PALAVRAS
De vivas cores
Mais fortes que
Oração
Fortalecem-me a alma
Resisto mais
À tensão...

PROVAR FEL
Em edição,
Em poema
Amargurado?
Pois seja esse
O destino
E se foi o meu
Pecado
Será sempre
Desatino
Sofrer assim
Este fado!

TEM SABOR 
De um remédio?
Talvez tenha,
Não duvido,
Só alivia,
Não cura,
É afecto proibido,
Inclinação
Da mais pura
Em que me sinto
Perdido...

JÁ NÃO A VEJO
Nem ouço,
É luz que nasce
De mim,
Se passar
Eu fujo dela,
Procuro-a no meu
Jardim
Como arbusto florido
Sempre ali
À minha frente...
................ 
De ser planta
Robusta
Não tem defeitos
De gente,
É esguia,
Não é gorda,
Tem mil folhas
De cetim,
Espera-me sempre
De pé
Mesmo ao lado do
Jasmim!

É AMOR
Em provação?
Se tem de ser,
Pois que seja,
Lanço versos por
Paixão
Onde quer que
Ela esteja,
Sai de mim 
Esta tensão
Como em cântico
D’igreja
Ou incenso 
Que respiro
E quando m’inunda
Por dentro
É pro céu
Que eu me viro.

PROVAR FEL
Em edição?
É enlace
Do mais puro,
Resulta 
Duma paixão,
Intensa 
Neste poema
E bela como 
Canção,
Mas abraço 
Sem futuro!
Jas_Cascata22-Exp.Rec

“Cascata”. Detalhe.

Poesia

PAIXÃO

Poema de João de Almeida Santos. 
Ilustração: “Cascata”. Original 
de minha autoria para este poema. 
Reproposição (com alterações) 
de um poema publicado há três anos, 
em resposta a um soneto de Ana de Sousa. 
Novembro de 2019.
Jas_Cascata22-Exp.

“Cascata”. JAS. 11.2019

MOTE - SONETO sobre a poesia 
de JOÃO DE ALMEIDA SANTOS

“Vinde cá meu tão certo Secretário”, 
Confirmai meu gosto de espelhar 
À Musa que recusa Amor notório 
Gritando ao Mundo o que não quero calar!  

De rosas, de loureiro, de jasmim 
De astral, de amargor, de doce fel 
As bagas, a folhagem, no jardim 
Onde abelhas obreiras fazem mel!  

Dizei o que tanto quero ouvir 
Que o que pensais, não quero, não! 
Escrevei que meu engenho repetir 

Só quero na rima, mil dores de coração. 
Enlace, ponto final, sem remédio é ir 
Do próprio veneno provar... em edição.” 
(AdS, 19.09.2016)

POEMA – “PAIXÃO”

ESPELHO MEU,
Espelho meu,
Vês dor mais forte
Do que a minha?
Não sabes que
Sem palavras
Nem tu me salvas,
Rainha?

PROVAR FEL
Em edição?
Tomei-o,
Nestes meus dias.
Castigo
Por afeição,
Derramado
Em poesias,
Palavras ditas
Em vão,
Estreitas sendas
Vazias...

INCAPAZ 
De as trilhar
Fui procurar
Novas vias,
Mas gastas
As encontrei,
Incertas
Em seu destino...
.................
Senti-me um pouco
Estranho
E perdi-me
Do caminho...

DEPOIS VIERAM
Flores...
.................
Tantas vezes disse
"Não!"...
Sempre falhei
Nos amores
E, agora, esta
Paixão!

NEM SEI 
O que aconteceu...
Um enigma,
Esse seu rosto!
Vi nele o que
Em mim faltava,
Tropecei,
Fiquei exposto,
Como ferida
Sempre aberta
Ao rubro o seu
Sangrar,
Uma dor que
Quando aperta
Põe palavras
A voar...

PALAVRAS
De vivas cores
Mais fortes que
Oração
Fortalecem-me a alma
Resisto mais
À tensão...

PROVAR FEL
Em edição,
Em poema
Amargurado?
Pois seja esse
O destino
E se foi o meu
Pecado
Será sempre
Desatino
Sofrer assim
Este fado!

TEM SABOR DE UM
Remédio?
Talvez tenha,
Não duvido,
Só alivia,
Não cura,
É afecto proibido,
Inclinação
Da mais pura
Em que me sinto
Perdido...

JÁ NÃO A VEJO
Nem ouço,
É luz que nasce
De mim,
Se passar
Eu fujo dela,
Procuro-a no meu
Jardim
Como arbusto florido
Sempre ali
À minha frente...
............... 
De ser planta
Robusta
Não tem defeitos
De gente,
É esguia,
Não é gorda,
Tem mil folhas
De cetim,
Espera-me sempre
De pé
Mesmo ao lado do
Jasmim!

PROVAR FEL
Em edição?
Se tem de ser,
Pois que seja
Lanço versos por
Paixão
Onde quer que
Ela esteja,
Sai de mim esta tensão
Como em cântico
D’igreja
Ou incenso que respiro
E quando m’inunda
Por dentro
É pro céu
Que eu me viro.

PROVAR FEL
Em edição?
É enlace
Do mais puro,
Resulta duma paixão,
Intensa no meu poema,
Talvez bela a canção,
Mas abraço sem futuro!
Jas_Cascata22-Exp.-cópia

“Cascata”. Detalhe.

Poesia-Pintura

PARA LEONARD

Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração, “Mil Beijos”. Original 
de minha autoria para este Poema,
dedicado a Leonard Cohen (1934-2016). 
Novembro de 2019.
MilBeij2Pub1711.7Experiencia

“Mil Beijos”. Jas. 11-2019

POEMA – “PARA LEONARD”

OUÇO-TE
Como respiro
Com a alma...
E como a sinto!
Vejo-a dançar
Na tua voz rouca
E grave
E, então, aninho-me
No regaço da tua
Melodia
A observar
O seu silêncio...
................
Mas estremeço
Como o rio quando
Entra na foz,
Mar adentro...

É SUAVE O REENCONTRO
Com ela,
Em fluxo submerso,
Como as dobras
Das palavras
Quando se ajeitam
Nas estrofes
Dos meus poemas
Ou os sons
Quentes
Na tua melodia,
Vindos lá do alto
Como ecos
Da montanha
Sagrada.

OUVIR-TE, ÀS VEZES,
Arrepia-me
Porque na tua voz
Acolhedora
Sinto-a
Dentro de mim
A segredar-me
O seu impossível
E sufocado
Silêncio.

E, ENTÃO, DANÇO,
DANÇO
Com a alma
Até ao fim...
.....................
Que nunca mais chega!
E não paro até 
(Já exausto)
Cair em mim...

OS MIL BEIJOS
Que não lhe dei
São, na tua melodia,
Mais profundos
Que as profundezas
Do mar,
Mais intensos
Que mil abraços
À superfície
Do seu corpo...

E ATÉ OS TEUS SORRISOS
Maliciosos
E os gracejos
Inocentes
Me levam
A inventar
Palavras quentes
Como balões coloridos
Que lanço
Ao vento
Que sopra
Na sua alma...

NÃO SOU COMO TU,
Leonard,
Eu esboço sozinho
Tristes canções
Em surdina
Até às lágrimas secas
Que nunca enxugam
Porque não tenho
Voz que chegue
Para a chamar 
Ao poema...
...................
Nem ela me ensinou
A cantar,
Por falta de jeito
E de tempo
Para amar...

MAS CANTAS TU
Por mim e por ela
E, então, ouço-te
Extasiado
Como se fosses
 Oráculo
Onde o silêncio
Partilhado
Se disfarça
De oração
Nos teus sons
E na tua voz
Para me enternecer
Até à emoção.

NÃO ME DESPEÇO,
De ti,
Com um abraço,
Leonard!
Vou continuar
A ouvir-te
Enquanto o silêncio
Me interpelar
No oráculo
Da tua melodia
E por ela sofrer
Dessa melancolia
Que nunca nos abandona,
Seja noite
Ou seja dia...
MilBeij2Pub1711.6Rec

“Mil Beijos”. Detalhe.

 

 

 

 

 

Artigo

A ÚLTIMA OPORTUNIDADE DE

PEDRO SÁNCHEZ

João de Almeida Santos

Manifiesto Cat1

Espanha está a transformar-se num interessante laboratório político, quase destronando a politicamente imaginativa e algo caótica Itália. Quase, porque a realidade italiana ainda continua a superar a imaginação de qualquer realista virtuoso que se dedique à análise política. Bastará concentrar-se no percurso do Movimento5Stelle ou na autoflagelação do Partito Democratico. O que não surpreende se até o tradicionalista e previsível Reino Unido nos tem levado a uma inimaginável surpresa  perante as infindáveis peripécias do Brexit, de Cameron a May, ao exuberante Boris Johnson.

Um casamento forçado

Aqui ao lado, estamos a conhecer um delicado processo de reivindicação de autodeterminação por parte de consistentes sectores da Catalunha. E assistimos ao espectáculo de quatro eleições legislativas em quatro anos. E ao surpreendente boom da extrema direita espanhola protagonizada pelo recente partido de Santiago Abascal. E, agora, provavelmente, à concretização de um governo do PSOE e do PODEMOS, quando há dois meses fora recusado liminarmente por um Sánchez politicamente muito mais robusto (tal como Pablo Iglesias) do que é hoje. De facto, não se vê outra solução que não seja a de um entendimento entre o PSOE e Podemos, com um governo protagonizado por Sánchez. Mas talvez isso ajude a um confronto mais sério e realista com o problema catalão e ajude a resolvê-lo. De qualquer modo, Sánchez carregará sempre o fardo de ter provocado eleições desnecessárias.

Ilações

Eu creio que é possível retirar destas eleições algumas ilações:

  1. Sánchez cometeu o erro de não ter formado um governo com o PODEMOS, acabando por provocar quatro eleições desde 2015 e por ser penalizado pelos eleitores em cerca de 700.000 votos e três deputados, arrastando com ele o partido de Iglesias, que perdeu mais de 600 mil votos e sete deputados. Agora, mais fragilizado, vai ter de fazer aquilo que, politicamente mais robusto, não quis fazer. PSOE e PODEMOS governarão com menos votos e menos mandatos do que tinham antes. Mais vale tarde que nunca e, pelos visto, já há pré-acordo.
  2. Os independentistas catalães já não tinham conseguido a maioria de mandatos nas eleições de Abril (tinham 22 mandatos, para um total de 48, e 1.626.001 votos para um total de 4.198.965 votantes, atingindo apenas 38,7% dos votos), tendo agora conseguido mais 16.063 votos e mais um mandato, perfazendo, assim, 23 mandatos, ou seja, dois mandatos abaixo do número necessário para ter maioria (que, na Catalunha, é de 25 mandatos).
  3. Parece ser consensual que o VOX teve esta subida estrondosa (quase mais um milhão de votos e mais 28 deputados), tornando-se, em pouco tempo, a terceira força política de Espanha, devido à reacção dos espanhóis às pretensões de secessão dos autonomistas catalães, ou seja, transformando-se esta pretensão em factor de radicalização política à direita. Deste ponto de vista, o nacionalismo catalão é perfeitamente simétrico ao nacionalismo do VOX. O radicalismo de um alimenta-se do radicalismo do outro.

O secessionismo é minoritário

 Mas, mais relevante do que isso, é a confirmação de que o secessionismo catalão não é, pela segunda vez consecutiva em 2019, maioritário na Catalunha, sendo, por isso, necessário questionar a legitimidade (mais profunda que a legalidade) das suas pretensões, tanto mais que a doutrina comum das constituições democráticas, como, por exemplo, as de Portugal, França, Itália, Alemanha, USA, exige que alterações constitucionais substanciais ou sejam proibidas (como, por exemplo, a unidade territorial, na constituição francesa, ou a forma republicana de governo, na constituição italiana) ou, então, decorram de maiorias qualificadas. Ora, se nem maioria simples têm em eleições legislativas, com uma taxa de participação assinalável, cerca de 72%, que suporte ou legitimidade tem essa reivindicação e que efeitos tem a não ser promover o crescimento de um perigoso nacionalismo pouco amigo da democracia e das próprias autonomias? Não deixa, todavia, de ser curioso que a exacerbação da questão catalã tenha sido provocada precisamente por aqueles que são mais rígidos em relação às autonomias, ou seja, o PP, responsável por ter mandado para o Tribunal Constitucional o estatuto que Zapatero tinha negociado, em 2006, com sucesso com os catalães. Ou seja, o PP recebeu como boomerang agravado o problema que julgava, com Rajoy, ter erradicado através do Tribunal Constitucional, em 2010. Levanta-se, agora, para o resolver de novo, exacerbando-o outra vez? Não, quem agora aparece é o VOX.

É necessário levar a sério a questão catalã

De qualquer modo, ainda que minoritário na sociedade catalã, com cerca de 7,5 milhões de habitantes, e no corpo eleitoral (em Abril os independentistas tiveram menos 800 mil votantes do que a tendência não independentista e em Novembro a diferença foi de cerca de 441 mil), não há dúvida de que o problema político existe e de que é preciso solucioná-lo, não através de tribunais, mas sim politicamente. E não vejo outra solução séria e que atenda às duas sensibilidades que não seja a de iniciar um caminho que possa conduzir a uma revisão global das autonomias ou mesmo à criação de um Estado federal, de resto não único na Europa, sendo certo que o problema da identidade das regiões ou das nacionalidades é perfeitamente compaginável com uma constituição comum avançada no plano federal, exigente tão-só daquilo a que Habermas chama “Verfassungspatriotismus”, patriotismo constitucional. Esta compatibilidade está muito bem exposta pelo filósofo alemão num escrito dos anos ’90 intitulado “Cidadania e Identidade Nacional”, quando tenta fundamentar a ideia de uma cidadania europeia (Veja-se a este respeito: HABERMAS, Jurgen (1992). “Cittadinanza e Identità Nazionale”. In MicroMega 5/91, 121-146). Ou seja, a questão da identidade nacional pode ser resolvida num quadro constitucional comum e num “patriotismo constitucional”. Uma coisa é a identidade nacional, outra é a cidadania e a moldura constitucional. Esta lógica está inscrita no desenho de uma democracia europeia a que os independentistas afirmam desejar pertencer. A moldura constitucional europeia não anularia a identidade nacional nem regional.

Um problema mais vasto

Mas também é verdade que a política em Espanha também está a espelhar aquela que começa a ser uma tendência dominante nas democracias ocidentais, ou seja,  a fragmentação dos sistemas partidários com o fim da bipolarização centro-esquerda/centro-direita entre os partidos do sistema, o que torna o funcionamento dos sistemas políticos muito mais complexo, exigindo cada vez mais o regresso da política, das ideologias e das bússolas cognitivas que possam orientar os cidadãos nas escolhas eleitorais e na participação política num panorama fortemente fragmentado.  Ou seja, o problema está em Espanha, mas ele é mais profundo que o problema espanhol, porque toca no essencial a fractura que se tem vindo a estabelecer e a aprofundar entre o establishment político tradicional (por mais que use a “langue de bois do politicamente correcto e da performatividade tecnológica) e a mudança estrutural na natureza da cidadania, decorrente da revolução tecnológica e da globalização.

 

Poesia-Pintura

NÃO ME OUVES…

Poema de João de Almeida Santos.
Ilustração: “Voar”.
Original de minha autoria
para este poema.
Novembro de 2019.
Voar1011

“Voar”. Jas. 11-2019

O POEMA – “NÃO ME OUVES…”

NÃO ME OUVES,
Perdida
Que andas
Nas tuas rotinas,
Na vertigem
De cada teu
Amanhecer
Como se a arte
 Pudesse, assim,
Acontecer...

NÃO HÁ CRIAÇÃO
SEM LIBERDADE,
Aquela que
Construímos
Sobre as ruínas
Do nosso próprio
Viver...

A PROCURA
DE ETERNIDADE,
A chegada à galeria
Dos imortais
Só acontece
Quando das ruínas
Se eleva
Um silêncio
Que te fala
Em surdina...
.............
E nada mais!

MAS GOSTAS
De te pôr
Fora do mundo
(Eu bem sei)
Observá-lo,
Tomá-lo
Nas tuas mãos
Como brinquedo
Em construção,
Estética virtuosa,
Minúcia de
De artesão...

MAS É FRÁGIL
A utopia,
Que o mundo só
Se deixa possuir
Pela dor,
Pela liberdade
Em ferida aberta,
Por intensa
Melancolia
Ou vida sofrida
E incerta...

CAIR NO MUNDO,
Tropeçar nele,
Molhar as asas
Da alma,
Caminhando
Pelas ruas da
Cidade
Como silhueta
Em dias de
Densa
Neblina ou
De chuva
Tropical,
Sem saber
Pra onde ir,
Perdida
Em intenso
Vendaval...
............
Oh, então,
Gela-te
A alma
E sentes-te
Profundamente
Mortal...

INUNDA-TE
De chuva
Por dentro
E elevar-te-ás,
Um dia,
Para além da tua
Janela
De persianas
Coloridas,
Possuirás o mundo
Com essas mãos
Que afagam
As cores do
Arco-íris
No vale
Em que habitas,
Depois da tempestade...

A ARTE
É liberdade,
É subir pelas
Sete cores acima
E voar
Para a montanha
À procura
Do infinito
Sideral,
Do tempo
À medida do
Desejo...

AH, COMO GOSTARIA
De te emprestar
As minhas asas
Com cicatrizes
Da vida
Para voares
Mais alto
Que o azul
Do céu
Onde pudesses
Levitar
Sobre um poema
Sem risco
De te perderes...
..................
Mas tu não me ouves,
Meu amor!
Voar1011Rec

“Voar”. Detalhe.